Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

A História do Curso de Teoria Literária e Literatura Comparada na USP, Notas de aula de Literatura

Este documento relata a história do início do curso de teoria literária e literatura comparada na faculdade de filosofia, ciências e letras da usp, em 1961. O texto detalha a necessidade de estudos introdutórios e teóricos especializados, a criação da área de teoria geral da literatura e, posteriormente, de teoria literária e literatura comparada. O documento também descreve as linhas-mestres do curso e os textos estudados, além de mencionar as pesquisas realizadas e publicadas por pesquisadoras na área. Finalmente, o texto apresenta o perfil da produção científica atual da área.

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Gaucho_82
Gaucho_82 🇧🇷

4.6

(52)

218 documentos

1 / 8

Toggle sidebar

Esta página não é visível na pré-visualização

Não perca as partes importantes!

bg1
Teoria literária
e literatura comparada
SANDRA
NITRINI
A
área
de
Teoria
Literária
e
Literatura Comparada começou
a in-
tegrar
o
curso
de
Letras
em
1961. Percebeu-se
que seu
currí-
culo carecia
de
estudos gerais introdutórios
e
estudos teóricos
especializados, indispensáveis para
uma boa formação
acadêmica.
Invocando-se
a
existência
de
disciplinas
com
este
objetivo
em
outras
Faculdade,
como Introdução
ao
Estudo
do
Direito,
Teoria Gerai
do
Estado, Teoria Geral
da
Educação, Introdução
aos
Estudos Históri-
cos,
Introdução
à
Filosofia
etc.,
foi
pedida
a
criação
de uma
área
com o
nome
de
Teoria Geral
da
Literatura,
em
1959,
à
Congregação
da Fa-
culdade
de
Filosofia, Ciências
e
Letras
da
USP,
por
iniciativa
de
Antô-
nio
Cândido, naquela época, assistente
de
Sociologia. Dois anos depois,
ele
inaugurou
o
curso
de
Teoria
da
Literatura.
Em
1962, Teoria
da
Literatura passou
a se
chamar Teoria Lite-
rária
e
Literatura Comparada, também
por
iniciativa
de
Antônio Cân-
dido,
então,
seu
único responsável, para
se
assegurar
o
estudo
das
lite-
raturas
estrangeiras
e um
espaço institucional para
a
Literatura Com-
parada.
Duas linhas mestras
foram
adotadas
no
curso
de
Teoria
da
Lite-
ratura
e
Literatura Comparada: "ensinar
de
maneira aderente
ao
texto,
evitando teorizar demais
e
procurando mostrar
de que
maneira
os
con-
ceitos lucram
em ser
apresentados como instrumentos
de
prática ime-
diata,
isto
é, de
análise''
(1)
e
escolher textos
de
cursos
dos
primeiros
anos, eram usados autores clássicos,
mas os
alunos
de
quarto
ano e da
Especialização tiveram
a
oportunidade
de
estudar escritores
do
Moder-
nismo
e de
entrar
em
contato
com os
clássicos
de
maneira atualizada.
Dentre
os
primeiros cursos, assinalam-se, para
o
quarto ano,
o de
Teoria
e
Análise
do
romance
(1961-1962)
e o de O
estudo analítico
do
poema
(1963-1964)
(2).
Os
primeiros cursos
de
quinto
ano ou
Espe-
cialização, baseavam-se
em
seminários
e
aulas centradas
num
problema,
visando
à
aquisição
de
técnicas avançadas
de
trabalho. Assim,
o mi-
nistrados nesse nível
o
curso
de
Ecdótica (Edição Crítica),
com
inves-
tigação
e
análise
de
manuscritos
e o de
crítica textual, tendo como objeto
pf3
pf4
pf5
pf8

Pré-visualização parcial do texto

Baixe A História do Curso de Teoria Literária e Literatura Comparada na USP e outras Notas de aula em PDF para Literatura, somente na Docsity!

Teoriaeliteraturaliteráriacomparada

SANDRA NITRINI

A

área de Teoria Literária e Literatura Comparada começou a in- tegrar o curso de Letras em 1961. Percebeu-se que seu currí- culo carecia de estudos gerais introdutórios e estudos teóricos especializados, indispensáveis para uma boa formação acadêmica.

Invocando-se a existência de disciplinas com este objetivo em outras Faculdade, como Introdução ao Estudo do Direito, Teoria Gerai do Estado, Teoria Geral da Educação, Introdução aos Estudos Históri- cos, Introdução à Filosofia etc., foi pedida a criação de uma área com o nome de Teoria Geral da Literatura, em 1959, à Congregação da Fa- culdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, por iniciativa de Antô- nio Cândido, naquela época, assistente de Sociologia. Dois anos depois, ele inaugurou o curso de Teoria da Literatura.

Em 1962, Teoria da Literatura passou a se chamar Teoria Lite- rária e Literatura Comparada, também por iniciativa de Antônio Cân- dido, então, seu único responsável, para se assegurar o estudo das lite- raturas estrangeiras e um espaço institucional para a Literatura Com- parada.

Duas linhas mestras foram adotadas no curso de Teoria da Lite- ratura e Literatura Comparada: "ensinar de maneira aderente ao texto, evitando teorizar demais e procurando mostrar de que maneira os con- ceitos lucram em ser apresentados como instrumentos de prática ime- diata, isto é, de análise'' (1) e escolher textos de cursos dos primeiros anos, eram usados autores clássicos, mas os alunos de quarto ano e da Especialização tiveram a oportunidade de estudar escritores do Moder- nismo e de entrar em contato com os clássicos de maneira atualizada.

Dentre os primeiros cursos, assinalam-se, para o quarto ano, o de Teoria e Análise do romance (1961-1962) e o de O estudo analítico do poema (1963-1964) (2). Os primeiros cursos de quinto ano ou Espe- cialização, baseavam-se em seminários e aulas centradas num problema, visando à aquisição de técnicas avançadas de trabalho. Assim, são mi- nistrados nesse nível o curso de Ecdótica (Edição Crítica), com inves- tigação e análise de manuscritos e o de crítica textual, tendo como objeto

de aplicação contos de Machado" de Assis, em 1961; seminários sobre

Quincas Borba, a cargo do professor e dos alunos, com o objetivo de

construir uma interpretação coletiva, em 1962; seminários de análise de

cinco poemas escolhidos a partir da obra de Manuel Bandeira, Mário de

Andrade, Murilo Mendes, Carlos Drummond de Andrade e João Cabral

de Mello Neto, em 1963.

Referindo-se a essa época, Antonio Candido lembra que, durante

meses, em 1962, ele e seus alunos analisaram o poema Louvação da

Tarde de Mário de Andrade. No decorrer dos seminários surgiu a idéia

do levantamento de suas anotações marginais, o que foi levado a cabo

por Maria Helena Grembecki, Nites Teresinha Ferer e Telé Porto An-

cona Lopez. Segundo o próprio Antônio Cândido, este levantamento

talvez tenha sido o primeiro impulso no processo de incorporação do

acervo deste escritor ao Instituto de Estudos Brasileiros. Valendo-se do

material colhido, as três pesquisadoras realizaram suas dissertações de

mestrado e teses de doutoramento sobre aspectos da obra de Mário de

Andrade, dando início a um ciclo de pesquisas, documentação e estudos

sobre a obra deste grande escritor e sobre o Modernismo em geral.

Em 1964, já havia começado a ampliar-se o corpo docente, pre-

mido pelo aumento de discentes e pelo número de aulas. Foi mantido

o currículo básico inicial: um primeiro ano de Introdução aos Estudos

Literários e um quarto ano de Teoria Literária e Literatura Comparada.

Com a reforma que transformou em 1969 a Faculdade de Filo-

sofia, Ciências e Letras em Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências

Humanas, foram criados dois Departamentos de Letras: um de Clássi-

cas e Vernáculas e outro de Modernas. Ficaram fora deles duas discipli-

nas gerais, a de Teoria Leterária e Literatura Comparada e a de Lingüís-

tica. Essa mesma reforma deslocou do Departamento de História os

recém-criados Estudos Orientais. Por mera conveniência dessas disci-

plinas sem qualquer afinidade, mas que necessitavam juridicamente da

massa crítica que só a Teoria Literária e Literatura Comparada podia

fornecer para constituição de um Departamento, surgiu, um Departa-

mento anômalo, como foi sempre o Departamento de Lingüística e

Línguas Orientais, em cujo título jamais figurou o nome de Teoria Li-

terária e Literatura Comparada, disciplina sem a qual ele não teria exis-

tido.

Essa situação equívoca de Teoria Literária e Literatura Comparada

só veio a se resolver em 1990, quando foi criado o Departamento de

Teoria Literária e Literatura Comparada.

Dois anos antes, o curso de Teoria Literária e Literatura Compa-

componente interdisciplinar também era contemplada. Com a passagem

para o regime novo, em 1971, a interdisciplinaridade continuou a ser

possível, embora não mais obrigatória e nem articulada ao eixo de Teo-

ria Literária. Este eixo deixou de ser único. As disciplinas tornaram-se

semestrais e passaram a ser ministradas por vários orientadores. No

entanto, é preciso ressalvar que a perda destes louváveis traços do cur-

rículo da primeira fase da pós-graduação em Teoria Literária e Litera-

tura Comparada foi compensada pela própria riqueza da diversidade de

pontos de vista, introduzidos pelos professores que começaram a atuar

na área no início da década de 70.

A ênfase do regime de pós-graduação a partir de 1971 passou a

recair, como se sabe, sobre as dissertações e teses. Vinte e três anos

depois, o balanço de seus resultados na área de Teoria Literária e Lite-

ratura Comparada se consusbstancia em quase 150 dissertações de mes-

trado e teses de doutoramento, tendo sido publicado um grande número

delas. Publicadas ou não, todas trazem uma contribuição, no mínimo,

de boa qualidade, para os estudos literários no Brasil, num amplo es-

pectro de perspectivas e de objeto de estudo.

O perfil da produção científica da área de Teoria Literária e Lite-

ratura Comparada se compõe de trabalhos que recobrem o estudo de

aspectos teóricos da poesia e do romance, envolvendo suas relações com

a sociedade e a psicanálise, aspectos teóricos da história literária e da

tradução literária, estudos das fontes, ecdótica e genética textual, análise

dos diferentes níveis do discurso, estudo sobre o ensino da literatura no

Brasil e, finalmente, estudo de autores, na perspectiva de literatura com-

parada. José de Alencar, Machado de Assis, Euclides da Cunha, Manuel

Bandeira, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, João Cabral de Mello

Neto, Augusto Meyer, Simões Lopes Neto, Clarice Lispector, Osman

Lins, Murilo Mendes, Carlos Drummond de Andrade, Torquato Neto,

Jorge de Lima, Dalton Trevisan, Chico Buarque de Holanda, Maria

Clara Machado, Cortázar, Borges, Huidobro, Girondo, Brecht, Gógol,

o cineasta Glauber Rocha, José Veríssimo, Álvaro Lins, Tristão de

Ataíde constituem alguns dos muitos autores e críticos que figuram

entre os principais objetos das teses e dissertações ao longo deste perío-

do.

Como se pode observar a partir do elenco citado, um dos princí-

pios adotados por Antônio Cândido nos primeiros cursos de Teoria

Literária da década de 60, ou seja, trabalhar com textos de autores con-

temporâneos se solidificou também na pós-graduação, chECAndo a criar

uma espécie de tradição na área de Teoria Literária e Literatura Com-

parada. O outro princípio, relacionado a uma atitude de tratamento do

texto, evitando teorizar demais e valendo-se dos conceitos como ins-

trunientos de análise também se enraizou e acabou por constituir um traço do que se poderia chamar a tendência da Teoria Literária e Lite- ratura Comparada da FFLCH da USP.

As pesquisas em andamento inserem-se, pois, nessa tradição e dis- tribuem-se em dez linhas:

  • Literatura e Educação, voltada para o estudo das relações entre pro- blemas educacionais e literários, tanto do ponto de vista teórico quanto pedagógico. Projeto vinculado: estágio de formação do edu- cador em serviço — a circulação da escrita na escola.
  • Problemas de Tradução Literária. Propõe-se a estudar e cotejar tex- tos, buscando identificar diferenças estilísticas no trabalho de tradu- ção. Projetos vinculados: problema de versão para o português da obra de F. Dostoievski e um capítulo excluído de Os demônios de Dostoievski.
  • Ecdótica e Genética Textual. Estudo das fontes e de diferentes ver- sões de textos literários, visando ao preparo das edições críticas, teo- ria e crítica textual e do próprio texto. Projetos vinculados: fontes de Euclides da Cunha, edição crítica de Grande sertão: veredas, de Gui- marões Rosa e edição crítica da correspondência ativa e passiva de Euclides da Cunha.
  • Literatura e Psicanálise, caracterizada pela utilização de conceitos psicanalíticos no estudo da literatura. Projetos vinculados: Gra- ciliano Ramos — a experiência, o imaginário e o simbólico; a poética do desejo nos contos de Guimarões Rosa — traços do feminino; literatura e psicanálise — o sonho literário e a questão da feminilida- de na literatura.
  • Teoria dos gêneros, voltada para a questão dos gêneros no estudo da obra literária. Projetos vinculados: a questão dos gêneros em Grande sertão: veredas; a narrativa de Pirandello; roman-noir americano e romance brasileiro
  • História literária e história cultural, ou seja, o estudo da questão da história literária e de suas relações com a história cultural. Projetos vinculados: biografia intelectual de Euclides da Cunha; re- presentações literárias da modernidade; a narrativa de A.P. Tchecov; a cultura russa nos últimos anos.
  • Correntes críticas, centradas na reflexão sobre a questão das teorias críticas no estudo da obra literária. Projetos vinculados: teorias críti- c a s — a questão literária; crítica e criação.

escolha individual, quando em outras universidades e mesmo em várias áreas da Faculdade, já é feito de maneira mais institucional.

Estes três pontos pareceram suficientes, ao corpo docente da área, para uma tentativa de alterar algo que, pelo menos em linhas gerais, vem dando certo, uma vez que a qualidade das dissertações de mestrado de- fendidas na área é, como já foi dito, no mínimo boa. Nesse sentido, modificou-se a forma de ingresso e a estrutura do curso com o objetivo de dar-lhe novamente alguma unidade e, também, de atender à demanda cada vez maior de discentes interessados numa formação em pós-gra- duação, sem desejar, no entanto, o titulo de mestre.

Através de um exame de seleção, o pós-graduando ingressa na área de concentração. O programa divide-se em duas etapas. Na primeira, o aluno cursa as disciplinas e conta com o apoio de um orientador aca- dêmico. Ao final desta primeira etapa, apresentam-se, para ele, duas possibilidades: encerrar o curso e receber o diploma de especialização, ou continuar e fazer a dissertação de mestrado. Se optar por esta segun- da possibilidade, já deverá ter definido seu tema e seu orientador de dissertação, que poderá não ser o orientador acadêmico, caso haja outro docente cuja linha de pesquisa seja mais compatível com a do tema es- colhido.

O programa da primeira etapa, com duração de três semestres, compõe-se de três disciplinas obrigatórias (Métodos e Técnicas de aná- lise Literária. Problemas de Teoria Literária ou Problemas de Literatura Comparada e Grandes Obras da Literatura Universal ou Um Grande Autor) e de outras três a serem escolhidas entre as complementares oferecidas pelo Departamento e as optativas, externas ao Departamento ou credenciadas juntamente com outro.

A segunda etapa é a da dissertação de mestrado, dirigida por um orientador. Esta reformulação não só atingiu a estrutura curricular do curso como também exigiu uma redefinição da dissertação de mestrado, cujas principais características devem mostrar que o canditado possui:

  • conhecimento da bibliografia geral da área de concentração;
  • conhecimento da bibliografia específica do recorte de pesquisa escolhido no interior da área;
  • capacidade de pesquisa, isto é, capacidade de descobrir, selecionar e discutir os dados mais importantes desta bibliografia;
  • capacidade de reorganizar de forma coerente os dados utilizados.

Estes quatro pontos bem explicitados delimitam melhor o âmbito

do mestrado, e espera-se, assim, livrar muitas dissertações de algumas arestas como os exageros do arremedo de doutoramento, a obsessão com o número de páginas e as tentativas ingênuas de se esgotar um assunto, as quais, se não chECAm a comprometer a qualidade de seus conteúdos, impedem-nas de atingir uma perfectibilidade formal.

Com este projeto, coincidentemente implantado no ano do sexa- gésimo aniversário da FFLCH, o Departamento de Teoria Literária e Literatura Comparada almeja aprimorar a formação do pesquisador em estudos literários, garantindo o padrão de qualidade das dissertações de mestrado, a partir da experiência já existente, mas redimensinando-o em função do novo contexto acadêmico, além de contribuir, também, para o aperfeiçoamento de outros pós-graduandos, cujos destinos profissio- nais cumprir-se-ão no ensino do segundo grau ou em atividades ligadas à critica literária e à produção de textos.

Fontes

Relatório para renovação do recredenciamento do curso de Pós-Graduação em Teoria Li- terária e Literatura Comparada (mestrado e doutorado), 1992 e Relatório apresentado à CAPES, 1994.

Documentos constantes do processo de criação de Departamento, 1987 e constantes do processo de reformulação da Pós-Graduação.

Notas

1 Antônio Cândido. O estudo analítico do poema. São Paulo, FFLCH-USP, s.d., p. 6

2 Parte deste curso foi mimeografado à revelia de Antonio Candido, na década de 60. Embora, mais de 20 anos depois, tenha permitido sua publicação pela FFLCH, moti- vado por uma perspectiva histórica à medida em que "este material já pode ser consi- derado como elemento para a sua história, como amostra do que se fazia naquele tem- po, antes das transformações e, em conseqüência, o seu ensino", o fato é que ele se revela ainda atual em sua maior parte e integra a bibliografia do curso Introdução aos Estudos Literários, constituindo um de seus itens mais lidos e aproveitados pelos alunos de hoje.

Sandra Nitrini é professora do Departamento de Teoria Literária e Literatura Comparada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.