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rESEnha. Leonardo Bruno Galdino*. HORTON, Michael. Cristianismo sem Cristo. Tradução de Neuza Ba- tista. São Paulo: Cultura Cristã, 2010. 208 p.
Tipologia: Notas de aula
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FIDES REFORMATA XV, Nº 1 (2010): 135-
Leonardo Bruno Galdino *
HORTON, Michael. Cristianismo sem Cristo. Tradução de Neuza Ba- tista. São Paulo: Cultura Cristã, 2010. 208 p.
Quem está familiarizado com os escritos do Dr. Michael Horton sabe que não é à toa que ele é tido como um dos maiores e mais competentes pensadores reformados da atualidade. A solidez doutrinária de seus escritos e sua aguda percepção em analisar as coisas que acontecem no mundo dito cristão a partir de uma ótica reformada e confessional, aliadas à sua imensa capacidade argumentativa (que nem sempre é tão sistemática e lógica quanto gostaríamos) e à sua habilidade como pesquisador, são fatores que tem jus- tificado seu prestígio mesmo entre cristãos de perspectiva não-reformada (e não-confessional). Agora, ele nos brinda com um de seus livros mais polêmicos, cujo título não só é intencionalmente provocativo, mas essencialmente reflexivo, Cris- tianismo sem Cristo , que, nas palavras do bispo metodista William Willimon (prefaciador da obra), também pode ser encarado como uma “polêmica induzida de Cristo” (p. 10). Se essa afirmação soa pretensiosa e arrogante demais, só mesmo lendo a obra para descobrir. Algo marcante nos escritos de Horton é que ele é sempre muito seletivo nas citações de obras e estatísticas que usa em suas pesquisas, objetividade que o distingue de muitos escritores prolixos e cansativos, apesar de ser ele mesmo um pouco repetitivo às vezes. Por exemplo, ele pode muito bem come- çar falando de um assunto, bruscamente interrompê-lo, e voltar a repeti-lo em
CRISTIANISMO SEM CRISTO
outro capítulo que, em princípio, deveria tratar de outra coisa. Por este motivo é que esta breve resenha é mais sistemática (análise por assunto) do que linear (análise de cada capítulo separadamente). Apesar do “auê” que o título da obra pode causar nos leitores mais apai- xonados, Horton se apressa em dizer que, a despeito de sua superficialidade, desatenção e humanismo, a igreja contemporânea ainda não chegou ao que ele chama de “cristianismo sem Cristo”, mas está a caminho (p. 10). Esse esclarecimento é importante especialmente porque aqueles de perfil mais polêmico correm o risco de ser mais radicais do que o autor da obra na qual tanto se deleitam (assim como tem gente que quer ser mais calvinista que Cal- vino). Entretanto, não estão equivocados aqueles que entenderem que Horton está apenas sendo eufêmico, adiando a bomba que está prestes a estourar no desenrolar de sua argumentação. Mas, o que vem a ser, finalmente, esse tal “cristianismo sem Cristo”? O autor o definiria como sendo “uma história sobre nós [nossos feitos] em vez de uma história sobre o Deus Trino que nos transporta para o drama em anda- mento [os feitos de Deus]” (p. 91). Cristianismo sem Cristo é quando “Deus e Jesus ainda são importantes, porém mais como parte do elenco de apoio do nosso próprio show” (p. 17). Nesse sentido, o cristianismo sem Cristo é deísta , visto que não é mais Deus quem governa as coisas, e sim o homem; é moralista , visto que o imperativo “faça mais, esforce-se mais” (p. 10), ou a famosa máxima de Benjamin Franklin de que “Deus ajuda a quem se ajuda”, está no âmago da religiosidade que norteia a maior parte das igrejas contem- porâneas; e é terapêutico , visto que “não há pecado nem culpa a ser perdoados por Deus, mas apenas os pesos e sentimentos de culpa por não corresponder às expectativas de si mesmo ou de outros seres humanos” (p. 37). Finalmente, Horton diz que a “chave” para essa sua crítica “é que, uma vez que você faz sua paz de espírito em vez de paz com Deus, que é o principal problema a ser resolvido, todo o evangelho é radicalmente definido”, e que “a autorrealização, a autossatisfação e a autoajuda são todas distorções contemporâneas de uma heresia antiga, que Paulo identificou como obras de justiça” (p. 34). Nesse sen- tido, entendo que a obra de Horton é, antes de tudo, uma forte argumentação e clamor em prol da doutrina bíblica da justificação pela fé somente, que os reformadores entenderam ser o coração do evangelho. Para efeito de síntese, Horton faz um quadro comparativo muito inte- ressante entre o cristianismo sem Cristo (que ele chama de “lei leve”) e o verdadeiro evangelho (p. 158):
CRISTIANISMO SEM CRISTO
O liberalismo começou por subestimar a doutrina em favor do moralismo e da experiência interior, perdendo Cristo por hierarquia. “ No entanto, é mais tolice que heresia que está nos matando suavemente. Deus não é negado, mas banalizado – usado para nossos programas de vida, e não recebido, adorado e usufruído ” (p. 20 – ênfase minha). Englobando as pessoas da Trindade nesse sacrílego processo de triviali- zação, Horton observa que no cristianismo sem Cristo “ Deus é usado como um recurso pessoal, em lugar de ser conhecido, adorado e confiado; Jesus Cristo é um treinador com um plano de jogo bom para nossa vitória, em vez de um Salvador que já alcançou a vitória para nós; […] e o Espírito Santo é uma tomada elétrica que podemos ligar para obter o poder necessário para sermos tudo o que podemos ser” (p. 17 – itálicos meus). Aliás, Horton esbanja nos adjetivos que o cristianismo sem Cristo tem conferido a Jesus. Ele observa que “Jesus tem sido vestido como um […] treinador de vida, guerreiro de cultura, revolucionário político, filósofo, copiloto, companheiro de sofrimento e par- ceiro na realização de nossos sonhos pessoais e sociais” (p. 21); ou como um “mascote na guerra das culturas” (p. 166); ou ainda, como um simples “ponto de encontro para jogos de futebol e inauguração de shopping centers ” (p. 64). Porém, o resultado disso tudo, diz Horton, em vez de um relacionamento ver- dadeiro com o Filho de Deus, “é um apego vago e sentimental por alguém que é mais um amigo invisível do que o Salvador dos ímpios, encarnado, morto e ressuscitado, que subiu e é Rei” (p. 64). O cristianismo sem Cristo definiti- vamente não contempla o Jesus das Escrituras – Histórico, Redentor, Deus! Tudo isso, naturalmente, leva a uma banalização não somente de Cristo, mas também dos meios de graça por ele instituídos. O Batismo e a Ceia, por exemplo, são transformados em “meios de compromisso” – um “veículo da experiência pessoal” (p. 142), uma vez que o indivíduo é levado a pensar que tanto a salvação como a manutenção desta dependem única e exclusivamente dele mesmo.
Para muitos de nós, criados em contexto evangélico-conservador em que a pre- gação era principalmente uma exortação para fazer mais, o Batismo foi nosso ato de compromisso em vez de ser o ato de compromisso de Deus; a Ceia do Senhor era um meio de nossa lembrança em vez de um meio da graça de Deus, e muitos hinos eram expressões da nossa piedade mais que um relato das mise- ricórdias maravilhosas de Deus na história da redenção (p. 154).
Mas Horton faz questão de nos lembrar que “o Batismo não é nosso ato de compromisso, com base em nossa decisão, é o ato de compromisso de Deus, baseado em sua decisão. […] A Ceia do Senhor não é nossa lembrança e reconsagração, mas se centra na promessa de Deus de nos dar seu Filho como nosso alimento e bebida – certificando e ratificando nossa inclusão no pacto da graça” (p. 180).
FIDES REFORMATA XV, Nº 1 (2010): 135-
Todos esses “apelos para a ação sem o anúncio da ação de Deus”, segun- do Horton, estão gradualmente “desevangelizando” a igreja (p. 155). Ela se imiscuiu tanto na agenda secular que, em sua tentativa de tornar o evangelho relevante, perdeu-se pelo caminho, transformando as boas-novas da salvação em meros estímulos morais de autoajuda. E é justamente aqui que Horton vai fazer críticas ferrenhas ao tipo de pregação e pregadores que o cristianismo sem Cristo (ou quase sem Cristo, na melhor da hipóteses) tem produzido, justamente pelo fato de que esta pregação, como vimos, exorta o espectador a sempre “fazer mais”. Charles Finney, Joel Osteen, Robert Schuller, Rick Warren, Joyce Meyer e o emergente Brian McLaren, dentre outros, não esca- pam da flecha certeira de Horton. Para ele, as pregações dos tais não diferem muito do que podemos encontrar nos ditos do Dr. Phil ou de Oprah Winfrey (p. 15 – trazendo para o nosso contexto, algo parecido com Super Nani, Max Gehringer e Ana Maria Braga). Por este motivo, não é mesmo a toa que, “na autoajuda secular, as vendas dos gurus chegam perto dos concorrentes evangélicos” (p. 58). Esse tipo de pregação, para Horton, também tira Cristo do cristianismo.
Quando a mensagem básica da igreja é menos sobre quem é Cristo e o que ele fez de uma vez por todas para nós e mais sobre quem somos e o que temos que fazer para tornar a vida dele (e a nossa) relevante para a cultura, a religião que é feita “relevante” não é mais o cristianismo (p. 118).
É nesse ínterim que Horton também vai criticar a tendência desse tipo de religião em moralizar e alegorizar as histórias bíblicas, como se a sabedoria da Escritura se nivelasse àquelas encontradas nas fábulas de Esopo (p. 121). De fato, é muito comum vermos isso acontecer nos dias de hoje. A pregação é tudo, menos exegética. O que sobra disso só pode ser mesmo alegorias e princípios morais. Daí temos que, assim como Davi, precisamos vencer os “gigantes” em nossas vidas; que temos que nos “atrever” a ser um Daniel; que devemos “sonhar” como José; etc. É por isso que nesse tipo de pregação geralmente Deus nunca está de mau-humor para com os pecadores, mas sempre pronto a recebê-los, não importa como estejam vivendo. Horton relembra de uma ocasião em que entrevistou o Dr. Robert Schuller em um programa de rádio, quando lhe perguntou como ele interpretaria a exortação que Paulo faz a Timóteo em 2 Tm 3.1-5. E, antes mesmo de terminar de articular sua pergunta, Schuller respondeu apressado às palavras apostólicas, dizendo: “Eu espero que você não pregue isso. Vai magoar um monte de gente bonita” (p. 28). Para Horton, coisas desse tipo não passam de “autoajuda pelagiana e autodeificação gnós- tica” (p. 59), na qual Deus novamente é nosso coadjuvante no esquema do já denunciado “deísmo moralista terapêutico”.
FIDES REFORMATA XV, Nº 1 (2010): 135-
é a lei, e não o evangelho, coisas para fazer (imperativos), no lugar de indicativos (coisas para acreditar)” (p. 108). “Confundir a lei e o evangelho é a tendência natural do coração caído. Todas as religiões
Como as resenhas geralmente fazem com que corramos o risco de reduzir o conteúdo da obra aos nossos próprios termos, iremos parar por aqui. Mas cabem mais algumas observações pontuais ao livro como um todo. Agora me refiro à questão estética , enfim, todo o processo editorial. Elogios e críticas
CRISTIANISMO SEM CRISTO
também são oportunos nesse aspecto. Primeiramente quero parabenizar a Editora Cultura Cristã – além do fato de pôr nas mãos do público de fala portuguesa uma obra de tamanha envergadura teológica como esta que temos aqui, é claro – pelo trabalho dos revisores em explicar certas expressões e conceitos próprios da cultura e linguajar norte-americanos (pp. 17, 19, 21, 29, 33, 60, 64, 86, 93, 95, 136, 140, 169, 181, 192 e 201), coisas estas que, na maioria das vezes, muitos tradutores e revisores não explicam. Em alguns casos, compreender tais conceitos torna-se essencial à compreensão do que o autor quer transmitir. Isso denota uma preocupação e respeito dos editores pelo leitor que é leigo em outras culturas. Em relação aos pontos que poderiam ter sido melhores podemos citar a falta de um índice onomástico e de assuntos, o que em muito facilitaria a pes- quisa e pouparia o leitor (inclusive quem faz resenhas!) de exaustivas anotações marginais (embora saibamos que o processo para tal é um pouco demorado, tendo em vista a “urgência” da publicação). Quanto aos erros de digitação, gramática e afins, foram tão leves que chegam a ser insignificantes (pp. 15, 137, 138, 139, 143, 176, 179, 182 e 187). E poderia também ter aquela tradicional folha em branco na última página (na qual consta o tipo de papel, a imprensa, etc.), pois sua falta deixa aquela impressão de que o livro ainda não chegou ao seu fim, especialmente no caso do livro em questão, que Horton conclui com uma citação sem acrescentar aquelas costumeiras observações, doxologias ou apelos. Mas nenhuma dessas faltas, evidentemente, é capaz de tirar o brilho da obra desse estimado pensador, que certamente perdurará como um dos textos apologéticos mais importantes desta década. Leitura mais que recomendada! Soli Deo Gloria!