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Este texto discute a importância de considerar os animais não humanos como sentientes e capazes de sofrimento, baseando-se em evidências científicas e históricas. O autor questiona a justificativa moral de realizar experimentos em animais e propõe a importância de respeitar a igualdade de dor ou prazer entre todos os seres vivos.
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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Nascido em 1946 na Austrália, o filósofo e bioético Peter Singer iniciou sua carreira acadêmica em 1971 , ensinando ética na Universidade de Oxford. Em 1977 , Singer tornou-se professor de filosofia na Universidade de Monash, em Melboume, onde entrou para o Centro para a Bioética Humana, que se dedica a estudar as implicações morais das descobertas biomédicas, e ao qual esteve ligado até 1992_._ Desde 1999 Singer dá aulas no Centro para os Valores Humanos da Universidade de Princeton. Além de Libertação Animal ( 1975 ), Peter Singer é autor de Ética Prática ( 1979 ) e How Are We To Live? ( 1993 ).
Peter Singer Libertação Animal
Para Richard e Mary, e Ros e Stan, e - em especial - para Renata. Esta edição é ainda dedicada a todos os que mudaram as suas vidas para tornar mais próxima a Libertação Animal. Foram eles que tornaram possível acreditar que o poder do raciocínio ético pode sobrepor-se aos interesses da nossa espécie.
Índice Prefácio à edição de 1975 Prefácio à nova edição Agradecimentos 1 Todos os animais são iguais... ou por que razão o princípio ético sobre o qual assenta a igualdade humana nos obriga a ter igual consideração para com os animais 2 Instrumentos para a investigação... os seus impostos aplicados 3 Visita a uma unidade de criação intensiva... ou o que aconteceu ao seu jantar quando ele ainda era um animal 4 Ser vegetariano... ou como produzir menos sofrimento e mais alimento com um custo reduzido para o ambiente 5 O domínio do Homem… uma breve história do especismo 6 O especismo hoje... defesas, racionalizações e objeções ao movimento de Libertação Animal, e progressos efetuados na sua resolução Apêndices
Este livro não é sobre animais de estimação. Não é provável que constitua uma leitura confortável para aqueles que consideram que o amor pelos animais só se exprime fazendo uma festa ao gato ou dando comida aos pássaros do jardim. Destina-se, ao contrário, às pessoas que se preocupam com o fim da opressão e da exploração, onde quer que estas se encontrem, e pretendem que o princípio moral básico da igual consideração de interesses não se restrinja arbitrariamente à nossa própria espécie. A presunção de que é necessário ser "amante dos animais" para se interessar por estes assuntos constitui, em si mesma, uma indicação da ausência da menor idéia de que os padrões morais que aplicamos aos seres humanos deveriam abranger os outros animais. Ninguém, exceto um racista que pretenda insultar os seus adversários chamando-lhes "amantes dos pretos", sugeriria que se tem que adorar as minorias raciais - ou considerá-las engraçadas e fofinhas - para mostrar preocupação pela forma como são maltratadas. Sendo assim, por que presumir isto relativamente às pessoas que trabalham para a melhoria das condições dos animais? O retrato daqueles que protestam contra a crueldade para com os animais como "amantes dos animais", sentimentais e emotivos, teve como consequência a exclusão de toda essa questão do nosso tratamento dos não-humanos do debate político e moral sério. É fácil ver porque fazemos isto. Se considerarmos seriamente a questão, se, por exemplo, virmos de perto as condições em que os animais vivem nas explorações pecuárias modernas que produzem a carne que consumimos, podemos sentir-nos pouco à vontade em relação a sanduíches de presunto, à carne assada, à galinha frita e a todos os ingredientes da nossa dieta que preferimos não considerar como animais mortos. Este livro não faz apelos sentimentais à simpatia por animais "fofinhos". Não me choca mais a morte de cavalos ou cães com fins alimentares do que a morte de porcos para o mesmo fim. Quando o Ministério da Defesa dos Estados Unidos descobriu que a utilização de beagles nos testes de gases letais provocara uma onda de protestos e resolveu usar ratos, não me considerei satisfeito. Este livro constitui uma tentativa de pensar atenta e coerentemente a questão de como devemos tratar os animais não-humanos. No processo do raciocínio, expõe os preconceitos que subjazem às nossas atitudes e comportamentos atuais. Nos capítulos que descrevem o que essas atitudes significam em termos práticos
O título deste livro tem implícita uma idéia séria. É necessário um movimento de libertação que dê fim aos preconceitos e à discriminação baseados em características arbitrárias como a raça ou o gênero. O exemplo clássico é o movimento de Libertação dos Negros. A imediata atratividade deste movimento e o seu sucesso inicial, embora limitado, tornou-o num modelo para os outros grupos oprimidos. Depressa nos familiarizamos com o movimento de Libertação dos Homossexuais e de movimentos em prol dos índios americanos ou dos americanos falantes de castelhano. Quando um grupo maioritário - as mulheres - iniciou a sua campanha, alguns pensaram que se tinha atingido o fim. A discriminação baseada no gênero, disse-se, era a última forma de discriminação a ser universalmente aceita e praticada aberta e assumidamente, mesmo naqueles círculos liberais que há muito se orgulhavam da sua ausência de preconceitos relativamente às minorias raciais. Devemos sempre acautelar-nos ao falar da "última forma de discriminação subsistente". Se aprendemos alguma coisa com os movimentos de libertação, deve ter sido precisamente a dificuldade de reconhecimento de preconceitos latentes nas nossas atitudes relativamente a grupos específicos, até esses preconceitos nos serem apontados ostensivamente. Um movimento de libertação exige o alargamento dos nossos horizontes. As práticas que anteriormente eram consideradas naturais e inevitáveis passam a ser vistas como resultado de um preconceito injustificável. Quem pode afirmar com alguma confiança que nenhuma das suas atitudes e práticas pode ser posta legitimamente em causa? Se desejamos evitar ser contados entre os opressores, devemos estar dispostos a repensar as nossas atitudes face aos outros grupos, incluindo as mais básicas. Devemos considerar as nossas atitudes do ponto de vista daqueles que sofrem devido a elas e devido às práticas que lhes estão associadas. Se conseguirmos proceder a esta invulgar mudança de perspectiva mental, talvez consigamos descobrir um padrão nas nossas atitudes e práticas cujo objetivo é o favorecimento constante do mesmo grupo - geralmente o grupo ao qual nós mesmos pertencemos - à custa de outro grupo. Chegamos assim à conclusão de que há argumentos a favor do aparecimento de um novo movimento de libertação. O objetivo deste livro é levar o leitor a proceder a esta mudança de perspectiva mental nas suas atitudes e práticas relativas a um grupo muito vasto de seres: os membros das espécies que não a nossa. Acredito que as nossas atitudes atuais para com estes seres se baseiam numa longa história de preconceitos e discriminação arbitrária. Defendo que não pode haver qualquer razão - com exceção do desejo egoísta de preservar os privilégios do grupo explorador - para a recusa de inclusão de membros de outras espécies no princípio básico da igualdade. Peço ao leitor que reconheça que as suas atitudes relativas a membros de outras espécies constituem uma forma de preconceito não menos condenável do que o preconceito aplicado ao gênero ou raça de uma pessoa. Em comparação com outros movimentos de libertação, o movimento de Libertação Animal apresenta várias dificuldades. A primeira, e mais óbvia, é o fato de os membros do grupo explorado não poderem, por eles mesmos, protestar de forma organizada contra o tratamento que recebem (embora possam protestar, e o façam o melhor que podem, individualmente). Temos de ser nós a falar em nome daqueles que não podem fazer isso por si próprios. É possível constatar a gravidade dessa dificuldade se perguntarmos a nós próprios quanto tempo teriam de ter esperado os negros pela igualdade de direitos se não tivessem sido capazes de falar por si mesmos e de exigir tal igualdade. Quanto menos um grupo for capaz de se tornar visível e de se organizar contra a opressão, mais facilmente será oprimido.
Os princípios básicos da Libertação Animal são muito simples. Tentei escrever um livro claro e fácil de entender, que não requeresse conhecimentos particulares de qualquer tipo. No entanto, é necessário começar com uma análise dos princípios que formam a base daquilo que tenho a dizer. Apesar de não haver nesta obra nada que seja de compreensão difícil, os leitores não familiarizados com este tipo de análise poderão considerar o primeiro capítulo muito abstrato. Não se assustem. Nos capítulos seguintes passamos aos pormenores pouco conhecidos acerca da forma como a nossa espécie oprime as outras que se encontram sob o seu domínio. Não há nada de abstrato nesta opressão nem nos capítulos que a descrevem. Se as recomendações sugeridas nos capítulos seguintes fossem aceitas, pouparia-se uma dor imensa a milhões de animais. Mais ainda, milhões de humanos tirariam igualmente proveito dessa mudança. Enquanto escrevo, há pessoas que morrem de fome em muitos locais do mundo, e muitas mais encontram-se em perigo iminente de morte por subnutrição. O govemo dos Estados Unidos da América afirmou que, devido a colheitas escassas e a existências reduzidas de cereais, apenas podia fornecer um auxílio limitado
Prefácio à nova edição Reler o prefácio original deste livro é como regressar a um mundo semi-esquecido. As pessoas que demonstram preocupação pelos animais já não me oferecem sanduíches de presunto. Nos grupos do movimento da Libertação Animal, os ativistas são agora todos vegetarianos; mas mesmo no movimento mais conservador, a favor do bem-estar dos animais, existe alguma consciência da questão do consumo de animais como alimentação humana. Os que o fazem sentem-se constrangidos e prontificam-se a fornecer alternativas quando preparam refeições para terceiros. Existe uma nova consciência da necessidade de estender as simpatias aplicadas agora aos gatos e cães também a porcos, galinhas e mesmo ratos de laboratório. Não tenho certeza de qual seja a responsabilidade do livro Libertação Animal nesta alteração. Os jornalistas de revistas populares apelidaram-no "bíblia do movimento de libertação animal". Não posso deixar de me sentir lisonjeado, mas, ao mesmo tempo, sinto-me pouco à vontade. Não acredito em bíblias: nenhum livro tem o monopólio da verdade. Em todo o caso, nenhum livro pode conseguir seja o que for se não tocar os leitores. Os movimentos de libertação dos anos 60 tornaram a Libertação Animal um passo seguinte óbvio: este livro apenas reuniu os argumentos e deu-lhes uma forma coerente. O resto foi feito por algumas pessoas excelentes, eticamente empenhadas e trabalhadoras incansáveis - primeiro um punhado de pessoas, depois centenas, e, gradualmente, milhares e, agora, talvez milhões - que constituem o movimento de Libertação Animal. Dediquei-lhes esta edição revista porque, sem eles, a primeira edição teria conhecido o destino do livro de Henry Salt, Animal's Rights, publicado em 1892 e deixado a acumular pó nas prateleiras da biblioteca do Museu Britânico até, oitenta anos mais tarde, uma nova geração reformular os argumentos, tropeçar em referências obscuras e descobrir que já tudo tinha sido dito, mas sem resultado. Desta vez não será em vão. O movimento cresceu demais para isso. Já se alcançaram importantes benefícios para os animais. Outros ainda maiores estão por vir. A Libertação Animal é agora um movimento mundial e constituirá uma questão importante durante ainda muito tempo. As pessoas perguntam-me muitas vezes se estou satisfeito com o modo como o movimento cresceu. Pela maneira como formulam a questão, é claro que esperam que eu diga que nunca tinha sonhado que o livro pudesse ter tamanho impacto. Enganam-se. Pelo menos nos meus sonhos, todos os que lessem o livro diriam: "Sim, mas é claro..." e iriam imediatamente tornar-se vegetarianos, revoltados com o que fazemos aos animais, para que mais pessoas tivessem conhecimento da mensagem da Libertação Animal, e pelo menos as formas mais extremas e desnecessárias de sofrimento dos animais terminariam devido a uma irresistível onda de protesto público. É verdade que tais sonhos eram contrabalançados pela minha consciência das dificuldades: o conservadorismo da maioria de nós no que se refere àquilo que metemos no estômago; os interesses econômicos que lutariam até o último milhão para defender o seu direito à exploração dos animais, para deles retirar o lucro máximo; e o peso sólido da história e da tradição, que apóiam as atitudes que justificam a exploração. Portanto, deu-me prazer receber cartas e encontrar muitas, muitas pessoas que leram o livro e disseram: "Sim, mas é claro...", deixando de comer animais e tornando-se membros ativos do movimento de Libertação Animal. Retirei ainda mais prazer, claro, do fato de, depois de tantos anos de luta levada a cabo por tantas pessoas, o movimento de Libertação Animal ter se tornado uma realidade política e social. Mas, mesmo assim, não basta; nem sequer está lá perto. Como esta edição mostra claramente, o movimento teve ainda um impacto muito restrito nas principais formas de exploração dos animais.
Refiro-me a algumas das principais campanhas e vitórias do movimento tanto nas descrições da experimentação laboratorial e da criação intensiva como no capítulo final desta edição revista. Não tentei descrever as campanhas em pormenor, uma vez que alguns dos ativistas mais importantes já o fizeram num livro intitulado In Defense of Animals, que editei não há muito tempo. Mas há uma questão importante para o movimento que precisa ser abordada num local proeminente deste livro, e faço-o aqui. Trata-se da violência. Os ativistas aplicaram vários meios para se aproximarem do objetivo do movimento de Libertação Animal. Alguns procuraram alertar o público, distribuindo folhetos e escrevendo cartas para jomais. Outros exerceram pressão junto aos funcionários governamentais e aos seus representantes eleitos, com assento no Parlamento ou no Congresso. As organizações de ativistas promoveram manifestações e protestos no exterior de locais onde se inflige sofrimento aos animais para servir objetivos humanos menores. Mas muitos impacientaram-se com a evolução lenta conseguida por estes meios e pretenderam agir mais diretamente para fazer cessar de imediato o sofrimento. Ninguém que compreenda aquilo que os animais suportam pode criticar tal impaciência. Perante a contínua atrocidade, é muito pouco sentar-se e escrever cartas. Há necessidade de ajudar os animais imediatamente. Mas como? Os habituais canais legítimos de protesto político são lentos e incertos. Deveria-se arrombar as portas e libertar os animais? Isso é ilegal, mas a obrigação de obediência à lei não é absoluta. Ela foi justificadamente infringida por aqueles que ajudaram os escravos em fuga no Sul americano, para mencionar apenas uma comparação possível. Um problema mais sério reside no fato de a libertação literal dos animais dos laboratórios e das unidades de criação poder ser apenas um gesto simbólico, pois os investigadores vão se limitar a pedir mais um lote de animais, e quem conseguirá encontrar casa para mil porcos ou l mil galinhas? Os raids efetuados pelos grupos da Animal Liberation Front, em vários países, têm sido mais eficazes quando obtêm provas da violência exercida sobre os animais que, de outra forma, não seriam conhecidas. No caso do raid ao laboratório do Dr. Thomas Genriarelli, na Universidade da Pensilvânia, por exemplo, as fitas de vídeo conseguidas forneceram a prova que finalmente convenceu até mesmo o ministro dos serviços humanos e de saúde de que as experiências tinham que cessar. É difícil imaginar outra forma de alcançar este resultado, e só posso louvar as pessoas corajosas, empenhadas e refletidas que planejaram e realizaram esta ação específica. Mas há outras atividades ilegais de natureza bem diversa. Em 1982, um grupo auto-denominado "Animal Rights Militia" enviou cartas armadilhadas a Margaret Thatcher; em 1988, Fran Trutt, uma ativista a favor dos direitos dos animais, foi capturada enquanto colocava uma bomba no exterior dos escritórios da U. S. Surgical Corporation, uma empresa que vinha utilizando cães vivos para testar os seus instrumentos cirúrgicos de grampear. Nenhuma destas ações foi, de forma alguma, representativa do movimento de Libertação Animal. Nunca se tinha ouvido falar da Animal Rights Militia, tendo esta sido condenada de imediato por todas as organizações do movimento britânico de Libertação Animal. Trutt trabalhava isoladamente, e suas ações foram de imediato denunciadas pelo movimento americano. (As provas apresentadas sugeriram a existência de uma armadilha, pois ela foi conduzida aos escritórios da empresa por um informante pago, disfarçado, a soldo do consultor de segurança da U. S. Surgical Corporation.) No entanto, estas ações podem ser vistas como um dos extremos do espectro de ameaças e assédio de experimentadores, negociantes em peles e outros exploradores dos animais, e, portanto, é importante que os membros do movimento de Libertação Animal tornem clara a sua posição com relação a tais ações.
Seria um erro trágico que mesmo apenas uma pequena seção do movimento de Libertação Animal tentasse alcançar os seus objetivos ferindo pessoas. Alguns crêem que aqueles que fazem os animais sofrer merecem que também os façam sofrer. Não acredito na vingança, mas, mesmo que acreditasse, esta seria uma distração prejudicial à nossa tarefa de fazer cessar o sofrimento. Para o fazermos, é necessário mudar as mentes das pessoas da nossa sociedade. Podemos estar convencidos de que quem pratica a violência sobre os animais é completamente mau e insensível, mas nós próprios desceremos a esse nível se ferirmos ou ameaçarmos ferir essa pessoa. A violência apenas gera mais violência - isto é um lugar-comum, mas a sua verdade trágica pode constatar-se na meia dúzia de conflitos que se desenrolam neste momento no mundo. A força do argumento a favor da Libertação Animal reside no seu compromisso ético: ocupamos um território moral elevado - abandoná-lo será fazer o jogo daqueles que se opõem a nós. A alternativa à via da violência é prosseguir o caminho dos dois maiores - e, não por acaso, melhor sucedidos - líderes dos movimentos de libertação do nosso tempo: Gandhi e Martin Luther King. Com uma coragem e uma determinação imensas, eles defenderam sempre o princípio da não-violência, apesar das provocações e, frequentemente, dos ataques violentos dos seus opositores. No final, tiveram sucesso porque a justiça das suas causas não pôde ser negada, e o seu comportamento tocou mesmo aqueles que se lhes tinham oposto. Os malefícios que infligimos às outras espécies são igualmente inegáveis, uma vez vistos com clareza; e é na justeza da nossa causa, e não no medo das nossas bombas, que residem as nossas possibilidades de vitória. Agradecimentos É prática corrente agradecer a todos aqueles que ajudaram na elaboração de um livro; mas, no caso presente, as minhas dívidas são de um tipo especial, que apenas pode ser definido através de uma breve narrativa. No outono de 1970 eu era estudante de licenciatura na Universidade de Oxford. Embora me tivesse especializado em filosofia moral e social, não me tinha ocorrido - não mais do que ocorre à maioria das pessoas - que as nossas relações com os animais colocavam uma séria questão moral. Claro que eu sabia que alguns animais eram tratados de forma cruel, mas presumia que se tratava de abusos casuais que não constituíam indicação de algo seriamente errado.
O convite para assumir um lugar como convidado no Departamento de Filosofia da Universidade de Nova lorque durante o ano letivo de 1973-74 ofereceu-me uma atmosfera favorável e um local ideal para investigar e escrever, e os meus colegas e estudantes teceram valiosos comentários e críticas. Também tive oportunidade de submeter as minhas opiniões sobre os animais ao escrutínio crítico dos estudantes e dos membros dos departamentos de filosofia das seguintes universidades: Brown University, Fordham University, Long Island University, North Carolina State University de Raleigh, Rutgers University, New York State University de Brockport, New York State University de Stony Brook, Tufts University, University of California de Berkeley, University of Miami e Williams College, e na Yale Law School e num encontro da Society for Philosophy and Public Affairs, em Nova lorque. Os capítulos 1 e 6 deste livro se beneficiaram consideravelmente dos debates que se seguiram às minhas conferências. Finalmente, tenho de agradecer aos redatores e editor do The New York Review of Books pelo seu apoio ao livro, e, em especial, a Robert Silvers, cujo sábio aconselhamento editorial melhorou consideravelmente o manuscrito original. Resta apenas acrescentar que quaisquer imperfeições remascentes são de minha inteira responsabilidade. P. S. Fevereiro de 1975
Agradecimentos da edição revista Tantas pessoas, de todo o mundo, ajudaram a preparar esta edição revista, que certamente deixarei alguém de fora, fato pelo qual peço desculpa. Por vezes, a ajuda consistiu na leitura de rascunhos, outras vezes, no envio de material que me permitiu manter-me atualizado relativamente aos desenvolvimentos ocorridos em vários países. Eis uma lista, sem qualquer ordem específica: Don Barnes e Melinda Moreland da National Anti-Vivisection Society (EUA), Alex Hershaft do Farm Animal Reform Movement, MacDonald White e Ann St. Laurent da United Action for Animais, Joyce D'Silva e Carol Long da Compassion in World Farming, Clare Druce e Violet Spalding da Chickens'Lib, Henry Spira do Animal Rights International, Brad Miller da Humane Farming Association, Kim Stallwood e Carla Bennett da People for the Ethical Treatment of Animals, Peter Hamilton da Lifeforce, Maria Comninou da Ann Arbor Association for Responsible Animal Treatment, George Cave da Trans-Species Unfirnited, Paola Cavalieri da Etica & Animali de Milão, Birgitta Carlsson da Swedish Society Against Painful Experiments on Animals, Detlef Fölsch do Institute of Animal Sciences do Swiss Federal Institute of Technology, Charles Magel, John Robbins, Richard Ryder, Clive Hollands e Jim Mason. São devidos agradecimentos especiais a Lori Gruen, que atuou como uma espécie de coordenadora nos Estados Unidos, reunindo novo material e ajudando-me a atualizar o material existente relativo aos capítulos sobre experimentação e criação intensiva. Também me fez valiosas sugestões com base num rascunho do livro integral. Por sua vez, Lori deseja agradecer, para além dos acima referidos, às seguintes pessoas que lhe passaram as informações: Diane Halverson do Animal Welfare Institute; Avi Magidoff, Jeff Diner e Martin Stephens, cujo trabalho sobre aspectos da experimentação com animais nos Estados Unidos se revelou um recurso valioso; e Ken Knowles e Dave Macauley. As minhas revisões do capítulo sobre criação intensiva foram ainda auxiliadas por uma contribuição preparada com grande zelo e conhecimento por Suzanne Pope e Geoff Russell para a Australian and New Zealand Federation of Animal Societies. Os meus comentários acerca dos peixes e das pescas também receberam o contributo de outro excelente relatório, preparado para a Animal Liberation (Victoria) por Patty Mark. Finalmente, devo de novo muito ao The New York Review of Books : a Robert Silvers, pelo seu apoio à idéia de uma nova edição e pela aplicação dos seus excelentes dotes críticos no processo da sua edição; a Rea Hederman, que dirigiu as várias fases da publicação; e a Neil Gordon, que procedeu à composição com grande cuidado e atenção ao pormenor. P. S. Novembro de 1989
Capítulo 1 Todos os animais são iguais... ou por que razão o princípio ético sobre o qual assenta a igualdade humana nos obriga a ter igual consideração para com os animais "Libertação Animal" pode soar mais como paródia dos outros movimentos de libertação do que como um objetivo sério. Na realidade, a idéia de "Os Direitos dos Animais" foi usada outrora para parodiar a causa dos direitos das mulheres. Quando Mary Wollstonecraft, uma precursora das feministas atuais, publicou a sua Vindication of the Rights of Woman , em 1792, as suas opiniões eram de um modo geral consideradas absurdas, e surgiu logo a seguir uma publicação intitulada A Vindication of the Rights of Brutes. O autor desta obra satírica (que se sabe agora ter sido Thomas Taylor, um distinto filósofo de Cambridge) tentou refutar os argumentos avançados por Mary Wollstonecraft demonstrando que eles poderiam ser levados um pouco mais longe. Se o argumento da igualdade se podia aplicar seriamente às mulheres, por que não aplicá-lo aos cães, gatos e cavalos? O raciocínio parecia poder aplicar-se igualmente em relação a estas "bestas"; no entanto, afirmar que as bestas tinham direitos era manifestamente absurdo. Por conseguinte, o raciocínio através do qual se alcançara esta conclusão tinha de ser incorreto, e se estava incorreto quando aplicado às bestas, também o estaria quando aplicado às mulheres, uma vez que em ambos os casos haviam sido utilizados os mesmos argumentos. Por forma a explicar o fundamento da argumentação a favor da igualdade dos animais, seria útil começar com uma análise da argumentação a favor da igualdade das mulheres. Vamos assumir que pretendíamos defender a causa dos direitos das mulheres contra o ataque levado a cabo por Thomas Taylor. Como lhe deveríamos responder?
Uma forma possível de resposta consistiria em afirmar que a causa da igualdade entre homens e mulheres não pode ser validamente ampliada aos animais não humanos. As mulheres têm o direito de votar, por exemplo, porque são tão capazes de tomar decisões racionais acerca do futuro como os homens; por outro lado, os cães são incapazes de compreender o significado do voto, portanto não podem ter direito a votar. Há muitos outros aspectos óbvios em que os homens e as mulheres se assemelham muito, enquanto humanos, e os animais diferem consideravelmente. Portanto, poderia dizer-se que os homens e as mulheres são seres similares e deverão ter direitos similares, ao passo que os humanos e os não humanos são diferentes e não deverão ter direitos iguais. O raciocínio que subjaz a esta resposta à analogia de Taylor encontra-se correto até certo ponto, mas não vai suficientemente longe. Há importantes diferenças óbvias entre os humanos e os outros animais, e estas diferenças devem traduzir-se em algumas diferenças nos direitos que cada um tem. Todavia, o reconhecimento deste fato não constitui obstáculo à argumentação a favor da ampliação do princípio básico da igualdade aos animais não humanos. As diferenças que existem entre homens e mulheres também são igualmente inegáveis, e os apoiantes da Libertação das Mulheres têm consciência de que estas diferenças podem dar origem a diferentes direitos. Muitas feministas defendem que as mulheres têm o direito de praticar o aborto através de simples pedido. Não se conclui daqui que, uma vez que estas feministas defendem a igualdade entre homens e mulheres, deverão igualmente apoiar o direito dos homens ao aborto. Como os homens não podem praticar o aborto, não faz sentido falar do direito masculino à prática do aborto. Uma vez que os cães não podem votar, não faz sentido falar do direito canino ao voto. Não há razão para tanto a Libertação das Mulheres como a Libertação Animal se envolverem nestas discussões absurdas. A extensão do princípio básico da igualdade de um grupo a outro não implica que devamos tratar ambos os grupos exatamente da mesma forma, ou conceder os mesmos direitos aos dois grupos, uma vez que isso depende da natureza dos membros dos grupos. O princípio básico da igualdade não requer um tratamento igual ou idêntico; requer consideração igual. A consideração igual para com os diferentes seres pode conduzir a tratamento diferente e a direitos diferentes. Existe, assim, um modo diferente de responder à tentativa de Taylor de parodiar a causa dos direitos das mulheres, um modo que não nega as diferenças óbvias existentes entre seres humanos e não humanos mas vai mais ao fundo da questão da igualdade e conclui por não encontrar nada de absurdo na idéia de o princípio básico da igualdade se aplicar às chamadas bestas. Neste momento, a conclusão pode parecer estranha mas, se analisarmos com maior rigor aquilo em que, em última instância, assenta o fundamento da nossa oposição à discriminação com base na raça ou no sexo, veremos que estaríamos em terreno pouco firme se pretendêssemos exigir igualdade para os negros, as mulheres e os outros grupos de humanos oprimidos e não o fizéssemos relativamente aos não humanos. Para esclarecer este ponto temos de, em primeiro lugar, ver por que razão o racismo e o sexismo são errados. Quando dizemos que todos os seres humanos, independentemente da sua raça, credo ou sexo, são iguais, o que estamos a afirmar, especificamente? Aqueles que desejam defender sociedades hierárquicas e desiguais muitas vezes observaram que, seja qual for o teste que façamos, simplesmente não é verdade que todos os seres humanos são iguais. Quer gostemos, quer não, temos de nos render à evidência de que os seres humanos têm diferentes tamanhos e feitios, diferentes capacidades morais, diferentes capacidades intelectuais, diferente intensidade de sentimentos de benevolência e sensibilidade às necessidades de terceiros, diferentes capacidades de comunicação e diferentes capacidades para experimentar o prazer e a dor. Resumindo, se a exigência de igualdade se baseasse na verdadeira igualdade de todos os seres humanos, teríamos de deixar de a fazer.