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35. 26. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da. Constituição. 6. ed. Coimbra: Almedina, ...
Tipologia: Notas de estudo
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MAURO ROBERTO GOMES DE MATTOS , Advogado no Rio de Janeiro-RJ. Autor de inúmeras Obras Jurídicas. Vice Presidente do Instituto Ibero-Americano de Direito Público (Capítulo Brasileiro) – IADP; Membro da Sociedade Latino-Americana de Direito do Trabalho e Seguridade Social; Membro do IFA – International Fiscal Association; Conselheiro efetivo da Sociedade Latino-Americana de Direito do Trabalho e Seguridade Social; Co-Coordenador da Revista Ibero-Americana de Direito Público – RIADP (Órgão de Divulgação Oficial do IADP).
SUMÁRIO: 1.- CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES. 2.- CONCEITO DE CONSTITUIÇÃO E O FUNDAMENTO DE SUA TEORIA. 3.- CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA DE CONSTITUIÇÃO. 4.- A NOVA INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL. 5.- CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO BRASILEIRO. 6.- CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO COMO FENÔMENO MUNDIAL. 7.-CONCLUSÃO. 8.- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
RESUMO:
O presente estudo traz uma visão sobre o desenvolvimento do conceito de Constituição iniciada pelos jusfilósofos gregos e romanos, que a estabeleceram como o centro de concentração de poder do Estado. Com a evolução da humanidade, surgiu a Teoria da Constituição, responsável por um amplo redimensionamento, onde a Constituição passou a se preocupar com os valores fundamentais do homem. E a atual fase da teoria da Constituição constitucionalizou o direito para estabilizar as relações públicas e privadas. Esse é um fenômeno mundial, pois os povos evoluídos juridicamente se uniram para estabelecer o Estado Democrático de Direito, como o responsável pelo equilíbrio entre o poder do Estado confrontado com fundamentais direitos do cidadão. Assim, os direitos são lidos a partir do que vem estabelecido na Teoria da Constituição.
O conceito de “ Constituição ” foi desenvolvido inicialmente pelos Gregos, que distinguiam o fundamento do Estado e as Leis simples, como forma de ordenar o poder e não permitir a instalação da anarquia na “ pólis ”.
Aristóteles^1 (384 a.C.- 322 a.C.), filósofo pagão, através de suas inúmeras Obras influenciou os pensadores e a filosofia européia ocidental com os seus escritos sobre a pobreza, em sua obra denominada “ Política ”, deixando várias composições literárias sobre a Teoria da Constituição, inclusive em sua “ Constituição de Atenas ”.
Pela filosofia, os Gregos foram expandindo suas idéias sobre o direito natural , anterior e posterior às leis escritas, a fim de melhorar a coexistência humana e tornar o homem mais feliz , vez que este compõe o Estado e portanto está predisposto à vida social.
Tendo a Constituição a função de Lei Geral, capaz de vincular o poder a uma regra pré estabelecida, os inúmeros pensamentos filosóficos foram responsáveis pela sua instituição e pela respectiva humanização das formas de Governo e dos Tipos de Estado, visto que a concentração do poder pelo Monarca/Soberano já não poderia ser despótica, tirânica, opressiva e absolutista.
Partindo dessa premissa, Jellinek^2 afirmou que: “Todo Estado, pues, necessariamente ha menester de una Constitución. Un Estado que no la tuviera, sería una anarquía. El proprio Estado arbitrario, en el antiguo sentido, tine necesidad de ella, tanto cuando se
(^1) Cf. VERDÚ, Pablo Lucas. Teoría de La Constitución como Ciencia Cultural. 2. ed. Madrid: Dynkinson,
América (1776 em diante) e depois, num segundo momento, no decorrer da Revolução Francesa (1789-1799), tida como a grande revolução burguesa, que ao seu próprio tempo utilizou-se da doutrina do “ pouvoir constituant ” , na qual todos os poderes do Estado possuíam o seu ponto de partida.
Com esse alcance, o conceito de Constituição é inseparável da própria essência do Estado, pois sem a sistematização de atividades da organização política de uma nação, ela não poderia subsistir.^6
Assim, influenciada pela “Teoria do Direito Natural”, se verifica uma profunda investigação sobre os vários aspectos das “Leis Fundamentais”. E a doutrina popular do contrato social é acolhida por Thomas Hobbes (1588-1679), jusfilósofo inglês, precursor do positivismo jurídico, que funda sua Teoria doutrinária Política do Absolutismo do Estado em contradição com as exigências democráticas da época. A filosofia hobbesiana aceita a expressão de “Lei Fundamental” e a define como aquela norma que ao ser suprimida destruiria o corpo do Estado e daria oportunidade ao surgimento da anarquia e do despotismo. A “Lei Fundamental” se identifica, portanto, como contrato social , sobre o qual se funda o Estado, assim como com as conseqüências que se depreendem imediatamente dele. Este contrato, que se leva a efeito com o consentimento unânime, é poder inalterável enquanto o príncipe assim designar ou desejar.
Tanto Hobbes, como Pufendorf estimam que a “liberdade individual” está sempre condicionada às leis civis e às ordens emanadas por quem ostenta o poder summum imperium e, portanto, restringida aos interesses da República, de mane ira tal que jamais o poder de um cidadão pode ser superior ou prevalecer sobre o da “ civitas ”.
Hobbes^7 era o jusfilósofo mais aguerrido na defesa da unidade do poder estatal, como centro das decisões políticas e não pela vontade do povo. Ele afirmava que o princípio das desigualdades , tanto de riqueza como de poder ou de nobreza, eram produtos da lei
(^6) Cf. LIMA, Eusébio de Queirós. Theoria del Estado. 3. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1939. p. 407. (^7) Cf. ALONSO, Clara Álvares. Lecciones de Historia del Constitucionalismo. Madrid: Marcial Pons,
civil, e que pela lei natural, que é o mesmo da lei moral, todos os homens hão de ser considerados iguais.
Em seu contrato social ou pacto de sociedade , os homens renunciam a uma parte dos seus direitos, em prol do Estado, do poder político e do soberano.^8
Suas idéias foram fundamentais para a evolução constitucional, desenvolvimento teórico do conceito de Estado e ideação da libertação dos cidadãos do jugo dos Governantes déspotas e Monarcas Absolutos, sendo Hobbes o primeiro dos pensadores políticos da Idade Moderna, a abrir caminho para a fundamentação/concretização do Direito e do Estado.
Sucede, que outros autores ingleses, também influentes na época áurea da filosofia defendiam o “governo limitado por leis”, sendo que as suas lições e pensamentos foram decisivos para o surgimento da primeira Constituição Norte-Americana, promulgada em 17 de setembro de 1787.
Uma das grandes expressões da época, que recebeu uma verdadeira herança no plano filosófico – filosofia moral e política, jurídica e iusracionalismo – foi John Locke, criador e fundamentador de célebres lições em seus Tratados.
Sendo inclusive um dos fundadores do movimento intelectual iniciado na Inglaterra, no século XVII e difundido na Europa, denominado “Iluminismo”, que atingiu seu apogeu, principalmente na França, no século XVIII.
Desde as suas publicações, nos finais do século XVII, os Tratados Lockianos são conhecidos pelo vínculo que estabelecem entre propriedade e sistema político, elaborados a partir de sua interpretação do “pacto social de raiz popular”, onde o homem, no entanto, possui um conjunto de direitos naturais inatos e originários que não são delegáveis ao Estado, limitando deste modo o poder político.
independentemente um do outro, não havendo supremacia e ou hierarquia de um sobre o outro.
De outra forma se conduziu a “Teoria do Direito Natural” na Alemanha, onde Pufendorf apesar de adepto, atenuou a doutrina de Hobbes, tendo também a adesão de Jakob Boehme, conhecido como Böhmer (1575-1624) e Wolff (discípulo de Leibniz), dentre outros, que transformaram o conceito de “Lei Fundamental” de um modo peculiar, no sentido de que ela era constitucional exclusivamente, mas também limitadora do poder do príncipe pelo povo. De sorte que a teoria posterior que identifica a “Lei Fundamental” como Constituição ( Konstitutio nelle werfassung) , manteve seus principais traços.
Immanuel Kant 10 (1724-1804), de nacionalidade alemã e filósofo-professor parte de uma dualidade, tendo o direito como ciência: “es el conjunto de todas las leyes jurídicas, pero en la medida que denota legitimidad, estriba en la conformidad de la acción con la regla de derecho, siempre y cuando [...] la acción no contradigo a la ley moral”.
Portanto, Kant construiu a idéia de uma “Administração Moral” preocupada com o bem estar dos cidadãos, tendo no Monarca o verdadeiro tutor dessa missão.
Pois bem, pela filosofia, através de grandes pensadores e jusfilósofos, o Estado foi tomando forma mais humanizada, pois a sociedade já não suportava mais conviver com o poder ilimitado, despótico e absoluto do Monarca.
Este processo histórico fez nascer o ideal de Constituição, como “Lei Fundamental” de uma nação, capaz de organizá- la política e socialmente, inclusive com a segurança/afirmação de liberdades, inicialmente burguesas, contendo certas garantias de liberdades gerais, como explicitado por Carl Schmitt:^11 “En el proceso historico de la Constitución moderna, há prosperado tanto un determinado concepto idela, que desde el
(^10) ALONSO, Clara Álvarez. Op. cit. ant., p. 162. (^11) SCHMITT, Carl. Teoria de la Constitución. Tradução de: Francisco Ayala. Madrid: Alianza Editorial,
silo XVIII, solo se han designado como constituciones aquellas que correspondían a las demandas de liberdad.”
Nessa vertente, os séculos XVII e XVIII foram cruciais para que uma parte da Europa se libertasse dos resquícios norteadores do “Feudalismo”, regime este que vigorou durante a Idade Média, mais acentuadamente entre os séculos IX e XII regendo no referido Continente – parte ocidental- a ordem política, social e econômica, ou seja, ocorrendo a libertação da relação Rei (suserano dos suseranos)/Grandes Feudatários/Senhores Feudais/Suseranos/Vassalos/Servos/Vilões, bem como dos princípios norteadores do “Absolutismo”, regime político no qual todos os poderes se concentravam nas mãos dos Soberanos e seus Ministros, ou seja, da relação despótica, tirânica entre Monarca e súdito, para dar lugar a uma “Lei Fundamental” mais liberal.
Promulga-se então a primeira Constituição escrita no sentido moderno, que foi a Constituição dos Estados Unidos da América de 1787, visto que a Constituição inglesa não era escrita – predominantemente costumeira -, cujas normas são sempre incorporadas à legislação ordinária, constantemente em contínua adaptação.
A sua importância para o cenário político- ideológico-social da época na qual ocorreu a sua promulgação foi bem grande, pois a Constituição Americana foi a primeira “republicana” em um contexto onde reinava na Europa o domínio absoluto, tirânico e despótico da Monarquia, representando o Rei a fonte divina do Poder.
Surgiu, pela primeira vez, uma sistema presidencialista^12 e também foi estabelecido, de forma pioneira, a fiscalização da constitucionalidade das leis.^13
Como muito bem expressou Ana Maria Guerra Martins: “A Constituição Americana é um verdadeiro laboratório de ensaio vivo das teses político- filosóficas imperantes na época. Mas ao mesmo tempo é o resultado de um pragmatismo que não hesita em afastar as teorias sem que tal se afigura necessário e útil.”^14
(^12) MARTINS, Ana Maria Guerra. Op. cit. ant., p. 17. (^13) Aprofundar em: AMARAL, Diogo Freitas do. Ciência Política. Coimbra: Almedina, 1991. v. 2. p. 215. (^14) MARTINS, Ana Maria Guerra. Op. cit. ant., p. 17.
[ Art. 1 er. “ Les hommes naissent et demeurent libres et égaux em droits. Les distinctions sociales ne peuvent être fondées que sur l’utilité commune.”].
O princípio básico sobre o poder que a Revolução Francesa adotou, incorporou as idéias, teses filosóficas e formulações ideológicas em especial, de François Marie Arouet, conhecido como Voltaire (1694-1778), Locke e Jean-Jacques Rousseau (1712- 1778), sendo que este último filósofo, em seu “ Do Contrato Social ”, citado por García de Enterría, deixou assente que: “El soberano, que nos es mas que um ser colectivo, no puede ser representado mas que por si mismo: el poder puede trasmitirse, pero no la voluntad.”^16
Pois bem, aos 3 de setembro de 1791 foi promulgada a primeira Constituição européia originada da Revolução Francesa, baseada nos ideais estruturais sobre o poder, estabelecido por uma Assembléia Constituinte, criada para tal fim. E de conseqüência, este exemplo constitucional, foi adotado pelos demais países do Velho Mundo.
O Título III, da Carta francesa, intitulado - “Dos Poderes Públicos”- estabelece que a soberania é indivisível, inalienável e imprescritível, pertencendo a nação e não mais a um único indivíduo. O exercício do poder deixou de ser absoluto, para dar lugar a soberania da nação vinculada ao povo, de forma inseparável e permanente.
Surgiu, a seguir a idéia fundamental do governo limitado pela lei, o do “ régne de la loi ”, criada pelo “corpo legislativo”, que era representado por uma única Câmara, renovado pelo sufrágio universal todos os anos. É de competência desta Assembléia propor as leis à aprovação popular, bem como fazer decretos elegendo um conselho executivo de 24 membros, responsáveis pela execução dos seus diplomas legais.
Estas experiências foram verdadeiras lições para a humanidade, que passou a ter na função política da Constituição, o estabelecimento de limites jurídicos ao exercício do
(^16) ENTERRÍA, Eduardo García de. La Lengua de los Derechos : La Formulación del Derecho Público Europeo tras la Revolución Francesa. Madrid: Alianza Editorial, 1999. p. 105.
poder, que de ilimitado e irresponsável, ficou vinculado às normas e dispositivos legais.^17
Essa garantia constitucional, na visão de Hans Kelsen:^18 “significa generar la seguridad de que esos limites jurídicos no serán transgredidos. Si algo es indudable es que ninguna otra instancia es menos idónea para tal función, que aquélla, precisamente, a la que la Constitución confiere el ejercicio total o parcial del poder y que, por ello, tine en primer lugar la ocasión jurídica y el impulso político para violarla.”
Assim, como a Constituição do Estado decide a unidade política de um povo,^19 ela delimita o poder, e estabelece uma orientação, em busca de um ideal, foi muito importante a fixação do “princípio da soberania popular”, como forma de limitar o poder, para evitar abusos.
Através da evolução dos tempos, tivemos grandes avanços no campo constitucional, pois o poder absoluto, despótico e tirânico passou a ser controlado por princípios até então ignorados.
Inicialmente, as Constituições, responsáveis pela geração de Poder Jurídico do Estado, ainda guardavam uma posição mais conservadora. A partir do século XIX, o Direito Constitucional foi considerado como ciência autônoma e sistematicamente ordenada, responsável pela transformação fundamental da estrutura jurídico-política tradicional, e que deu lugar a um sistema de normas e princípios valorativos, capazes de vincular todo o sistema legal. 20
Foi o ápice do Direito Constitucional que unificou a imagem jurídica do mundo, para a expansão de uma crença de que tal sistema representa uma fórmula definitiva da convivência harmônica-política-social, e de que era uma das grandes e definitivas
(^17) Cf. KELSEN, Hans. ¿Quién debe ser el defensor de la Constitución?. Tradução de: Roberto J. Brie. Madrid: Editorial Tecnos, 1995. p. 5. 18 19 KELSEN, Hans. Op. cit. ant.,^ p. 5. 20 Cf. SCHMITT, Carl. Op. cit. ant., p. 29. Cf. HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha. Tradução de: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p. 41.
Estes estudos, mesmo não aparecendo sob o título de “Teoria do Estado”, como hoje em dia, foram feitos por notáveis estudiosos/filósofos, sob outra designação, mas com a mesma preocupação de se vislumbrar o estudo do Estado. Isto se deu em “A República” , de Platão, em “A Utopia” , de Thomas Morus, “Nova Atlântida” , de Francis Bacon, “A Cidade do Sol” , de Tomaso Campanella ou no “Leviatã” , de Thomas Hobbes, dentre outros notáveis.
Com as inúmeras transformações das situações políticas, não existia a figura do poder ao qual estamos acostumados, o que leva alguns autores a não reconhecerem a existência de “Estados” na Idade Média, dado ao sistema de dominação existente do Monarca sobre os demais. Todavia, como sujeito de Direito Internacional, a figura do Estado se confundia com o próprio reino. Cabral de Moncada,^22 em precioso estudo utiliza-se da expressão de um “policentrismo da degradação feudal e municipalista” da respectiva época, até o século XVI, onde apareceu a figura do Estado Moderno, capaz de designar grupos, territórios e poder de domínio.^23
Surge, portanto, a figura do Estado, como fator da concentração de poderes públicos na figura do Rei e do controle de um território, que significava a sua soberania.
A “palavra do Estado ficou geralmente associada ao grupo de domínio dotado do poder supremo.”^24 No sentido do Direito Público, Estado é o agrupamento de indivíduos, estabelecidos em um determinado território e submetidos a um poder público soberano, vinculado às regras constitucionais, que lhes outorga autoridade orgânica e vinculada aos princípios e as regras supremas. Assim, o Estado passou de Absoluto ao Constitucional, vinculando o poder ao Direito.
Sobre um outro prisma, Jorge Miranda,^25 estabelece o seguinte conceito: “O Estado é uma sociedade política com indefinida continuidade no tempo e institucionalização do poder significa dissociação entre a chefia, a autoridade política, o poder, e a pessoa que em cada momento tem o seu exercício; fundamentação do poder, não nas qualidades pessoais do governante, mas no Direito que o investe como tal; permanência do poder (como ofício, e não como domínio) para além da mudança de titulares; e sua subordinação à satisfação de fins não egoísticos, à realização do bem comum.”
Deixando de lado a definição de Jorge Miranda, o Estado na atualidade é constitucional, “com qualidades”. Sendo certo que duas de suas qualidades são descritas por J. J. Gomes Canotilho como: “Estado de Direito” e “Estado Democrático” (“Estado Constitucional”).^26
O Estado de Direito limita o poder político pelo ordenamento jurídico, estabelecendo o governo de leis.
Outro traço marcante do Estado de Direito é o estabelecimento jurídico de uma divisão de poderes, que hoje em dia é mais conhecido como divisão de funções.
O Estado de Direito exige uma conformação com a democracia, para que não seja violada a soberania popular.
O Estado Constitucional é o Estado Democrático, instituído como fonte reguladora de uma estabilidade entre o poder central e o indivíduo. Esta estabilidade vem delineada geralmente pela “Lei Fundamental”, que ao mesmo tempo em que dota os poderes constituídos de direitos e garantias de governabilidade, estabelece limites para a sua atuação, quando elenca princípios e normas voltados para a consecução do bem comum de todos.
(^25) MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Coimbra: Coimbra Ed., 2002. p. 35. (^26) CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 6. ed. Coimbra: Almedina, 2002. p. 93.
Malberg, 28 representa a existência do nascimento do Estado, através da sua primeira “Lei Fundamental”, seja ou não escrita.
Não se equivocou Carl Schimitt^29 quando inicia a sua Teoria da Constituição destacando que a palavra constituição apresenta uma diversidade de sentidos.
Até chegarmos ao atual e presente estágio constitucional, muitos doutrinadores se debruçaram no estudo dessa ciência do direito para compreender a origem do Estado e estabelecer os direitos e as garantias fundamentais para toda a coletividade.
Desde às priscas eras, o homem se atormenta com o poder absoluto e ilimitado do Estado. E, acreditando que o império da lei seria suficiente para combater arbítrios do poder estatal, deixou a Constituição estagnada, no sentido de que ela apenas regulasse os poderes políticos e estipulasse os valores inerentes à soberania nacional.
Por esta razão, a doutrina se manteve firme na busca de uma real evolução da Carta Magna, e o ponto de partida foi a estruturação do Estado, como ente jurídico, para após estabelecer a sua permanente importância perante a Nação.
Portanto, houve uma pluralidade de conceitos, como, por exemplo, o de Ferdinand Lassalle,^30 que em abril de 1863, proferiu conferência perante um auditório composto de cidadãos (intelectuais e operários) da antiga Prússia, onde aduziu: “Constituição é um pacto juramentado entre o rei e o povo, estabelecendo os princípios alicerçais da legislação e do governo dentro de um país. Ou, generalizando, pois existe também a Constituição nos países de governo republicano: A Constituição é a lei fundamental proclamada pela nação, na qual baseia-se a organização do Direito público do país.”
(^28) MALBERG, R. Carré du. Teoria General del Estado. Tradução de: José Lión Depetre. México: Faculdade de Derecho/UMAM, 2001. p. 76. 29 30 SCHMITT, Ca rl. Op. cit. ant., p. 29. LASSALLE, Ferdinand. A Essência da Constituição ( Uber das Verfassungswesen ). 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. p. 6.
Para Lassalle,^31 o conceito de Constituição “é a fonte primitiva da qual nasce a arte e a soberania constitucionais.”
Segundo Jellinek,^32 toda associação permanente necessita de um princípio de ordenação, conforme o qual se constitua e desenvolva sua vontade. Este princípio de ordenação será o limite da situação de seus membros dentro da respectiva associação e em relação com ela. Essa ordenação se chama Constituição, assim definida pelo citado mestre: “La Constitución de los Estados abarca, por consiguiente, los principios jurídicos que designan los órganos supremos del Estado, los modos de su creación, sus relaciones mutuas, fijan el círculo de su acción, y, por último, la situación de cada uno de ellos respecto del poder del Estado.”
Carl Schmitt^33 distingue os conceitos “absoluto”, “relativo”, “positivo” e “ideal”. Constituição em sentido absoluto para ele pode significar, no primeiro momento, a concreta maneira de ser resultante de qualquer unidade política existente. A unidade política e a ordenação social, para o ilustre mestre, se pode chamar Constituição. O Estado, nas palavras de Schmitt: “no tiene una Constitución ‘según la que’ se forma y funciona la vontad estatal, sino que el Estado es Constitución, es decir una situación presente del ser, un status de unidad e ordenación. El Estado cesaría de existir si cesara esta Constitución, es decir, esta unidad y ordenación. Su Constitución es su ‘alma’, su vida concreta y su existencia individual.”
Em uma segunda acepção absoluta, Carl Schmitt atribui ao termo Constituição o conceito de uma especial ordenação política e social, significando o modo concreto da supra ordenação e subordinação, em face à uma realidade social.
Por outro lado, em uma terceira significação de Constituição, ainda em sentido absoluto, para Carl Schmitt, é o princípio dinâmico de uma unidade política, renovada continuamente, sem perder, contudo, a sua força e energia subjacente, mantenedora da
(^31) Ibid., p. 7. (^32) JELLINEK, Georg. Op. cit. ant., p. 413. (^33) SCHMITT, Carl. Op. cit. ant., p. 30.
Já o aspecto material é a parte da realidade constitucional que se integra com benefícios exemplares, que compõe uma ordem de conduta, representada por um modelo em todo universo jurídico.
Outro grande expoente do Direito Constitucional argentino, Linares Quintana,^36 define a Constituição em “sentido genérico” e em “sentido específico”.
Nas duas hipóteses, é sustentado: “a) el concepto genérico de Constitución, que designa simplesmente el ordenamiento u organización de un Estado: así como todo ente animado o inanimado, posee una Constitución, cualquiera sea el contenido de ésta o los principios que la informen (...) b) el concepto específico de Constitución - del cual deriva el adjetivo constitucional, calificativo de un determinado tipo de Estado – que única y exclusivamente expresa la idea de un ordenamiento jurídico estatal orientado a la consecución de un fin supremo y ultimo: la garantía de la libertad y la dignidad del hombre en la sociedad; régimen que implica derechos individuales y derechos sociales.”
Marcello Caetano 37 define a Constituição como “conjunto de normas fundamentais que regulam a atribuição e o exercício do poder político, definindo a competência dos seus órgãos, as funções específicas destes e os direitos dos indivíduos e das sociedades primárias com força obrigatória para todos os poderes constituídos e vinculativa dos seus atos.”
Constituição em “sentido material” para Santi Romano 38 é: “entendida como sendo sinônimo de organismo ou corpo social, ou seja, de instituição, tendo uma estrutura, uma ordem, um status , uma organização, mais ou menos estável e permanente, que reduz à unidade os elementos que o compõem, conferindo- lhes individualidade e vida própria.”
(^36) QUINTANA, V. Linares. Tratado de la Ciencia del Derecho Constitucional Argentino y Comparado.
Já a Constituição em “sentido formal” para Santi Romano 39 é: “Constituição, em sentido formal ou instrumental, nada mais é senão o documento, a ‘carta’, o ‘estatuto’ ou ainda a ‘lei’ que estabelece ou da qual resulta a Constituição em sentido material. Urge salientar que não é diversa essa significação da palavra Constituição em sentido material quando esta resulta não de um documento escrito, mas dos costumes, como ocorre com a Inglaterra.”
A “Constituição moderna”, na visão de J.J. Gomes Canotilho,^40 seria: “a ordenação sistemática e racional da comunidade política através de um documento escrito no qual se declaram as liberdades e os direitos e se fixam os limites do poder político.” Em complementação à sua definição, Canotilho estabelece a incorporação das seguintes características: documento escrito, estabelecimento de direitos fundamentais e as suas garantias e a organização do poder político segundo esquemas tendentes a torná- lo um poder limitado e moderado.
O único reparo que se faz ao grande mestre Canotilho, quanto ao seu conceito de Constituição é que a mesma pode derivar de um documento não escrito. Sabemos que constitui exemplo minoritário, pois a maioria dos Países adotam o texto escrito, para a existênc ia de maior segurança jurídica.
Jorge Miranda,^41 também imbuído da modernidade, estabelece que: “as Constituições do século XX (todas ou quase todas) estendem o seu domínio e as novas regiões, garantindo não só direitos do homem, do cidadão, do trabalhador, como princípios objectivos da vida social, permitindo ou impondo intervenções econômicas, modelando ou remodelando instituições públicas e privadas.”
O conceito de “Lei Fundamental”, em um primeiro momento, que Paolo Biscaretti di Ruffia,^42 desenvolve, utilizando-se de uma genealogia das Constituições modernas é o
(^39) Ibid., p. 4. (^40) CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op. cit. ant., p. 52. (^41) MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. 3. ed. Coimbra: Coimbra Ed., 1996. t. 2. p. 21-