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Presunção de culpa e imputação de responsabilidade ao advogado: elementos e limites, Notas de aula de Direito

Este documento discute a responsabilidade civil do advogado, enfatizando a importância da presunção de culpa e a imputação direta de responsabilidade ao advogado. O texto aborda as regras básicas da responsabilidade civil subjetiva e objetiva, as exceções aplicáveis aos profissionais liberais, e os elementos constitutivos da responsabilidade civil. Além disso, o documento discute as graus de culpa na responsabilidade civil e as hipóteses de exclusão de responsabilidade.

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Gisele
Gisele 🇧🇷

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Brasília a. 37 n. 146 abr./jun. 2000 175
1. Normas de regência
O advogado responde civilmente pelos
danos que causar ao cliente1. A responsa-
bilidade é a contrapartida da liberdade e
da independência do advogado. O advoga-
do tem obrigação de prudência (obligation
de prudence). Incorre em responsabilidade
civil o advogado que, imprudentemente,
não segue as recomendações do seu cliente
nem lhe pede instruções para as seguir. Na
hipótese de consulta jurídica, o conselho
insuficiente deve ser equiparado à au-
sência de conselho, sendo também impu-
tável ao advogado a responsabilidade
civil2. O parecer não é apenas uma opinião,
mas uma direção técnica a ser seguida, e
quando é visivelmente colidente com a
legislação, a doutrina ou a jurisprudência,
acarreta danos ao cliente que o acompanha.
Questão ainda não respondida, inteiramen-
te, diz respeito à natureza e ao alcance
dessa responsabilidade.
Responsabilidade civil do advogado
Paulo Luiz Netto Lôbo
Paulo Luiz Netto Lôbo é Doutor em Direito,
Professor da UFAL e da UFPE.
Sumário
1. Normas de regência. 2. Elementos consti-
tutivos da responsabilidade civil. 3. O advogado
como fornecedor de serviços na relação de
consumo. 4. Presunção da culpa e imputação
de responsabilidade ao advogado. 5. Inversão
do ônus da prova e as hipóteses de exclusão da
culpa do profissional. 6. Responsabilidade
objetiva por vício do serviço advogado. 7.
Superação da distinção entre obrigação de meios
e obrigação de resultado.
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Brasília a. 37 n. 146 abr./jun. 2000 175

1. Normas de regência

O advogado responde civilmente pelos danos que causar ao cliente^1. A responsa- bilidade é a contrapartida da liberdade e da independência do advogado. O advoga- do tem obrigação de prudência ( obligation de prudence ). Incorre em responsabilidade civil o advogado que, imprudentemente, não segue as recomendações do seu cliente nem lhe pede instruções para as seguir. Na hipótese de consulta jurídica, o conselho insuficiente deve ser equiparado à au - sência de conselho, sendo também impu- tável ao advogado a responsabilidade civil^2. O parecer não é apenas uma opinião, mas uma direção técnica a ser seguida, e quando é visivelmente colidente com a legislação, a doutrina ou a jurisprudência, acarreta danos ao cliente que o acompanha. Questão ainda não respondida, inteiramen- te, diz respeito à natureza e ao alcance dessa responsabilidade.

Responsabilidade civil do advogado

Paulo Luiz Netto Lôbo

Paulo Luiz Netto Lôbo é Doutor em Direito, Professor da UFAL e da UFPE.

Sumário

  1. Normas de regência. 2. Elementos consti- tutivos da responsabilidade civil. 3. O advogado como fornecedor de serviços na relação de consumo. 4. Presunção da culpa e imputação de responsabilidade ao advogado. 5. Inversão do ônus da prova e as hipóteses de exclusão da culpa do profissional. 6. Responsabilidade objetiva por vício do serviço advogado. 7. Superação da distinção entre obrigação de meios e obrigação de resultado.

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No direito positivo brasileiro, são as seguintes as normas gerais de regência da responsabilidade civil do advogado: a) art. 133 da Constituição Federal, que estabelece a inviolabilidade do advogado por seus atos e manifestações no exercício da profissão. É norma de exoneração de responsabilidade, não podendo os danos daí decorrentes serem indenizados, salvo no caso de calúnia ou desacato. Essa peculiar imunidade é imprescindível ao exercício da profissão, que lida com a contradição e os conflitos humanos; b) art. 159 do Código Civil, regra básica da responsabilidade civil subjetiva, que permanece aplicável aos profissionais liberais; c) art. 32 da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia), que responsabiliza o advogado pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa; d) art. 14, § 4º, do Código do Consu- midor, que abre importante exceção ao sistema de responsabilidade objetiva, na relação de consumo dos fornecedores de serviço, ao determinar a verificação da culpa, no caso dos profissionais liberais.

2. Elementos constitutivos da

responsabilidade civil

Tendo em vista o desenvolvimento da teoria da responsabilidade civil, nos últi- mos anos, a responsabilidade civil do ad- vogado assenta-se nos seguintes elementos: a) o ato (ou omissão) de atividade profissional; b) o dano material ou moral; c) o nexo de causalidade entre o ato e o dano; d) a culpa presumida do advogado; e) a imputação da responsabilidade civil ao advogado. O advogado exerce atividade, entendida como complexo de atos teleologicamente ordenados, com caráter de permanência. A atividade de advocacia não é livre, posto

que dependente de requisitos, qualificações e controles previstos em lei, inserindo-se no conceito amplo de relação de consumo, pois o advogado é prestador de serviço profis- sional. A atividade obriga e qualifica como culposa a responsabilidade pelo dano decorrente de qualquer de seus atos de exercício. A culpa perdeu progressivamente o lugar privilegiado que ostentava, com o crescimento das hipóteses de responsabili- dade objetiva. Contudo, no que respeita ao profissional liberal, ela ainda é elemento fundamental, conquanto sempre presu- mida, como demonstraremos a seguir. O dolo, entendido como intenção mali- ciosa de causar prejuízo a outrem, é espécie do gênero culpa, no campo da responsabi- lidade civil. Aproxima-se da culpa grave, que o direito sempre repeliu. O dolo é qualificado em caso de lide temerária, quando o advogado estiver coligado com o cliente para lesar a parte contrária. É gravíssima infração à ética profissional e, também, acarretará responsabilidade solidária, assim por dano material (emer- gente e lucros cessantes) como por dano moral. Ao contrário da culpa, em que o dano terá de ser indenizado na dimensão exata do prejuízo causado pelo advogado, o dolo em lide temerária acarreta um plus ao advogado, porque é obrigado solidário juntamente com a parte contrária, inclusive naquilo que apenas a este aproveitou indevidamente. A lide temerária, no entanto, não se presume, nem pode ser decretada de ofício pelo juiz, na mesma ação. Tampouco basta a prova da temeridade, que pode ser resultado da inexperiência ou da simples culpa do advogado. Deverá ser apurada em ação própria, contra ele proposta pelo próprio cliente, incumbindo a este o ônus da prova da existência do dano, da temeri- dade da lide, e da coligação com a parte contrária. A imputação da responsabilidade é direta ao advogado, que praticou o ato de

178 Revista de Informação Legislativa

mento incompleto ou defeituoso. O direito do consumidor rompe o princípio da relatividade subjetiva das obrigações negociais, projetando uma transeficácia que alcança terceiros atingidos pelo dano provocado pelo produto ou serviço, não figurantes do negócio jurídico. Outra tendência do direito do consu- midor, nessa área, é a franca adoção da responsabilidade (extranegocial) objetiva. A culpa esteve sempre no centro da construção doutrinária liberal da respon- sabilidade civil, tendendo à socialização dos riscos, como preço a pagar por todos para o desenvolvimento da livre inicia- tiva. O advento do direito do consumidor revelou uma face do problema que se desconsiderava: o consumidor não dispõe das mesmas condições de defesa do for- necedor, no mercado de consumo. Uma das características do consumidor (o cliente do advogado o é) diz respeito à vulnerabilidade jurídica, que o direito presume, independente de ser o fornecedor de serviços uma macroempresa ou um prestador isolado. De qualquer forma, a responsabilidade objetiva, na relação de consumo, não é absoluta ou integral, uma vez que admite exonerações, em benefício do fornecedor de serviços, tais como a culpa exclusiva da vítima, a prova de não prestação do serviço, a prova da inexis- tência do defeito do serviço que teria causado o dano, o caso fortuito e a força maior e, conquanto muitos não admitam, o risco do desenvolvimento (o Código do Consumidor refere a “adoção de novas técnicas”). Assim, surpreende que o Código do Consumidor brasileiro tenha excepcionado os profissionais liberais dessa linha de tendência, ao exigir a verificação da culpa. Todavia, a interpretação da regra legal deve ser feita de modo a dar cumprimento ao princípio constitucional de proteção ao consumidor (artigo 170, V, da Constituição Federal), ou seja, no sentido mais favorável ao consumidor, particularmente nos

seguintes pontos: a) natureza da culpa; b) ônus da prova da culpa. No estágio atual do direito, a culpa na responsabilidade civil pode sofrer as seguintes gradações: a) é requisito, sem a qual não há ilícito nem se poderá imputar responsabilidade a alguém pelo dano: responsabilidade culposa; b) é requisito, mas presume-se exis- tente, em determinadas situações: culpa presumida; c) nem sempre é requisito para quem deu causa ao dano (por fato do homem, porque evidentemente se exclui nas hipóteses de fato do animal ou de coisa), sendo dispensável para quem se imputa a responsabilidade: responsabilidade transubjetiva; d) não é requisito, sendo dispensável a verificação de sua existência, bastando o dano para imputação da responsabi- lidade: responsabilidade objetiva. A responsabilidade culposa tout court dos profissionais liberais é incompatível com o sistema de proteção do consumidor, porque significaria sua exclusão das regras e princípios do Código, o que, como já acima demonstramos, não ocorreu. Também não seria hipótese de responsa- bilidade objetiva, porque a lei impõe a “verificação da culpa”. Não é hipótese de responsabilidade transubjetiva, pois a imputação de responsabilidade recai dire- tamente sobre o fornecedor de serviços e não sobre outrem. Assim, a hipótese “b” é a mais razoável e adequada. A culpa presumida constitui um avan- ço na tendência evolutiva que aponta para a necessidade de não se deixar o dano sem reparação, interessando menos a culpa de quem o causou e mais a imputar a alguém a responsabilidade pela indenização. Por isso, cresceram as hipóteses em que a lei ou a jurisprudência consideram que a culpa é presumida, cabendo ao imputável contraditá-la. Para o Código do Consu- midor, havendo dano em virtude do fato

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do serviço, imputável (responsável) é o fornecedor, sem consideração à culpa. Sendo profissional liberal, é o responsável presumido. Pontes de Miranda^3 ressalta a conexão entre culpa presumida e inversão do ônus da prova, ao comentar o inciso III: “Os que são apontados como devedores de reparação, no artigo 1.521, III, têm o ônus da prova de não-culpa; os que o apontaram têm de dar prova de que havia o vínculo contratual entre o agente e o respon- sável e o dano derivasse de ato previsto no artigo 1.251, III”.

5. Inversão do ônus da prova e as hipóteses

de exclusão da culpa do profissional

O princípio da inversão do ônus da prova é um dos esteios do sistema jurídico de proteção do consumidor. Sem ele, a efetividade do sistema fica comprometida. Não foi por acaso que se transformou em um dos principais alvos dos adversários do Código do Consumidor, quando o projeto de lei tramitava no Congresso Nacional. O princípio transfere ao responsável pelo dano o ônus de provar que não foi culpado por ele, ou que não houve dano, ou que o culpado foi exclusivamente a vítima, ou que houve fato que pré-excluiu a contrariedade a direito. Não é novidade no direito brasileiro, como já se demons- trou à outrance , tendo o próprio Código Civil, ao início deste século, rendido-se a sua evidência, em determinadas situações de responsabilidade civil. O Código do Consumidor, no artigo 6º, VIII, elevou a inversão do ônus da prova a direito básico do consumidor, positi- vando o princípio em regra geral e estru- turante, a que se subordina qualquer operação hermenêutica. De um modo geral, o juiz poderá determiná-lo, mesmo quando não seja exigível, sempre que se convencer da verossimilhança das alega-

ções do consumidor. Porém, deixa de depender do convencimento do juiz, tornando-se obrigatório, quando resultar de responsabilidade por culpa presumida ou de responsabilidade objetiva. No caso do fornecedor de serviços, em geral, cabe-lhe o ônus da contraprova, em hipóteses que a lei delimita em numerus clausus : a) não houve defeito no serviço, e, portanto, dano ao consumidor; b) a culpa pelo defeito foi exclusi- vamente do consumidor; c) o dano foi pré-excluído, uma vez que o suposto defeito decorreu da adoção de novas técnicas. Além delas, devemos cogitar de outras hipóteses de pré-exclusão de contrarie- dade a direito, previstas no direito obri- gacional comum, também aplicáveis ao fornecedor de serviços, supletivamente, como o caso fortuito e a força maior, a legítima defesa e o estado de necessidade. As hipóteses a) e c) são de natureza objetiva, não envolvendo culpa em sentido estrito. Poderiam ser enquadradas no âmbito da responsabilidade sem culpa. Na hipótese a), cuida-se de comprovar a inexistência do defeito alegado pelo consumidor; não se questiona se houve culpa ou não do fornecedor pelo possível defeito ou evento danoso. Na hipótese c), o defeito é desconsiderado (pré-excluído pela lei) porque se comprova que corres- ponde, em exata dimensão, à utilização de novas técnicas, segundo o estágio dos avanços tecnológicos na área específica de serviços, que não podem ser obstados por argumentos desse jaez; a culpa não desem- penha qualquer papel. A culpa aparece apenas na hipótese b), mas não em relação ao fornecedor. O defeito e o dano existem, não são objeto de controvérsia, mas o fornecedor inverte a imputação ao consumidor, comprovando que foi ele que os provocou, ou terceiro, por negligência, imprudência ou impe- rícia. A culpa exclusiva do consumidor, no

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6. Responsabilidade objetiva por vício do

serviço advogado

A responsabilidade com culpa presu- mida, referida no Código do Consumidor, é relacionada exclusivamente ao fato do serviço, ou seja, quando o serviço causar dano à pessoa ou ao patrimônio do consu- midor. A responsabilidade por vício do serviço (defeito de inadequação, oculto ou aparente) do advogado ou de qualquer profissional liberal é idêntica à dos demais fornecedores de serviços, sem qualquer restrição. A regra de exceção, prevista no § 4º do artigo 14 do Código do Consumidor, não alcança as hipóteses de vícios do serviço, previstas nos artigos 18 e se- guintes, em prejuízo do consumidor. Compreende-se que, em se tratando de dano, impõe-se a verificação da culpa. Em casos tais, o dano é conseqüência da má execução ou da inexecução culposa do serviço devido. Contudo, o vício (salvo quando também provocar dano) não é conseqüência, mas característica da própria execução defeituosa. A responsa- bilidade por vício é objetiva, não envolve necessariamente indenização por dano nem verificação de culpa. O princípio de defesa do consumidor estaria seriamente comprometido se, para exercer as alternativas em caso de vício do serviço (reexecução do serviço, restituição da quantia paga ou abatimento propor- cional do preço), dependesse de verifica- ção de culpa do profissional^6.

7. Superação da distinção entre obrigação

de meios e obrigação de resultado

Ao longo do século XX, na teoria da responsabilidade civil em geral, nota- damente com relação aos profissionais liberais, predominou, no direito brasileiro, uma distinção ou dicotomia que se trans- formou quase em petição de princípio: a obrigação ou é de meios ou é obrigação de resultado.

Como regra geral, a doutrina domi- nante diz que o profissional liberal assume obrigação de meios, sendo excepcionais as obrigações de resultado. Na obrigação de meios, a contrariedade a direito reside na falta de diligência que se impõe ao profis- sional, considerado o estado da arte da técnica e da ciência, no momento da prestação do serviço (exemplo: o advoga- do que comete inépcia profissional, cau- sando prejuízo a seu cliente). O profis- sional não prometeria resultado, mas a utilização, com a máxima diligência possível, dos meios técnicos e científicos que são esperados de sua qualificação. A farta jurisprudência dos tribunais brasileiros utiliza essa dicotomia como pré-requisito para imputar a responsa- bilidade ou não do profissional liberal. Se o profissional se houve com dili- gência, pouco importa o resultado obtido, excluindo-se sua responsabilidade, limi- narmente. Essa orientação dominante resultou em dificuldades quase intrans- poníveis para as vítimas de prejuízos causados pelos profissionais liberais, quando não conseguem provar que a obrigação por eles contraída é de resultado. No caso dos advogados, a configuração de sua obrigação como de resultado era e é quase impossível. Assim, restam os danos sem indenização, na contramão da evo- lução da responsabilidade civil, no sentido da plena reparação. Já sustentamos essa tese, sem reflexão mais aprofundada 7. Hoje, não pensamos mais assim. A dicotomia, obrigação de meios ou obrigação de resultado, não se sustenta. Afinal, é da natureza de qualquer obriga- ção negocial a finalidade, o fim a que se destina, que nada mais é que o resultado pretendido. Quem procura um advogado não quer a excelência dos meios por ele empregados, quer o resultado, no grau mais elevado de probabilidade. Quanto mais renomado o advogado, mais pro- vável é o resultado pretendido, no senso comum do cliente. Todavia, não se pode

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confundir o resultado provável com o resultado necessariamente favorável. Assim, além da diligência normal com que se houve na prestação de seu serviço, cabe ao advogado provar que se empenhou na obtenção do resultado provável, objeto do contrato que celebrou com o cliente. O cliente que demanda o serviço do advogado para redação de algum ato jurídico (parecer, contrato, estatuto de sociedade etc.) tem por finalidade evitar que algum problema futuro venha a lhe causar prejuízo. Tem-se assim obrigação de meios como de resultado, o que torna inviável a dicotomia. Quando o cliente procura o advogado, para ajuizar ação, não pretende apenas o patrocínio mais diligente, mas a maior probabilidade de resultado favorável. Em qualquer dessas situações, cabe ao advogado provar que não agiu com imprudência, imperícia, negligência ou dolo, nos meios emprega- dos e no resultado, quando de seu serviço profissional redundar dano. Dessarte, é irrelevante que a obrigação do profissional liberal classifique-se como de meios ou de resultado. Pretendeu-se que, na obrigação de meios, a responsabi- lidade dependeria de demonstração ante- cipada de culpa; na obrigação de resul- tado, a inversão do ônus da prova seria obrigatória 8. Não há qualquer funda- mento para tal discriminação, além de prejudicar o consumidor que estaria com ônus adicional de demonstrar ser de resul- tado a obrigação do profissional. A exigência à vítima de provar que a obrigação foi de resultado, em hipóteses estreitas, constitui o que a doutrina denomina prova diabólica. A sobrevivência dessa dicotomia, por outro lado, é flagran- temente incompatível com o princípio constitucional de defesa do consumidor (art. 170, V, da Constituição), alçado a condicionante de qualquer atividade econômica, em que se insere a prestação de serviços dos profissionais liberais. Somente é possível harmonizar a natureza de responsabilidade subjetiva ou

culposa do profissional liberal, que o próprio Código de Defesa do Consumidor consagrou, com o princípio constitucional de defesa do consumidor, se houver aplicação de dois princípios de regência dessas situações, a saber, a presunção da culpa e a conseqüente inversão do ônus da prova. Ao advogado e ao profissional liberal qualquer, e não ao cliente, impõe- se o ônus de provar que não agiu com dolo ou com culpa, na realização do serviço que prestou, exonerando-se da responsabi- lidade pelo dano. No mesmo sentido, veja-se a lição de Jorge Mosset Iturraspe^9 , para quem essa distinção não favorece a tutela do consu- midor de serviços e sempre foi utilizada na doutrina e na jurisprudência para amparar os prestadores de serviços, atenuando o rigor de suas obrigações, construindo um âmbito de inadimple- mento contratual admitido. Diz ainda o autor que a qualificação das obrigações como de meios desvincula o dever do devedor do compromisso de alcançar um resultado de interesse do credor, juridi- camente protegido, ou seja, o de lograr um resultado benéfico. “A tutela do consumidor se refor- ça, na medida em que se considera cada serviço como um resultado e uma finalidade em si mesmo, que responde ao interesse do credor, e na medida em que a prova sobre a impossibilidade ou aleatoriedade deve produzi-la o devedor do serviço, pois do contrário será considerado como inadimplente responsável”.

Notas (^1) As Ordenações Filipinas, Livro 1, Título XLVIII, 10, já determinavam que, “se as partes por negligência, culpa, ou ignorância de seus procuradores receberem em seus feitos alguma perda, lhes seja satisfeito pelos bens deles”. (^2) Cf. ALMEIDA, L. P. Moitinho de. Responsabilidade civil dos advogados. Coimbra : Coimbra Editora, 1985. p. 18.