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um modelo teórico para a integração regional, Notas de aula de Relações Internacionais

O neoliberal institucionalismo é resultado do desenvolvimento histórico de outras teorias. Suas origens estão ligadas à teoria neofuncional e a teoria da ...

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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O NEOLIBERAL INSTITUCIONALISMO:
um modelo teórico para a
integração regional
1995
Cadernos Cedec nº 50 Karina L. P. Mariano
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O NEOLIBERAL INSTITUCIONALISMO: um modelo teórico para a integração regional 1995

Cadernos Cedec nº 50 Karina L. P. Mariano

CADERNOS CEDEC N° 50

COORDENADOR EDITORIAL Pedro Roberto Jacobi

CONSELHO EDITORIAL Amélia Cohn, Eduardo Kugelmas, Gabriel Cohn, Gildo Marçal Brandão, José Álvaro Moisés, Leôncio Martins Rodrigues, Lúcio Kowarick, Marcelo Coelho, Marco Aurélio Garcia, Maria Teresa Sadek, Maria Victoria de Mesquita Benevides, Miguel Chaia, Pedro Roberto Jacobi, Regis de Castro Andrade, Tullo Vigevani e Valeriano Mendes Ferreira Costa

DIRETORIA Presidente: Amélia Cohn Vice-Presidente: Pedro Roberto Jacobi Secretário-Geral: Tullo Vigevani Tesoureiro: Regis de Castro Andrade

Cadernos Cedec - Centro de Estudos de Cultura Contemporânea São Paulo: Cedec, 1995 Periodicidade: Irregular ISSN: 0101-

ÍNDICE

  • INTRODUÇÃO
  • NEOFUNCIONALISMO E A TEORIA DE ROGOWSKI
  • TEORIA DA INTERDEPENDÊNCIA
  • O NEOLIBERAL INSTITUCIONALISMO
  • BIBLIOGRAFIA..........................................................................................................

INTRODUÇÃO^1

Considera-se, que após o fim da Guerra Fria e o conseqüente desmantelamento do sistema bipolar, o mundo estaria passando agora por uma fase de reorganização do sistema de poder e, portanto, ainda não estaria definida qual seria a nova ordem política a reger as relações internacionais.

Apesar dessa desordem aparente do sistema internacional, há um certo consenso de que, seja qual for a nova ordem, está terá como característica as relações de interdependência, situação esta em que os atores são afetados, de forma potencialmente custosa, pelas ações dos outros.

Os fatores econômicos tornaram-se elementos explicativos importantes das relações internacionais, uma vez que sua capacidade de incidir nas formulações estratégicas vem aumentando no decorrer dos anos.

A questão do desempenho econômico vem assumindo importância crescente dentro das relações internacionais e, em decorrência disso, os países lançaram-se numa corrida em busca de melhor eficiência nesse âmbito.

A fim de promover tal desenvolvimento, as nações têm seguido as mais variadas estratégias. No caso do Cone Sul, a escolha recaiu sobre um processo de liberalização/abertura econômica, simultâneo a um processo de integração econômica.

Dentro deste novo panorama internacional se desenvolveu o Mercosul, e por isso talvez este processo de integração seja diferente de todas as experiências de integração anteriores, do tipo ALALC, ALADI (na América Latina) ou até mesmo a da ex-Comunidade Econômica Européia.

Em função deste novo cenário externo, não se pode analisar uma integração econômica sem, por exemplo, levar em conta o processo de interdependência econômica que existe atualmente entre os países, ou deixar de lado o fenômeno da globalização.

(^1) Agradecemos ao CNPq e à FAPESP pelo apoio parcial dado à pesquisa “Globalização e Regionalização no MERCOSUL: a intervenção dos sindicatos no processo de integração” , realizada no CEDEC e coordenada pelo Prof. Tullo Vigevani, e da qual este texto é um resultado parcial.

b) com interesses competitivos, ou seja, há um conjunto de interesses que competem entre si, tendo como respaldo para essa disputa uma sociedade como elemento de organização. Neste caso, o interesse comum não surge como resultado de uma homogeneidade, mas da própria diferença. É isto que motiva, por exemplo, as integrações econômicas.

Toda integração possui internamente um processo preliminar e constante de identificação das divergências e dos conflitos, resultando numa negociação permanente de interesses que posteriormente criará a base para a formulação de um interesse comum.

Dentro deste contexto, haveriam quatro condições para se criar uma instituição internacional (isso vale para ambos os grupos):

  1. desenvolvimento de instituições relacionadas a determinadas tarefas;

  2. as funções desempenhadas devem ser capazes de criar políticas ou normas efetivas a serem respeitadas pelo conjunto dos participantes. Elas devem ser implementadas de fato, e para isso necessitam de instrumentos de ação, o que implica alguma forma de transferência de autoridade dos países-membros para essa instituição;

  3. Cada função tem que ter capacidade de criar novas funções, de se expandir e, a cada nova etapa, fortalecer a anterior. Isto dinamiza o processo de integração e a cooperação. É a idéia de Ernest Haas a respeito do spill-over^4. O spill-over pressupõe a existência de um núcleo funcional que dá origem à integração regional, porque ele contém uma capacidade autônoma de provocar estímulos integracionistas, incorporando ao longo de seu trajeto novos atores e setores relevantes (HIRST, 1991);

  4. compromisso dos Estados em participarem de modo cooperativo desse processo. O compromisso é o resultado de uma escolha racional feita pelos tomadores de decisão de cada nação.

O tema fundamental para esta concepção teórica é o processo decisório, é saber como os interesses são negociados no nível internacional. A tomada de decisão é uma conseqüência da disposição dos países de negociarem e, portanto, possui uma lógica de negociação diversa da lógica dos outros tipos de negociações internacionais.

(^4) O termo spill-over não possui uma tradução teórica específica, por isso será sempre usado em inglês; seu significado está ligado com a idéia de “derramamento”, de algo que se inicia num determinado ponto e se “desparrama”.

Para a teoria neofuncional essa particularidade levaria naturalmente à formação de instituições supranacionais, as quais seriam capazes de lidar com os possíveis problemas que surgiriam ao longo da integração. Além disso, seria a partir de uma supranacionalidade que os integrantes do processo poderiam formular interesses comuns, graças ao distanciamento e desvinculação de sua atuação do controle nacional.

A tomada de decisão nesse contexto supranacional seria facilitada porque partiria de um denominador comum, que é o interesse compartilhado por todos de integrarem-se, e, no decorrer das negociações, as diferenças seriam aparadas através de uma tentativa de maximização dos pontos em comum, deixando de lado, num primeiro momento, as divergências mais difíceis de serem conciliadas. Com isso, seria possível a criação de uma agenda de negociação positiva que permitiria a descoberta de áreas e elementos impulsores do processo.

O neofuncionalismo tem sua preocupação voltada para a articulação dos interesses presentes nas sociedades envolvidas. Se esses interesses estão bem articulados ou a integração está capacitada para absorvê-los e processá-los, provavelmente haverá capacidade de controlar e minimizar os efeitos negativos que poderão afetar determinados setores da sociedade, considerados como importantes (MARIANO, 1994). A criação da agenda positiva facilita a conciliação dos interesses variados, ao formular patamares mínimos de adequação entre eles.

Em algum momento, a integração impacta as sociedades envolvidas, principalmente nos aspectos econômicos, afetando os interesses dos grupos componentes das mesmas, sejam estes organizados ou não.

Para que a integração possa avançar, os neofuncionalistas consideram prudente relativizar os impactos sobre os interesses dos grupos para evitar uma situação na qual a oposição destes seja capaz de impedir ou obstacularizar o andamento do processo.

Nesse sentido, o interesse de Haas (HAAS, 1963) pela questão da integração econômica reside nas potencialidades por ela apresentadas de proporcionar conhecimentos sobre o processo de formação de comunidades no âmbito internacional.

Este autor considera que a verdadeira integração somente é possível quando o critério subjetivo das expectativas de certas elites é satisfeito. Se as elites^5 mais importantes da região têm suas expectativas convergindo com as demandas e os benefícios decorrentes da integração

(^5) Elites econômicas e políticas principalmente.

O estreitamento dos vínculos entre as organizações nacionais, no nível internacional (como partidos políticos, sindicatos, associações profissionais, organizações religiosas e outras instituições semelhantes) é essencial para uma integração regional mais ampla.

No caso europeu, a aproximação e comunicação mais intensa entre as elites ocorreram com a realização do Ato Constitutivo Institucional. A partir de então, configurou-se um relacionamento estreito entre sindicatos, uniões industriais, partidos políticos e altos funcionários, o que deu maior impulso à Comunidade do Carvão e do Aço, permitindo um aprofundamento da relação, transformando-a num Mercado Comum graças à criação de um âmbito institucional para facilitar as negociações e promover a cooperação (HAAS, 1964).

O núcleo funcional conseguiu atrair apoio e ampliar o processo -- e conseqüentemente realizar o spill-over -- quando passou para os políticos e as elites dominantes a percepção da cooperação como algo capaz de produzir mais ganhos, ao invés de sacrifícios. A realização desse spill-over se deve à conversão dos grupos anteriormente indiferentes ou hostis à integração, em seus defensores, em decorrência dos sucessos alcançados, os quais reforçaram o entusiasmo por maiores expectativas e novas demandas, fatores estes mobilizadores do processo^7.

Além disso, é preciso oferecer aos grupos participantes compensações por sua participação e para equilibrar os possíveis efeitos deletérios que ela possa ocasionar. Isto é muito importante no caso dos sindicatos e dos setores econômicos que possam ser afetados de forma negativa. A perspectiva futura de receber algo em troca do sacrifício presente estimula o apoio à integração brindado por estes grupos desfavorecidos pela própria.

Entretanto, esta situação somente pode se concretizar se os governos criarem algum tipo de espaço institucional para a participação, por exemplo, do movimento sindical (HAAS, 1964).

Contudo, a mera participação não é suficiente para pressionar os governos a fornecerem compensações aos sindicatos, que são os atores estudados nesta análise; eles mesmos deveriam, segundo Haas, promover uma atuação conjunta em base a uma lógica supranacional. Esta lógica supranacional possibilita a formação de uma nova coalizão com interesses regionais, não mais ligada às questões meramente nacionais, pois haveria um novo “centro de fidelidade”.

(^7) Este seria um movimento de realimentação, no qual cada objetivo atingido implica novas demandas que, por sua vez, produzem mais realizações, e assim por diante.

Utilizando o modelo de Rogowski^8 (ROGOWSKI, 1989), pode-se avaliar os possíveis impactos de variáveis internacionais nos processos políticos domésticos e, inversamente, qual o papel da política interna na determinação dos posicionamentos internacionais, e com isso entender o estímulo à participação por parte das centrais sindicais.

A tese de Rogowski, dentro deste quadro, é de que, frente às possibilidades de maior exposição ao comércio internacional, formam-se coalizões sociais de acordo com a capacidade dos atores de competirem nessa nova situação de abertura econômica. Há nesse modelo duas variáveis causais: os fatores de produção e as variações nos níveis de exposição comercial; esta última variável reflete uma série de condicionantes que estão muito ligados com a capacidade competitiva.

O autor baseia sua tese numa adaptação à política do teorema econômico de Wolfang Stopler e Paul Samuelson. Conforme o teorema, um país exporta bens que utilizam intensivamente fatores de produção que ele possui em relativa abundância em relação à distribuição internacional desses fatores, e importa os bens produzidos pelo uso intensivo de fatores de produção que ele possui em relativa escassez.

Para Rogowski, os detentores de fatores de produção beneficiados em cada uma dessas situações tenderiam a tentar traduzir sua situação econômica em termos políticos, através do aumento de sua influência no processo decisório. Este modelo teórico busca sugerir que tipos de coalizões tendem a se formar de acordo com as flutuações do comércio, tendo em conta que isto se dá dentro de um processo histórico cujos resultados são, em última instância, conseqüências das escolhas e do comportamento dos diferentes atores sócio-políticos.

Os sindicatos brasileiros, por exemplo, face aos novos fenômenos econômicos -- regionalização e globalização -- seguiriam a lógica do modelo de Rogowski: quando ameaçados, tenderiam a pressionar o governo por maior proteção; quando favorecidos, apoiariam suas políticas liberalizantes e de abertura comercial^9.

Este aspecto demonstra bem a interligação do modelo de Rogowski com a teoria neoliberal institucionalista, porque os constrangimentos produzidos pelo comércio criariam uma série de demandas por parte das coalizões sociais formadas, as quais através do governo,

(^8) É preciso assinalar que a utilização deste modelo se limita a tentar entender a mobilização das centrais sindicais, mas não trata do processo de integração em si. Assim, esta explicação será realizada com o uso de conceitos pertencentes à abordagem neoliberal- institucionalista, não havendo problema de contradições entre ambas explicações uma vez que o modelo de Rogowski está inserido numa abordagem neoliberal. 9 A veracidade desta suposição será confirmada ou não no decorrer da análise.

Essa alteração na perspectiva de atuação dentro do sistema internacional significou a perda, por parte do Estado-nação, de seu status de ator dominante, e praticamente único, da política mundial; seu "poder" foi obscurecido pelo surgimento de novos atores internacionais, tais como as corporações multinacionais, movimentos sociais transnacionais e organizações internacionais.

Além disso, a existência da interdependência afetou a política internacional e o comportamento dos Estados. Todavia, apesar da existência dos novos atores, são os governos nacionais que controlam e regulam as relações transnacionais e interestatais.

Durante a Guerra Fria utilizou-se muito o conceito de "segurança nacional" para justificar, e até mesmo formular, as estratégias políticas exteriores dos países. Muitas vezes apelava-se para a segurança nacional para favorecer políticas comerciais protecionistas.

Contudo, a alteração nas relações internacionais, que resultou numa maior interdependência, fez com que essa noção de segurança nacional, de certa forma, fosse ampliada, não porque os conflitos de interesses desapareceram, mas porque estes assumiram novas formas.

Os interesses assim como as questões de segurança ampliaram-se para além das fronteiras nacionais. A sobrevivência das populações deixou de ser um problema nacional para internacionalizar-se, passando a depender das soluções contra os perigos militares e ambientais.

Os países tornaram-se mais vulneráveis às catástrofes, tanto militares como ecológicas, e a solução para esse tipo de questão não é de escolha múltipla, no sentido de não haver lugar para os conflitos resultantes das discussões sobre como resolver tais questões e sobre quem deveria arcar com os custos de tal solução, devido à necessidade de se encontrar o quanto antes uma saída para o problema, a fim de que seus efeitos sejam minimizados (KEOHANE e NYE, 1989).

Desta forma, a discussão gira em torno de quanto cada ator está disposto a cooperar e de que modo pretende concretizar tal cooperação. Nas relações de interdependência os objetivos domésticos e transnacionais, assim como os interesses governamentais, estão interligados.

Um bom exemplo disto é a questão ambiental. É comum um país sofrer com a poluição do ar ou dos rios provocada por um país vizinho. Frente a esse tipo de problema, a única

representantes da sociedade civil, podendo ter fins lucrativos, como as empresas multinacionais, ou não, como no caso das Organizações Não-Governamentais (ONGs).

solução eficiente é enfrentar essa poluição com uma política cooperativa entre ambos, porque qualquer ação unilateral do país afetado resulta inútil.

O conceito de interdependência dentro da política externa refere-se às situações caracterizadas pelos efeitos recíprocos entre países ou atores nos diferentes países (KEOHANE e NYE, 1989). Tais efeitos geralmente resultam das transações internacionais, que aumentaram muito desde a Segunda Guerra Mundial.

Onde há interdependência, encontram-se também custosos efeitos das transações, que nem sempre são impostos direta ou intencionalmente por algum ator, mas que surgem devido às circunstâncias, como no caso da necessidade de realizar uma ação coletiva para prevenir desastres no sistema ambiental ameaçado pelo aumento gradual de resíduos industriais.

Na perspectiva de Keohane e Nye, as relações de interdependência sempre implicarão custos para os envolvidos, e a princípio não é possível especificar se os benefícios do relacionamento serão maiores do que seus custos; nada garante que essas relações de interdependência se beneficiem mutuamente.

Utilizando as concepções destes autores, a interdependência complexa é um tipo ideal, que se opõe ao realismo, pretendendo explicar as mudanças nos regimes internacionais dentro deste contexto de maior complexidade, utilizando a noção de poder.

Na perspectiva realista, a política internacional é uma luta em busca do poder, cuja principal característica é a violência organizada. Dentro desta visão teórica estão embutidas três suposições:

  1. Estados são os atores determinantes na política mundial;
  2. Força é um instrumento possível e eficaz da política;
  3. Existe uma hierarquia nos assuntos de política externa, encabeçados pelas questões de segurança militar.

A política internacional, segundo a versão realista, é um conflito potencial entre as nações, e o uso da força é um elemento sempre presente. Assim, as aproximações entre os Estados, e até mesmo as integrações, ocorrem durante e na medida em que atendam aos interesses da nação mais poderosa.

Para melhor entender esse "poder" na interdependência é preciso diferenciar duas dimensões: sensibilidade e vulnerabilidade. Todos os atores internacionais são sensíveis e vulneráveis aos fatores externos, porém a intensidade com que tais fatores externos os atingem é bem diferenciada. Um ator pode ter pouca ou muita sensibilidade, ou vulnerabilidade; isso dependerá de algumas de suas características particulares.

A sensibilidade é diferente da vulnerabilidade, aquela se manifesta quando alguma alteração no panorama externo provoca reações no nível interno. A vulnerabilidade, por sua vez, refere-se à capacidade (ou grau dela) de um ator arcar com os custos das mudanças necessárias para enfrentar tais alterações externas.

Em termos de custos da dependência, a sensibilidade refere-se à obrigação de arcar com os custos impostos pelos efeitos exteriores antes que sejam alteradas as políticas, na tentativa de mudar a situação. Enquanto a vulnerabilidade está ligada à obrigação de um ator de sofrer os custos impostos pelos eventos externos, depois que as políticas foram alteradas.

Nesse sentido, a vulnerabilidade é um elemento importante para entender a estrutura política do relacionamento interdependente, já que aquele ator que possui menor vulnerabilidade aos efeitos externos tem maior capacidade de barganha nas suas relações internacionais.

Os conceitos de vulnerabilidade e sensibilidade são mais aplicados aos Estados do que aos demais atores internacionais, devido às características de cada tipo de ator e às suas formas de participação dentro do sistema internacional. Existe hoje uma proliferação institucional que, no entanto, não corresponde a uma verdadeira transferência ou delegação de competência por parte dos Estados; estes conservam ainda seus poderes de decisão e estão incessantemente buscando a consolidação de suas influências.

Uma vez que a autonomia dos Estados está parcialmente limitada pelo fenômeno da interdependência, surge um dilema para os formuladores e tomadores de decisão: reafirmar a soberania estatal por meio de decisões unilaterais ou formar instituições multilaterais e aderir a elas.

As instituições multilaterais, como já foi visto anteriormente, servem para promover a cooperação entre os governos, a fim de melhorar a capacidade individual de cada um para lidar com um conjunto de problemas que unilateralmente seriam difíceis de solucionar. Tais

instituições^11 estabelecem normas e criam estruturas no seio das quais podem ser concretizados acordos entre governos.

As relações de interdependência resultam em custos para os atores nelas envolvidos em conseqüência da restrição à autonomia de cada um. De acordo com o poder de cada ator e da natureza da relação é que serão especificados os custos e os benefícios, assim como a forma como ambos serão distribuídos.

Os custos e benefícios resultantes de uma relação são desconhecidos a priori , assim como nada garante que os benefícios sejam mútuos e eqüitativos. Portanto, as relações de interdependência não são necessariamente simétricas (ou pode-se dizer que a interdependência geralmente é assimétrica).

A interdependência assimétrica descreve a realidade das relações internacionais: os participantes sofrem com freqüência limitações, mas devido à posse de instrumentos mais efetivos, à maior capacidade de projetar poder e a um grau menor de vulnerabilidade, um Estado pode se colocar dentro do relacionamento de forma mais poderosa e repassar assimetricamente parte dos seus custos da relação para o(s) seu(s) parceiro(s).

A expansão dos blocos econômicos pode ser considerada como um reflexo das pressões da assimetria, ao aumentarem os riscos econômicos dos países que permanecem fora dessa estrutura de blocos, assim como minam a realidade da autonomia política da opção de permanecer independente. Isso faz com que países em desenvolvimento, que geralmente dispõem de poucos incentivos para investirem em instituições multilaterais, procurem apoiá- las.

Este novo tipo de relacionamento entre Estados limita a autonomia política de cada um, porém não ameaça a sua soberania formal porque sua adesão a um ou mais acordos internacionais faz parte das atribuições de um Estado soberano. Quando os governos assim o fazem, estão reduzindo sua própria liberdade de ação, tendo por contrapartida limitações semelhantes na liberdade de ação de seus parceiros.

Deste modo, os governos criam uma cooperação ao aceitarem limitar sua soberania operacional para atingirem resultados que somente podem ser assegurados pela ação dos demais. Com isso, o controle dos eventos sob a própria jurisdição é sacrificado em troca de um certo controle sobre os eventos no território alheio.

(^11) São também chamadas de regimes internacionais pela literatura das relações internacionais.

A partir dessas noções, o neoliberal institucionalismo avança na teorização da integração econômica regional, ao assimilar também pressupostos provenientes do realismo. O neoliberalismo, da mesma forma que o realismo, considera que os Estados são os atores centrais nas relações internacionais, porém, diferentemente dos realistas, considera que as instituições internacionais são atores relevantes dentro do sistema internacional.

Os Estados interagem num determinado meio ambiente -- o sistema internacional --, mas não são seus únicos atores porque outros tipos de interações ocorrem com importância política significativa entre organizações não submetidas a algum tipo de controle governamental.

Sua capacidade de operar como atores internacionais ou transnacionais advém do fato dos homens terem um leque de identidades e interesses muito mais amplo do que o fornecido pela nação (KEOHANE & NYE, 1981). Daí utilizarem outras formas corporativas de representação para canalizar suas demandas.

Estas relações transnacionais são todo tipo de contatos, coalizões e interações ocorridas fora das fronteiras nacionais e que não são controladas pelos órgãos de política externa dos governos.

A globalização supõe uma série de interações a nível mundial; elas poderiam ser esquematizadas em quatro tipos:

  1. comunicação ou circulação de informações;
  2. transporte ou movimento de objetos;
  3. finanças ou mobilização de dinheiro e instrumentos de crédito;
  4. movimento de pessoas. Algumas dessas interações são realizadas e mantidas quase que exclusivamente pelos governos dos países; são as chamadas interações interestatais. Outras, contudo, são efetuadas por atores não-governamentais, que podem ser indivíduos ou organizações. Este segundo tipo são as interações transnacionais, cuja principal característica é o papel central desempenhado por elas.

As relações interestatais instituem os governos como agentes através dos quais as sociedades interagem politicamente umas com as outras. Por outro lado, as relações transnacionais são levadas a cabo por indivíduos ou grupos de indivíduos de uma dada

sociedade, que desempenham diretamente seus papéis na política mundial, independentemente de seus próprios governos (KEOHANE & NYE, 1981).

Um dos efeitos das relações transnacionais é o aumento da sensibilidade entre as sociedades, através do qual, ocorre uma alteração no relacionamento entre os Estados. Essa ação sobre a sensibilidade do Estado resulta na alteração dos comportamentos dos grupos domésticos constituintes de sua sociedade que, ao serem expostos ou ao entrarem em contato mais intenso com os de outras sociedades, modificam suas formas de atuação e questionam questões anteriormente aceitas e reconhecidas como válidas.

A maior interação entre as sociedades pode, assim, influenciar as opiniões e percepções de seus cidadãos sobre a sua realidade dentro do panorama nacional, ao mesmo tempo em que novos mitos, símbolos e valores são criados comunitariamente entre elas. Esses novos códigos valorativos de comportamento dão legitimidade às mudanças sociais que se processam.

Um segundo efeito produzido pelas relações transnacionais é a promoção do pluralismo internacional, que se dá através da aproximação e interligação dos grupos de interesse nacionais dentro das estruturas transnacionais, facilitando a promoção da cooperação.

Outra conseqüência desse tipo de relacionamento é a emergência de uma dependência e interdependência mais aprofundadas, e a criação de novos instrumentos de influência mútua.

O aumento da sensibilidade, portanto, resulta da interação transnacional mais ampla das organizações internas, mas, principalmente, da incapacidade estatal de controlar estas interações.

Não considerar os efeitos das relações transnacionais sobre o sistema internacional e sobre os Estados nacionais limita a compreensão deste cenário porque são ignorados atores relevantes, embora não-governamentais, que também utilizam meios similares aos usados pelos governos para atingirem seus fins.

No atual contexto mundial, muitas empresas transnacionais lidam com capitais ou recursos superiores aos de muitos países cujo desenvolvimento econômico ainda é limitado. Por conseguinte, o seu poder político de pressão e manipulação dentro do âmbito externo não é desprezível, muito pelo contrário.

Recentemente, a Argentina e o Brasil depararam-se com uma situação conflitiva em decorrência de acordos assinados no contexto do Protocolo de Ouro Preto, por considerá-los (o Brasil) como potencialmente prejudiciais, pois poderiam criar entre ambos uma desigual