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Este artigo explora como utilizar textos jornalísticos no ensino de língua portuguesa, além das comuns exposições sobre gêneros textuais. O artigo propõe explorar as características de tais textos, como a ordem direta e o emprego reduzido de adjetivos, que podem ajudar os estudantes no entendimento de conceitos linguísticos. O texto também discute outras temáticas que podem aproveitar notícias e reportagens no trabalho em sala de aula, como a alternância entre discurso direto e indireto, o conceito de tópico, o uso de terceira pessoa e impessoalidade, o emprego de metáforas e comparações, e os tipos de texto. Além disso, o artigo discute a importância dos operadores argumentativos na coesão textual.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de estudo
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Curso de Especialização em Gramática e Ensino da Língua Portuguesa – 7ª Edição
Tatiany Oleques Lukrafka (Autora) Gabriel de Ávila Othero (Orientador)
portuguesa, com o intuito de ampliar seus usos em sala de aula para além das comuns exposições sobre gêneros textuais. Por acreditar que certas características da redação jornalística contribuem para a abordagem de várias temáticas, este trabalho busca despertar a atenção dos docentes sobre o assunto e sugerir alguns tópicos para os quais notícias e reportagens podem ser aproveitadas para o ensino de língua. Como forma de demonstrar o emprego desse tipo de material, ao final, propõe-se uma atividade com elementos coesivos.
Embora ainda haja muito a descobrir nos campos da Linguística e da Comunicação Social, especialistas de ambas as áreas reconhecem que Letras e Jornalismo estão intimamente conectados. Essa ligação se deve ao fato de este último ter, como basilar instrumento de trabalho, a palavra. Por essa razão, o jornalismo tira proveito do conhecimento construído nas Letras e a partir dele forma preciosa parte de seu saber. A apropriação tem início nas reflexões teóricas e se estende às regras gramaticais: para um jornalista comunicar, precisa, por exemplo, além de escrever conforme a norma padrão, compreender as funções da linguagem descritas por Jakobson, conhecido linguista.
Por outro lado, algo mais pode ser dito sobre essa relação: ao longo da história da língua portuguesa no Brasil, vários escritores atuaram, paralelamente, como jornalistas. Euclides da Cunha, célebre por Os Sertões , publicou seu relato sobre a Guerra de Canudos em
uma série de reportagens n‟ O Estado de São Paulo , antes de reunir a história toda em livro. Assim como ele, Clarice Lispector, Fernando Sabino, João Ubaldo Ribeiro, Machado de Assis, Luis Fernando Verissimo e Nelson Rodrigues, entre outros, escreviam para jornais. Uns tendiam mais ao texto literário, outros mais ao jornalístico, ressalva seja feita, mas todos esses personagens ajudam a ilustrar a proximidade entre os campos de Jornalismo e de Letras.
Por tanto utilizar-se do saber da área irmã, o Jornalismo merece poder oferecer a ela, no que diz respeito ao ensino, uma contribuição que vá além da costumeira abordagem de gêneros textuais, em aulas de língua portuguesa, quando é mencionado o gênero “notícia” ou “editorial” pelo professor. Por essa razão, propõe-se neste trabalho explorar as qualidades desses textos para o ensino: o que se supõe, por certas características que apresentam, ajudar os estudantes quanto ao entendimento de diversos conceitos linguísticos.
A ideia para este artigo surgiu quando, ao folhear livros didáticos recentes de língua portuguesa, percebeu-se que a maior parte dos exemplos empregados pelos autores era extraída de obras de escritores clássicos. E que, crendo ser o texto jornalístico bastante útil para a abordagem de certas temáticas, este geralmente aparecia nos capítulos destinados aos gêneros textuais. A possibilidade de indicar alguns caminhos possíveis para o aproveitamento de notícias/reportagens em sala de aula foi o que motivou a elaboração deste trabalho.
O texto básico do jornalismo é a notícia. O espaço do jornal é dedicado aos relatos sobre fatos novos ou desconhecidos, bem como aos registros de novos desdobramentos para os acontecimentos já noticiados. A primeira razão que demonstra a utilidade de relatos noticiosos para o ensino de língua portuguesa é que os textos informativos são aqueles – escritos – com que se tem mais contato no dia a dia^1. O último levantamento da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil^2 , publicado em 2012, aponta que os materiais de leitura mais citados pelos entrevistados, quando questionados sobre o que gostam de fazer em seu tempo livre, são revistas (53%) e jornais (48%), respectivamente. Livros indicados pela escola (^1) É preciso deixar claro que não se quer aqui diminuir a importância do livro, nem substitui-lo por outros meios: a proposta é a de inserir no espaço escolar as demais práticas de leitura, de modo a refletir os tipos e suportes encontrados no ambiente social do estudante, com o objetivo de facilitar a aprendizagem de Língua Portuguesa. 2 Dados publicados no site do Instituto Pró-Livro. Disponível em: http://www.prolivro.org.br/ipl/publier4.0/dados/anexos/2834_10.pdf. Acesso em 18 dez. 2013.
estudo^4 publicado na página d’Observatório da Imprensa , em 2007, feito a partir da análise de manchetes de jornais catarinenses, mostrou que mais de 80% dos títulos das notícias respeitam o uso da ordem direta, facilitando ao docente a tarefa de encontrar exemplos.
No sentido de explorar as características das notícias e reportagens para o ensino, também outro atributo colabora: o emprego reduzido de adjetivos nos textos, que ocorrem em menor quantidade porque são vistos pelos jornais como uma fuga à objetividade – utópica, mas ainda assim perseguida. No Manual da Redação da Folha de São Paulo (2006), os repórteres são aconselhados a evitarem esses termos, ressalva feita à utilização na escrita de opinião (editoriais, comentários, críticas e artigos). Ainda assim, a recomendação é usá-los “com sobriedade”.
Para o ensino, esse atributo é favorável à medida que torna menos complexo, aos alunos, apontar os sintagmas nominais. É claro que, para o pleno entendimento dessas estruturas, é necessário compreender também os elementos adjuntos e as relações estabelecidas entre eles, mas a simplicidade da redação noticiosa possibilita que ela seja utilizada em aulas introdutórias sobre o tema. Assim, aos poucos, o professor pode ir tornando a tarefa mais complicada para os estudantes, ao selecionar, aos poucos, construções mais elaboradas, dentre as quais as literárias.
Em relação à característica apresentada acima, pode-se esperar, em contrapartida, a crítica de que não é uma qualidade, mas um defeito, pois a escola deve preparar o aluno para o entendimento das mais complexas estruturas linguísticas. É clara a noção de que uma abordagem centrada unicamente em uma redação de menor complexidade – a jornalística – é prejudicial ao estudante: não é essa a ideia defendida neste trabalho. Sabe-se, no entanto, que o processo de construção do conhecimento parte do menos complexo para o mais complexo. E, assim sendo, o emprego dos textos jornalísticos, para iniciar a discussão sobre temas em LP, é bastante proveitoso. Desse modo, conforme a evolução da turma, podem ser introduzidos textos que apresentem construções mais elaboradas.
Situação semelhante ocorre com os advérbios, que têm recomendação de serem usados com moderação pelos repórteres e redatores. Esses elementos, no entanto, trazem consigo
(^4) Coluna Informação à primeira vista , da seção Diretório Acadêmico. Disponível em: < http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/informacao-a-primeira-vista>. Acesso em: 18 dez. 2013.
uma questão particularmente relevante: sua presença em um texto ajuda a revelar orientações sobre a linha editorial do veículo em que determinada notícia/reportagem foi publicada. O uso de “ainda”, ou “já”, por exemplo, apontam para um posicionamento do jornal em relação a determinado tema. Exemplos:
Em uma leitura mais atenta dos trechos acima, é fácil indagar-se sobre o quanto o uso dos advérbios revela certo posicionamento do jornal em relação aos temas abordados nas matérias. No segundo caso isso é ainda mais evidente: fica claro que o jornal condena subsídios governamentais ao setor energético. Ressalva-se que os exemplos (1) e (2) são apenas ilustrativos: é óbvio que a análise descontextualizada de apenas um trecho de texto, ou de uma única reportagem, não será suficiente para que se tirem conclusões sobre a linha editorial de um veículo. No entanto, deve-se atentar para o fato do quão rica uma análise desse tipo se mostra aos estudantes. É um belo trabalho para se realizar em sala de aula: além de promover uma discussão sobre língua a partir de um texto presente no cotidiano, essa atividade desperta a atenção dos discentes sobre a suposta neutralidade da mídia. Assim, ao estimular a leitura crítica, a escola contribui para a construção da cidadania do aluno.
Outro tema em que o conteúdo dos veículos de comunicação pode ser explorado é o que se refere aos tempos verbais. Em jornal, recomenda-se o uso de presente do indicativo sempre que possível^5 , conselho seguido à risca por repórteres e editores na redação de títulos^6 , os quais constituem o carro-chefe da informação:
Um bom título acrescenta valor a uma peça jornalística. Na tradição jornalística dominante, os títulos devem ser informativos, sintetizando o núcleo duro da informação numa frase curta, forte e sedutora. Devem ter garra. Devem ser claros, concisos, precisos, atuais e verídicos. Lendo-se títulos assim redigidos, torna-se possível, de imediato, apreender a informação mais relevante que um jornal oferece. (SOUSA, 2001, p. 200)
(^5) O presente do indicativo é o tempo mais usado em títulos. No corpo das notícias, é o pretérito perfeito. (^6) Após rápida consulta às capas de jornais de 24 de janeiro de 2014, nota-se que a ampla maioria traz construções com verbos no presente do indicativo. A título de exemplo, na mesma data, a Folha de S. Paulo, um dos veículos impressos mais importantes do país, segue a recomendação em todos os títulos que compõem a primeira página.
informativos, uma vez que buscam seguir as normas gramaticais, mas têm por objetivo a proximidade linguística com o leitor, empregando, desse modo, o registro coloquial, especialmente em se tratando de veículos de comunicação voltados para as classes D e E da população, como o jornal porto-alegrense Diário Gaúcho.
Os aspectos mencionados na seção anterior ajudam a demonstrar o quanto um texto jornalístico pode ser útil no ensino de língua portuguesa. Dando continuidade à exposição, neste item, serão listadas, em especial, algumas características que colaboram para a abordagem da coesão textual: o uso de operadores argumentativos e o mecanismo de coesão referencial, em especial nas retomadas (anáfora).
2.1 Conjunções e operadores argumentativos
Conjunção, como ensina Almeida (2009), é toda a palavra que tem por função ligar orações, de duas formas: coordenando, ao conectar orações da mesma espécie, e subordinando, ao unir aquelas diferentes de espécie. No nível do texto, entretanto, esses termos agem como operadores argumentativos, constituindo-se em importante mecanismo de coesão textual. A coesão textual, segundo Koch (2010, p. 11) “diz respeito a todos os processos de sequencialização que asseguram (ou tornam recuperável) uma ligação linguística significativa entre os elementos que ocorrem na superfície textual”.
Ainda de acordo com Koch (2010), esses operadores respondem pela estruturação de enunciados em textos, por meio de encadeamentos sucessivos, de modo que cada um deles é resultado de um ato de fala distinto. Esses termos podem aparecer entre orações de um mesmo período, entre dois ou mais períodos e, também, entre parágrafos de um texto, exprimindo relações de conjunção, de disjunção, de contrajunção de ideias; também de explicação, de comprovação, de conclusão, de comparação, entre outros.
O papel de operadores argumentativos é exercido não apenas por conjunções, mas por locuções conjuntivas, advérbios e locuções adverbiais; preposições e locuções prepositivas; itens continuativos como então , daí etc. O que os une é a propriedade de estabelecerem
relações entre as ideias. E é neste ponto em que se encontra a valiosa contribuição, para o trabalho em sala de aula, de uma abordagem que explora esses termos dentro da perspectiva da coesão textual: é possível fugir da exposição baseada nas classes gramaticais, tão comuns nos livros didáticos. Além disso, o estudo a partir das funções que tais elementos exercem no texto oferece ao aluno uma visão não-mecanizada dos processos de construção da linguagem.
O que vale, neste setor, é explorar os tipos de relações semânticas e que partes do texto elas põem em junção. Os exercícios, puros e simples, de classificação das orações muito pouco acrescentam à competência comunicativa do falante. Ao contrário, conhecer aquelas relações semânticas e sua função no estabelecimento da coesão do texto é de inteira significação para a atividade discursiva. (ANTUNES, 2007, p.49)
Aproveitar-se dessas possibilidades oportuniza ao estudante notar como existem diferentes maneiras de se alcançar o mesmo objetivo comunicativo, o que colabora para que a língua seja vista como algo “maleável, versátil, sujeita a efeitos especiais, por vontade do falante”, argumenta Antunes (2007, p. 50). Esse, aliás, é outro ponto a favor do jornalismo, que, embora empregue a linguagem com certa formalidade, muitas vezes foge às regras estabelecidas nas gramáticas. Mas essa já é outra discussão.
2.1.1 Ligando orações
Por evidenciarem as relações estabelecidas entre ideias, o uso dos operadores argumentativos é bastante comum em jornalismo, que se pauta pela clareza e pela inteligibilidade do texto. Ao ligar orações, os operadores atuam para a produção de dois (ou mais) enunciados distintos, encadeando-se o segundo sobre o primeiro, tomado como tema. Exemplos:
Nos períodos acima, em (1), o operador e aponta a relação de conjunção existente entre as orações: ele liga enunciados que constituem argumentos para a mesma conclusão. Em (2), o mas indica a relação de contrajunção entre as orações: o conectivo contrapõe enunciados de orientações argumentativas diferentes.
Além disso, a tempestade causou cortes de luz que afetaram 48 mil lares na região que rodeia Tóquio, sendo que 26 mil delas continuam sem eletricidade, segundo a empresa Tokyo Electric Power. A capital japonesa viveu a maior nevasca em 20 anos, com 27 centímetros de neve acumulada (Estadão Online, 09 fev. 2014).
Em (1), a relação que se estabelece entre os parágrafos é de conjunção, efetuada pelo operador além disso , ligando enunciados que constituem argumentos para a mesma conclusão. Já em (2), o portanto introduz um enunciado de valor conclusivo em relação ao ato de fala imediatamente anterior – iniciado por “A pesquisa...” –, o qual contêm as premissas que evidenciam esse valor.
2.2 Coesão referencial
São vários os mecanismos de coesão que promovem as relações textuais. Um deles, que interessa particularmente a este trabalho, é a referenciação, construída a partir dos elementos de referência, “itens da língua que não podem ser interpretados semanticamente por si mesmos, mas remetem a outros itens do discurso necessários à sua interpretação” (Koch, 2010, p. 12).
A coesão referencial se realiza por meio de formas gramaticais e de formas lexicais. Quando essas formas retomam elementos dentro do próprio texto e aparecem posteriormente a eles, ocorre o que se chama de anáfora, “um fenômeno textual de referenciação e correferenciação, de ativação e reativação de referentes ao longo do texto” (OTHERO, 2003, p. 16). A anáfora é definida tradicionalmente como toda retomada de um elemento anterior em um texto e é muito comum em jornalismo: um vocabulário amplo enriquece a notícia, e uma antiga regra de estilo recomenda que não sejam repetidas palavras nas matérias.
2.2.1 Formas gramaticais
Uma das formas de retomada é a gramatical. A esse grupo correspondem os pronomes pessoais de 3ª pessoa; os pronomes demonstrativos; os pronomes possessivos; os pronomes relativos; alguns advérbios e locuções adverbiais; os artigos definidos e indefinidos; os numerais; a elipse. As formas gramaticais não proveem ao leitor/ouvinte instruções de sentido, apenas instruções de conexão, como por exemplo, a concordância de gênero e de número. Exemplos:
Nos títulos acima, ocorre referenciação anafórica por uso de um pronome pessoal da 3ª pessoa, ele , no primeiro exemplo, e por meio de pronome possessivo, seu , em (2).
É importante destacar que as formas gramaticais tendem a ser menos usuais do que as lexicais em jornalismo, em razão de fornecerem ao leitor somente instruções de conexão. O jornal Estadão, no Manual de Redação e Estilo (1997), em relação aos pronomes do caso reto, registra a orientação de só empregá-los em situações específicas: principalmente, para dar ênfase ao sujeito e para distinguir os pronomes que tenham a mesma forma na 1ª e 3ª pessoa do singular (como em eu disse , ele disse ). Nos demais casos, a orientação é explícita: “dispense o pronome reto, especialmente quando a desinência verbal deixar claro a quem se refere” (p. 241). A justificativa do veículo é a de que repetições de termos são desnecessárias e enfraquecem o texto.
No mesmo manual, recomendações semelhantes são feitas quanto ao emprego dos pronomes possessivos. São prescindíveis quando há redundância. Em relação à ambiguidade, há um item dedicado unicamente ao uso do pronome seu , que frequentemente dá origem a orações de duplo sentido – como em “Para o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, o ciclo lula-desenvolvimentista atingiu o seu limite” (Sul21, 23 jan. 2014), em que não é possível saber se o limite é do governador ou do ciclo.
Exemplos como esses podem ser usados para se trabalhar a coesão referencial a partir de formas gramaticais e lexicais em sala de aula. Explorando o texto jornalístico, convém refletir que tipo de informações trazem à narrativa as formas lexicais, em comparação com as gramaticais. Realizar exercícios de substituição de expressões nominais por pronomes, por exemplo, possibilita ao aluno compreender o quanto cada termo é responsável pela mensagem que o texto transmite, como será demonstrado a frente, na seção 4.
Para a atividade a ser proposta na seção seguinte, foram escolhidos dois textos, que tratam da temática da tecnologia e as recentes revelações de espionagens da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos – NSA: a reportagem Na mira dos EUA , um trabalho publicado em julho de 2013 no jornal O Globo , que venceu o Prêmio Esso de Jornalismo , principal premiação do gênero no país; e, de forma complementar, para auxiliar com os debates sobre o tema, a matéria Quem é Edward Snowden, o ex-agente que vazou documentos secretos dos EUA , publicada na edição online da revista Época , no mesmo ano.
Segundo as notícias, um funcionário da agência – Edward Snowden – resolveu delatar as operações de vigilância do órgão dentro e fora dos EUA, por não concordar com a política invasiva do governo americano, que justificou as ações como medidas antiterrorismo. Ao lado de nações como China, Rússia, Irã e Paquistão, o Brasil foi apontado como um dos alvos do monitoramento. As revelações causaram desconforto entre o presidente dos Estados Unidos e chefes de estado de diversos países, geraram disputas sobre o direito de regulação da internet
no mundo e estimularam governos a implantarem políticas antiespionagem – como é o caso do Brasil, que discute, nas casas legislativas, o Marco Civil da Internet.
Para fornecer subsídios à atividade de sala de aula, esta seção tem como objetivo abordar o emprego dos elementos coesivos nos textos selecionados, oferecendo alguns exemplos para serem usados no trabalho com os alunos. Salienta-se que a análise desenvolvida neste item não será exaustiva: ela quer, principalmente, orientar o trabalho do professor quanto à reflexão sobre os elementos coesivos com os discentes, uma vez que é impossível prever todos os desdobramentos da atividade. Assim, abre-se espaço para novos rumos, conforme a criatividade do professor e o interesse dos estudantes.
3.1 EUA espionaram milhões de e-mails e ligações de brasileiros
Principal texto da atividade, por se tratar de reportagem, tem redação mais rica. Com esse material, é possível explorar de que maneiras os operadores argumentativos e as formas gramaticais e lexicais contribuem para a construção dos sentidos do texto. Quanto aos operadores argumentativos, a redação traz advérbios e locuções adverbiais e conjunções e locuções conjuntivas em abundância, colaborando para a apreensão desses conceitos pelos alunos. Em relação à anáfora, aparecem na reportagem retomadas por formas gramaticais e lexicais, demonstrando como as ideias de um texto podem ser articuladas de formas distintas. Exemplos:
que precisaria estar longe quando o resultado de suas ações viesse a público[...].
Nesses itens, observa-se o emprego dos operadores argumentativos: em [1], da locução prepositiva Apesar de , que liga parágrafos estabelecendo relação de contraposição de ideias; em [2], do advérbio depois , conectando períodos, indicando sucessão de eventos, e da conjunção mas , estabelecendo a relação de contraposição de ideias entre dois parágrafos. Em [3], o excerto se repete, mas com destaque para o fenômeno de anáfora. Nesse exemplo, os recursos de retomada por formas gramaticais – anáfora zero e anáfora pronominal, respectivamente – evidenciam o uso do recurso em jornalismo e salientam sua importância para a construção da narrativa.
Valendo-se dos resultados das experiências de Naujorks e Sturm (2011) na orientação de trabalhos de iniciação à docência em Letras, este artigo pretende sugerir uma atividade com notícias/reportagens que contemple o estudo da língua no eixo uso → reflexão → uso, de modo que a análise do texto e das estruturas possíveis da linguagem se concretize a partir do próprio texto. Segundo as pesquisadoras, nesse processo, o conhecimento da língua culmina em práticas de linguagem cada vez mais complexas, em conformidade com a realidade de uso da língua.
Desse modo, será desenvolvida, neste item, uma unidade de ensino, de acordo com proposto pelas autoras na obra Iniciação à docência em Letras , com o intuito de trabalhar os elementos coesivos em textos jornalísticos. A metodologia a ser empregada, em função do eixo uso → reflexão → uso, busca contemplar os níveis linguístico e extralinguístico e pressupõe atividades que desenvolvam o reconhecimento, a construção e a reflexão de estruturas gramaticais e lexicais. Além disso, objetiva estimular a interação entre realidade e texto, uma vez que cada leitura traz consigo informações sobre situações do mundo, a respeito das quais o aluno tem mais ou menos conhecimento.
Portanto, quanto maior o estímulo a essa interação entre realidade e texto, maiores a compreensão e a atribuição de significados ao texto. Logo, para a produção de escrita e de leitura dos textos selecionados, é desejável sempre o debate a propósito do tema escolhido para subsidiar o desenvolvimento dessa produção. (NAUJORKS, STURM, 2011, p. 14)
A partir dessa perspectiva, corrobora-se a ideia de que o ensino precisa centrar-se na língua em uso, privilegiando-se a prática linguística em si, e não sua metalinguagem. Sobre as atividades de sala de aula, Antunes (2007) argumenta que não basta que as palavras a serem questionadas tenham sido retiradas de um texto para que exista uma análise do texto. Seguindo esse direcionamento, propõe-se que o texto seja analisado no seu gênero, na sua função, nas suas estratégias de composição, na sua distribuição de informações, no seu grau de informatividade, para então chegar-se às suas remissões intertextuais e aos seus recursos de coesão.
4.1 Escolha da temática e dos textos a serem trabalhados
Para a atividade a ser desenvolvida, conforme indicado na seção anterior, foram escolhidos dois textos que abordam a temática da tecnologia e as recentes revelações de espionagens da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos – NSA. Para trabalhar em sala de aula, o assunto é bastante pertinente, porque, por meio dele, é possível suscitar um debate sobre os propósitos dos usos da internet e sobre a exposição dos indivíduos na rede, antes de iniciar a análise dos elementos coesivos, conforme ensinam Naujorks e Sturm (2011). Como no Brasil, mais de 70% dos jovens (15 a 19 anos) são usuários de internet^7 , o tema é algo que faz parte da realidade do estudante, facilitando o envolvimento dele com a atividade proposta.
4.2 Unidade de ensino: usos e limites da internet e a espionagem governamental
Seguindo o modelo da obra de Naujorks e Sturm (2011), propõe-se, neste subitem, a unidade de ensino Usos e limites da internet e a espionagem governamental. A atividade é
(^7) Dados da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, divulgada pelo IBGE em 2013. Disponível em http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/imprensa/ppts/00000012962305122013234016242127.pdf. Acesso em 24 fev. 2014.
pessoas não têm conhecimento: é possível interceptar dados na rede e empregá-los com os mais diversos fins, sem que as vítimas sequer saibam o que está ocorrendo. É claro que o caso delatado por Snowden é extremo, revelando uma ação de estado duvidosa e questionável, mas o exemplo serve para demonstrar o quanto os usuários estão expostos na internet. E mais: o quanto cada um de nós pode ser responsável pelas informações que os interceptores têm em mãos.
Após a entrega dos materiais e a leitura silenciosa, os alunos são convidados a comentar sobre o caso, dizendo se concordam com a espionagem, se apoiam a atitude de Snowden – justificando a opinião – , visando ao desenvolvimento de suas habilidades argumentativas e ao emprego dos elementos de coesão. Nesse momento, o professor pode anotar os elementos empregados pelos alunos, para, em um momento posterior, usá-los como exemplos durante a conversa sobre coesão textual.
Iniciando a conversa sobre língua portuguesa: Em seguida, buscando trabalhar a língua em seu uso, o docente pede aos estudantes que identifiquem o tipo de linguagem utilizada em ambos os textos e possíveis meios de publicação. Depois, inicia-se uma breve conversa sobre o gênero textual jornalístico. Neste momento, os alunos são questionados a apontarem que funções acreditam que textos como esses podem ter (a exemplo: informar, convencer, indicar um modo de pensar, opinar etc), o que abre caminho para uma discussão sobre papéis dos veículos de comunicação, neutralidade no jornalismo, linha editorial, manipulação de informações etc. A partir das respostas dos alunos, questiona-se sobre as estratégias de composição dos textos: de que maneira podem evidenciar um posicionamento? Como uma notícia deixa claro ao leitor o assunto sobre o qual está tratando? Aqui podem ser lembradas as noções de tópico frasal, relacionando-as com a ideia de composição de textos jornalísticos chamada de pirâmide invertida: os fatos mais importantes – ou aqueles que se quer destacar – vêm sempre antes.
Logo após a comparação entre tópico frasal e pirâmide invertida, pergunta-se aos alunos quais as informações mais importantes das notícias – o que de fato o jornal está noticiando? Qual seu grau de informatividade? É possível que, nesta ocasião, os alunos notem que um dos textos é mais extenso do que outro. Se houver fôlego e se a turma estiver curiosa, o docente pode elucidar rapidamente as diferenças entre notícia (relato sobre um
acontecimento) e reportagem (detalhamento desse acontecimento, com dados que complementam a notícia e ajudam a compreendê-la).
Elementos coesivos: Continuando a atividade, o professor pode introduzir o tema coesão e elementos coesivos. Após explanação sobre o assunto, utilizando como exemplos os termos empregados pelos alunos ao exporem suas opiniões sobre o caso, os estudantes partem para a análise de alguns elementos destacados nos trechos de texto relacionados no apêndice A, ou outros que o professor considerar conveniente. As palavras destacadas nesses exemplos serão usadas para que os alunos possam descrever que papel elas desempenham nos textos, que ligação estabelecem entre as orações, que características possuem, em que gênero textual aparecem com mais frequência etc.
Em alguns casos, o docente pode suprimir os elementos de coesão e questionar sobre a relação que se estabelece entre as ideias. Espera-se que os estudantes ainda consigam observar as relações, mas com maior dificuldade, já que um dos papeis desses termos é o de evidenciá- las. Essa oportunidade também pode ser aproveitada para ressaltar a importância de tais vocábulos para a língua e para elucidar diferenças entre gêneros e tipos textuais.
Ao final dos esclarecimentos, os alunos são divididos em pequenos grupos (de três ou quatro integrantes cada) e recebem, para discussão e análise, dois elementos destacados nos textos. Encerrada a apreciação, os grupos são chamados ao quadro para registrar, em uma lista, as palavras recebidas e para apresentar aos colegas suas conclusões sobre elas. Essa atividade possibilita a reflexão sobre o uso dos elementos coesivos, de maneira independente de sua classificação tradicional, a partir da semântica que acrescentam ao texto. Em seguida, o professor completa a lista do quadro com os exemplos trazidos pelos alunos durante o debate inicial, pede para explicarem de que forma ajudam a construir o sentido de um texto e para indicarem situações de emprego dos termos.
Por fim, é possível criar um quadro de elementos coesivos, organizados de acordo com a função que exercem nos textos. Com essa atividade, espera-se desenvolver nos alunos a capacidade de compreensão sobre esses termos e a competência de empregá-los conforme a semântica textual, esclarecendo que há palavras adequadas a cada situação, ligando ideias a