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TRADUZIR O OUTRO ORIENTAL, Notas de estudo de Tradução

They are now free to negotiate and translate their cultural ... For Fear of the Fire – Joan of Arc and the Limits of. Subjectivity.

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Rio890
Rio890 🇧🇷

4.8

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UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE LETRAS
PROGRAMA EM ESTUDOS COMPARATISTAS
TRADUZIR O OUTRO ORIENTAL
A CONFIGURAÇÃO DA FIGURA FEMININA NA LITERATURA
PORTUGUESA FINISSECULAR
(ANTÓNIO FEIJÓ E WENCESLAU DE MORAES)
Marta Pacheco Pinto
DOUTORAMENTO EM TRADUÇÃO
ESPECIALIDADE EM HISTÓRIA DA TRADUÇÃO
2013
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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

PROGRAMA EM ESTUDOS COMPARATISTAS

TRADUZIR O OUTRO ORIENTAL

A CONFIGURAÇÃO DA FIGURA FEMININA NA LITERATURA

PORTUGUESA FINISSECULAR

(ANTÓNIO FEIJÓ E WENCESLAU DE MORAES)

Marta Pacheco Pinto

DOUTORAMENTO EM TRADUÇÃO

ESPECIALIDADE EM HISTÓRIA DA TRADUÇÃO

Pavilhão de porcelana (100 cm x 120 cm) por Rogério Silva. Grafite s/ papel, 2009.

RESUMO

O presente estudo incide sobre a configuração literária da mulher extremo-oriental na obra de dois autores portugueses finisseculares, nomeadamente na recolha de poesias traduzidas que compõe Cancioneiro chinez (1890, 1903) de António Feijó (1859-1917) e nos títulos publicados em livro de Wenceslau de Moraes (1854-1929). O nosso ponto de partida consiste na inscrição do corpus seleccionado numa prática discursiva já analisada em estudos críticos sobre o Oriente islâmico no âmbito do orientalismo literário de tradi- ção anglo-francesa: a retórica orientalista de feminização do Oriente. No nosso estudo, que articulamos com o postulado de Edward Said (1978), a geografia literária em foco é o Extremo Oriente (China e Japão), situada no final do século XIX e princípios do sécu- lo XX. As marcas orientalistas que lemos no corpus identificado convergem na feminiza- ção desse Oriente, que entendemos como parte integrante de um fenómeno de tradução cultural. O corpus exemplifica, com base em diferentes modos de relacionamento com o Extremo Oriente, uma apreensão estética dessa geocultura através da figura feminina, que estabelece uma relação de contiguidade com o espaço que representa e simboliza, e em que está implicada a ideia europeia de Oriente, de diferença de género e de corpo feminino. A articulação da nossa análise far-se-á, portanto, por meio de três expressões- -chave: orientalismo, tradução cultural e feminização do Extremo Oriente. Formalmente, a dissertação divide-se em duas partes distintas, uma teórico-conceptual, em que expla- namos cada expressão-chave, e outra de análise do corpus literário, em que exploramos redes imagéticas e metafóricas e as suas implicações estético-ideológicas para a com- preensão das assimetrias e ambiguidades que ligam o Portugal de fim-de-século à Ásia Oriental. Esperamos que a nossa análise da esteticização literária do Extremo Oriente contribua para o entendimento do fenómeno finissecular do orientalismo literário, que assenta num processo de tradução cultural.

Palavras-chave: orientalismo, tradução cultural, feminização, Extremo Oriente, alteridade, exotismo, António Feijó, Wenceslau de Moraes

Agradecimentos

O trabalho de dissertação que aqui se apresenta é fruto de um esforço colectivo, pelo que não teria sido possível sem o apoio de diversas pessoas e instituições, a quem queremos deixar aqui expresso o nosso sincero agradecimento e gratidão. As primeiras palavras de reconhecido apreço dirijo-as aos orientadores deste pro- jecto, o Prof. Doutor João Ferreira Duarte e a Prof.ª Doutora Helena Carvalhão Buescu, que me guiaram no meu caminho para Oriente. A eles agradeço o apoio constante, as leituras atentas e cuidadas, os comentários e as críticas sempre pertinentes, a exigência de propriedade semântica e de rigor científico que ajudaram este trabalho a ganhar forma e substância; a eles agradeço a amizade, a paciência e a confiança depositada em mim e neste trabalho. Quero agradecer à Prof.ª Doutora Ana Paula Laborinho (Universidade de Lisboa) pelas inúmeras oportunidades de diálogo, em particular durante o seminário de pós- -graduação “Visões do Oriente: medos e seduções”, que me foi permitido frequentar e evitou que eu imergisse nas areias movediças do Oriente, e no âmbito do projecto de investigação “Orientalismo português: textos e contextos (1850-1950)”. Agradeço-a pelo empenho em me integrar nos principais circuitos e círculos de debate em torno da relação de Portugal com as coisas orientais. Pela possibilidade de acesso privilegiado à primeira versão manuscrita de Relance da alma japoneza , de Wenceslau de Moraes, e pelos contí- nuos gestos de amizade e apoio. Palavras de sincera gratidão são devidas ao Prof. Doutor José Cândido Martins (Universidade Católica Portuguesa) pelo modo exemplar como se prontificou a receber- -me, a mim e à minha família, em sua casa em Braga. Quero agradecer a sua amizade e, acima de tudo, o seu espírito solidário, representativo do que a comunidade académica

procura ser, um espaço de partilha e de intercâmbio. Agradeço em particular a oportuni- dade que me proporcionou de conhecer, consultar e registar fotograficamente o seu valio- so arquivo pessoal sobre o poeta António Feijó e a sua obra. Agradeço ao Prof. Doutor K. David Jackson (Universidade de Yale) as tertúlias, a amizade e o entusiasmo com que partilhou comigo a sua orientalidade e as suas reflexões em torno, sobretudo, das musas que inspiraram Wenceslau de Moraes. Quero também agradecer à Prof.ª Doutora Kioko Koiso (Universidade de Lisboa), por me ter proporcionado a descoberta da língua japonesa e pelo desejo que gerou em mim de aprofundar o conhecimento dessa língua, literatura e cultura, bem como pela simpatia com que me facultou materiais audiovisuais sobre Wenceslau de Moraes e a sua vida na vila de Tokushima. Ainda uma palavra de apreço à Prof.ª Doutora Paula Morão (Universidade de Lisboa), pela partilha de uma paixão documentada sobre Salomé, e à Prof.ª Doutora Ana Maria Martinho (Universidade da Califórnia), pois sem a sua ajuda não me teria sido possível realizar pesquisa bibliográfica em Berkeley, pesquisa essa que muito me auxiliou a fundamentar a tese que aqui defendemos. Das companheiras na labuta diária pela realização de um projecto aparentemente sem fim à vista, sobretudo sem o fim brilhante ingenuamente ambicionado no início da aventura, e na luta contra a incomodativa sensação de angústia, as minhas mais do que palavras de amizade e profundo reconhecimento dirigem-se à Doutora Rita Bueno Maia e à Dra. Ana Catarina Almeida. À Rita, por acreditar neste trabalho, pela companhia picaresca e constante, estivesse sol ou a chover, fosse dia ou noite, por partilhar, viver e sofrer os mesmos dramas, medos e desânimos, pela leitura, revisão e discussão de partes desta dissertação. À Catarina, que me acompanhou sobretudo no início e no final deste percurso, um sincero obrigada: pela paciência e pela amizade verdadeira, por estar sem- pre disponível para ouvir, aconselhar e resolver o caos em que aqueles que fazem um

Lisboa, tornada em local de trabalho permanente e pela facilidade concedida no acesso a materiais em mau estado de conservação, à Biblioteca Municipal de Ponte de Lima e ao Arquivo Municipal da mesma cidade, pela simpatia com que me receberam e disponibili- zaram a consulta e utilização do espólio de António Feijó. Não posso deixar de louvar os esforços envidados no sentido de desenvolver e enriquecer as bibliotecas digitais, que facilitaram o acesso – rápido, económico e cómodo

  • a muitos dos materiais bibliográficos usados neste trabalho. São de destacar, nesse sen- tido, a Hemeroteca Digital (da Hemeroteca Municipal de Lisboa), a Biblioteca Nacional Digital (da Biblioteca Nacional de Portugal), a Biblioteca Geral Digital (da Universidade de Coimbra), o Gallica (da Bibliothèque nationale de France), o Internet Archive (www.archive.org) e o Google Books.

Muito obrigada!

Índice

Guia de leitura

A presente dissertação coloca questões estruturais próprias do discurso académico e de uma investigação desta natureza e dimensão que se impõe clarificar, nomeadamente no que respeita ao modo de apresentação e selecção da informação.

Referenciação bibliográfica De forma a uniformizar citações, referências bibliográficas e bibliografia final, seguimos, em geral, o sistema “autor-data”, em grande proximidade ao estilo de referenciação inter- nacional The Chicago Manual of Style (16.ª edição). Dentro do corpo do texto, à identifi- cação do autor e da data da edição citada segue-se a indicação do número de página, prece- dido de espaço e dois pontos. Na inexistência de número de página, usamos as siglas “s.p.”; na ausência de data de publicação, usamos as siglas “s.d.”. No caso particular da citação de poemas, dada a extensão dos textos poéticos que se citam, de um modo geral relativamente breves, remetemos apenas para o número de página, sem especificar o núme- ro do verso. Quanto ao uso de maiúsculas nos títulos citados, adoptámos, por questões de coe- rência, a norma românica de maiusculização do primeiro item lexical (substantivos, adjectivos e verbos) nos títulos em português e em francês. Nos títulos em língua inglesa, maiusculizámos todos os itens lexicais.

Edições usadas Em termos da bibliografia primária, foi nosso objectivo socorrermo-nos da maior varie- dade possível de edições, em função da relevância do diferente aparato crítico que cada edição oferece.

No que toca ao poeta António Feijó, privilegiámos primeiras edições ou edições da obra completa. A sua produção poética é pela primeira vez reunida em Poesias completas , numa edição não-datada, mas que se sabe ser da década de 1940, “promovida pelos ami- gos e admiradores de António Feijó, com o concurso da Câmara Municipal de Ponte do Lima”, dirigida e revista por Afonso Lopes Vieira e publicada pela Livraria Bertrand. Em 2004, J. Cândido Martins organiza a reedição destas Poesias completas , agora pelas Edi- ções Caixotim e enriquecida com um estudo crítico, e prepara também a publicação de um volume de Poesias dispersas e inéditas , que dá à estampa pela mesma editora em

  1. Relativamente à obra em estudo – Cancioneiro chinez – , citamos sempre a partir da edição original, a de 1890, ou da segunda edição, a de 1903. Não seguimos o texto fixado na edição de 2004 de Poesias completas , porque não apenas se trata da segunda edição, mas nela também não se inclui a adenda crítica que acompanha a edição de 1903 nem o nome dos poetas chineses antologiados no índice final. À excepção de Cancionei- ro chinez , as restantes composições poéticas são, em geral, citadas a partir das edições completas de 2004 ou 2005. Recorremos ainda a outras edições, sobretudo em função da informação paratextual oferecida, sempre que pertinente para o nosso argumento. No caso da obra de Wenceslau de Moraes, privilegiámos de igual modo edições mais recentes, sendo que as edições posteriores às décadas de 1970 e 1980 se baseiam, em regra, nas edições de Armando Martins Janeira. Nalguns casos, recorremos a edições originais, ora porque não houve reedições subsequentes – como acontece com quase todos os volumes de Cartas do Japão – , ora porque as reedições não apresentam aparato crítico e/ou exibem uma elevada recorrência de erros tipográficos. Usámos ainda a pri- meira versão manuscrita de Relance da alma japoneza , datada de 1925 mas anterior à primeira edição publicada, em 1926, que cotejamos apenas uma vez com uma edição mais recente.

Poesias completas = PC Poesias dispersas e inéditas = PDI Sol de Inverno = SI

Obras de Wenceslau de Moraes A Vida japonesa = VJ Cartas do Japão. Antes da guerra (1902-1904) = CJ Cartas do Japão. II – um anno da guerra (1904-1905) = CJ Cartas do Japão – 2ª série, vol. I (1907-1908) = CJ Cartas do Japão – 2.ª série, vol. II (1909-1910) = CJ Cartas do Japão – 2.ª série, vol. III (1911-1913) = CJ Dai-Nippon (o grande Japão) = DN Fernão Mendes Pinto no Japão = FMPJ O “Bon-Odori” em Tokushima = BOT O Culto do chá = CC Os Serões no Japão = SJ Ó-Yoné e Ko-Haru = OYKH Paisagens da China e do Japão = PCJ Relance da alma japonesa = RAJ Relance da história do Japão = RHJ Traços do Extremo Oriente = TEO

Outras estratégias pontuais de economia textual serão mencionadas no corpo do texto.

Para todas as obras citadas, publicadas e manuscritas, respeitámos sempre a grafia original, não procedendo em momento algum à actualização ortográfica. Actualizámos apenas, tanto no corpo do texto como na bibliografia final, os nomes dos autores que se citam, bem como o de outras personalidades que mencionamos ao longo do texto. O nome de Wenceslau de Moraes é o único que não actualizámos, em respeito à resistência do autor em adoptar a reforma ortográfica de então^1. Na romanização de nomes chineses, quando não se cita directamente a partir de uma fonte, opta-se pelo sistema hanyu pinyin , que consiste na transcrição fonética ofi- cialmente adoptada na República Popular da China, desde a aprovação pelo Governo de Pequim em 1958. Na romanização de nomes japoneses, seguiu-se o alfabeto latino con- forme fixado pelo sistema Hepburn, actualmente em uso nos dicionários japoneses.

Organização da bibliografia final A bibliografia final, na qual reunimos as obras citadas no nosso estudo, está dividida em duas secções apenas: uma de bibliografia primária e outra de bibliografia secundária. Atendendo à natureza interdisciplinar do estudo, que se reflecte na bibliografia consulta- da, evitámos subcategorizar as referências bibliográficas, uma vez que tal estratégia con- duziria a uma fragmentação e compartimentação temáticas incompatíveis com a natureza interdisciplinar do trabalho.

(^1) “Eu cá continuo a ser Wenceslau com W , mesmo officialmente [...] e creio que assim continuarei” (car- ta 2 Novembro 1903 – Moraes 1998: 97).

Introdução

O mito daquele que se apaixona, sem o saber, pelo seu próprio reflexo, que assume como sendo um Outro diferente e exterior a si, ficou conhecido como o mito de Narciso, exem- plarmente plasmado nas Metamorfoses de Ovídio. Narciso procura “uma fugitiva ima- gem?!/O que desejas não existe! O que amas, retirando-te, perdê-lo-ás!/Essa sombra que vês é o reflexo da tua imagem! Nada tem de seu!/Contigo chega e contigo está. Partiria contigo, se tu partir pudesses!” (Ovídio 2006: III, 420-440). Eis, neste gesto inconsciente de autocontemplação, a incapacidade de Narciso reconhecer o Outro como sendo o Eu ou, inversamente, de se reconhecer no Outro. O acto de ver(-se) não é aqui sinónimo de (re)conhecimento, mas antes de distanciamento e alienação, como se uma imagem fosse em si mesma um sujeito (ou objecto) autónomo, donde a impossibilidade de imagem e sujeito (ou objecto) coexistirem lado a lado. Em síntese, Narciso procura apropriar-se da imagem que acredita ser não apenas do Outro mas o Outro e que, na verdade, é a sua. Numa primeira análise, este episódio parece sugerir uma identidade dupla ou des- locada em que o Eu sai de si e dele se desliga, para além de anular a possibilidade de uma anagnórise em que, apesar do gesto falhado de regressar a si mesmo, mais interessante é constatar como não hesita em conceber-se como Outro, mas um Outro com o qual firma um elo de empatia instintiva. O corpo como signo simultâneo da identidade/alteridade é central a esta narrativa mítica; não é, por isso, de estranhar que, como relembra Peter Brooks (1993: 1), o corpo seja, no âmbito da psicanálise, o objecto ou alvo primário do narcisismo. Importante é também verificar como à atracção de Narciso subjaz não apenas uma ideia do estético, mas sobretudo uma ideia familiar desse estético. Pretendemos, desta forma, sugerir que o estético que Narciso vislumbra no corpo estranho e que o cati- va reside naquilo que é inconscientemente familiar a este sujeito contemplador.

Noções duais como Eu e Outro, identidade e alteridade, pertença e não-pertença, familiar e estranho – e os múltiplos pares em que estas construções interpretativas podem desdobrar-se, em particular, no âmbito do nosso estudo e como evidenciado pelos título e subtítulo da presente dissertação, Ocidente/Oriente e homem/mulher – conotam relações, no seu conjunto, assimétricas no que toca ao posicionamento de quem escreve, bem como ao espaço e à distância temporal a partir de onde se escreve. Podemos globalmente definir a identidade, enquanto património partilhado de experiências, práticas e significados de índole diversa, como um processo cumulativo de significação social, que se constrói continuamente sem nunca estar finalizado. Intrínseca à natureza humana, a identidade é sempre dinâmica, manifestando-se de forma mais evi- dente na interacção com o Outro, que pode desempenhar um papel mais activo ou passi- vo nesse intercâmbio (Standaert 2002: 28). À semelhança de Narciso, o ser humano não consegue evitar (no sentido de desejar) o Outro. A identidade é assim pensada em termos relacionais, a partir do Outro, termo e medida de comparação. Ao circunscrever uma sub- jectividade individual ou colectiva, a identidade pressupõe um sentimento de pertença que adquire sentido sobretudo quando contraposto a um sentimento de não-pertença. E a não-pertença atesta-se no confronto com o estranho, o estrangeiro, a alteridade. Tal como a identidade, a alteridade nunca significa de forma autónoma, podendo definir-se como aquele ou aquilo que se percepciona e se sente como diferente e distante do universo do Eu. É, portanto, em função do Outro que o sujeito constrói e organiza a sua experiência interior e a do mundo, a sua memória e intimidade, conhece os seus limites, entrevê a sua liberdade, os seus medos e desejos. Como já problematizado pela chamada imagologia comparatista, a que os contras- tes apontados são inerentes, e a que voltaremos mais adiante, Eu e Outro estabelecem uma relação dialéctica, que admite uma inversão de papéis de acordo com o posiciona-