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obras que já se tornaram clássicas: O operário em construção, poema de Vinicius de Moraes, publicado em 1956, na primeira edição do ...
Tipologia: Notas de estudo
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Adilson Citelli* Professor titular do Departamento de Comunicações e Artes da ECA/USP, onde ministra cursos de graduação e pós-graduação. Orienta dissertações e teses nas áreas de Comunicação e Linguagem, com ênfase nas subáreas Comunicação/Educação, Comunicação/Linguagem. É coeditor da revista Comunicação & Educação , bem como pesquisador 1C do CNPq**^. E-mail: citelli@uol.com.br
Nesta edição, a revista Comunicação & Educação publica dois textos que explicitam uma série de contradições que matizam o modo de produção capita- lista, destacando, sobretudo, o problema da reificação, da apropriação alienada do trabalho. Sob andamentos um pouco diferentes, o tema do assujeitamento, da subsunção da vida humana aos interesses do capital, é elaborado em duas obras que já se tornaram clássicas: O operário em construção , poema de Vinicius de Moraes, publicado em 1956, na primeira edição do quinzenário Para Todos , e a canção de Chico Buarque, Construção , lançada em 1971, em LP de mesmo nome. Os dois textos relatam a trajetória de operários que laboram na cons- trução civil e se acham marcados pelas duras condições que acompanham suas atividades. Entretanto, como se verá, os textos revelam singularidades no modo de tratar o assunto; enquanto um indica falta de saída, criando um sufocante clima de impossibilidades, o outro aponta alternativas, mostrando um possível caminho para o trabalhador superar as condições que o degradam. Na canção de Chico Buarque, o elemento dramático se faz presente no primeiro verso: “Amou daquela vez como se fosse a última”, passagem que pre- nuncia a tragédia final do trabalhador. Na sequência das estrofes constituem-se os lineamentos desumanizadores do sujeito ante as coisas e as funções por ele exercidas: “Subiu a construção como se fosse máquina”, “Seus olhos embotados de cimento e lágrima”: fusão coisificadora de elementos espirituais e mate- riais; movimento que promove a alegoria da perda dos sentidos que deveriam singularizar o ser humano. Tudo isto evidencia a condição de não sujeito do trabalhador. Diante da opressão e da falta de saída no interior de um sistema que afirma a matéria em detrimento da subjetividade, da afetividade, dos ele- mentos de identidade, ao operário só cabe o final trágico e desumanizador: “E se acabou no chão feito um pacote flácido”. O poema de Vinicius de Moraes aborda, inicialmente, a contradição do sistema capitalista ao descrever a trajetória do trabalhador: “Sendo sua liberdade / Era a sua escravidão”. Em meio ao processo de alienação, o personagem do
texto passa por um processo de conscientização ao perceber que “Tudo naquela mesa / Garrafa, prato, facão / Era ele quem fazia / Ele um humilde operário / Um operário em construção”. Ao ganho de consciência, sucede a resistência ao sistema: “E foi assim que o operário / Do edifício em construção / Que sempre dizia sim / Começou a dizer não ”. Por fim, a redenção é apresentada através da possibilidade de o sujeito reinterpretar o universo que o circunda, adentrando um novo plano existencial: “O operário adquiriu / Uma nova di- mensão: / A dimensão da poesia”.
No dia 19 de junho de 1944, nasce, no Rio de Janeiro, Francisco Buar- que de Hollanda, o quarto dos sete filhos do historiador e sociólogo Sérgio Buarque de Hollanda e da pianista amadora Maria Amélia Cesário Alvim. Em São Paulo, o compositor fez o Ensino Fundamental e Médio no Colégio Santa Cruz, onde se apresentou pela primeira vez num palco com uma composição própria, Canção dos olhos. Em 1963, ingressa na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, cursando apenas até o terceiro ano. No ano seguinte, inscreve-se no festival promovido pela TV Excelsior com a canção Sonho de um Carnaval , cantada por Geraldo Vandré. Em 1965, lança sua primeira gravação, o compacto Olé Olá. Sua projeção nacional ocorreria logo depois, ao vencer o festival de MPB da TV Record, com a canção A banda. Em 1967, Chico Buarque estreia a peça Roda-viva , entretanto, com o acirra- mento da ditadura militar, o espetáculo é censurado. Em 1968, Chico exila-se na Itália. Voltando ao Brasil em 1970; produz, no ano seguinte, o álbum Construção. Em 1974, lança o álbum Sinal Fechado e inicia a carreira de escritor ao publicar a novela Fazenda modelo. Um ano depois, escreve com o dramaturgo Paulo Pontes a peça Gota d’água. Segue-se a Ópera do malandro , obra na qual Chico Buarque escreve e compõe as canções, e que resulta no Prêmio Molière de melhor autor teatral de 1978. Em 1979, publica o livro infantil O chapeuzinho amarelo. A partir de 1992 publica uma série de romances: Estorvo , com o qual ga- nha o Prêmio Jabuti de Literatura; Benjamin (1995); Budapeste (2003); e O leite derramado (2009).
Marcus Vinitius da Cruz e Mello Moraes nasce em 19 de outubro de 1913, no bairro da Gávea, no Rio de Janeiro, filho da pianista Lydia Cruz de Moraes e do poeta bissexto Clodoaldo Pereira da Silva Moraes. Escreve seu primeiro
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado E flutuou no ar como se fosse um pássaro E se acabou no chão feito um pacote flácido Agonizou no meio do passeio público Morreu na contramão atrapalhando o tráfego Amou daquela vez como se fosse o último Beijou sua mulher como se fosse a única E cada filho seu como se fosse o pródigo E atravessou a rua com seu passo bêbado Subiu a construção como se fosse sólido Ergueu no patamar quatro paredes mágicas Tijolo com tijolo num desenho lógico Seus olhos embotados de cimento e tráfego Sentou pra descansar como se fosse um príncipe Comeu feijão com arroz como se fosse máquina Dançou e gargalhou como se fosse o próximo E tropeçou no céu como se ouvisse música E flutuou no ar como se fosse sábado E se acabou no chão feito um pacote tímido Agonizou no meio do passeio náufrago Morreu na contramão atrapalhando o público Amou daquela vez como se fosse máquina Beijou sua mulher como se fosse lógico Ergueu no patamar quatro paredes flácidas Sentou pra descansar como se fosse um pássaro E flutuou no ar como se fosse um príncipe E se acabou no chão feito um pacote bêbado Morreu na contramão atrapalhando o sábado.
E o Diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe num momento de tempo todos os reinos do mundo. E disse-lhe o Diabo:
Era ele que erguia casas Onde antes só havia chão. Como um pássaro sem asas Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão. Mas tudo desconhecia De sua grande missão: Não sabia, por exemplo Que a casa de um homem é um templo Um templo sem religião Como tampouco sabia Que a casa que ele fazia Sendo a sua liberdade Era a sua escravidão.
De fato, como podia Um operário em construção Compreender por que um tijolo Valia mais do que um pão? Tijolos ele empilhava Com pá, cimento e esquadria Quanto ao pão, ele o comia… Mas fosse comer tijolo! E assim o operário ia Com suor e com cimento Erguendo uma casa aqui Adiante um apartamento Além uma igreja, à frente Um quartel e uma prisão: Prisão de que sofreria Não fosse, eventualmente Um operário em construção.
Mas ele desconhecia Esse fato extraordinário: Que o operário faz a coisa E a coisa faz o operário. De forma que, certo dia À mesa, ao cortar o pão O operário foi tomado De uma súbita emoção Ao constatar assombrado Que tudo naquela mesa
O operário em (des)construção • Adilson Citelli
E foi assim que o operário Do edifício em construção Que sempre dizia sim Começou a dizer não. E aprendeu a notar coisas A que não dava atenção:
Notou que sua marmita Era o prato do patrão Que sua cerveja preta Era o uísque do patrão Que seu macacão de zuarte Era o terno do patrão Que o casebre onde morava Era a mansão do patrão Que seus dois pés andarilhos Eram as rodas do patrão Que a dureza do seu dia Era a noite do patrão Que sua imensa fadiga Era amiga do patrão.
E o operário disse: Não! E o operário fez-se forte Na sua resolução.
Como era de se esperar As bocas da delação Começaram a dizer coisas Aos ouvidos do patrão. Mas o patrão não queria Nenhuma preocupação
Dia seguinte, o operário Ao sair da construção Viu-se súbito cercado Dos homens da delação E sofreu, por destinado Sua primeira agressão. Teve seu rosto cuspido Teve seu braço quebrado
O operário em (des)construção • Adilson Citelli
Mas quando foi perguntado O operário disse: Não!
Em vão sofrera o operário Sua primeira agressão Muitas outras se seguiram Muitas outras seguirão. Porém, por imprescindível Ao edifício em construção Seu trabalho prosseguia E todo o seu sofrimento Misturava-se ao cimento Da construção que crescia.
Sentindo que a violência Não dobraria o operário Um dia tentou o patrão Dobrá-lo de modo vário. De sorte que o foi levando Ao alto da construção E num momento de tempo Mostrou-lhe toda a região E apontando-a ao operário Fez-lhe esta declaração:
Disse, e fitou o operário Que olhava e que refletia Mas o que via o operário O patrão nunca veria. O operário via as casas E dentro das estruturas Via coisas, objetos Produtos, manufaturas. Via tudo o que fazia
pós-graduação em Direito da UFSC. Florianópolis: Fundação Boiteux, n. 47, p. 33-57, dez. 2003. Disponível em: http://www.buscalegis.ufsc.br/sequencia. Acesso em: 29 mar. 2010.
Chico Buarque: vida. Disponível em: http://www.chicobuarque.com.br/vida. Acesso em: 29 mar. 2010. “Construção”. Disponível em: <http://www.chicobuarque.com.br/construcao/ mestre.asp?pg=construc_71.htm>. Acesso em: 29 mar. 2010. “O operário em construção”. Disponível em: <http://www.viniciusdemoraes.com. br/poesia/index.php>. Acesso em: 29 mar. 2010. Vinicius de Morais: biografia. Disponível em: <http://www.releituras.com/ viniciusm_bio.asp>. Acesso em: 29 mar. 2010.