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SEPARAÇÃO DOS PODERES E SISTEMA DE FREIOS E
CONTRAPESOS : DESENVOLVIMENTO NO ESTADO
BRASILEIRO
MAURÍLIO MALDONADO (∗)
- Evolução do conceito de Separação dos Poderes enquanto doutrina. 2. Evolução do conceito de Separação dos Poderes enquanto princípio constitucional no Direito Brasileiro. 3. Sistema de Freios e Contrapesos. 4. O Controle na Constituição Federal de 1988. 4.1. Controle do Poder Executivo exercido em relação ao Legislativo. 4.2. Controle do Poder Executivo exercido em relação ao Judiciário. 4.3. Controle do Poder Judiciário exercido em relação ao Legislativo. 4.4. Controle do Poder Judiciário exercido em relação ao Executivo. 4.5. Controle do Poder Legislativo exercido em relação ao Executivo. 4.6. Controle do Poder Legislativo exercido em relação ao Judiciário. Bibliografia.
1. EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE SEPARAÇÃO DOS
PODERES ENQUANTO DOUTRINA
Em primeiro lugar estaremos verificando a evolução do conceito de
Separação dos Poderes enquanto doutrina.
A história da separação dos poderes é a história da evolução da
limitação do poder político, objetivo fundamental da doutrina da separação dos
poderes.
Conforme acentua o jurista português NUNO PIÇARRA 1 , esta
doutrina remonta à Grécia e Roma antigas.
O autor lusitano identifica as origens da idéia da separação dos
poderes no conceito de constituição mista de ARISTÓTELES em sua obra
Política , segundo o qual:
“(...) constituição mista, para Aristóteles, será aquela em que os vários grupos ou classes sociais participam do exercício do poder político, ou aquela em que o exercício da soberania ou o governo, em vez de estar nas mãos de uma única parte constitutiva da sociedade, é comum a todas. Contrapõem-se-lhe, portanto, as constituições
(∗)O autor é Procurador da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, atual Diretor- Presidente do Instituto do Legislativo Paulista e mestrando em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie-SP. (^1) A separação dos poderes como doutrina e princípio constitucional – um contributo para o estudo
das suas origens e evolução , p. 31.
puras em que apenas um grupo ou classe social detém o poder político.” 2
Com efeito, é o caráter de síntese da constituição mista,
expressando a visão de ricos e pobres, que leva ARISTÓTELES a entendê-la
como a melhor constituição, vez que, misturando formas de governos (oligarquia e
democracia), poderia se chegar ao meio-termo, ideal de toda a ética aristotélica.
É neste ponto que, continua PIÇARRA, se insere o conceito
aristotélico de constituição média ou governo médio que é basicamente um meio
de assegurar ou manter, mas também fomentar por via institucional a classe
média numa sociedade:
“A constituição mista atende, antes de mais, às desigualdades e diversidades existentes na sociedade com o objectivo de as compor na orgânica constitucional, de tal maneira que nenhuma classe adquira a preponderância sobre a outra. Neste sentido, constituição mista não é mais do que um sistema “político-social pluralmente estruturado”.^3
Assim, PIÇARRA extrai do pensamento aristotélico a idéia de
equilíbrio ou balanceamento das classes sociai s que virá, segundo o irmão d’além
mar, a ser associada à doutrina da separação de poderes, numa fase já adiantada
de sua evolução, através da sua participação no exercício do poder político.
Sobre este aspecto, devemos dizer que a idéia de equilíbrio
(balança) nos induz a uma associação imediata à teoria de freios e contrapesos. É
o que faz, por exemplo, A. P. SOARES DE PINHO em estudo apresentado à
Congregação da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Estado do Rio
de Janeiro para habilitação à docência livre de Direito Constitucional – o qual
veremos em detalhes mais adiante – que identifica também nas formas de
governo de ARISTÓTELES a origem do sistema de freios e contrapesos. 4
Desde já, esclarecemos, todavia, que as idéias não são antagônicas
como veremos adiante, pelo contrário.
De outra parte, gostaríamos de registrar que a noção de separação
dos poderes se nos afigura anterior a ARISTÓTELES. Com efeito, notamos
vestígios da vetustez das idéias em apreço no próprio ARISTÓTELES, que, ao
comentar polêmica existente acerca do mérito da constituição de SÓLON, diz:
“Os que o consideram um bom legislador argumentam que ele: a) acabou com a oligarquia absoluta; b) pôs um ponto final na escravização do povo; c) estabeleceu a tradicional democracia ateniense combinando de modo correto a constituição. Explicam que
(^2) Ibid., p. 33. (^3) Ibid., p. 35. (^4) Freios e contrapesos do Governo na Constituição brasileira.
À vontade do soberano se confundia com a vontade do Estado, como
exemplifica a célebre frase atribuída a LUÍS XIV, l’Etat c’est moi. Esta
concentração de poderes levou à degeneração, às arbitrariedades e ao abuso do
poder. Adicionada à ascensão econômica da Burguesia, inicia-se o término da
Idade Moderna:
“Com efeito, observava-se em quase toda a Europa continental, sobretudo em França, a fadiga resultante do poder político excessivo da monarquia absoluta, que pesava sobre todas as camadas sociais interpostas entre o monarca e a massa de súditos. Arrolavam essas camadas em seus efetivos a burguesia comercial e industrial ascendente, a par da nobreza, que por seu turno se repartia entre nobres submissos ao trono e escassa minoria de fidalgos inconformados com a rigidez e os abusos do sistema político vigente, já inclinado ao exercício de práticas semidespóticas. (...) Todos os pressupostos estavam formados pois na ordem social, política e econômica a fim de mudar o eixo do Estado moderno, da concepção doravante retrógrada de um rei que se confundia com o Estado no exercício do poder absoluto, para a postulação de um ordenamento político impessoal, concebido segundo as doutrinas de limitação do poder, mediante as formas liberais de contenção da autoridade e as garantias jurídicas da iniciativa econômica .” 11
Este é o caldo de cultura para o desenvolvimento sistematizado da
doutrina da separação dos poderes como técnica de limitação do poder levado a
cabo por LOCKE e MONTESQUIEU.
Efetivamente a doutrina da separação dos poderes encontrará em
Locke e Montesquieu seus grandes sistematizadores; o inglês, pioneiro, através
do Segundo tratado sobre o governo civil e o francês no célebre “ Do Espírito das
Leis”.
LOCKE, considerado o fundador do empirismo – doutrina segundo a
qual todo o conhecimento deriva da experiência – vai desenvolver na obra acima,
o que NORBERTO BOBBIO considera a primeira e mais completa formulação do
Estado Liberal, que constitui, ainda, a justificação ex post facto da Revolução
Gloriosa na Inglaterra, onde LOCKE fundamenta a legitimidade da deposição de
JAIME II – ao qual LOCKE se opunha, refugiado na Holanda – por GUILHERME
DE ORANGE (chefe de Estado da Holanda) e pelo parlamento com base na
doutrina da resistência.
12
É nesta obra que LOCKE restabelece a conexão entre a doutrina da
separação dos poderes e a rule of law , concebendo-a como pré-requisito desta
última: para que a lei seja imparcialmente aplicada é necessário que não sejam os
(^11) Paulo Bonavides, ciência política , p.134-136. (^12) Leonel Itaussu Almeida Mello, p.82-83.
mesmos homens que a fazem, a aplicá-la
13
. Sendo, em decorrência disso,
necessária a separação entre legislativo e executivo.
Como bem salienta PAULA BAJER FERNANDES MARTINS DA
COSTA 14 , o poder supremo para Locke é o legislativo , os demais poderes dele
derivam e a ele estão subordinados. Compete ao poder executivo , cuja existência
é perene, a aplicação das leis. LOCKE ainda concebe um terceiro poder, que
apesar de distinto, não pode ser separado do executivo, ao qual denomina de
federativo , ao qual incumbe o relacionamento com os estrangeiros, a
administração da comunidade com outras comunidades, compreendendo
formação de alianças e decisões sobre a guerra e a paz.
Nesse passo, ressaltamos que, a despeito de LOCKE não
contemplar expressamente, em sua tripartição dos poderes da sociedade
(Legislativo, Executivo e Federativo), o Poder Judiciário, e, ainda, de referir-se a
este como atividade meio do poder legislativo, vislumbramos em seus escritos
uma vital importância do poder judiciário em sua sistematização das funções de
Estado. Vejamos:
“E por essa maneira a comunidade consegue , por meio de um poder julgador , estabelecer que castigo cabe às várias transgressões quando cometidas entre os membros dessa sociedade
- que é o poder de fazer leis –, bem como possui o poder de castigar qualquer dano praticado contra qualquer dos membros por alguém que não pertence a ela – que é o poder de guerra e de paz –, e tudo isso para preservação da propriedade de todos os membros dessa sociedade, tanto quanto possível. [...] E aqui deparamos com a origem dos poderes legislativo e executivo da sociedade , que deve julgar por meio de leis estabelecidas até que ponto se devem castigar as ofensas quando cometidas dentro dos limites da comunidade, bem como determinar , mediante julgamentos ocasionais baseados nas circunstâncias atuais do fato, até onde as agressões externas devem ser retaliadas; e em um outro caso utilizar toda a força de todos os membros, quando houver necessidade.[...]”. 15
É, contudo, MONTESQUIEU, o responsável pela inclusão expressa
do poder de julgar dentre os poderes fundamentais do Estado, e, à esteira do que
já havia sido preconizado por LOCKE, também aproxima sua formulação da
concepção de rule of law. E, com a clareza d’água, revela ao mundo os contornos
da acepção mais difundida da separação dos poderes:
(^13) W. B. Gwyn, the meaning of the separation of powers, New Orleans, 1965, apud Nuno Piçarra, A
separação dos poderes como doutrina e princípio constitucional – um contributo para o estudo das suas origens e evolução , p.71. (^14) Sobre a importância do Poder Judiciário na configuração do sistema de separação de poderes
instaurado no Brasil após a Constituição de 1988, in Revista de Direito Constitucional e Internacional, p.241-258. (^15) John Locke, two treatises of civil government, London : Every-man’s Library, 1966, p.117-241,
tradução de Cid Knipell Moreira, apud clássicos da política , p. 90
Lordes e dos Comuns. Nesse sentido, vale a pena a leitura de emblemática
passagem do artigo federalista nº 51:
“Mas a desgraça é que, como nos governos republicanos o Poder Legislativo há de necessariamente predomina r, não é possível dar a cada um dos outros meios suficientes para a sua própria defesa. O único recurso consiste em dividir a legislatura em muitas frações e em desligá-las umas das outras, já pela diferente maneira de elegê- las , já pela diversidade dos seus princípios de ação, tanto quanto o permite a natureza das suas funções comuns e a dependência comum em que elas se acham da sociedade. Mas este mesmo meio ainda não basta para evitar todo o perigo das usurpações. Se o excesso da influência do corpo legislativo exige que ele seja assim dividido, a fraqueza do Poder Executivo, pela sua parte, pede que seja fortificado. O veto absoluto é , à primeira vista, a arma mais natural que pode dar-se ao Poder Executivo para que se defenda : mas o uso que ele pode fazer dela pode ser perigoso e mesmo insuficiente.^20 (...) Para manter a separação dos poderes, que todos assentam ser essencial à manutenção da liberdade, é de toda necessidade que cada um deles tenha uma vontade própria; e, por conseqüência, que seja organizado de tal modo que aqueles que o exercitam tenham a menor influência possível na nomeação dos depositários dos outros poderes .”^21
Nesse passo, cumpre destacar, a grande responsabilidade dos
Estados Unidos por situar o Poder Judiciário no mesmo nível político dos outros
dois ramos do governo
22
, configurando sua moderna função no mundo. Foi
através da célebre decisão de JOHN MARSHALL, Chief-Justice da Suprema Corte
norte-americana, no caso MARBURY versus MADISON (1803), que inaugurou o
poder da judicial review (revisão judicial), segundo o qual compete ao Poder
Judiciário dizer o que é lei
23
, considerada lei aquele ato legislativo em
conformidade com a Constituição, ato legislativo contrário à Constituição não é
lei^24.
Afirmou-se, assim, o poder daquela corte para a declaração de
inconstitucionalidade de um ato legislativo, principiando o sistema de controle da
constitucionalidade (difuso).
Esta decisão é tão crucial para a caracterização das atribuições do
Poder Judiciário e para o reconhecimento de sua vital importância no concerto das
(^20) O federalista, op. cit., p.131, nota 18. (^21) Ibid., p.130. (^22) Paulo Fernando Silveira, freios e contrapesos (checks and balances) , p.94. (^23) Ibid., p.90. (^24) Leonard Baker, John Marshall - A life in law , Easton Press, 1990, v.2, p.407, apud Paulo
Fernando Silveira, op. cit., p. 91, nota 22..
funções do Estado que atribui-se a ela a responsabilidade pela fundação da
doutrina americana da supremacia judicial.
25
Interessante notar, ainda, a importância do papel dos Founding
Fathers , norte-americanos, no sentido de viabilizar a convolação de uma doutrina
em princípio constitucional, de modo que, em 1787, os Estados Unidos da
América positivaram em sua Constituição a divisão funcional dos poderes,
conferindo, através de sua lei fundamental, o papel de cada um dos poderes –
legislativo (art. 1º), executivo (art. 2º) e judiciário (art. 3º) – na conformação das
funções político-constitucionais básicas.
Da mesma forma que a divisão de MONTESQUIEU, conforme ensina
Alexandre de Moraes , tornando-se princípio fundamental da organização política
liberal, é transformada em dogma pelo art. 16 da Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão, de 1789 26 :
“Toda sociedade na qual a garantia dos direitos não está assegurada, nem a separação de poderes estabelecida não tem constituição .” (destacamos)
Assim é que a formulação da doutrina da separação dos poderes,
como técnica para a limitação do poder, é posta em prática nas Revoluções
Liberais Burguesas dos séculos XVII e XVIII – Revolução Gloriosa, Inglaterra
1688/89, Independência Norte-Americana, 1776, e Revolução Francesa, 1789 –
em resposta aos abusos e iniqüidades resultantes, entre outros fatores, da
concentração de poderes nas mãos do soberano, típica do Absolutismo da Idade
Moderna. Vale lembrar que essa era marca o início do Estado de Direito.
2. EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE SEPARAÇÃO DOS
PODERES ENQUANTO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL NO
DIREITO BRASILEIRO
Para demonstração da evolução do conceito de separação dos
poderes, enquanto princípio constitucional no Brasil, reproduziremos os textos
relativos, acrescidos de comentários. No tocante ao período de 1824 a 1946, ou
seja, da Carta Imperial de 1824 à Constituição de 1946, resgatamos já citado
estudo do Professor Doutor A. P. SOARES DE PINHO
27
, enriquecido de uma
análise da Constituição de 1937, da lavra do Professor Doutor PAULO
BONAVIDES em co-autoria com PAES DE ANDRADE, lançada na obra História
Constitucional do Brasil.
“CONSTITUIÇÃO POLITICA DO IMPERIO DO BRAZIL DE 1824
(^25) Vide C. Herman Pritchett, a supremacia judicial de Marshal a Burger, in ensaios sobre a
Constituição dos Estados Unidos, editado por M. Judd Harmon, Rio de Janeiro : Forense Universitária, [s.a.p.], p.145-162. (^26) Direito constitucional , p.354. (^27) Freios e contrapesos do Governo na Constituição brasileira.
confiada a chefia do Poder Executivo (arts. 102 e seguintes), desequilibrando
completamente a relação entre os poderes com uma nítida prevalência do Poder
Executivo exercido pelo Monarca.
De acordo, A. P. SOARES DE PINHO^30 , o Poder Moderador,
teorizado por Benjamin Constant, “seria destinado a estabelecer o equilíbrio entre
os demais poderes e exercido pelo Imperador”, ou, ainda, “seria a chave de toda
organização política, ou melhor, o fecho da abóbada, a cúpula do governo”.
Neste passo, o autor também oferece seu contributo à compreensão
da doutrina da separação dos poderes, demonstrando a presença, na Carta de
1824, da idéia de interpenetração, equilíbrio e harmonia dos poderes e sua
importância como técnica de limitação do poder em benefício da liberdade
individual. Vejamos:
“O que pretendemos deixar assinalado é que a divisão de poderes nunca se dissociou da idéia da sua interpenetração , do seu equilíbrio , da sua harmonia, não podendo ser tida como absoluta e desintegradora. E teve sempre em vista, no consenso unânime dos que a adotaram, a limitação do poder em benefício da liberdade individual. Nem seria lícito imaginar-se que o Estado, destinado a servir ao homem, e sua criação, fosse organizado e funcionasse de tal modo que o absorvesse e o oprimisse, como ocorre nos regimes absolutistas e totalitários. (...) A divisão da Assembléia Geral, órgão do Poder Legislativo, em duas Câmaras, como ainda hoje ocorre, já inclui nesse ramo um dos processos de interpenetração , exercendo a ação frenadora através da qual se visa a alcançar o desejado equilíbrio .”^31
A primeira Constituição da República, a “Constituição da República
dos Estados Unidos do Brazil”, consagrou a tradicional tripartição dos poderes,
repudiando a monarquia, adotando o presidencialismo norte-americano como
solução para a titularidade do Poder Executivo. Esta não foi a única contribuição
do modelo norte-americano.
A Constituição dos Estados Unidos da América, indiscutivelmente,
representou o mais importante referencial dos constituintes brasileiros. Princípios
estruturantes, como a forma federal da organização de nosso Estado, com a
conseqüente repartição espacial de competências, foram adotados sob a
influência ditada, principalmente, por Rui Barbosa. E quanto à separação dos
poderes, assim dispunha:
“ Art. 15. São orgãos da soberania nacional o Poder Legislativo, o Executivo e o Judiciario, harmonicos e independentes entre si .” 32
(^30) Op. cit., p.27, nota 27. (^31) Ibid., p.27-28. (^32) Op. cit., p. 753, nota 28.
O Professor SOARES DE PINHO, bem salienta:
“(...) além da conservação do princípio da divisão de poderes, surge, também, o da distribuição de competências entre a União e os Estados-membros, de onde decorrem novas limitações e novos freios e contrapesos. 33 (...) A vigência da primeira Constituição republicana enseja o funcionamento do mecanismo do equilíbrio dos poderes, com a atuação recíproca de cada um sobre os demais, na contenção de excessos, mecanismo que vai atuar, igualmente, no campo peculiar do legislativo, na interação exercida pelas duas casas do Congresso Nacional e, ainda, nos três níveis em que se desdobra a federação – União, Estados-membros, municípios .”^34
A efêmera Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil
de 1934 segue a tradição inaugurada pela primeira Carta da República, e elenca
três órgãos da soberania nacional:
“Art. 3º São orgãos da soberania nacional, dentro dos limites constitucionaes, os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, independentes e coordenados entre si.”^35
Grandes novidades são introduzidas no Poder Legislativo.
O Senado Federal é incumbido do papel de “coordenação dos
poderes”, ao qual cumpria, nos termos do art. 88, Capítulo V, da Carta, manter a
continuidade administrativa e velar pela Constituição. Note-se que o Senado
Federal passa a ser tratado fora do capítulo reservado ao Poder Legislativo
(Capítulo II), passando a ser um mero colaborador do Poder Legislativo, a teor do
disposto no próprio art. 22 da Carta. Vejamos:
“CAPÍTULO II
Do Poder Legislativo (...) Art. 22 - O Poder Legislativo é exercido pela Câmara dos Deputados com a colaboração do Senado Federal .”^36
(^33) O Professor Canotilho dá o nome de repartição vertical à separação e interdependência dos
órgão de soberania que visa a delimitação das competências e as relações de controlo segundo critérios fundamentalmente territoriais (competência do Estado central, competência das regiões, competência dos órgãos locais), a repartição horizontal refere-se à diferenciação funcional (legislação, execução, jurisdição), à delimitação institucional de competências e às relações de controlo e interdependência recíproca entre os vários órgãos de soberania. ( Direito constitucional e teoria da Constituição , p.513), (^34) Op. cit., p. 30, nota 27. (^35) Constituições do Brasil , p.683. (^36) Ibid., p.691.
“Art. 96 - Só por maioria absoluta de votos da totalidade dos seus Juízes poderão os Tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou de ato do Presidente da República. Parágrafo único - No caso de ser declarada a inconstitucionalidade de uma lei que, a juízo do Presidente da República, seja necessária ao bem-estar do povo, à promoção ou defesa de interesse nacional de alta monta, poderá o Presidente da República submetê-la novamente ao exame do Parlamento: se este a confirmar por dois terços de votos em cada uma das Câmaras, ficará sem efeito a decisão do Tribunal .” (destaques nossos)
Outra inovação da chamada “polaca”
43
, de nítida inspiração do
coorporativismo fascista e português 44 , é a “substituição” do Senado Federal por
um Conselho Federal, composto de representantes dos Estados e por dez
membros nomeados pelo Presidente da República, e, ainda a criação de um
Conselho da Economia Nacional para colaborar com o Poder Legislativo,
composto por representantes dos vários ramos da produção nacional, obreiros e
patronais 45 (artigos 38, 46, 50, 57 e 61).
Nesse passo, registramos as procedentes críticas de PAULO
BONAVIDES e PAES DE ANDRADE:
“A competência dos três Poderes na Constituição de 1937, era meramente formal. Os artigos 38 e 49 que tratavam do Poder Legislativo esboroavam-se com o conjunto do texto e, mesmo, com a coexistência de um Conselho Federal criado pelos artigos 50 e 56, usurpando faculdades legislativas com dez dos seus membros escolhidos pelo Presidente da República e os restantes pelas Assembléias Legislativas dos Estados. Era o Senado sem voto popular, constituído já à época, dos senadores biônicos que recebiam a designação de “conselheiros”. Quanto ao Judiciário, o arbítrio do Poder Executivo ultrapassava até mesmo o texto da Carta constitucional. Esta, todavia deixava a brecha para esses abusos, quando em seu artigo 91, ressaltava as
(^43) Denominação pejorativa de “polaca” à Constituição de 1937, transmitia o conhecimento de
conteúdo e de ideologia do texto, aurido na Carta polonesa, de origem totalitária e fascista, e construída por Pilsudski (Paulo Bonavides e Paes de Andrade, história constitucional do Brasil , p. 345). (^44) Em nossa história, como a primeira Constituição que não saiu da representação popular, a Carta
de 10 de novembro de 1937 não se contentou com os movimentos direitistas da Alemanha e da Itália, vindo buscar no corporativismo português, até à denominação de “Estado Novo”, para tentar definir o regime (op. cit., p. 340, nota 43). (^45) Ao Conselho da Economia Nacional competia o exercício de importantes funções normativas,
participando, inclusive do próprio processo legislativo. Com efeito dispunha o artigo 61 da Constituição: “ b) estabelecer normas relativas à assistência prestada pelas associações, sindicatos ou institutos; c) editar normas reguladoras dos contratos coletivos de trabalho entre os sindicatos da mesma categoria da produção ou entre associações representativas de duas ou mais categorias; d) emitir parecer sobre todos os projetos, de iniciativa do Governo ou de qualquer das Câmaras, que interessem diretamente à produção nacional; (grifo nosso) (Adriano Campanhole e Hilton Lobo Campanhole, Constituições do Brasil , p. 608).
restrições à vitaliciedade, à inamovibilidade, à irredutibilidade dos vencimentos dos magistrados. A competência dos três Poderes ficou limitada ao centralismo do Executivo e condicionada aos interesses do chefe supremo da administração – o Presidente da República.”^46
Após o término da ditadura VARGAS, o país se reconcilia com a
democracia e em 1946 promulga sua nova Constituição. E dentre outros
importantes avanços, o Brasil reata-se com a melhor tradição consagradora do
princípio da separação dos poderes:
“CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL DE 1946
Art. 36. São Podêres da União o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, independentes e harmônicos entre si. § 1º O cidadão investido na função de um dêles não poderá exercer a de outro, salvo as exceções previstas nesta Constituição. § 2º É vedado a qualquer dos Podêres delegar atribuições.”^47
É o constituinte de 1946 que inaugura a técnica de redação utilizada
nas constituições posteriores para enunciar o princípio, substituindo a idéia de
coordenação entre os poderes, presente na Carta de 1934, por harmonia,
conforme, aliás, constava das constituições anteriores. Assim descreve o período
o Professor SOARES DE PINHO:
“(...) a adoção do sistema bicameral, seguindo a tradição do nosso direito público, permite às duas casas competentes do Congresso Nacional exercer recíproca ação frenadora, evitando excessos ou precipitações na elaboração legislativa. O mesmo ocorre em se tratando da atividade dos três poderes, cujos abusos e extralimitações encontram os indispensáveis freios e contrapesos à disposição de cada qual e dos membros da comunidade nacional .”^48
Destaque-se da técnica empregada na afirmação do princípio pelo
legislador constituinte de 46, a expressa vedação do exercício concomitante de
funções distintas pelo mesmo cidadão (§ 1º, art. 36).
A Constituição do último período autoritário, formalmente, não inovou
com relação à Constituição democrática de 1946 no que se refere ao princípio da
separação dos poderes.
Registre-se, tão somente, a introdução, através do artigo 58 da
Constituição de 1967 (art. 55 da Emenda nº 01/69), do famigerado instituto do
decreto-lei, que na prática, em virtude, principalmente, da previsão de sua
aprovação por decurso de prazo, em face da omissão do Congresso Nacional,
conferia competência legislativa plena ao chefe do Poder Executivo.
(^46) História Constitucional do Brasil , p.345. (^47) Constituições do Brasil , p. 482 (^48) Freios e Contrapesos do Governo na Constituição Brasileira , p.41.
Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.”^51
A despeito, entretanto, da excessiva participação do Poder Executivo
no processo legislativo, inclusive com a possibilidade da edição de medidas
provisórias pelo Presidente da República, com força de lei, 52 e também da
concentração exagerada de matérias reservadas ao legislador federal, por força
da repartição vertical (entre União, Estados e Municípios) de competências,
adotadas pelo constituinte de 88, a limitação do poder no Brasil experimentou uma
importante evolução, em especial com o reforço do papel do Poder Judiciário e do
Ministério Público na tutela dos interesses coletivos e difusos, da tarefa de defesa
da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis (art. 127, C.F.).
Assim, o princípio da separação dos poderes sai fortalecido do último
processo constituinte popular de 1988, considerando, como dissemos, a adoção
de importantes sistemas de controle jurídico do poder, que, conforme adverte
Nuno Piçarra, passam a constituir o núcleo essencial, o centro de gravidade do
princípio da separação dos poderes no Direito Contemporâneo
53
. É o que veremos
ao final de nosso trabalho. Antes, contudo, aprofundaremos o estudo no que toca
ao Sistema de Freios e Contrapesos.
3. SISTEMA DE FREIOS E CONTRAPESOS ( CHECKS
AND BALANCES )
Como dissemos, de início, A. P. SOARES DE PINHO identifica nas
formas de governo de Aristóteles a origem do sistema de freios e contrapesos.
54
JOHN H. GARVEY e T. ALEXANDER ALEINTKOFF^55 ensinam que o
balance (contrapesos, equilíbrio) surge na Inglaterra, a partir da ação da Câmara
dos Lordes (nobreza e clero) equilibrando (balanceando) os projetos de leis
oriundos da Câmara dos Comuns (originados do povo), a fim de evitar que leis
demagogas, ou formuladas pelo impulso momentâneo de pressões populares,
fossem aprovadas. Na verdade, o objetivo implícito era conter o povo,
principalmente contra as ameaças aos privilégios da nobreza.
(^51) Constituições do Brasil , p.15. (^52) “Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas
provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional, que, estando em recesso, será convocado extraordinariamente para se reunir no prazo de cinco dias. Parágrafo único. As medidas provisórias perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de trinta dias, a partir de sua publicação, devendo o Congresso Nacional disciplinar as relações jurídicas delas decorrentes.” (^53) Constituições do Brasil , p. 258-259. (^54) Freios e contrapesos do Governo na Constituição Brasileira , p.45. (^55) Modern constitutional theory : a reader, St. Paul : West Publishing, 1991, p.238, a pud Paulo
Fernando Silveira, freios e contrapesos (checks and balances) , p.99.
MONTESQUIEU é explícito ao justificar a necessidade do
bicameralismo, Câmaras Alta e Baixa – lembrando nesse passo que o famoso
livro Décimo Primeiro do Espírito das Leis, onde se encontra a formulação da
tripartição dos poderes do autor, é dedicado à análise da “Constituição” da
Inglaterra:
“Existem sempre num Estado pessoas eminentes pelo nascimento, pelas riquezas ou pelas honras. Se elas ficassem confundidas entre o Povo, e não tivessem senão um voto como os outros, a liberdade comum seria a sua escravidão, e elas não teriam interesse em defender a liberdade, porquanto a maioria seria contra elas. A participação dessas pessoas na Legislação deve pois estar proporcionada às demais vantagens que têm no Estado. Ora, isto se dará se elas formarem um corpo com direito de frear as iniciativas do Povo, assim como o Povo terá o direito de frear as delas.”^56
Identifica-se também na evolução do modelo político inglês, duas
outras importantes ferramentas iniciais do sistema de freios e contrapesos. O veto
e o impeachment. O primeiro, inicialmente concebido, no modelo do King in
Parliament , enquanto ato do Rei em cooperação e aperfeiçoamento do processo
legislativo, passa a exprimir a negative voice , expressando, tão somente, a
oposição do Rei que não mais participa do processo legislativo, apenas o
controla , podendo impedir que a legislação entre em vigor através do veto. O
impeachment , por sua vez, é mecanismo jurídico que permite o controle do
parlamento sobre os atos executivos dos Ministros do Rei. O Parlamento não
executa, mas controla o exercício da função executiva.
57
O “check”, segundo o juiz mineiro PAULO FERNANDO SILVEIRA,
surgiu 58 quando o Justice MARSHAL declarou sua “opinion”, lançada no famoso
caso Marbury x Madison, em 1803 – conforme acima abordamos –, que o Poder
Judiciário tinha a missão constitucional de declarar a inconstitucionalidade – e,
portanto tornar nulos – dos atos do Congresso, quando, a seu exclusivo juízo, tais
lei não guardassem harmonia com a Carta Política. Pela doutrina do Judicial
Review, o Judiciário passa a controlar o abuso do poder dos outros ramos 59.
Assim, do empirismo britânico, da racionalização de MONTESQUIEU
e do pragmatismo norte-americano, exsurge o que, como já dissemos, será o
principal elemento caracterizador do princípio da separação dos poderes no
Direito Contemporâneo, o sistema de freios e contrapesos ( checks and balances).
(^56) Do espírito das leis , p.173. (^57) Sobre o assunto, vide Nuno Piçarra, A separação dos poderes como doutrina e princípio
constitucional – um contributo para o estudo das suas origens e evolução , p.59-62 e 79-83. (^58) Nuno Piçarra ensina que a doutrina dos checks and balances surge, por completo, na Inglaterra
(op. cit., p.83, nota 57). Vide ainda nota de rodapé 9. (^59) Freios e contrapesos (checks and balances) , p.99. Sobre Marbury v. Madison vide também p.
85-94.
exequibilidade de ato do Poder interferido, aquiescendo ou não, no todo ou em parte, conforme o caso, com aquele ato, submetendo-o a um crivo de legitimidade e de legalidade. 3 – Controle de fiscalização: O controle de fiscalização é o que se exerce pelo desempenho de funções de vigilância, exame e sindicância dos atos de um Poder por outro. Pela fiscalização, o Poder interferente, o que desenvolve essa função atípica, tem a atribuição constitucional de acompanhar e de formar conhecimento da prática funcional do Poder interferido, com a finalidade de verificar a ocorrência de ilegalidade ou ilegitimidade em sua atuação. 4 – Controle de correção: O controle de correção é o que se exerce pelo desempenho de funções atribuídas a um Poder de sustar ou desfazer atos praticados por um outro. Pela correção, realiza-se a mais drástica das modalidades de controle, cometendo-se ao Poder interferente a competência constitucional de suspender a execução, ou de desfazer, atos do Poder interferido que venham a ser considerados viciados de legalidade ou de legitimidade.”
Passemos aos exemplos constitucionais pátrios destes controles.
4.1. Controle do Poder Executivo exercido em relação ao
Legislativo - A previsão constitucional da possibilidade do VETO do Poder
Executivo à elaboração legislativa é exemplo mais difundido de forma de controle
da atividade típica do Poder Legislativo por parte Executivo. No ordenamento
pátrio temos:
“Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. § 1.º Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto. (...) Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) III - iniciar o processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Constituição; IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução; V - vetar projetos de lei, total ou parcialmente; (...) XV - nomear, observado o disposto no art. 73, os Ministros do Tribunal de Contas da União;” (destaques nossos)
O veto, como já vimos, constituiu marco histórico na conformação
do sistema de freios e contrapesos.
O veto foi concebido como instrumento de cooperação entre
Legislativo e Executivo (no modelo King in Parliament ), como, inclusive, defende
que ainda o seja, atualmente, DIOGO DE FIGUEIREDO MOREIRA NETO
62
Ousando discordar do autor da classificação utilizada, e
considerando que o veto, pelo menos, momentaneamente, impede que a lei entre
em vigor, classificaríamo-lo como forma de controle mais rigorosa, talvez uma
situação sui generis , um controle de correção não necessariamente terminativo,
ou, pelo menos, como controle de fiscalização, vez que, indiscutivelmente,
constitui modalidade de controle preventivo de constitucionalidade de norma.
Parecem-nos mais próximas da idéia do controle de cooperação as
previsões constantes dos incisos III e IV acima transcrito, ou seja, a iniciativa
facultativa de legislação – registre-se, absurdamente ampla, ao nosso ver –, bem
como sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, e expedir decretos e
regulamentos para execução da lei.
DIOGO DE FIGUEIREDO MOREIRA NETO ainda aponta como
controle de cooperação a competência do Presidente da República de nomear um
terço dos membros do Tribunal de Contas da União (inciso XV do art. 84).
4.2. Controle do Poder Executivo exercido em relação ao
Judiciário - Em primeiro lugar, aproveitando as observações acima, referimo-nos
à possibilidade do veto (art. 84, V) do chefe do Poder Executivo a propostas
legislativas de iniciativa do Poder Judiciário. Assim como, valendo também para o
Poder Legislativo, é bom lembrar que a possibilidade do veto alcança a lei
orçamentária, encontrando limite, todavia, ao nosso ver, na autonomia
administrativa e financeira garantida pela Constituição no art. 99.
Vislumbramos mecanismo de controle, talvez controle de
fiscalização , na possibilidade prevista no § 4º do art. 103 da Constituição, de ser
proposta pelo Presidente da República perante o Supremo Tribunal Federal, ação
declaratória de constitucionalidade diante da existência de controvérsia judicial
relevante sobre a aplicação de norma, nos termos do art. 14, III, da Lei nº
9.868/99, especialmente em face do efeito vinculante da declaração de
constitucionalidade, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário,
conforme previsto no § 2º do art. 102 da C.F.
Parece-nos, também, que a faculdade atribuída ao Presidente da
República no art. 84, XII, da CF, para a concessão de indulto e comutação de
penas, pode ser utilizada como forma de controle de correção da atividade
jurisdicional, quando não motivada a decisão, apenas pelo juízo de conveniência e
oportunidade, mas inspirado, o Chefe do Executivo, pelo caráter controvertido,
juridicamente, da sentença condenatória judicial.
(^62) Op. cit., p.14-15, nota 51.