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TCC - Pós Graduação Direito Processual, Teses (TCC) de Direito Penal

TCC - apresentado para formação.

Tipologia: Teses (TCC)

2021

Compartilhado em 29/04/2021

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thamara-sousa-8 🇧🇷

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THAMARA KARLLEN DE SOUSA PEREIRA
A RESPONSABILIDADE DO ESTADO ANTE A VULNERABILIDADE
SOCIAL DO AGENTE DELINQUENTE À LUZ DA APLICAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA CO-CULPABILIDADE
FADILESTE – FACULDADE DE DIREITO E CIÊNCIAS SOCIAIS DO
LESTE DE MINAS
REDUTO, 2020
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THAMARA KARLLEN DE SOUSA PEREIRA

A RESPONSABILIDADE DO ESTADO ANTE A VULNERABILIDADE

SOCIAL DO AGENTE DELINQUENTE À LUZ DA APLICAÇÃO DO

PRINCÍPIO DA CO-CULPABILIDADE

FADILESTE – FACULDADE DE DIREITO E CIÊNCIAS SOCIAIS DO

LESTE DE MINAS

REDUTO, 2020

THAMARA KARLLEN DE SOUSA PEREIRA

A RESPONSABILIDADE DO ESTADO ANTE A VULNERABILIDADE

SOCIAL DO AGENTE DELINQUENTE À LUZ DA APLICAÇÃO DO

PRINCÍPIO DA CO-CULPABILIDADE

Monografia apresentada ao Curso de Pós Graduação da Faculdade FADILESTE – Faculdade de Direito e Ciências Sociais Do Leste De Minas, como requisito parcial à obtenção do título de Pós-Graduada. Área de Concentração: Direito Penal, Direito Processual Penal e Direito Constitucional Orientadora:

FADILESTE – FACULDADE DE DIREITO E CIÊNCIAS SOCIAIS DO

LESTE DE MINAS

Dedico ao meu avô João Cornélio ( in memoriam ) que mesmo não estando mais presente sei que está olhando por mim. Aos meus Pais Roberto (in memoriram) e Conceição, por me incentivarem sempre ir em busca do melhor, as minhas irmãs, aos meus sobrinhos Raphael e Dominc e a todos que sempre estiveram comigo nesta caminhada.

AGRADECIMENTOS

A Deus, não só pela minha existência mas também por toda força que cotidianamente me forneceu, através da qual pude enfrentar os obstáculos que me apareceram durante a confecção deste trabalho de conclusão de curso. Aos meus pais, Roberto e Conceição pela boa educação que me ministraram e por todo o amor com que sempre me envolveram. Não obstante, não posso me furtar de tecer agradecimentos pessoais a cada um deles individualmente. A minha mãe, Conceição, exemplo de força e coragem, que com muito carinho e apoio, não mediu esforços para que eu chegasse até esta etapa de minha vida. Ao meu pai, Roberto (in memoriam) , meu herói, por toda dedicação e incentivo que ofereceu durante a minha caminhada. As minhas irmãs, Tiara e Thaynara, por sempre estarem presentes nas horas mais difíceis, me auxiliando e incentivando em toda a minha caminhada. Aos meus sobrinhos Raphael e Dominic, por fazer dos meus dias mais alegres, e ao meu avô João Cornélio ( in memoriam ) por sempre incentivar e acreditar no meu potencial. A Taíse, a pessoa que mais de perto acompanhou todas as dificuldades que advieram durante a realização desta pesquisa, me auxiliando com toda sua paciência e companheirismo. A Michele, pela constante prontidão na solução de dúvidas, por seu apoio, sua paciência, atenção e inspiração no amadurecimento dos meus conhecimentos durante o curso de Especialização em Direito Processual.

RESUMO

O presente artigo busca analisar a responsabilidade compartilhada do Estado na pratica/cometimento de determinados delitos criminosos por indivíduos marginalizados socialmente, ante o resultado da omissão estatal em promover a todos os indivíduos da sociedade as mesmas oportunidades sociais. Fazendo uma análise do princípio da co- culpabilidade, que tomou força no direito moderno, discorrendo sobre seu histórico, conceito, equiparando-o na Constituição Federal, fazendo uma análise dos princípios constitucionais, assim como na sua relação com o instituto neocunstitucionalismo, e apresentado possíveis formas de inseri-lo no Direito Brasileiro. Palavras-chave: Co-culpabilidade; Vulnerabilidade do agente; Corresponsabilidade; Omissão Estatal; Atenuação da Pena.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.........................................................................................................................

1 A

CULPABILIDADE ..........................................................................................................

CONCEITO ........................................................................................................................

1.2 ELEMENTOS DA CULPABILIDADE ............................................................................

1.2.1 A imputabilidade ........................................................................................................... 1.2.2 Potencial Consciência sobre a ilicitude do fato .......................................................... 1.2.3 Exigibilidade da Conduta Diversa ............................................................................... 2 O PRINCÍPIO DA CO-CULPABILIDADE ....................................................................... 2.1 O PRINCÍPIO DA CO-CULPABILIDADE E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL ............... 2.2 A CO-CULPABILIDADE NO DIREITO PENAL BRASILEIRO ................................... 3 POSSIBILIDADE DA (IN) APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA CO- CULPABILIDAE NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO ...................................... 3.1 DOSIMETRIA DA PENA ................................................................................................. 3.2 CO-CULPABILIDADE COMO ATENUANTE E COMO ATENUANTE GENERICA 3.3 CO-CULPABILIDADE COMO CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA ....................... 3.4 CO-CULPABILIDADE COMO CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL ................................... 3.5 CO-CULPABILIDADE COMO CAUSA DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDAE (RESPONSABILIDADE PENAL) .......................................................................................... CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................. REFERÊNCIAS......................................................................................................................

8 Consequentemente, o presente estudo é também relutante, tendo em vista que o condão de disseminar a ideia na visibilidade social. O desconhecimento deste tema e sua ausência nos meios acadêmicos, nos tribunais e nas sessões legislativas, levam a uma atrofia mental, dificultando a sua aplicação e por consequência aumentando, ainda mais a desigualdade e a exclusão social. Portanto, entende-se que o Estado não garantiu a todos os indivíduos a mesma oportunidade social. Deste modo, alguns indivíduos que não se dispuseram ou não nutriam condições de, com recursos próprios, socializarem, eis que a eles foram vedados os direitos básicos, tais como saúde e educação, torna-se necessário um tratamento diferenciado no tocante à aplicação da pena. Verifica-se, então, que o princípio da co-culpabilidade não atinge a todos os indivíduos indistintamente, mas somente aqueles socialmente vulneráveis, ou seja, aqueles que tiveram seus direitos mitigados em virtude da condição de vida a qual foram submetidos. Cumpre mencionar que, não trata-se de deixar de punir o indivíduos vulnerável, mas aplicar-lhe uma pena mais justa, diante da circunstâncias sociais em que viveu. Desta forma, tem-se como objetivo abordar o princípio da co-culpabilidade como atenuação do juízo de reprovabilidade do agente diante da prática criminosa em razão de fatores socioeconômicos, os quais influenciam de forma significativa sua atuação, de certo modo, uma maior complacência do Estado juiz para tal indivíduo, motivo pelo qual deverá ser reduzida a pena. O princípio da co-culpabilidade busca à concretização da dignidade humana, ante as discrepâncias sociais que assolam o cenário brasileiro, admitindo-se, então, a sua aplicação como forma compensatória dos déficits sociais que atingem grande maioria da sociedade. O princípio referido aparece como medida de justiça, no momento em que o Estado reconhece a sua parcela de culpa no cometimento do delito praticado por indivíduos marginalizados socialmente, compensando, então, negligencia no tocante aos deveres constitucionais de saúde, educação, vida digna, lazer, entre outros, no momento da aplicação da pena. Por conseguinte, será abordo o princípio da co-culpabilidade, explicando preliminarmente o seu conceito, interligando-se ao enfoque constitucional do tema em questão, para, enfim, chegar-se à demonstração das possibilidades de sua aplicação no Direito Penal Brasileiro.

9 1 A CULPABILIDADE Antes de falarmos a respeito do princípio da co-culpabilidade, é necessário falar o que é culpabilidade, seu conceito e seus elementos quais sejam imputabilidade, potencial consciência sobre a ilicitude do fato e exigibilidade da conduta diversa. 1.1 CONCEITO O conceito de culpabilidade no ponto de vista jurídico teve início com a representação grega de penalidade e se consubstancia na nacionalidade do sistema jurídico romano. Luiz Regis Prado (2008) assevera que a culpabilidade está ligada ao indivíduo capaz de responder pelas consequências decorrente de seus atos sendo determinado em razão de lei preestabelecida e que conta com a imposição de um terceiro, estranho ao sujeito. O delito analiticamente é uma ação ou omissão típica, ilícita e culpável, na visão de Prado (2008, p.365) “a culpabilidade é a reprovabilidade pessoal pela realização de uma ação ou omissão típica e ilícita. Assim, não há culpabilidade sem tipicidade e ilicitude, embora possa existir ação típica e ilícita inculpável.” Prado explica que a culpabilidade seria um juízo de reprovabilidade ou censura pessoal destinado ao agente delinquente por não ter ele agido de outro modo quando assim lhe foi exigido. De outro modo, a ilicitude seria um juízo de desvalor sobre o fato típico, Portanto, seria a culpabilidade, o fundamento e o limite da pena. Zaffaroni apresenta um conceito em que a culpabilidade é a reprovabilidade do injusto ao autor: Vejamos: [...] um injusto, isto é, uma conduta típica e antijurídica, é culpável quando reprovável ao autor a realização desta conduta porque não se motivou na norma, sendo-lhe exigível, nas circunstâncias em que agiu, que nela se motivasse. Ao não ser motivado na norma, quando podia e lhe era exigível que o fizesse, o autor mostra uma disposição interna contrária ao direito. (ZAFFARONI, 2011, p. 521) Juarez Cirino dos Santos (2008), aduz que esse juízo de reprovação tem como objetivo a realização injustificada de um tipo de injusto e possui como fundamento, a imputabilidade quais sejam as condições pessoais mínimas que capacitam o agente saber o que faz. Outrossim, tem por objetivo ainda, a consciência da antijuridicidade e a exigibilidade de conduta diversa. Cumpre destacar a existência de um sentido social da culpabilidade que, nos dizeres de Prado (2008, p.366) “a responsabilidade jurídica não tem nenhum sentido senão em relação à liberdade jurídica indissociável da noção de pessoa livre, única capaz de responder por suas ações, e que vincula reciprocamente os indivíduos.”

11 (...)^1 Já a terceira função é configurada a culpa, haverá a imposição de pena, se verificada a presença de um fato típico, ilícito e culpável será o papel do Estado impor uma sanção. 2.2 ELEMENTOS DA CULPABILIDADE Sendo a culpabilidade um limite à pretensão punitiva do Estado, existem alguns elementos a serem configurados para que esse esteja habilitado a aplicar uma sanção. O indivíduo delinquente alvo do Direito Penal deve ter capacidade de se motivar de acordo com as normas preexistentes. Caso o indivíduo não possua tal capacidade, a sanção perde o sentido, já que ameaça de uma pena não é capaz de motivar o agente a agir de acordo com as imposições do ordenamento. Assim, cumpre-se dizer que os inimputáveis não têm culpabilidade. Entretanto, não é apenas aos inimputáveis que se aplica a excludente de culpabilidade, existem outras condições psicológicas, pessoais e fáticas que podem fazer com que o agente delinquente não possua capacidade de agir de acordo com as normais legais. Segundo Fernando Capez (2013, p. 324), a culpabilidade é “a possibilidade de se considerar alguém culpado pela prática de uma infração penal.” Capez (2013, p. 324) assevera que: Verifica-se, em primeiro lugar, se o fato é típico ou não; em seguida, em caso afirmativo, a sua ilicitude; só a partir de então, constatada a prática de um delito (fato típico e ilícito), é que se passa ao exame da possibilidade de responsabilização do autor. Entende-se, então, que a análise da culpabilidade discorre em torno de três elementos, devendo ser identificado cada um deles no caso concreto. O elemento psicológico é a imputabilidade em razão do desenvolvimento intelectual do agente. As condições pessoais são as causas que não há potencial conhecimento da ilicitude. Já as condições fáticas, são aquelas em que a conduta diversa da criminosa não pode ser exigida do agente. Por conseguinte, para se ter a culpabilidade é necessário a capacidade de sentir-se motivado a violação de uma norma penal. A análise desse instituto que permite a identificação da reprovação pessoal do agente e não do resultado causado. 1.2.1 A imputabilidade (^1) Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm Acesso em 20 de maio de 2020

12 A imputabilidade de capacidade de culpabilidade, considera-se como imputável aquele que é capaz de ser reprovado, porque possui a capacidade de autodeterminação, ou seja, de entender suas ações e de se direcionar livremente sobre aquela conduta. Pode-se dizer que a imputabilidade é formada por dois elementos. O primeiro deles, é a capacidade de entender o caráter ilícito da norma, o segundo, é a capacidade de determinar- se de acordo com esse entendimento. Sanzo Brodt (1996, p. 45) aduz que: A imputabilidade é constituída por dois elementos: um intelectual (capacidade de entender o caráter ilícito do fato), outro volitivo (capacidade de determinar-se de acordo com esse entendimento). O primeiro é a capacidade (genérica) de compreender as proibições ou determinações jurídicas. Bettiol diz que o agente deve poder prever as repercussões que a própria ação poderá acarretar no mundo social, deve ter, pois, a percepção do significado ético-social do próprio agir. O segundo, a capacidade de dirigir a conduta de acordo com o entendimento ético jurídico. Conforme Bettiol, é preciso que o agente tenha condições de avaliar o valor do motivo que o impele à ação e, do outro lado, o valor inibitório da ameaça penal. Outrossim, é necessário fazer uma diferenciação entre capacidade penal e imputabilidade. A imputabilidade é verificada no momento em que se pratica a conduta, ou seja, no momento da ação ou da omissão. De outro lado, a capacidade penal, pode ser analisada a qualquer tempo, antes ou depois da pratica do delito. Assevera Rogerio Greco (2011, p. 385) que a imputabilidade “é a possibilidade de se atribuir, imputar o fato típico ao agente”. Baseando-se nessa afirmação, em princípio, todas as pessoas possuem capacidade penal, todavia nem todas poderão ser imputadas. Uma vez que, mesmo que sejam capazes, a análise deste elemento recai ao momento da prática do delito criminoso, se naquele momento o indivíduo estava ou não em estado de inimputabilidade. Nesse sentido, se no momento da prática do crime o sujeito não pode ser considerado imputável, não haverá culpabilidade. Contudo, se o agente possuía plena capacidade de autodeterminação, será considerado imputável e haverá culpabilidade. Verifica-se então que, se uma pessoa plenamente capaz por motivo qualquer se torna completamente incapaz e cometer a pratica de algum tipo penal, esta será considerada como inimputável no momento do ato delituoso e não poderá ser penalizada, pois lhe faltará culpabilidade. Em contrapartida, se, por exemplo, uma doença mental surgir durante a execução penal, o indivíduo que era capaz no ato da pratica do crime, deixará de o ser e, por conseguinte, não poderá continuar cumprindo pena.

14 Neste diapasão, percebe-se uma controvérsia que continua atual de que existe um número demasiado de leis imponto proibições e punições para essas práticas, sendo difícil se exigir o conhecimento todas as normas penais por parte do cidadão comum. Isso demonstra uma banalização do Direito Penal, que é a ultima ratio. Fernando Capez aduz que a potencial consciência da ilicitude, consiste no fato de o indivíduo ter a possibilidade de saber do caráter ilícito de sua ação ou omissão, no momento em que a praticou (CAPEZ, 2013). Chega-se à conclusão que o direito penal irá reprovar aquele que praticar o fato sabendo que este é ilícito e também quem o pratica sem o saber, quando for possível que se conheça a ilicitude. Um fato será censurado em razão do agente agir em condições de se inteirar da antijuridicidade de sua conduta, quando faltar tal conhecimento, fala-se em erro de proibição que será tratado mais tarde. 1.2.3 Exigibilidade da Conduta Diversa Quando constatada a prática de um delito, deve-se observar se era possível exigir do agente um comportamento diferente, ou seja, uma conduta que estivesse conforme o direito. Dessa forma, para a censura de uma conduta, é necessário mais do que a capacidade de agir conforme o direito e a possibilidade de conhecimento da norma incriminadora. Nesse sentido, é necessário também verificar se fatores externos não tiveram influência na motivação do agente, já que a punição só poderá aplicada quando for possível se exigir um comportamento conforme o direito. Nas palavras de Capez (2013, p. 354) a exigibilidade de conduta diversa, significa “que só podem ser punidas as condutas que poderiam ser evitadas.” A exigibilidade de conduta diversa determina que uma conduta só pode ser considerada reprovável se do agente pudesse se exigir qualquer outro tipo de atuação. Não se pode reprovar um comportamento se é impossível exigir daquela pessoa atitude diversa. E a própria lei estabelece, hoje, algumas hipóteses em que esta conduta diferente é inexigível, e, portanto, exclui-se a culpabilidade. Vejamos cada um dos constantes do artigo 22 do Código Penal: Art. 22 - Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem. Assim, requer-se uma certa normalidade das condições que que motivaram a vontade do autor que Frank (2000, p. 41) nomeou de “normal disposição das circunstâncias concomitantes”. Em caso de uma conduta que esteja fora da normalidade esperada e esta que

15 possa servir para influenciar na vontade do agente, não será mais possível se esperar um comportamento conforme o direito. Só será exigível um certo comportamento do agente quando nas situações concretas em que atuou era possível que se motivasse normalmente. Muñoz Conde (1988, p. 162) diz que: O cumprimento de preceitos normativos é um dever que se pode exigir, em tese, de todos os cidadãos. Os níveis de exigência desse cumprimento variam segundo o comportamento exigido, as circunstâncias em que ele se realize, os interesses em jogo etc. Em princípio, o ordenamento jurídico fixa uns níveis de exigência mínimos, que podem ser cumpridos por qualquer pessoa. Fala-se, nesses casos, de uma exigibilidade objetiva, normal ou geral. Além dessa exigibilidade normal, o ordenamento jurídico não pode impor o cumprimento de suas determinações. Segundo Fernando Capez (2010, p.331): “somente haverá exigibilidade de conduta diversa quando a coletividade podia esperar do sujeito que tivesse atuado de outra forma”. Ademais, para se impor ao autor uma pena o comportamento deve ser tido como reprovável. Dessa forma, é preciso que se possa exigir essa conduta diferente no contexto em que houve a prática dessa conduta. Perde-se a capacidade de exigir um comportamento diverso nos casos em que o agente está sofrendo uma coação moral irresistível ou atua em razão de obediência hierárquica. E, verificadas essas condições que não lhe permitiam agir de outra, o ato não poderá ser censurado, acarretando na falta de culpabilidade e sendo esse isento de pena. 2 O PRINCÍPIO DA CO-CULPABILIDADE

17 Ainda que tenha sido omisso em incontáveis obrigações, no primeiro delito dos indivíduos, o Estado está pronto para exigir-lhe o cumprimento das normas positivadas. O Estado sempre tem justificativas para o descumprimento de seus deveres sociais, entre as quais, a mais utilizada é a falta de verbas para grandes investimentos. Todavia, impõe-se à sociedade a rigorosa observância da lei, seja qual for a situação socioeconômica do indivíduo delinquente. Perante um cidadão com poucas, ou até mesmo nenhuma oportunidade, não se pode dizer que o mesmo teve escolha livre de seus atos. A igualdade social é a verdadeira garantia de liberdade de escolha de um cidadão, essa livre decisão de agir diante das circunstancias é denominada autodeterminação, que pode ser entendida como autonomia do ser humano eleger seus próprios caminhos. Zaffaroni e Pierangeli assevera que em uma sociedade, por mais organizada que seja, não haverá a possibilidade de brindar a todos os seres humanos com as mesmas oportunidades. Assim, há sujeitos que têm um menor âmbito de autodeterminação, condicionado por causas sociais. Deste modo, não será possível atribuir essas causas sociais ao sujeito e sobrecarregá-lo com elas no momento da reprovação de culpabilidade (ZAFFARONI e PIERANGELI, 2011). Foi a partir desses conceitos, e influenciado pelas ideias de Jean-Paul Marat (1780), que Eugênio Raul Zaffaroni (2011) desenvolveu a chamada “co-culpabilidade”, com a qual o Estado e a própria sociedade devem compartilhar a culpabilidade daqueles que se encontram marginalizados socialmente, os quais não possuem seus direitos fundamentais garantidos. Jean-Paul Marat (1780 apud MATTE, 2008) deixou importantes questionamentos sobre a sociedade desigual e a reprovabilidade da conduta daqueles desamparados pelo Estado: Numa terra em que tudo é possessão de outro e na qual não se pode apropriar-se de nada, resta apenas morrer de fome. Então, não conhecendo a sociedade, a não ser por suas desvantagens, estarão obrigados a respeitar a lei? Não, sem dúvida. Se a sociedade os abandona, voltam ao estado natural e quando reclamam à força direitos dos quais não podem prescindir senão para proporcionar-lhes melhorias, toda autoridade que se oponha é tirânica e o juiz que os condena à morte não é mais que um vil assassino. (MARAT, 1780 apud MATTE, 2008, p. 32). Desta forma, não é possível afirmar que um indivíduo privado de seus direitos basilares, vivendo em um setor social totalmente desprezado pelo Estado e convivendo diariamente com a miséria e a segregação, possui o mesmo nível de liberdade de ação

18 daqueles que se veem rodeados de privilégios e oportunidades, recebendo do Estado todo tipo de proteção e garantia de direitos. Diante da falta de oportunidades, a capacidade de decisão e a liberdade de ação são drasticamente reduzidas. Assim, uma vez que culpabilidade e a autodeterminação estão intimamente ligadas, quanto menos o poder de escolha do ser humano, menor a exigibilidade de conduta diversa e, consequentemente, mínimo é o grau de reprovabilidade. Para Aragão existe no direito atual inúmeras correntes doutrinárias no sentido de que o homem não possui tanta liberdade de escolha, mas que seria fortemente influenciado por fatores externos e internos que o levariam a agir. Por conseguinte, o valor da herança, da educação, do meio físico e social em que o agente cresce e vive, é elemento poderosamente responsável pela formação de seu caráter e temperamento, proporcionando-lhe ideias e sentimentos que certamente guiarão sua conduta no seio da sociedade (ARAGÃO, apud GRECO, 2005). Conclui-se então, que o indivíduo marginalizado socialmente não está totalmente livre para escolher seus caminhos e que o meio social influencia na prática de determinadas infrações penais. Nesse sentido, toma-se como base o dizer de Leonardo Boff (2004, p. 09): A cabeça pensa a partir de onde os pés pisam. Para compreender, é essencial conhecer o lugar social de quem olha. Vale dizer: como alguém vive, com quem convive, que experiências tem, em que trabalha, que desejos alimenta, como assume os dramas da vida e da morte e que esperanças o animam. Isso faz da compreensão sempre uma interpretação. Ao reconhecer que alguns indivíduos que cometem um ilícito, somente o praticam em decorrência da falta de oportunidades e que sua liberdade de escolha foi mitigada pelo Poder Público, o qual possuía a obrigação constitucional de garantir-lhe uma realidade diversa, porém foi omisso, não há como negar que o mesmo Estado que irá puni-lo carrega responsabilidade no crime praticado por esse cidadão marginalizado. Destarte, nessas circunstâncias, fala-se em culpabilidade compartilhada ou co-culpabilidade do Estado. 2.1 O PRINCÍPIO DA CO-CULPABILIDADE E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL O princípio da coculpabilidade é um princípio constitucional implícito o qual reconhece a corresponsabilidade do Estado no cometimento de alguns delitos, praticados por indivíduos que possuem menor âmbito de autodeterminação diante das circunstâncias do caso concreto, particularmente no que se refere às condições socioeconômicas do agente