Baixe Valor das Experiências Significativas: Relato com Crianças Hospitalizadas e outras Notas de estudo em PDF para Enfermagem, somente na Docsity!
SENTINDO O VALOR DAS EXPERIÊNCIAS SIGNIFICATIVAS
PARA A APRENDIZAGEM:
RELATO DE DUAS SITUAÇÕES VIVIDAS COM
CRIANÇAS HOSPITALIZADAS
C ir ceia Amalia Ribeiro *
RIBEIRO, C. A. Sentindo o valor das experiências significativas para a aprendizagem: relato de duas situações vividas com crianças hospitalizadas. Rev. Esc. Enf. USP, São Paulo, /7(3):179-203, 1983.
O trabalho relata duas experiências vividas, pela autora, junto a crianças hospita- lizadas. Na primeira há descrição do comportamento de uma criança recém-admitida ao hospital, e são comentados os motivos do mesmo. A segunda é uma experiência de relacionamento enfermeiro-paciente com a utilização da técnica de entrevista com brincadeira, sendo comentada a mudança de comportamento da criança após a mesma. A autora ressalta o significado dessas experiências em relação à assistência e ao ensino da assistência de enfermagem pediátrica.
INTRODUÇÃO
Durante o tempo em que fui enfermeira em unidade de pediatria,
vi muitas crianças tristes, chorando e chamando insistentemente pela
mãe. Algumas pareciam acalmar-se após algum tempo e outras perma-
neciam assim até o final da internação. Sentia pena delas, procurava
acalmá-las, o que muitas vezes não conseguia; porém, eu nem sempre
entendia o que estava acontecendo com elas e nem mesmo a intensidade
de seu sofrimento. Em algumas situações chegava a ficar irritada com
a criança que chorava tanto, e também comigo, por não saber mais o
que fazer para ajudá-la.
Mais recentemente, já como docente de enfermagem pediátrica da
Escola de Enfermagem da USP, ao realizar o teste piloto de um trabalho
de pesquisa, tive contato com duas crianças hospitalizadas recém-admiti-
das. Uma eu apenas observei e com a outra interagi, aplicando a técni-
ca de entrevista com brincadeira, para auxiliá-la em sua adaptação ao
hospital.
O que vou contar a seguir é o que aconteceu às crianças e o que
aconteceu comigo após essas duas experiências.
- Enfermeira. Auxiliar de Ensino do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psi- quiátrica da Escola de Enfermagem da USP — disciplina Enfermagem Pediátrica.
A PRIMEIRA CRIANÇA
A primeira criança, A.P., era uma menininha de quatro anos,
admitida na clínica, pela primeira vez, cerca de uma hora antes da
minha observação, para fim de correção de luxação congênita de quadril.
A impressão que me deu foi de total desespero: chorava muito, andava
de um lado para o outro no corredor da enfermaria; chamava seguida-
mente por seus pais, especialmente pela mãe; tentava fugir cada vez que
a porta da clínica se abria; recusava-se a dialogar com as funcionárias
da clínica, assim como a aceitar destas qualquer tipo de cuidado ou
auxílio.
Senti que esse seu comportamento estava "perturbando" o pessoal
da clínica que não sabia o que fazer para acalmá-la.
Fui embora, após uma hora de observação, deixando a criança
exatamente como a havia encontrado.
À tarde do mesmo dia, voltei para observá-la novamente. Logo
que entrei na clínica, antes mesmo de ver a criança, a enfermeira infor-
mou-me que ela havia sido colocada no berço e já estava bem mais
calma. Realmente, ela não chorava ou reclamava mais; ao contrário,
estava quieta, deitada em seu berço, evitando qualquer comunicação com
alguém, segurando fortemente uma chupeta, manuseando seu próprio
corpo e inclusive masturbando-se.
Saí do hospital muito triste, chocada com a mudança de compor-
tamento da criança, preocupada por não entendê-la e não saber como
ajudá-la e preocupada também em compreender o que realmente estava
acontecendo com ela. Naquele momento tomei consciência da profun-
didade da influência da hospitalização no comportamento da criança e
da minha incapacidade para trabalhar com ela.
A descrição do caso apresentado pode ser lida no Anexo I.
Procurei então literatura que me explicasse o significado dos
comportamentos tão diversos que a criança apresentou de manhã e à
tarde.
ROBERTSON
1 6
aponta a sensação de abandono da criança, decor-
rente da separação da mãe, como a principal causa das reações à hospi-
talização, e descreve três fases de resposta emocional através das quais
as crianças evoluem quando são hospitalizadas e não recebem cuidado
adequado, que são: fase de protesto, fase de desesperança e fase de
negação. A fase de protesto, é caracterizada por choro forte e con-
tínuo, e/ou pelo chamar e procurar a mãe intensamente, e por intensi-
dade de movimentos físicos; é decorrente da confiança que a criança
tem de que será atendida pela mãe. A fase de desesperança é caracte-
rizada pela diminuição da atividade física, choro monótono e intermitente,
retração e apatia, aparentando tranqüilidade erroneamente considerada
como diminuição da tensão; decorre da consciência que a criança tem
da necessidade da mãe junto com uma desesperança crescente que esta
partes do corpo ou objetos, batendo-se; disturbios de comportamento:
chupa o dedo, rola no berço, bate a cabeça, masturba-se.
Analisando os comportamentos apresentados pela criança observa-
da, de acordo com a classificação acima citada, vê-se que, nos dois perío-
dos de observação, eles podem ser enquadrados em uma dessas três
categorias de comportamento de tensão.
Tal afirmação está de acordo com dados apresentados por PRUGH
o qual refere que a principal reação da criança à hospitalização é a
ansiedade, e esta decorre da separação da mãe, especialmente até os
quatro anos de idade.
Agora compreendo a intensidade do sofrimento e da tensão que a
hospitalização impõe à criança e o quanto ela pode piorar, se não for
corretamente atendida. Entendo também que as reações que ela
apresenta decorrem não só deste sofrimento e desta tensão, mas também
de uma tentativa de se proteger e se adaptar à situação nova e difícil
que é obrigada a enfrentar, especialmente quando está longe de sua
mãe; e que a enfermeira precisa ser sensível para captar, compreender
e aceitar tais comportamentos como um pedido de ajuda da criança,
a fim de poder auxiliá-la a enfrentar a situação.
A SEGUNDA CRIANÇA
A segunda criança, A., era um menino de cinco anos, internado,
também pela primeira vez, havia quatro dias, com o diagnóstico de pé
torto e aguardando cirurgia corretiva.
Encontrei-o encostado à parede do corredor da clínica, próximo à
porta de entrada, afastado de todos, chorando muito e pedindo para ir
para casa.
Como eu estava fazendo treinamento para aplicação da técnica de
entrevista com brinquedo, convidei-o para brincar, o que aceitou.
Inicialmente, muito tristonho, apenas manuseou os brinquedos, mas
depois brincou intensamente, especialmente com material hospitalar,
"dando" injeções em um outro paciente que chamou para brincar com
ele. Ao final da sessão, enquanto guardávamos os brinquedos, perguntou-
-me se eu voltaria no dia seguinte; eu lhe respondi que não. Aí então,
ele olhou para mim e começou a chorar e ao mesmo tempo a falar de
seu desejo de voltar para casa. Conversei com ele, explicando-lhe o
motivo e a finalidade de sua hospitalização. Em seguida, ainda
chorando, A. falou-me de seus problemas em relação à hospitalização:
queixou-se do hospital, de seu médico, da falta de informação, da
incompreensão da enfermeira, da falta de visitas, das saudades de casa,
da comida do hospital. Após, parou de chorar e passou a falar das
coisas que iria fazer para resolver os seus problemas.
A descrição do caso apresentado pode ser lida no Anexo n.
Fiquei espantada! O menino fraco e choroso, tornou-se suficiente-
mente forte para falar de seus problemas e procurar soluções para eles.
Senti-me satisfeita por tê-lo auxiliado e fiquei também motivada para
entender melhor como o brinquedo pode auxiliar a criança.
MACHADO
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aponta que uma das funções principais do brinquedo
é a dramatização de papéis ou de conflitos, que além de possibilitar o
diagnóstico do conflito que a criança está vivendo, tem também função
curativa, pois funciona como uma "válvula de escape" e conduz à
diminuição da ansiedade pela função de catarse, isto é de alívio ou
purificação do indivíduo, e que esta função é tão importante que cons-
titui a base da técnica de psicoterapia infantil, a ludoterapia.
PRUGH
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recomenda o uso do brinquedo como uma das medidas
para diminuir o sofrimento da criança hospitalizada.
Revendo o caso apresentado e estudando bibliografia a respeito,
identifiquei que o brinquedo possibilitou as ocorrências que relatarei
a seguir.
Em primeiro lugar o brinquedo possibilitou o início de nosso
relacionamento. Percebi que o brinquedo é um meio bastante eficaz
para facilitar a aproximação da enfermeira à criança; é come se a
enfermeira passasse a falar a linguagem da criança.
B A R T O N
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afirma que o brinquedo é um instrumento efetivo de
enfermagem que possibilita à enfermeira estabelecer relacionamento com
a criança e obter informações relativas aos conceitos e sentimentos da
criança sobre a sua doença e hospitalização, a fim de estabelecer metas
para a assistência de enfermagem.
A segunda ocorrência foi a oportunidade que a criança teve para
dominar uma provável situação vivida no meio hospitalar com conseqüente
relaxamento da tensão, através do manuseio de material hospitalar e
dramatização da situação de exame físico e aplicação de injeção.
ERICKSON
6
considera o brinquedo como parte integrante da vida
da criança e concorda com Freud, Piaget e Erikson os quais afirmam
que a criança usa o brinquedo para interiorizar uma situação difícil, e
se fortalecer no sentido de enfrentá-la, dominá-la ou torná-la suportável;
fazem isto através da dramatização e da repetição de uma atividade
que determine situação de estresse. A autora enfatiza ainda que a
técnica não diretiva da entrevista com brinquedo deve ser utilizada pelas
enfermeiras como um recurso para identificarem os sentimentos das
crianças.
Segundo GREEN^8 , o procedimento desagradável de receber injeção
se torna mais suportável para a criança quando ela dramatiza a situação,
porque isto faz com que ela não se sinta tão impotente em face de
tal procedimento, uma vez que também pode realizá-lo e assim descarregar
sua tensão. Para FREUD* isto acontece porque a criança passa da
A mesma autora também ressalta que, quando assistida devidamente e
informada de sua situação, a criança demonstra ego forte, isto é, é capaz
de perceber sua realidade, de interpretá-la positivamente e de reagir,
adaptando-se ao hospital, mesmo enfrentando a ansiedade da separação.
Realmente, pela mudança de comportamento da criança pode-se
afirmar que houve fortalecimento do ego de A.
Segundo DENYES^5 a atuação adequada da enfermeira junto a uma
criança deve permitir que esta use a enfermeira para conseguir um ego
forte. A autora define os termos ego forte, recursos do ego e
respostas comportamentais da seguinte maneira:
— "ego forte é a capacidade do indivíduo para a organização de suas
respostas aos estímulos internos e externos, de maneira que o
capacite a agir inteligentemente e eficientemente, e a controlar seus
impulsos e seu meio ambiente para conseguir satisfação e prazer,
ou diminuição de tensão";
— "recursos do ego referem-se àqueles processos psicológicos que se
desenvolvem dentro de um indivíduo e são dirigidos para lidar com
os estímulos internos e externos, de modo que o habilite a buscar
satisfação e prazer, ou diminuir a tensão";
— "respostas comportamentais: incluem ações observáveis e expressão
de sentimentos".
DENYES^6 descreve as seguintes respostas comportamentais como
sendo indicadoras de criança saudável ou de ego forte: protesta diante
de tratamentos; expressa verbalmente sentimentos de prazer, raiva e
desconforto; procura ajuda fazendo perguntas; procura ativamente
pessoas para ser confortada; usa pessoas acessíveis para receber apoio;
aceita dependência quando apropriada; inicia atividades independentes;
sai, explora e brinca livremente; encara a realidade de experiências
desagradáveis; persiste em tentativas para resolver seus problemas,
brincando e verbalizando.
Lendo a descrição do caso, Anexo II, podemos identificar que,
antes de brincar, A. apresentava comportamento que pode ser classifi-
cado como comportamento de ansiedade. Durante a entrevista com
brincadeira ele inicialmente manuseou os brinquedos, mas após assumiu
um papel e então brincou realmente. Após a entrevista com brincadeira
apareceram comportamentos que, segundo DENYES^6 , são característicos
de criança possuidora de ego forte: expressou verbalmente sentimentos
de prazer, raiva e desconforto; procurou ajuda fazendo perguntas;
procurou-me para receber apoio; brincou e verbalizou o que sentia, na
tentativa de resolver seus problemas; e no final tomou decisões sobre
o que iria fazer para resolver seus problemas e verbalizou-as.
Quanto a mim, como enfermeira, passei a acreditar no valor da
entrevista com brinquedo, como terapia para a criança, e na importância
de seu uso como valioso instrumento de enfermagem para facilitar a
assistência emocional à criança hospitalizada. Concordo com ERJLKSON
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quando ele afirma: "através do brinquedo podemos ajudar o ego de
uma criança a ajudar-se a si mesmo".
O SIGNIFICADO DESSAS EXPERIÊNCIAS PARA MIM
A experiência com essas duas crianças foi de alto significado para
mim. Sinto que houve uma mudança em mim quanto à percepção da
intensidade do sofrimento da criança e, também, do quanto é importante
para a criança sentir apoio e o quanto a enfermeira pode fazer por uma
criança.
Passei a acreditar no valor terapêutico do brinquedo, constando a
mudança de comportamento que houve na criança. Passei a acreditar
mais em mim, como sendo uma enfermeira capaz de auxiliar uma
criança a enfrentar uma situação difícil, como a de hospitalização.
Fiquei ainda altamente motivada a continuar estudando a respeito
dos dois assuntos: a hospitalização e o uso do brinquedo na assistência
de enfermagem.
Por que isto aconteceu comigo? O que determinou que esta expe-
riência tivesse um significado tão grande para mim?
Identifico estarem presentes, nesta minha experiência, os elementos
citados por ROGERS
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como integrantes de uma experiência significa-
tiva, e que são indispensáveis para que ocorra aprendizagem. Tais
elementos são:
— a experiência significativa tem a qualidade de envolvimento pessoal:
a pessoa como um todo, tanto sob o aspecto sensível, quanto sob o
aspecto cognitivo, inclui-se no processo de aprendizagem;
— ela é auto-iniciada: mesmo quando o primeiro impulso ou estímulo
vem de fora, o senso da descoberta, do alcançar, do captar e do
compreender vem de dentro;
— ela é penetrante: suscita modificação no comportamento, na atitude,
talvez mesmo na personalidade do educando;
— ela é avaliada pelo educando: este sabe se, através da experiência,
está indo ao encontro de suas necessidades, e se ela está sendo
esclarecedora para suas dúvidas;
— sua essência ê que a experiência tenha significado para o educando
durante todo periodo em que se realiza.
Realmente, entendo que não foi só o meu conhecimento a respeito
dos assuntos tratados neste trabalho que se modificou; houve também
mudança nos meus sentimentos e no meu comportamento. E isto
aconteceu porque a experiência não foi simplesmente mais uma pela
qual passei; ao contrário, ela passou dentro de mim. Eu mudei.
- FREUD, S. apud ERIKSON, E. H. Infancia c sociedade. Rio de Janeiro, Zahar, 1977. p. 199.
- GREEN, C. S. Larry thought puppet play «childiah». But it helped him face his fears. Nursing, Horsham, 5(3):30-3, Mar. 1975.
- MACHADO, D. V. M. O brinquedo e suas funções. Anais Nestle, São Paulo, (100):54-8,
- & MACHADO, E. M. Cuidados psicológicos à criança hospitalizada. Bev. Hosp. Clin., São Paulo, 11(4):205-8, jul./ago. 1956.
- MORAES, E. Mensagem única, um modo terapêutico de tratar crianças em sofrimento: relato de uma experiência. Rev. Esc. Enf. USP, São Paulo, 14(2):165-9, ago. 1980.
- MOUSTAKAS, C. E. Psychotherapy with children: the living relationships. 3. ed. New York, Bellantine Books, 1973. 366 p.
- P E T R I L L i O , M. & SANGER, S. Cuidado emocional dei niño hospitalizado. México, La Prensa Médica Mexicana, 1975. 259 p.
- PRUGH, D. G. A study of the emotional reactions of children and families to hospi-
talizations and illness. Amer. J. Orthopsychiat., New York, 2(31):70-106, Jan. 1959.
- ROGERS, C. R. Liberdade para aprender. 4. ed. Belo Horizonte, Interlivros, 1977. 330 p.
- ROBERTSON, J. Some responses of young children to loss of maternal care. Nurs. Times, London, 49(16):382-6. Apr. 1953.
ANEXO 1
Nome: A.P. Idade: 4 anos Diagnóstico:
«Luxação congênita de quadril»
Admissão e observação: 30/11/
Observação do período da manhã
Hora
llh 15min
llh 20min
llh 20min
Comportamento das pessoas da clinica
Chego à clínica
Uma atendente a leva no colo para a enfermaria
Aproxima-se uma nutricionista ( N ) : «Como é seu nome?»
N —: «Aqui você chama todo o mundo de tia»
Nutricionista afasta-se
Aproxima-se uma enfermeira ( E ) E — «Venha aqui conversar com a tia, ver o papá»
E «Venha^ com a^ tia»
E —: «Aqui você vai se ma- chucar se alguém abrir a porta»
Comportamento da criança
Na frente da porta de entrada chorando muito, chamando pela mãe, rodeada por quatro meninas maiores. Tenta sair da clínica cada vez que um adulto entra ou sai.
Chora muito, ao ser colocada no chão. Sai correndo pelo corredor (deambula claudican- do), pára em frente da porta de outra enfermaria, fica olhando para dentro da mes- ma. Continua chorando e gri- tando, sempre segurando uma chupeta: — «Mamãezinha, mãezinha».
cQuero a mãe, a mãe.»
— «O mulher, cadê minha mãe».
Sai correndo em direção a por- ta de entrada, chorando e soluçando, gritando pela mãe. Agacha-se junto à porta, per- manece chamando pela mãe e chorando.
— «Mamãezinha, mamãe»
— «Não! mamãe, mamãe»
l l h 30min
llh 35min
quer mamãe? Ela está lá per- to da escada no fundo. Venha mamãe, espera mamãe!»
Atendente a segura no colo
Copeiro (COP) se aproxima com o carro de alimentação. AT —: «Sua mãe vem logo, segura esta boneca. Senhor, dê um prato de comida para ela.»
Atendente põe a criança no chão.
COP: — «Eu mandei chamar sua mãe»
AT —: «Venha com a tia para papar»
Uma escrituraria (ESC) entra na enfermaria e pega a crian- ça no colo.
ESC —: «Não chore. Você não quer comer?» ESC —: «Não chore. Olhe, a tia já vai dar seu papá.» Escrituraria a coloca no chão e sai
Outra atendente entra na en-
Estende os braços
Pára de chorar. Vai carrega- da pela atendente, até a porta de uma enfermaria próxima.
Segura a boneca
Entra na enfermaria, chora sem parar, novamente. Anda dentro da enfermaria seguran- do a boneca (Emilia) que a atendente lhe havia dado e uma outra bonequinha de plás- tico.
Aproxima-se novamente porta da enfermaria
da
Sai andando para o corredor interno da enfermaria, cha- mando pela mãe.
Chora, segurando as bonecas.
«Mamãe, mamãe»
Continua chorando
Anda pela enfermaria, segu- rando as bonecas e chorando. — «Quero fazer xixi»
l l h 35min
l l h 45mln
fermaria. AT —: «Venha, a tia leva voce para fazer». Leva a menina ao banheiro, senta-a no vaso sanitário, per- manecendo a seu lado.
AT —: «Faça xixi, faça. Pare de chorar para fazer xixi. Não vai fazer? Faça!»
AT —: «Olhe a Emilia, olhe. Você gosta da Emilia? Ela chocalha. Quer fazer uma trança nela?» AT —: «Ela vai vir amanhã.»
AT —: «Ela foi chamar o papai. Faça xixi, faça» Sai do banheiro, deixando a criança sentada no vaso.
Entro no banheiro. —: «Você fez xixi, fez?» Passo a mão em sua cabeça.
Atendente entra, levanta sua calcinha: «Venha papar ve- nha» Sai para ver se há comida para a menina Eu me afasto fico parada num canto do banheiro.
Fica sentada no vaso sanitá- rio, nele apoiando-se com as duas mãozinhas e chorando — «Mamãe, mamãe, mamãe»
Continua chorando
— «Eu quero a minha mãe»
— « E meu pai?»
Continua chorando: — «Mãe, mãe, m a m ã e... » Chora forte. Para de chorar. — «Mamãe, mamãe» Levanta-se do vaso sanitário, deita sua cabeça em uma ca- deira, abraçando as duas bo- necas.
— «Não! quero a mamães Chora.
Continua chorando, abrançando a boneca Emilia e manusean- do a bonequinha plástica. Vira a cabeça para a parede, dei- tando o tórax sobre a Emilia; continua a manusear outra boneca, chorando continuamen- te, a princípio forte e depois
xima e diz para a atendente: «Olha»
AT —: «Deixe, depois ela es- quece e eu guardo» CR —: «Eta! não pode fazer isso com a boneca dos outros»
CR. «Ela arrancou o colar». Sai do banheiro
llh 50min
Outra menina entra no ba- nheiro, olha para ela e sai Enfermeira entra no banheiro e sorri para ela.
Enfermeira sai.
Não olha para a atendente nem para a outra criança.
— «Não». Arranca a corrente do pescoço da Emilia.
Continua manuseando a bone- ca e a corrente. Soluça. Lar- ga a boneca. Olha em redor, anda em volta da cadeira. Vai até a pia, meche nos pingos de água da torneira. Vai até a porta, encosta-a (esta fica semiaberta). Volta até a ca- deira, pára a pouca distância da mesma e fica olhando as bonecas. — «Quero minha mãe, quero minha mãe». Pega as bonecas esfrega-as com a barra de sua camiseta. — «Quero minha mãe». Anda até o caso sanitário, exa- mina o encanamento da des- carga, mexe na torneira da parede sem abrí-la; — «Quero minha mãe (fala baixinho) Choraminga, recomeça a cho- rar, pára de chorar, recosta a cabeça na cadeira.
Olha a enfermeira. — «Quero minha mãe»
Choraminga, recomeça a cho- rar mais forte e a gritar: — «Quero minha mãe, quero minha mãe, quero minha mãe». Senta-se no chão ao lado da cadeira: — «Quero mamãe, quero ma- mãe» Pára de chorar, levanta-se, anda até a porta, volta para
12h lOmin (^) Retiro-me.
Observação do periodo da tarde
perto da cadeira. Chora: — «Quero minha mãe». Sai do banheiro, entra na sala de utilidades, sai, anda até urna porta ao fundo do corre- dor, tenta abri-la mas não consegue. Volta à sala de uti- lidades, sai, entra no banheiro Recomeça a chorar e a cha- mar a mãe.
15h lOmin
15h lOmin
Observo-a, da porta
Entro, cumprimento as crian- ças e a atendente que está na enfermaria. Não responde. Outra criança pergunta à atendente referindo-se a ela: — «Tia como ela chama?» AT —: «Como você se chama? A.P. né?»
Atendente sai: — «Vou tomar café» CR —: «A.P., A.P.»
CR —: «Você empresta a bo- neca para mim brincar?»
CR —: «Tia (para mim) pega a boneca que ela emprestou para mim». Aproximo-me do berço: «A.P., posso levar a boneca para ela? ou não?»
Deixo a boneca onde está. Afasto-me. Aproxima-se uma enfermeira: «Oi! tudo bem?
Na enfermaria, deitada em um berço, decúbito dorsal, acordada, sugando a chupeta, com uma boneca jogada a seu lado. A televisão está ligada, mas a criança não está olhan- do para ela.
Vira o rosto para a atenden- te. Não responde.
Olha em direção à menina.
Não responde. Passa a mão na perna e na orelha.
Olha para mim. Nada res- ponde.
Olha para a enfermeira. Não responde.
ANEXO n
Nome: A. Idade:^5 anos^ Diagnóstico: Pé torto
Admissão: 08/12/78 Entrevista com brincadeira: 12/12/
Hora Comportamento das pessoas da clínica
Comportamento da criança
15h 15min
15h 20min
15h 20min
Eu: «O que foi?»
Eu: «Quantos anos você tem?»
Eu: «Quer brincar com a tia?»
Eu: «Então venha. A tia em- presta alguns brinquedos para você brincar um pouco».
Eu: «Tome conta da sacola que eu vou buscar uma ca- deira»
Volto, sento-me, tiro os brin- quedos da sacola: «Você pode brincar com o que quiser. En- quanto você brinca eu vou es- crever, está bem?
Sua cama fica rodeada de ou- tros meninos que comentam sobre os brinquedos e até os manuseiam. Peço às crianças que o deixem brincar um pou- co sozinho. Aos poucos eles se afastam.
Não entendo o que ele fala.
Chega uma criança na maca e pára na porta da enferma- ria. Um outro menino que está próximo à cama comenta: «Olha, ele voltou, não foi ope- rado, está acordado».
Chorando encostado à parede do corredor da clinica
«Quero ir para minha casa».
«Cinco».
Faz que sim com a cabeça
Acompanha-me ao quarto, até sua cama. Expressão tristo- nha.
Fica em pé junto à cama
Senta em sua cama e olha para tudo o que vou mos- trando. Parece ignorar os outros me- ninos. Pega o revólver, solta. Pega o boneco pai e o boneco filho, solta-os. Pega nova- mente o boneco pai, manuseia-o e solta-o. Pega os bonecos pai e médico, bate um contra o outro e fala algo que não se entende, solta-os. Manuseia um a um todos os bonecos, movimenta-os e conversa com eles. Esconde a boneca mãe sob o travesseiro.
Hora Comportamento das pessoas Comportamento^ da da clinica criança
15h 25min
15h 30min
Outra criança me pergunta, olhando os brinquedos: — «Tia, você está dando para ele?». Eu: — «Não, é só para brin- car um pouco».
Eu: «Quer papel? Quer carim- bar?» Entrego-lhe uma folha de papel.
Eu: «Você sabe como tem que fa- zer? Quer que a tia ensine?»
Outro menino: «Não é assim, tem que fazer mais forte»
Ouço falarem algo, penso que é ele. Eu: «Você falou alguma coisa?
Pára um instante, olha para a porta e para a outra criança. Pega o boneco pai, movimen- ta-o e diz: — «Oba, que bele- za! eu estou contente».
Pega um boneco plástico, sol- ta-o. Pega a mamadeira, abre, fe- cha. Dá para o boneco pai dizendo: «Olha meu filhinho», solta-os: Pega o saco de carimbos, olha-os.
Faz que sim com a cabeça. Abre a almofada de tintas e fica olhando.
«Não, eu sei tia». Começa a carimbar.
Carimba, uma a uma, todas as figuras. Levanta-se da cama para apanhar um brinquedo que cai no chão. Volta, fica de pé no chão carimbando sobre o criado-mudo; antes de ca- rimbar olha a figura do carim- go. Pega a caixa de lápis de cor, abre, olha, fecha. Continua a carimbar. Olha o papel onde carimbou e aponta, uma a uma, com o indicador, todas as figuras carimbadas. Pega os lápis de cor e começa a colorir as figu- ras. Pinta o cavalo carimbado.