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A história do movimento chicano na década de 1960 e 1970, focando em publicações como el grito e a editora quinto sol, que desempenharam papel central na disseminação da literatura chicana e na luta por direitos trabalhistas. O texto aborda a emergência de teorias feministas e a análise de temas relacionados às mulheres chicanas, como a exploração de sua situação em diferentes contextos culturais, opressão, corpo, sexualidade e espiritualidade. Além disso, o documento discute as organizações ativistas pelos direitos chicanos, como a ufw, la raza unida e a mecha, e as influências entre elas.
O que você vai aprender
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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Não perca as partes importantes!
THAÍS RIBEIRO BUENO
LITERATURA CHICANA E TRADUÇÃO – TRANSBORDAMENTOS E APROXIMAÇÕES À FRONTERA
Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de doutora em Linguística Aplicada, na área de Linguagem e Educação
Este exemplar corresponde à versão final da Tese defendida pela aluna Thaís Ribeiro Bueno e orientada pela Profa. Dra. Maria Viviane do Amaral Veras
Maria Viviane do Amaral Veras
Daniela Palma
Alfredo Cesar Barbosa de Melo
Lynn Mario Trindade Menezes de Souza
Joana Plaza Pinto
Érica Luciene Alves de Lima
Lenita Maria Rimoli Esteves
Ana Maria de Moura Schäffer
Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno.
Para Pedro, que tão generosamente soube entender cada uma de minhas ausências, e tão sábia e amorosamente soube me acolher em cada uma de minhas voltas.
Zamora, Adriano da Silva, Ana Amélia Calazans Rosa, Cynthia Agra Brito Neves, Andreia Moroni, Adeline Jalabert Araújo e Lígia Francisco.
Por fim, agradeço às pessoas que, direta ou indiretamente, estiveram envolvidas e proporcionaram o apoio e o acolhimento de que precisei, no momento em que precisei: muito obrigada às minhas amigas Priscila Valle, Márcia Pereira, Líllian Bento, Ana Elisa Nascimento e Fernanda Verçosa, pelo amor e pela inspiração que são para mim; meu também muito obrigada Luiz, Pedro e Mayla, pela fonte inesgotável de amor e solidariedade. E, sobretudo, minha gratidão eterna ao meu irmão Marcos e àqueles sem os quais esta jornada certamente não teria sido possível, e que nunca deixaram faltar amor: meus queridos pais, Márcia e Marcos.
A literatura de fronteira, por se inscrever em um universo cultural desenvolvido a partir de um longo e contínuo processo de mestiçagem cultural, apresenta em seu bojo inúmeras questões e traços linguísticos que são do domínio do hibridismo linguístico. Mais especificamente, a literatura chicana aborda, entre outras, questões relacionadas à história e à cultura chicana, a partir de uma exploração de tensões políticas e sociais que emergem dos choques culturais na região da fronteira entre o México e os EUA. Nesse caso, nota-se o desenvolvimento de uma literatura cuja temática e cuja linguagem recorrem a um hibridismo estético que se manifesta na própria materialidade textual, entremeada pelo uso recorrente e intercambiado de diferentes idiomas como o inglês, o espanhol, e o nahuatl. Nesse contexto, o que fica evidente é uma concepção de língua que extrapola os limites tradicionais do idioma nacional, modelo erigido no século XVIII e ainda em voga e dominante em muitos campos do conhecimento, como é o caso da tradução. Esta última, tradicionalmente, apoia-se em um modelo de transposição de informações, de uma língua-fonte para uma língua-alvo, que identifica os idiomas como blocos homogêneos, estanques e unificados. No entanto, o mito da cultura monolíngue, que tem sustentado tal modelo tradicional de tradução, cai por terra com as reconfigurações geopolíticas em operação desde o advento da globalização, que, por sua vez, põem em xeque o ideal “uma nação, uma bandeira, um idioma”. Nesta pesquisa, a literatura chicana é analisada como exemplo de manifestação cultural que desafia o tradicional modelo linguístico nacionalista e que constitui um obstáculo a projetos de tradução que seguem tal modelo. A partir de um olhar a momentos- chave da história e da cultura chicana, e tomando como ponto de partida a obra Borderlands/La Frontera – The New Mestiza , da feminista chicana Gloria Anzaldúa, propomos um exercício de reflexão acerca dos limites que textos como esse impõem às teorias de tradução, e nos perguntamos que tipo de tradutora/tradutor um texto como esse exige. Mais especificamente, propomos um entendimento de tradução enquanto lugar de re-leitura e re-escrita (e, por isso, de grande potencial para a ação política em prol de uma justiça social) para uma tentativa de articulação epistemológica entre os campos da literatura chicana e das teorias de tradução. Para tanto, nos apoiaremos na literatura desenvolvida nos mais diversos campos do saber, entre os quais a filosofia da linguagem, os estudos da tradução, os estudos chicanos, os estudos culturais e os estudos pós-coloniais.
Palavras-chave : tradução; literatura chicana; hibridismo; Gloria Anzaldúa; mestiçagem.
La literatura de frontera, por inscribirse en un universo cultural que se ha desarollado en un largo y continuo proceso de mestizaje cultural, presenta en su manifestación innumerables cuestiones y marcas linguisticas que se encuentran en el dominio del hibridismo linguistico. Más especificamente, la literatura chicana se enfoca, entre otras cosas, en cuestiones relacionadas a la historia y la cultura chicana desde una exploración de tensiones políticas y sociales que emergen de los choques culturales en la región de la frontera entre México y los EE.UU. En este caso, se observa el desarollo de una literatura cuyo lenguage y temática recurren a un hibridismo estético que se manifesta en la propia materialidad textual, con el uso recurrente y intercambiado de diferentes idiomas, como el inglés, el español, el náhuatl y variaciones. En este contexto, lo que se evidencia es una concepción de lengua que extrapola los límites tradicionales del idioma nacional, un modelo concebido en el siglo XIX y todavía dominante en muchos domínios de conocimiento como la traducción. Esta última, tradicionalmente, se apoya en un modelo de transposición de informaciones, de una lengua fuente para una lengua meta, que identifica los idiomas como bloques homogéneos, refrenados y unificados. Sin embargo, el mito de la cultura monolingüe que se ha apoyado en tal modelo tradicional de traducción se desmorona con las reconfiguraciones geopolíticas resultantes de la globalización, que, por otra parte, llevan a un cuestionamiento de lo ideal, “una nación, una bandera, un idioma”. En esta pesquisa, la literatura chicana es analisada como ejemplo de manifestación cultural que desafía el modelo lingüístico tradicional nacionalista y como un problema para proyetos de traducción de naturaleza tradicional. A partir de un análisis de momentos claves en la historia y en la cultura chicana, y adoptando como punto de partida la obra Borderlands/La Frontera – The New Mestiza de la escritora chicana Gloria Anzaldúa, proponemos un ejercício de reflexión acerca de los límites que textos como este imponen al campo de las teorías de traducción, y nos preguntamos que tipo de traductora o traductor evoca un texto como este. Más especificamente, proponemos un entendimiento de la traducción como lugar de re-lectura y re-escrita (y, por eso, de grande potencial para la acción política a favor de una justícia social) en un intento de articulación epistemológica entre los campos de la literatura chicana y de las teorías de traducción. Por tanto, baseamonos en la literatura de los más diversos campos del saber, entre los cuales se encuentran la filosofía de lenguaje, los estudos de la traducción, los estudos chicanos, los estudos culturales y los estudios poscoloniales.
Palavras-claves : traducción; literatura chicana; hibridismo; Gloria Anzaldúa; mestizaje.
auh ayc polihuiz ayc ylcahuiz yn oquichihuaco yn oquitlallico yn intlillo yn intlapallo yn intenyo yn imitolloca yn imilnamicoca yn ompa titztihui.^1 Hernando de Alvarado Tezozomoc
The US-Mexican border es una herida abierta where the Third World grates against the First and bleeds. Gloria Anzaldúa
Este trabalho se fez a partir de um olhar direcionado a pessoas e textos que viajaram – ou que se viram forçados a viajar – através de limites definidos e impostos de forma alheia a suas histórias de vida. Pode-se argumentar que movimentos, migrações, êxodos, exílios e outros tipos de trânsito humano são tão antigos quanto a própria civilização. Não se trata de novidade. A imigração não é algo novo para nós – pelo contrário, podemos dizer que muitas culturas só foram preservadas devido à sua capacidade de procurar recursos para sua sobrevivência em diferentes
(^1) “E aquilo que eles realizaram, o que vieram a consagrar em seus escritos, suas pinturas, sua fama, seu renome, sua memória nunca se extinguirá nem se esquecerá nos tempos vindouros.” Exceto quando o(a) tradutor(a) é indicado(a), todas as citações originalmente escritas em línua estrangeira e apresentadas nesta tese em língua portuguesa foram traduzidas por nós.
lugares, e que o povoamento dos continentes só se deu porque inicialmente éramos todos nômades. No entanto, é preciso que se admita que a imigração como problema a ser resolvido é algo recente. Não é difícil encontrar, nos dias de hoje, notícias carregadas de um tom alarmante anunciando tragédias ocorridas em situações ligadas à imigração – a morte de refugiados sírios na costa da Europa; as condições de vida sub-humanas a que imigrantes bolivianos são submetidos em porões de antigos prédios em São Paulo; as mulheres latino-americanas estupradas e mortas durante tentativas de travessia ilegal da fronteira entre o México e os Estados Unidos. O que mudou, em séculos de história humana? Por que é que, em livros de história antiga, a imigração aparece como um movimento natural, e agora constitui problema central na agenda de candidatos a presidente das principais potências mundiais?
Ao refletimos sobre tradução ou sobre fronteira – os dois temas que inspiram este trabalho – é comum também se pensar em certas imagens que evocam a ideia de passagem (ou de sua impossibilidade), fluxo, movimento. Tanto em situações em que o movimento é possibilitado (que seria, em tese, a ideia e o ideal de tradução: a passagem e a chegada de certa informação ao destino pretendido) ou impedido, barrado (que é, por sua vez, em tese, uma das funções de uma fronteira geopolítica), há que se levar em conta o fato de que estamos falando, aqui, de movimento, de processo.
No caso da tradução, o movimento mais facilmente identificável é aquele que transporta determinadas informações, dados, de uma língua a outra. Ou seja, traduzimos um texto originalmente escrito, por exemplo, em russo – tradicionalmente denominada língua-fonte, língua de partida e outras expressões que conotam o início do movimento – para, suponhamos, o alemão. Esta última seria a língua-alvo, ou língua de chegada, ou qualquer outro tipo de língua- receptáculo, final do movimento e da jornada percorrida pela informação.
Apesar de essa dupla analogia – tradução/ponte e fronteira/muro – nos parecer um esquema simplório e bastante óbvio, é preciso que a mencionemos, constante e incansavelmente, dada sua importância e relevância para qualquer situação que envolva a ideia de tradução. E,
geopolítica específica. Esse tipo de fronteira, como ficará claro nos próximos capítulos, foi criado e posto em prática em um período relativamente recente de nossa história; período esse em que, com a formação e organização geopolítica dos estados-nação, a unidade nacional e a militarização de seus limites territoriais passariam a constituir elementos essenciais que assegurariam a metanarrativa da nação como unidade homogênea de organização de povos e culturas. Tal metanarrativa viria, por sua vez, a contribuir para a solidificação de identidades nacionais e para uma compartimentação artificial e violenta de diferenças culturais. Como se sabe, tal estratégia política culminaria, séculos depois, em uma série de crises políticas em todo o globo, aceleradas pelo advento daquilo que foi denominado globalização e caracterizadas, entre outras coisas, por ondas migratórias, choques étnicos e culturais em zonas de contato e a resposta do ideal nacionalista a tais movimentos: repressão e xenofobia.
O contexto de fronteira estudado nesta pesquisa traz justamente esses elementos de choque cultural e é, atualmente, um dos mais analisados e debatidos no mundo, visto que envolve economias-chave dentro da política internacional atual: a fronteira entre México e Estados Unidos.
La Frontera: uma herida abierta que não cicatriza
No dia 29 de janeiro de 2013, o presidente dos Estados Unidos da América, Barack Obama, apresentou, em discurso na cidade de Nevada, sua proposta para a chamada Reforma Completa da Imigração. Em seu discurso, Obama deixou claro que aquele era um momento decisivo para mudanças e melhorias em um sistema que apresenta, há muitos anos, problemas como a imigração ilegal, o tráfico de drogas através da fronteira México-Estados Unidos e a situação social desprivilegiada em que se encontra boa parte dos imigrantes de origem latino- americana que tentam viver no país. O discurso, com tom otimista e humanitário, projetava, para boa parte dos chamados Hispanics^3 , um futuro de oportunidades e trabalho digno.
(^3) Em português, “hispânicos”, ou seja, aqueles que têm em comum o passado de colonização espanhola. Conforme discutiremos no capítulo III, a aplicação de termos como esse a determinados sujeitos – bem como a recusa que se faz a tais nomeações – é da ordem da representação e do forjamento de identidades atravesadas por políticas e ideologias.
Lembrem-se de que este não é apenas um debate político. É um debate sobre pessoas. Sobre homens, mulheres e jovens que desejam nada mais do que a chance de trilhar seu caminho na história da América^4_._ (THE WHITE HOUSE, 2003)
Ainda no mesmo discurso, Obama lembra aos estadunidenses que seu país é constituído de uma população com alto número de imigrantes ou descendentes de imigrantes, e que esse fato caracteriza os Estados Unidos como uma nação heterogênea; por esse motivo, os termos “nativo” e “imigrante” devem passar por uma reformulação e ser entendidos de forma relacional:
Quando falamos sobre isso [imigração] em termos abstratos, a discussão pode facilmente rumar para algo como “nós” versus “eles.” E quando isso acontece, muita gente esquece que a maioria de “nós” costumava ser “eles”. Nós nos esquecemos disso. (aplausos.)
É realmente importante que nos lembremos de nossa história. A menos que você seja um dos primeiros americanos, um nativo americano, você vem de outro lugar. Alguém trouxe você para cá. (aplausos.)
Ken Salazar, ele tem ascendência mexicana, mas ele lembra que sua família vive na sua região há 400 anos, e que, portanto, eles não emigraram de lugar algum (risos) (THE WHITE HOUSE, 2003).
Pouco tempo após o primeiro ano de mandato de Barack Obama, no início do ano de 2014, o número de deportações para o México atingiu o patamar de 1,8 milhões de pessoas (DHS, 2014). Esse número se aproxima facilmente dos 2 milhões registrados ao longo dos dois mandatos de seu antecessor, George W. Bush. Ou seja, é de se esperar que, ao fim do seu segundo mandato, Obama seja o presidente que mais deportou imigrantes, ou, como foi apelidado por ativistas pelos direitos de imigrantes, deporter-in-chief (VICENS, 2014).
Assim, apesar das perspectivas otimistas que o discurso (vazio) de Obama reflete, números sugerem que a fronteira nunca foi tão militarizada e que, apesar de o número de apreensões e deportações ter caído nos últimos anos, o número de mortes decorrentes de apreensões é atualmente bastante alto (MEISSNER et al., 2013). Além disso, o fato de a
(^4) Todas as traduções de citações de obras originalmente em idioma estrangeiro foram feitas por nós.
Neste ponto, consideramos importante esboçarmos um breve comentário a respeito das dimensões que o termo “fronteira” pode tomar, sobretudo em campos das ciências humanas nos quais pesquisadores se debruçam exaustivamente sobre tal expressão no intuito de problematizar limites divisórios em conceitos teóricos, seja na linguística aplicada, na filosofia ou na antropologia. É comum, atualmente, o uso do conceito de fronteira como metáfora e, mesmo no campo dos estudos chicanos e na própria literatura chicana, a fronteira aponta para questões internas ao sujeito. Assim, não se fala mais da fronteira física e geopolítica que divide México e Estados Unidos ou da experiência de cruzá-la, mas sim da própria experiência do sujeito dividido pela condição imigrante, do sujeito desterritorializado e traduzido, conforme magistralmente definido por Salman Rushdie em Pátrias Imaginárias (1994). No entanto, uma das consequências de um uso generalizado e indiscriminado do termo fronteira é o fato de que, muitas vezes, uma série de efeitos opressores advindos do policiamento ostensivo e da militarização da fronteira passa despercebida, assim como ocorre com as perigosas relações desse esquema militarizado com o desenvolvimento de pesquisas e novas tecnologias e a própria criação e organização de instituições que, em tese, deveriam oferecer apoio e bem-estar aos imigrantes e cidadãos de ascendência latino-americana.
É, portanto, necessário que se entendam, também, as implicações das várias extensões da cultura bélica estadunidense e de como ela afeta os diversos elementos da vida social da comunidade chicana nos Estados Unidos. Exemplos claros disso podem ser notados em épocas distintas da história do país: as consequências da Guerra do Vietnã (1955-1975) para uma reorganização social dos mexicano-americanos e chicanos e as relações pouco divulgadas entre a suposta “segurança” representada pelo aparelho bélico que assegura a fronteira e os exorbitantes lucros obtidos por grandes empresas privadas produtoras de armas e sistemas de segurança. No primeiro caso, que se insere no contexto da Guerra do Vietnã, boa parte do grande contingente de soldados mexicano-americanos e chicanos que voltavam para casa após prestar o serviço militar (é preciso notar aqui que, não por acaso, a maioria de recrutados era de etnia negra e mexicano- americana/chicana) se beneficiaram da lei que garantia a veteranos apoio financeiro para a educação superior, o que conferiu o início de certa “inclusão” de chicanos em instituições de ensino superior e a circulação de ideias em prol de uma defesa da justiça social. Já no segundo caso, que concerne à fronteira física entre México e Estados Unidos, a militarização é um dos elos que liga o funcionamento dessa fronteira, enquanto órgão regulador de pessoas e espaços, e
os centros de tecnologia responsáveis pela criação das armas e dos dispositivos de segurança utilizados pelos oficiais nessas operações. Sejam elas criadas em centros de pesquisa governamentais ou públicos (com fins de exploração astrofísica), sejam criadas pelas grandes corporações privadas que cada vez mais investem no lucrativo mercado bélico estadunidense e assumem o papel do Estado na fiscalização e no controle das pessoas que cruzam a fronteira, fica claro que tais investimentos em ações militares e tecnologias fazem parte de um quadro que extrapola a fronteira em si, e que, por isso mesmo, as operações militares levadas a cabo na fronteira física são de grande relevância e devem ser levadas em conta.
Por outro lado, além da fronteira física entre México e Estados Unidos, podemos conceber também, obviamente, várias outras fronteiras que se estabeleceram e se reconstituem continuamente no tecido das relações sociais: fronteiras culturais, psicológicas, linguísticas. É sobre essas fronteiras que este estudo se debruça, sendo, no entanto, necessária uma breve revisão histórica da constituição da fronteira geográfica entre México e Estados Unidos.
Quando se olha para a fronteira que divide o México e os EUA, em sua forma atual, ou para a dinâmica de fluxos de corpos e discursos que compõem a cultura de fronteira, é inevitável a menção a um fato histórico específico, ocorrido em 1848, que determinaria, em grande parte, as transformações históricas e geográficas da região: o tratado de Guadalupe-Hidalgo, assinado pelos governos mexicano e estadunidense como forma de solucionar um conflito de interesses por terras: “o grande marco da história chicana está em 1848, ano em que o Tratado de Guadalupe-Hidalgo encerrou um período de vinte e um anos de guerra entre México e Estados Unidos” (PAREDES, 1982, p. 36). Firmado como solução para o fim da guerra entre México e Estados Unidos, o Tratado determinaria, de forma geral, a anexação de parte do território mexicano pelos Estados Unidos.
Dessa forma, o território estadunidense ampliou-se com a anexação de terras hoje correspondentes aos estados do Texas e Califórnia, além de parte do Novo México, Arizona, Colorado, Utah e Wyoming (na figura 1 a seguir, é possível identificar, na porção do mapa grafada em branco, os territórios transferidos do México para os EUA). E os cidadãos que residiam nesse território e que não queriam abandonar suas terras foram obrigados, em um curto período de tempo, a abandonar a cidadania mexicana e assumir o estatus de cidadãos dos Estados Unidos. Obviamente, para além dos inúmeros detalhes e pormenores legais que tal mudança