





Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Prepare-se para as provas
Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Prepare-se para as provas com trabalhos de outros alunos como você, aqui na Docsity
Os melhores documentos à venda: Trabalhos de alunos formados
Prepare-se com as videoaulas e exercícios resolvidos criados a partir da grade da sua Universidade
Responda perguntas de provas passadas e avalie sua preparação.
Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Comunidade
Peça ajuda à comunidade e tire suas dúvidas relacionadas ao estudo
Descubra as melhores universidades em seu país de acordo com os usuários da Docsity
Guias grátis
Baixe gratuitamente nossos guias de estudo, métodos para diminuir a ansiedade, dicas de TCC preparadas pelos professores da Docsity
Este artigo é resultado de uma pesquisa, sobre religiosidade no Brasil.
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
1 / 9
Esta página não é visível na pré-visualização
Não perca as partes importantes!
Norma Ires de Souza Almeida
RESUMO: Este artigo é resultado de uma pesquisa, sobre religiosidade no Brasil.
Palavras-Chave : religiosidade, fé, história.
ABSTRACT: This article is the result of a research about religiosity in Brazil done in the period from July 29th, 2008 to August 5th 2008.
“ Um homem que buscava o caminho da espiritualidade, chegou ao sopé da Montanha Da Verdade e quis saber qual era o caminho que o levaria à iluminação. Para cada homem santo a quem perguntava, obtinha uma resposta diversa. Depois de muito pensar, decidiu-se por um caminho e se convenceu que aquele era o único caminho que o levaria ao topo da Montanha. Depois de algum tempo, quando chegou lá, o homem olhou para baixo e viu que os caminhos que levavam ao topo, eram tantos, quantos eram as almas que procuravam a Montanha.” (Parábola Zen- budista).
Neste trabalho procuro estabelecer uma discussão em torno das devoções e das múltiplas faces de uma religiosidade. Para tanto, busco, de um lado, delinear historicamente o conceito de “ser religioso” a partir de experiências concretas dos sujeitos sociais em diferentes momentos e, de outro, focalizar as muitas tentativas de controle por parte da Igreja, uma vez que a devoção santoral constitui-se em prática tradicional, desde os primórdios do cristianismo. Constatou-se que, neste universo devocional, tanto a Igreja Católica, quanto historiadores e, outros estudiosos desta temática, fazem uso de algumas expressões comuns, embora com diferentes níveis de compreensão. Nesse sentido, enquanto a primeira, designa religiosidade popular como manifestação de fé racionalizada e regulamentada por meio de um processo formal de santificação, os demais a entendem como expressão puramente emocional e espontânea que dispensa qualquer patente institucional.
Numa abordagem historiográfica de religiosidade, focalizou-se a construção da santidade de Maria Bueno, a ‘santinha’ de Curitiba que, em diversas ocasiões do século passado, especialmente nas últimas décadas, esteve em destaque nos meios de comunicação local. Muitas vezes, essa santidade desclericalizada, traduzindo relações diretas e sem intermediação com o sagrado, foi alvo de resistência, especialmente por parte de representantes da Igreja, uma vez que não se enquadrava nas suas diretrizes. No entanto, verificou-se que, apesar das tentativas de desqualificar e, com isso, esvaziar esta devoção, a exemplo de tantas outras, o culto piedoso em torno de Maria Bueno tem se mostrado vigoroso, num claro exemplo de um fenômeno de longa duração. O atual pluralismo religioso em várias partes do Brasil, com diferentes intensidades e matizes, tem suscitado inquietações e investigações em diversos campos do saber. As múltiplas manifestações religiosas, envolvendo a devoção aos santos constituem-se numa das mais antigas práticas do cristianismo. Da veneração nos primeiros mártires cristãos aos nossos dias, o culto santoral sistematicamente ocupou um lugar de destaque, quer arraigado em antigas tradições, quer se renovando, se recriando para se adaptar a novos contextos, o que permite, segundo Michel VOVELLE (1997), apreender, por meio do estudo da longa duração, a homogeneidade, a unidade e a continuidade de idéias formadas no decorrer de sucessivas gerações. Nesse sentido, a reflexão acerca desta temática descortina uma extensa gama de expressões, nas quais estão presentes, tanto a fé institucionalizada, burocratizada, como reflexo de uma organização racional, quanto uma outra, espontânea, subjetiva e puramente emocional que se legitima sem quaisquer formalidades, daí ser identificada como manifestação de religiosidade ou piedade popular. Adentrar neste universo de investigações das expressões populares de fé e das devoções santorais, significa, transitar por uma rede de caminhos, ora institucionais, ora desclericalizados, que se resvalam continuamente, aproximando-se em alguns momentos, para se distanciar logo mais adiante, sem que um represente, de alguma forma, a anulação do outro.
desta instituição, sobretudo na sua proposta de estabelecer um diálogo mais abrangente, em busca "do povo de Deus". Finalmente, em decorrência das reflexões anteriores acerca das práticas espontâneas, subjetivas e emocionais de religiosidade e das diretrizes oficiais, dentro de uma organização racional, precisávamos compreender a maneira pela qual um culto popular pode ser construído, quais os elementos que se perpetuam ao longo do tempo em relação a outros cultos santorais, que inovações são introduzidas nessas manifestações de fé, que interesses se fazem presentes ou provocam tensão no processo de edificação de uma "nova" devoção, especialmente quando envolve uma pessoa absolutamente comum e como esse fenômeno é realimentado por longo período de tempo, povoando o imaginário social. Na busca desse entendimento, das muitas expressões de piedade popular e, devoção santoral, procurou contrapor as diretrizes mais recentes, da Igreja quanto a essas práticas e, o tratamento dispensado a elas por diferentes especialistas, uma vez que, esta mesma expressão - religiosidade popular tem sido, igualmente, usada por esses segmentos, mas entendida, com alguns nuances de diferenciação. Para as elites clericais, essas práticas populares se restringem àquelas consagradas, enquanto para os estudiosos, de forma geral, são todas aquelas que envolvem o povo, mas não necessariamente o pobre ou o marginalizado social. Mesmo defendendo diferentes concepções, estudiosos convergiram na crença da religião como um fato social e indica que a experiência religiosa encarna-se no tecido da ação social, dando-lhe um sentido, desvencilhado, tanto de imagens de um ideal inacessível, quanto de projeções delirantes. Max WEBER foi considerado o criador da sociologia do sentido por creditar a esta ciência o papel de compreender, por interpretação, as atividades sociais e com isso explicar seu desenvolvimento e seus efeitos. Esta é a concepção weberiana da ação que deve ser compreendida pelo ‘sentido’ que lhe atribuem os atores numa abordagem intersubjetiva que transcende a análise do sujeito para buscar no seu contexto as justificativas das suas ações.
A experiência religiosa constitui-se portanto, em uma matriz de sentido, mas não a única e, deve ser entendida a partir do que ela representa para os que nela crêem, sem descartar a importância dos demais elementos constitutivos da sociedade. Nessa perspectiva, os diversos grupos sociais ( comerciantes, proletariado, etc) atribuem significados diferenciados para a religião, o que justifica a existência das religiões de salvação e as de adaptação ao mundo, em que as primeiras tomam quase sempre o aspecto de uma revolução social, já que aspiram a uma nova comunidade, enquanto as segundas, "como a piedade católica, de forma resignada, espera a recompensa na vida após a morte" o que permite entender o encaminhamento institucional da hierarquia eclesial, assim como as muitas práticas cotidianas dos fiéis frente a este pressuposto. Por isso, aplicando essa teoria ao campo religioso, WEBER preteriu a discussão da essência religiosa para concentrar-se no entendimento de seu impacto nas sociedades. Este foi o seu caminho em A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, quando trabalhou a noção de ética como prática e interação social, uma vez que não visava o indivíduo singular e descontextualizado, pois, o autor conferia grande importância às intenções dos atores sociais em conjunto. Daí sua justificativa para a religião como fato social, em que sua preocupação transcende o fiel em suas subjetividades para focalizar sua vivência de fé, no interior de uma vertente religiosa, sem descuidar da relação desta com outros aspectos e segmentos da sociedade. Nesse sentido, em consonância com o pensamento de WEBER, apontamos que "a religião proporciona uma ampla perspectiva com que as pessoas abordam o mundo, suas próprias atividades, a terra a que pertencem, o tempo de suas vidas e seus futuros, inclusive a morte". A experiência religiosa constitui-se portanto, em uma matriz de sentido, mas não a única e, de acordo com a visão weberiana, deve ser entendida a partir do que ela representa para os que nela crêem, sem descartar a importância dos demais elementos constitutivos da sociedade. Entendimento a religião como um dos pilares da sociedade, o estudo da história das religiões permite compreender como elas se compuseram progressivamente e se configuram na atualidade. Para ele, isso é possível, pois admite que todas as
O Sagrado, Deus e todos os santos, os oficiais e, inclusive os santos populares, os oficiosos, manifestam-se de modo imediato no mundo e na história humana. Por isso, a religiosidade popular constituiu-se tanto para as pessoas comuns, quanto para os acadêmicos, em um fenômeno emocional, em que o homem tem a vivência profunda de seus aspectos não-racionais como o ’mistério tremendo e fascinante’. Nestas condições, a religiosidade popular é profundamente mística, pois valoriza o significativo em relação ao contexto sócio-cultural, abstraindo, muitas vezes o oficial, os serviços especializados e a sistematização dos conteúdos de fé. Enquanto os ritos institucionais são propostos pela hierarquia, a religiosidade popular expressa convicções pessoais que oferecem mais segurança para as incertezas da vida uma vez que incluem a visão do homem sobre si mesmo e o seu mundo concreto. Na religiosidade popular, cada sujeito social manifesta, com maior autonomia e espontaneidade, seus sentimentos, sua fala, seus medos, suas necessidades, assim como o pagamento de suas promessas ou simples agradecimentos. Por meio de promessas, um sistema de troca com a santidade, o fiel sente que a salvação é possível e, sobretudo, é capaz de trazer os benefícios necessários para a sua vida, numa relação funcional com a santidade, nos momentos de maiores dificuldades materiais ou emocionais. Neles, a comunicação com o sagrado se intensifica na busca de graças e milagres que caracterizam em grande parte o caráter utilitário da religiosidade popular e a relevante importância ocupada pelas constelações devocionais, onde as santidades transcendem o abstrato para encarnar-se na imagem daquele que representa. Assim, o devoto não precisa da autoridade eclesiástica para cultuar seu santo de devoção. Ele o elege e se sente eleito por ele e, com ele, realiza uma sacralização simbólica da vida cotidiana. A espinha dorsal da religiosidade popular, para nós, é um fenômeno dessas características, emocional e mística e está presente em todas as expressões do catolicismo e, em todos os graus da consciência humana, pois do ponto de vista individual, o encontro com o sagrado é fonte de coragem e energia, sobretudo por
um sentido de se estar integrado à grande ordem cósmica presente na natureza e na história. Transitar nesta ‘floresta de símbolos’ que caracteriza a religiosidade popular, nos levou a enveredar por diversos caminhos e muitas trilhas, uma vez que, o universo religioso, forma, uma rede densa de práticas e saberes, nem sempre coerentes ou conscientes, nos quais se inscreve e se desenvolve o cotidiano. Na busca de um entendimento, ao menos parcial, deste cenário multifacetado, se entrelaçaram, em nossa pesquisa, duas esferas deste cosmo: uma institucional e outra popular, além de duas dimensões temporais, o tempo curto, do cotidiano, onde se encontram os acontecimentos habituais e o da longa duração, das representações coletivas, que se modelam e remodelam, vagarosamente, ao sabor do tempo. Por meio da junção destes elementos, a religiosidade popular, ao longo desta investigação, delineou-se como uma riquíssima construção cultural, mesmo considerando as dificuldades iniciais para definirmos no que se constituíram tais práticas populares de manifestação de fé. Por isso, logo percebemos a necessidade de nos mantermos atentos aos aspectos, muitas vezes sutis, presentes nas clivagens do simbólico e das representações do sagrado. No entanto, é importante lembrar que, tanto no início desta devoção, como atualmente, aos devotos, interessava, sobretudo, aquilo que eles acreditavam ser seu poder de intermediação com o sagrado. Esse percebimento do que é divino, transcende qualquer racionalização, qualquer justificativa concreta, pois se constitui em um sentimento de emoção e de devoção, capaz de envolver um abrangente repertório de conflitos humanos, respondendo às questões mais íntimas e essenciais, de acordo com as aflições e com as esperanças de cada um. Neste contexto de crenças e vivências emocionais e espontâneas, encontramos os sujeitos sociais, adeptos de Maria Bueno, a ‘santinha’ de Curitiba ou de qualquer outra santidade popular, embora nem sempre os limites entre o institucional e o desclericalizado estejam bem definidos ou evidenciados, já que, em determinadas situações, ao longo da história, a Igreja cooptou elementos da religiosidade popular, da mesma forma que as manifestações populares de fé, mesclam muitos elementos consagrados pela hierarquia eclesiástica.