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Textos dissertativo-argumentativos: subsídios para qualificação de avaliadores, Resumos de Linguística

Textos dissertativo-argumentativos: subsídios para qualificação de avaliadores

Tipologia: Resumos

2025

Compartilhado em 09/06/2025

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TEXTOS DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVOS
Subsídios para qualificação de avaliadores
Lucília Helena do Carmo Garcez
Vilma Reche Corrêa
Organizadoras | Cebraspe
MINISTÉRIO DA
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TEXTOS DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVOS

Subsídios para qualificação de avaliadores

Lucília Helena do Carmo Garcez

Vilma Reche Corrêa

Organizadoras | Cebraspe MINISTÉRIO DA

EDUCAÇÃO

TEXTOS DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVOS

Subsídios para qualificação de avaliadores

Lucília Helena do Carmo Garcez

Vilma Reche Corrêa

Organizadoras | Cebraspe MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 5
DOMÍNIO DA MODALIDADE ESCRITA FORMAL DA LÍNGUA PORTUGUESA 8
  1. A MODALIDADE ESCRITA FORMAL DA LÍNGUA 9 Carlos Alberto Faraco
  2. A AVALIAÇÃO DO DOMÍNIO DA LÍNGUA PORTUGUESA NO ENEM E A DIVERSIDADE DO PORTUGUÊS BRASILEIRO 17 Alzira Neves Sandoval Simone Silveira de Alcântara (Org.) Stefania C. M. de R. Zandomênico
  3. NOTAS SOBRE A AVALIAÇÃO DE DESVIOS DE REGISTRO 23 Alzira Neves Sandoval (Org.) Simone Silveira de Alcântara Stefania C. M. de R. Zandomênico
  4. NOTAS SOBRE A AVALIAÇÃO DOS DESVIOS GRAMATICAIS E DE CONVENÇÃO DA ESCRITA 31 Alzira Neves Sandoval Simone Silveira de Alcântara Stefania C. M. de R. Zandomênico (Org.)

DESENVOLVIMENTO DO TEMA E LIMITES ESTRUTURAIS DO TEXTO DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVO 42

  1. GÊNERO E TIPO DE TEXTO 43 Lucília Helena do Carmo Garcez
  2. O TEXTO DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVO 50 Maria Luiza Coroa
  3. REDAÇÃO ESCOLAR: UM GÊNERO TEXTUAL? 64 Maria da Graça Costa Val
  4. A ANÁLISE DO TEXTO DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVO 73 Márcio Matiassi Cantarin Roberlei Alves Bertucci Rogério Caetano de Almeida

ARGUMENTOS EM DEFESA DE UM PONTO DE VISTA 85

  1. ORIGINALIDADE E CONSCIÊNCIA DA ESCRITA: INDÍCIOS DE AUTORIA NA ARGUMENTAÇÃO EM TEXTOS ESCOLARES 86 Anderson Luís Nunes da Mata
  2. A AVALIAÇÃO DOS INDÍCIOS DE AUTORIA 92 José de Ribamar Oliveira Costa Mariza Andrade Guedes
  1. ARGUMENTAR 101 Sírio Possenti
  2. TEXTO E ARGUMENTAÇÃO 110 Vanda Maria da Silva Elias
  3. A ARGUMENTAÇÃO PERSUASIVA 129 Mônica Magalhães Cavalcante
  4. NOTAS SOBRE SEMÂNTICA ARGUMENTATIVA 135 Sírio Possenti
  5. A CONSTRUÇÃO DO ARGUMENTO COM FIGURAS RETÓRICAS EM TEXTOS DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVOS 144 Luiz Eduardo da Silva Andrade
  6. A AVALIAÇÃO DO EMPREGO DE OPERADORES E CONECTIVOS ARGUMENTATIVOS 154 Jaqueline dos Santos Peixoto
  7. SELEÇÃO E AVALIAÇÃO DE ARGUMENTOS 164 Elen de Sousa Gonzaga

MECANISMOS LINGUÍSTICOS DE COESÃO NECESSÁRIOS PARA A CONSTRUÇÃO DA ARGUMENTAÇÃO 173

  1. TEXTO E ESTRATÉGIAS DE COESÃO REFERENCIAL E SEQUENCIAL 174 Vanda Maria da Silva Elias
  2. COESÃO NOMINAL: RELACIONAR, CATEGORIZAR E... ARGUMENTAR 193 Maria da Graça da Costa Val Márcia Mendonça
  3. A COESÃO NA TESSITURA TEXTUAL: AVALIAÇÃO DO EMPREGO DOS RECURSOS COESIVOS 200 Maria de Fátima de Souza Aquino

SITUAÇÕES QUE LEVAM À ATRIBUIÇÃO DE NOTA ZERO 207

  1. A AVALIAÇÃO DE REDAÇÕES DO ENEM QUANTO ÀS SITUAÇÕES QUE LEVAM À ANULAÇÃO 208 Denis Leandro Francisco
  2. EXERCÍCIO DA CIDADANIA E DIREITOS HUMANOS – AS FUNÇÕES DA COMPETÊNCIA V NA REDAÇÃO DO ENEM 219 Ricardo Nascimento Abreu
  3. UM OLHAR TEÓRICO, NORMATIVO E METODOLÓGICO SOBRE A EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS NA REDAÇÃO DO ENEM 231 Ricardo Nascimento Abreu

REFLEXÕES METODOLÓGICAS 251

  1. AVALIAÇÃO FORMATIVA, REGISTROS REFLEXIVOS E PRODUÇÃO DE TEXTOS 252 André Lúcio Bento
  2. O ENSINO DE REDAÇÃO 261 Lucília Helena do Carmo Garcez

No que se refere à compreensão da proposta de redação, ao desenvolvimento do tema e ao respeito aos limites estruturais do texto dissertativo-argumentativo, foca- lizados na Competência II, as considerações apresentadas ampliam e aprofundam as diferenças entre as noções de gênero e tipo, a definição do que seja um texto dissertativo-argumentativo e ainda discutem a redação escolar como um gênero específico, que se diferencia de outros por sua natureza, seu objetivo e contexto em que se realiza.

Quanto à seleção e organização de argumentos em defesa de um ponto de vista, relativas à Competência III, os capítulos desenvolvem reflexões sobre os indícios de autoria revelados na elaboração de textos. Desenvolvem-se também noções relativas ao funcionamento das informações, dados, fatos, testemunhos, concei- tos, evidências e opiniões no processo argumentativo de defesa de uma posição em relação a algum problema colocado pelo tema da prova de redação. Nesse particular, são especialmente importantes as discussões sobre a função dos ope- radores argumentativos e conectores e sobre o emprego de figuras de retórica como recursos de argumentação.

No que se refere aos mecanismos linguísticos de coesão textual necessários para a construção do texto dissertativo-argumentativo, objetos da Competência IV, são apresentadas, neste e-book, as diversas estratégias que asseguram a elaboração de um texto coeso e coerente.

Quanto à Competência V, os textos dos especialistas desenvolvem uma profunda reflexão sobre como se revelam o respeito aos direitos humanos e as propostas de exercício da cidadania nas redações dos participantes do Enem, que objetivam solucionar os problemas levantados, a cada ano, pelas provas de redação do Enem.

Além da reflexão sobre os direitos humanos, há esclarecimentos relevantes so - bre situações previstas em edital que levam à atribuição de nota zero à redação: inserção de parte desconectada do tema; fuga ao tema; não atendimento ao tipo textual dissertativo-argumentativo; cópia de texto motivador, entre outras formas propositais de anulação da prova pelo participante.

Como os avaliadores são necessariamente professores de língua portuguesa, acres- centaram-se a essas considerações específicas sobre a avaliação das redações do Enem textos que ampliam as reflexões metodológicas a respeito da prática de redação no ensino médio, com o objetivo de enriquecer o acervo de noções sobre a natureza da escrita e sobre seu desenvolvimento no ambiente escolar. Assim, destinada prioritariamente aos avaliadores das redações do Enem, a obra dirige-se também a professores de língua portuguesa do ensino médio.

A colaboração de renomados e experientes especialistas da área de Letras garante a qualidade e a atualidade dos conceitos apresentados. A variedade de textos escritos sobre a Matriz de Referência para Redação permite ainda a expectativa de que a publicação esclarecerá os vários, e por vezes desconhecidos, critérios que regem a avaliação das redações do Enem.

Lucília Garcez Vilma Reche Corrêa Organizadoras

TEXTOS DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVOS: SUBSÍDIOS PARA QUALIFICAÇÃO DE AVALIADORES 9

  1. A MODALIDADE ESCRITA FORMAL DA LÍNGUA Carlos Alberto Faraco*
  2. A variação linguística

Uma das características fundamentais das línguas é a sua variabilidade. Nenhuma língua é homogênea e uniforme; todas as línguas são heterogêneas e multiformes.

A variabilidade é tão intrínseca à realidade linguística que não há outro meio de con- ceituar uma língua que não seja como um conjunto de variedades. A língua (qualquer língua) existe exclusivamente no conjunto das variedades que a constituem.

Essa heterogeneidade constitutiva da língua está diretamente relacionada com a diversidade seja das experiências históricas, seja das atividades sociais e culturais dos grupos humanos que a falam. Por isso, a diversidade linguística — tanto no plano interno (as variedades constitutivas de uma língua) quanto no plano externo (as muitas línguas que são faladas no mundo) — deve ser para nós motivo de mara- vilhamento contínuo, embora, muitas vezes, ela também seja, infelizmente, motivo de preconceito, exclusão e violência simbólica.

A diversificada ocupação demográfica de cada ponto do território em que a língua é falada, as diferentes circunstâncias históricas que se desenvolvem em cada um desses pontos, a variadíssima (quase infinita) dinâmica da vida social e cultural – essa diversidade toda repercute nas formas como a língua é falada nas diferentes regiões de um país, em diferentes momentos de sua história, por diferentes segmentos so- ciais (identificados estes pelos mais variados critérios: faixa etária, gênero, atividade profissional e nível de renda, experiência de escolaridade e assim por diante).

Outro aspecto fundamental da variabilidade da língua é o fato de ela ser também intrínseca a cada falante. Nenhum falante é unilíngue no sentido de dominar apenas uma variedade da língua. Em sua vida social e cultural, cada falante participa de várias comunidades de prática (por exemplo, no interior da família, no trabalho, na

  • Carlos Alberto Faraco é professor da Universidade Federal do Paraná e pós-doutor em Linguística pela University of California.

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escola, nas atividades de lazer, etc.) e estabelece em cada uma dessas comunidades um conjunto de múltiplas redes de interação (por exemplo, com seus chefes e colegas no trabalho, com seus professores e colegas na escola, com seus pares nas atividades esportivas, com sua roda de amigos, com seus parentes mais velhos ou da mesma faixa etária na família, e assim por diante).

Pelo fato de sua vida social e cultural ser assim diversificada, o falante vai constituindo um repertório linguístico igualmente diversificado, ou seja, todos os falantes dominam sempre muitas variedades da língua. Daí dizer-se que todo falante é um poliglota em sua própria língua.

Em suma, a língua, em decorrência da heterogeneidade quase infinita da vida social, é altamente diversificada no interior da sociedade que a fala; e cada falante, no interior dessa sociedade, é também altamente diversificado do ponto de vista linguístico: domina não apenas uma, mas muitas das variedades sociais da língua em razão de estar envolvido em muitas comunidades de prática que albergam múltiplas redes de interação social.

Toda essa realidade linguística heterogênea que caracteriza a sociedade e o falante é extremamente dinâmica. Como a sociedade muda continuamente, também as variedades sociolinguísticas vão passando por mudanças lentas e contínuas. Nesse sentido, nenhuma variedade é estática.

Também o repertório sociolinguístico do falante não é estático. Ele se altera e se am- plia à medida que se alteram e se ampliam suas experiências de vida. Como exemplo, basta lembrar o impacto amplificador que o processo de alfabetização e letramento tem sobre o repertório linguístico de qualquer falante.

A entrada no universo da cultura escrita e o progressivo envolvimento com as práticas sociais de leitura e escrita não só ampliam exponencialmente o conhecimento, como também o acesso e o domínio das variedades linguísticas próprias da língua escrita ou correlacionadas com todo o universo da cultura letrada.

Um dado que não podemos perder de vista é que o falante, à medida que vai cons- truindo seu heterogêneo perfil sociolinguístico, vai também desenvolvendo a capa- cidade de fazer uso adequado das variedades que domina. Nesse sentido, o falante vai adquirindo a capacidade de selecionar a variedade que melhor se ajusta a cada evento interacional, atendendo assim as expectativas sociais.

A sociedade vai criando historicamente expectativas quanto à variedade linguística que pode ou deve ocorrer em diferentes situações. Por isso é que o saber linguístico envolve

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É preciso lembrar que o perfil sociolinguístico da sociedade brasileira não é de modo algum simples. Ele reflete as vicissitudes da nossa história socioeconômica e cultural, bem como a diversidade da nossa população.

Nossa realidade sociolinguística — como reflexo da forma como a sociedade brasileira foi constituída — é ainda fortemente polarizada. As grandes divisões socioeconômicas e culturais, resultantes de uma economia escravocrata que subsistiu durante trezentos anos, repercutiram no português do Brasil na forma de uma polarização sociolinguísti ca. De um lado está o conjunto de variedades reunidas sob o rótulo de português popular ; e de outro, o conjunto das variedades reunidas sob o rótulo de português culto.

No meio desses dois polos há — em decorrência das mudanças por que passou e con- tinua passando nossa sociedade — um leque de variedades que manifestam diferentes graus de contato entre os dois extremos.

O Brasil foi, até meados do século XX, um país eminentemente rural, com a maio- ria da sua população morando no campo. Em poucas décadas, esse perfil mudou radicalmente. O país passou por um rápido e amplo processo de urbanização, de tal modo que o século XX terminou com aproximadamente 80% da população brasileira vivendo no espaço urbano.

Esse fato de tamanha proporção repercutiu e continua repercutindo na variabili- dade do português que se fala no Brasil. Há nos extremos variedades tradicional e tipicamente rurais e variedades tradicional e tipicamente urbanas. No meio desses dois polos, há um contínuo de variedades em que características urbanas e rurais co- existem com predominância de umas ou outras, dependendo do grau de urbanização do respectivo grupo social.

Da mesma forma, o Brasil foi, até meados do século XX, um país com elevados contin- gentes populacionais sem acesso à leitura e à escrita. Embora os índices de analfabe- tismo tenham sido reduzidos nos últimos quarenta anos, ainda hoje aproximadamente 10% da população adulta são analfabetos. E, considerando que nossos índices de escolaridade continuam baixos (basta lembrar que apenas 23% da população adulta atual concluíram a educação básica, ou seja, têm o ensino médio completo), os níveis de letramento da população são, em geral, muito reduzidos. Calcula-se que apenas 25% dos adultos podem ser considerados plenamente letrados.

Essa realidade sociocultural tem também seus efeitos sobre a variabilidade do portu- guês falado no Brasil. Há variedades linguísticas típicas dos grupos sociais afetados pelo analfabetismo (dominam apenas a oralidade) e, no outro extremo, variedades

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linguísticas típicas dos grupos sociais que, por terem tido historicamente acesso a todos os níveis de escolaridade (inclusive a universitária), assim como aos bens da cultura escrita, têm alto grau de letramento (dominam fluentemente as práticas sociais de leitura e escrita). Entre esses dois polos, há uma gama de variedades correlacio- nadas com os diferentes graus de letramento dos respectivos grupos sociais.

Inter-relacionando esses dois contínuos, adquirimos condições de explicar a polari- zação sociolinguística do Brasil. As variedades que constituem o chamado português culto são as que estão mais próximas do polo urbano e do polo do letramento. Ou seja, o português culto reúne as variedades linguísticas da população tradicionalmente urbana e com acesso histórico à plena escolaridade e aos bens da cultura escrita.

Já o chamado português popular reúne as variedades linguísticas da população de raiz rural e que historicamente teve pouco ou nenhum acesso à escolaridade e aos bens da cultura escrita.

Podemos também entender por que os falantes do português culto estigmatizam tão fortemente os falantes do português popular do Brasil: a variação linguística, numa sociedade historicamente dividida como a nossa, é tomada como o mais pesado fator de discriminação positiva (“nós”) e negativa (“eles”) dos grupos sociais.

Os estudos sociolinguísticos mostram ainda que, entre as muitas características que distinguem as variedades desses dois grandes grupos do português do Brasil, a mais forte é a frequência com que cada grupo faz a concordância verbal, desde os percentu- ais mais baixos no extremo rural e na oralidade até os mais altos no extremo oposto, passando por um gradiente de progressivo aumento de frequência desse particular fenômeno sintático.

Por fim, temos de considerar que, em qualquer ponto em que os falantes estejam desses dois contínuos, dependendo da situação interacional, eles monitoram, em graus variados, sua expressão linguística. Há, portanto, um contínuo da monitoração (ou seja, de graus de atenção à forma da expressão) que atravessa os outros dois.

Em decorrência, existem variedades próprias de situações que exigem do falante alto grau de atenção e controle da forma como se expressa (a escrita de uma tese universitária, ou um pronunciamento presidencial pelo rádio e pela televisão, por exemplo); e outras típicas de situações mais distensas, mais coloquiais (um e-mail entre amigos, ou um bate-papo entre colegas de trabalho na hora do cafezinho, por exemplo).

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Outra situação que merece particular reflexão é a dos exames de escolaridade. Pelo fato de a instituição escolar e a cultura letrada estarem historicamente ligadas um- bilicalmente, temos a forte expectativa de que os egressos da escola básica tenham um razoável domínio da escrita. Por isso, nos exames de escolaridade (vestibulares e Exame Nacional do Ensino Médio – Enem), assim como em concursos públicos, costuma haver uma prova de produção de texto.

Essas provas, em geral, solicitam dos participantes um texto dissertativo, ou seja, um texto em que o autor, sustentado em argumentos, defende uma hipótese, uma tese, uma opinião.

Os textos dissertativos – muito frequentes no mundo universitário, mas também no mundo jurídico e no jornalismo – ocorrem normalmente em situações interacionais consideradas formais (há um relativo distanciamento social entre os interlocutores) e, por isso, espera-se que sejam escritos na modalidade formal.

  1. Instrumentos normativos

As variedades que constituem o português standard escrito, pelo estatuto sociocultu- ral que adquiriram em decorrência de sua ligação com as práticas da cultura letrada, recebem especial atenção cultural e são objeto de esforços de codificação: busca-se fazer o registro do seu universo lexical nos dicionários e apresentar suas características morfossintáticas em manuais de gramática.

Esses dicionários e gramáticas, ao lado dos vocabulários ortográficos, constituem os chamados instrumentos normativos que são usados como referência pelos que escrevem para adequar seus textos às expectativas sociais que perpassam as práticas discursivas de cada esfera da atividade escrita (direito, ensaística, filosofia, ciência, jornalismo, literatura, etc.).

Esses instrumentos, embora, claro, úteis para quem escreve, não são necessariamen- te perfeitos. Nenhuma das gramáticas normativas tradicionais, por exemplo, está baseada em estudos sistemáticos da modalidade formal escrita da língua. Assim, costumam estipular aleatoriamente padrões estruturais nem sempre condizentes com o uso efetivo. Chegam a inventar regras (como boa parte das famigeradas re- gras de colocação de pronomes; ou a não menos famigerada diferença entre este e esse , que não sobrevive a uma leitura comezinha dos textos do Padre Vieira, para ficarmos num só exemplo); ou a tomar uma das possibilidades estruturais como a

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única possível (fenômeno muito comum no trato da regência verbal, por exemplo). E os dicionários, mesmo os melhores, muitas vezes apenas repetem os enunciados aleatórios das gramáticas sem um estudo sistemático dos fatos.

Além disso, esses instrumentos muitas vezes se contradizem nos julgamentos de fenômenos da modalidade escrita formal. Não há, portanto, seja entre os especialistas, seja entre os instrumentos normativos correntes (dicionários e gramáticas), absoluto consenso sobre que fenômenos pertencem à modalidade escrita formal do português brasileiro contemporâneo. Há razoável convergência quanto à morfologia dos verbos e a concordância verbal e nominal; mas há não poucas divergências quanto à regência verbal e a colocação e uso dos pronomes (para ficarmos em alguns casos).

Quem escreve regularmente não tem como fugir dessa situação, que não é má em si (apenas revela que os autores dos instrumentos normativos têm olhares parciais sobre a língua, além da falta frequente de estudos sistemáticos sobre seu uso efetivo). No entanto, no momento de resolver uma dúvida ou de avaliar um texto, precisamos enfrentar essas contradições, adotando sempre, nesses casos, um parâmetro flexível, que pode ser assim resumido: o uso formal corrente deve prevalecer sobre o julga - mento dos instrumentos normativos; e, se o mesmo fenômeno recebe julgamentos divergentes, os dois registros são próprios da modalidade formal escrita da língua.

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consequente exercício da cidadania. Nessa perspectiva, considera-se imprescindível que, para avaliar o domínio da modalidade escrita formal da língua portuguesa no Enem, todos os envolvidos nos procedimentos operacionais compreendam a con- cepção de linguagem que norteia o exame, traduzida como a capacidade humana de articular significados coletivos e compartilhá-los, em sistemas arbitrários de re- presentação, que variam de acordo com as necessidades e experiências da vida em sociedade. A principal razão de qualquer ato de linguagem é a produção de sentido.

Além disso, é importante também conhecer os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCNEM). Ao tratar dos conhecimentos de Língua Portuguesa, os PCNEM afirmam que o processo de ensino/aprendizagem de Língua Portuguesa deve basear-se em propostas interativas língua/linguagem, consideradas em um processo discursivo de construção do pensamento simbólico, constitutivo de cada aluno em particular e da sociedade em geral. Essa concepção destaca a natureza social e interativa da linguagem, em contraposição às concepções tradicionais, deslocadas do uso social. O trabalho do professor centra-se no objetivo de desenvolvimento e sistematização da linguagem interiorizada pelo aluno, incentivando a verbalização da mesma e o domínio de outras utilizadas em diferentes esferas sociais (BRASIL, 2000, p. 18).

Na prática, todos nós, professores de língua portuguesa, de uma forma geral, devemos saber que o objetivo do ensino da língua é ampliar a competência do estudante para o exercício cada vez mais fluente da fala e da escrita, incluindo-se nessa prática a escuta e a leitura. As aulas de português são, portanto, aulas de falar, ouvir, ler e escrever textos em uma complexidade gradativa, com atividades que promovam, entre outras habilidades, a compreensão das relações sintáticas, semânticas e pragmáticas que caracterizam textos orais e escritos estruturados de forma clara e coerente. Nesse contexto, dada a importância da aprendizagem dessas habilidades, uma das competências avaliadas na redação do Enem é o domínio da modalidade escrita formal da língua portuguesa.

Os aspectos gramaticais na produção textual: a concepção dos PCN e a abordagem em sala de aula

Avaliar textos em seus diferentes aspectos não constitui tarefa das mais simples. Diferentes formações acadêmicas e até mesmo preferências pessoais fazem com que haja diversas concepções e julgamentos por parte do professor de língua portuguesa acerca de língua, de texto, de níveis de formalidade, de adequação vocabular, de conhecimento linguístico mínimo necessário, entre outros elementos. Há, ainda,

A AVALIAÇÃO DO DOMÍNIO DA LÍNGUA PORTUGUESA NO ENEM E A DIVERSIDADE DO PORTUGUÊS BRASILEIRO

TEXTOS DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVOS: SUBSÍDIOS PARA QUALIFICAÇÃO DE AVALIADORES 19

outros fatores determinantes nesse processo: o ano de escolarização dos alunos, os objetivos a serem alcançados em cada etapa, as especificidades de cada público-alvo. Esses fatores interferem diretamente na forma de trabalhar produção de texto com os alunos em sala de aula e no modo de avaliar os mais diversos aspectos dos textos que eles produzem. É possível, entretanto, desenhar alguns cenários que, com algumas adaptações, podem corresponder a diversos contextos educacionais e, a partir daí, adotar procedimentos de ensino de língua que, se bem empregados, podem se mostrar bastante profícuos em diferentes ambientes educacionais.

Neste artigo, deixaremos de lado a avaliação de questões relacionadas ao atendimento à proposta, à seleção de informações, à articulação de argumentos, entre outros as- pectos relativos ao conteúdo das redações. Essa escolha não está relacionada com o nível de importância de cada um desses aspectos da redação, e sim com a delimitação do tema que nos propusemos discutir. Interessa-nos aqui, especificamente, abordar o tratamento de aspectos gramaticais dos textos dos alunos, assim como sugerir procedimentos gerais de ensino que auxiliem o trabalho do professor de língua portu- guesa em sala de aula e que favoreçam a efetividade da aprendizagem linguística pelo aluno, no que diz respeito aos tópicos aqui levantados. Para tanto, faz-se necessário conhecermos como os PCN+ Ensino Médio compreendem a gramática e o texto.

Gramática

O conceito refere-se a um conjunto de regras que sustentam o sistema de qualquer lín- gua. Na fala, fazemos uso de um conhecimento linguístico internalizado, que independe de aprendizagem escolarizada e que resulta na oralidade. Na escrita, também utilizamos esse conhecimento, mas necessitamos de outros subsídios linguísticos, fornecidos pelo letramento (conjunto de práticas que denotam a capacidade de uso de diferentes tipos de material escrito). O domínio desse conceito é importante em quase todas as situações em que se trabalha com a língua. Para ficar em alguns exemplos.

  • Na fala ou na escrita, é fundamental considerar a situação de produção dos dis - cursos que, afinal, são possibilitados pelo conhecimento gramatical (morfológico, sintático, semântico) de cada pessoa.
  • Compreender que o aceitável na linguagem coloquial pode ser considerado um desvio na linguagem padrão ou norma culta.
  • Abordar os diversos graus de formalidade das situações de interação.
  • Compreender as especificidades das modalidades oral e escrita da língua. Texto Texto é um todo significativo e articulado, verbal ou não verbal. O texto verbal pode assumir diferentes feições, conforme a abordagem temática, a estrutura composicional, os traços estilísticos do autor – conjunto que constitui o conceito de gênero textual.