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Participação Popular nas Políticas Públicas , Manuais, Projetos, Pesquisas de Serviço Social

É parte de uma pesquisa realizada pelo Instituto Pólis e pelo Programa Mercosul Social e Solidário. Maria do Carmo Alburquerque

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2015

Compartilhado em 16/04/2015

jocelma-diiniiz-6
jocelma-diiniiz-6 🇧🇷

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Participação Popular nas
Políticas Públicas
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Participação Popular nas

Políticas Públicas

Maria do CarMo albuquerque

organização

O Instituto Pólis conta com o apoio solidário de: Action Aid CCFD - Comité Catholique contre la Faim et pour le Développement EED – Evangelischen Entwicklungsdienst (El Servicio de las Iglesias Evangélicas en Alemania para el Desarrollo) FPH – Fondation Charles Léopold Mayer Frères des Hommes Fundação Ford Fundação Friedrich Ebert / ILDES IDRC/CIID – Centro Internacional de Investigaciones para el Desarollo NOVIB OXFAM CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÃO DO INSTITUTO PÓLIS ALBUQUERQUE, Maria do Carmo, (Org.) Participação popular em políticas públicas: espaço de construção da demo- cracia brasileira. – São Paulo: Instituto Pólis, 2006. 124p.

  1. Políticas Públicas. 2. Políticas Sociais. 3. Participação Cidadã. 4. Reforma do Estado. 5. Política de Habitação. 6. Política de Assistência Social. 7. Política de Segurança Alimentar e Nutricional. 8. Política de Defesa da Criança e do Adolescente. 9. Conselhos Gestores de Políticas Públicas. I. Título. II. Instituto Pólis. III. Série. Fonte: Vocabulário Instituto Pólis/CDI Organizadora: Maria do Carmo Albuquerque Coordenação Editorial: Paula Freire Santoro Assistente Editorial: Cecilia Bissoli e Iara Rolnik Xavier Revisão de Texto: Cecilia Bissoli e Veronika Paulics Editoração: Paula Freire Santoro

Apresentação 5 Introdução Maria do Carmo Albuquerque 9 Mudanças recentes no Estado brasileiro: a reforma do modelo nacional desenvolvimentista - entre a garantia de direitos e a abertura do mercado Cibele Franzese 15 Política Habitacional no Brasil A História e os Atores de uma Narrativa Incompleta Renato Cymbalista e Tomás Moreira 31 A Política de Assistência Social no Brasil A Assistência Social como política de proteção social Dirce Koga 49 Políticas Públicas de atenção à infância e adolescência no Brasil Uma breve abordagem sobre origens, diagnóstico e perspectivas Marcelo Nastari 65 Políticas Públicas em Saúde e Participação Popular Luíza Heimann e Jorge Kayano 85 Participação e Políticas Públicas na Segurança Alimentar e Nutricional no Brasil Christiane Costa e Mariana Pascoal 97 Participação no Brasil: dilemas e desafios contemporâneos Tatiana de Amorim Maranhão e Ana Claudia Chaves Teixeira 109

Sumário

Apresentação

Esta revista é parte de uma pesquisa realizada pelo Instituto Pólis e pelo Programa Mercosul Social e Solidário. Este programa articula experiências participativas em cinco países do cone sul: Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai. O resultado da pesquisa foi publicado^1 em 2006 com o título “De- mocracia y ciudadanía en el Mercosur” e apresenta estudos de caso sobre a participação da sociedade civil nas políticas públicas nos cinco países. As ONGs que participam do Programa definiram linhas comuns para esta pesquisa, que buscou iluminar a participação da sociedade civil na construção das políticas que garantem direitos sociais nos cinco países. A pesquisa deu seqüência a uma primeira publicação do Programa, intitulada “La construcción democrática desde abajo en el cono sur^2 ” na qual as mesmas ONGs buscaram reescrever a história da construção da democracia em seus países, desde a ótica da participação da sociedade. A segunda publicação enfatiza a construção das políticas públicas que garantem direitos sociais. Nesta publicação encontra-se uma breve história de algumas das principais políticas sociais, bem como os recentes impactos de receitas e agendas neoliberais de reformas, as distintas formas como um setor democrático da sociedade civil vem reagindo a estas agendas e buscando intervir na construção de uma agenda democrática de reformas das políticas sociais. A pesquisa, nos cinco países, pautou-se por estas mesmas premissas, relacionando-se, no entanto, com realidades diversas. Embora com caracterís- ticas comuns, a construção da democracia, da cidadania e a participação da sociedade em políticas públicas apresentam formas bastante distintas nestes países. Se, por um lado, todos eles enfrentaram ditaduras militares nos anos 70 e 80, e uma nova sociedade civil engajou-se nas lutas contra estas ditaduras e pela reconstrução e ampliação da democracia, são distintas as trajetórias históricas de conformação da sociedade civil, de construção das instituições públicas, dos partidos políticos assim como as relações entre estes atores e as políticas sociais. Estas distintas realidades e os diferentes enfoques sobre a relação entre a sociedade e as políticas públicas revelam-se nas distintas ênfases dos diversos artigos. O livro que ora apresentamos é a parte brasileira desta pesquisa. Ele dialoga, conseqüentemente, com estas diferenças e segue o mesmo objetivo de avaliar a participação da sociedade civil na construção de uma agenda atual de reforma das políticas sociais. 1 Ver GARCÉS, Mario, GI- RALDEZ, Soraya. GOLDAR, María Rosa, ALBUQUERQUE, Maria do Carmo. RIQUELME, Quintín, BURONI, Teresa (coords.). 2006. Democracia y ciudadanía en el Mercosur. Santiago: LOM Ediciones 2 Ver ALBUQUERQUE. Maria do Carmo (org.). 2002. La Construcción democrática desde abajo en el Cono Sur. São Paulo: Instituto Pólis.

O Brasil, no entanto, distingue-se bastante dos demais quatro países do cone sul. O protagonismo da sociedade civil na reconstrução democrática que se seguiu à ditadura militar é mais destacado, expressando-se especialmente no processo da Constituinte. A nova Constituição consagrou a criação de es- paços institucionais que garantiram a continuidade da participação popular que marcou as lutas contra a ditadura. A criação de conselhos e conferências de políticas públicas vem buscando, ao longo dos anos, propiciar a incidência da sociedade na elaboração e na gestão de políticas sociais. A construção destes espaços não tem sido fácil. As disputas entre inte- resses mais e menos democráticos é intensa, a precariedade de uma cultura democrática e participativa se faz notar tanto na burocracia estatal como nas organizações da sociedade e no setor privado, dificultando a consolidação dos espaços de diálogo e negociação sobre as políticas. Além destas dificuldades, esta agenda de reforma democrática do Estado, confronta-se, desde seu mo- mento inaugural pós-Constituição, com uma hegemonia crescente de agendas neoliberais de reforma do Estado. São estas as disputas que esta publicação busca apresentar. Traz um pa- norama da trajetória e desafios da participação cidadã no Brasil hoje, sobre as disputas em torno das agendas de reforma do Estado, e enfoca a trajetória de construção de cada uma de cinco políticas sociais que se destacam pela presença constante de uma ativa participação social. Ao enfatizar as distintas relações entre Estado e sociedade no desenho e na gestão destas cinco políticas, a revista ilumina alguns dos dilemas que permeiam o debate atual sobre as reformas do Estado, sobre formas de gestão pública, sobre o papel do Estado, da sociedade civil e do setor privado nas políticas públicas e sobre o controle público sobre elas.

1 Esta expressão se origina na obra de Sérgio Buar- que de Hollanda “Raízes do Brasil”.

Introdução

Maria do Carmo
Albuquerque

Pesquisadora do Instituto Pólis e do Programa Mercosul Social e Solidário. O Brasil é um país marcado pela desigualdade e por uma cultura do privilégio e do favor que predomina sobre a consciência dos direitos. É nesse contexto que o empenho de setores democráticos da sociedade civil, especialmente os movimentos sociais vêm, desde as lutas contra a ditadura militar e pela con- quista de uma Constituição Cidadã, em 1988, convergindo para a construção de políticas públicas inclusivas, que buscam garantir direitos universais e o direito da sociedade civil exercer um controle público sobre elas. O Brasil compartilha com os demais países do Cone Sul uma herança colo- nial marcada pela dizimação dos povos indígenas e por um processo tortuoso de construção nacional vinculado aos interesses econômicos das metrópoles. Portugal, Espanha, Inglaterra e, mais recentemente, os Estados Unidos polariza- ram fortemente os movimentos e decisões econômicas e políticas nestes países. A implantação do Estado nacional ocorreu sobre nações que se constituíram a partir de sociedades indígenas, incluindo povos africanos, amalgamados sob relações autoritárias e violentas com povos europeus. Nestas condições se articularam formas tradicionais e formas ocidentais de relações sociais e concepções sobre o indivíduo, a sociedade e o poder que coexistem de forma complexa e contraditória até os dias de hoje. Apesar destas semelhanças, o Brasil se distingue dos vizinhos países de colonização hispânica por algumas características importantes. Entre elas a escravidão negra, que perdurou por quase 4 séculos (até 1888) e desenvol- veu-se de modo peculiar, abrangendo quase todo o território nacional. Ao contrário de outros países, as relações escravocratas no Brasil propiciaram uma convivência ao mesmo tempo “familiar” e cruel entre senhores e escravos que compartilhavam o mesmo espaço doméstico, gerando a cultura do chamado compadrio, do favor e da subserviência. Os filhos do senhor com as escravas ou os seus protegidos aprenderam que a docilidade era uma via de ascensão social – que é assim entendida como favor e não como direito. Daí se desenvolve uma espécie de “cordialidade”^1 que marca a cultura brasileira com uma certa aversão ao conflito.

como as “classes perigosas”. Constituem-se Institutos que provêm assistência médica e organizam projetos habitacionais para trabalhadores formais. A saúde pública volta-se apenas a alguns grupos prioritários como bebês, mulheres grávidas e pessoas afetadas por doenças contagiosas. Entre o final dos anos 50 e o início dos anos 60 houve uma forte mobiliza- ção sindical, camponesa e social, que se associa ao chamado movimento pelas “reformas de base”. Foram antecedentes de movimentos que persistem até hoje na sociedade como o movimento pela reforma agrária, reforma urbana, reformas na educação e o movimento sanitarista. O golpe militar de 64 interrompeu estas mobilizações e reorientou estas propostas, restando a unificação dos institutos de saúde, aposentadoria e pensões e o surgimento do Sistema Financiamento da Habitação (SFH), que produziu uma política habitacional forte e centralizada. A centralização também caracterizou políticas voltadas ao “menor”. A resistência e a luta contra a ditadura provocaram o surgimento de novas formas de organização na sociedade brasileira. A perseguição aos partidos de esquerda e aos movimentos sindical, camponês e estudantil gerou a politização de novos espaços de organização social como os bairros, as questões de gênero, de etnias, do meio ambiente, das crianças e jovens marginalizados. Estes novos movimentos sociais emergiram na cena pública questionando o autoritarismo e o centralismo da ditadura militar e colocando em pauta a exigência de direitos

  • civis, sociais e políticos – e o direito de participar da definição das políticas que viessem a garantir esses direitos. Um vigoroso movimento de participação popular na Assembléia Constituinte propiciou o surgimento de uma nova sociedade civil democrática, articulando movimentos populares e associações profissionais que contribuíram para a sistematização das reivindicações populares. Reivindicações convertem-se assim em propostas de políticas públicas que visaram garantir, através do novo ordenamento constitucional, a universalização de direitos que jamais houvera na sociedade brasileira. Desta forma foram elaboradas “emendas populares” à Constituinte, arti- culando forças sociais que coletaram centenas de milhares de assinaturas em torno de propostas de políticas públicas como a liberdade sindical, a reforma agrária, a reforma urbana, a criação de um sistema único de saúde, a criação de políticas públicas de Assistência Social e de atenção à criança e ao adolescente. A natureza participativa deste processo de elaboração de políticas públicas, bem como a necessidade de enfrentar a tradicional impermeabilidade, autoritarismo e centralismo do Estado brasileiro, marcaram as propostas elaboradas com exigên- cias de descentralização e de criação de instrumentos de participação e controle social sobre estas políticas, nos âmbitos federal, estadual e municipal. Aprovaram-se então, em decorrência da nova Constituição, a lei federal que criou o Sistema Único de Saúde (SUS), o Estatuto da Criança e do Adoles- cente (ECA) e a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS). Somente em 2001 se conseguiu aprovar o Estatuto da Cidade, que possibilita a constituição de

um sistema descentralizado e participativo de política urbana, semelhante aos demais. Estas políticas foram escolhidas por nós como representativas do en- gajamento de um setor dos movimentos sociais e da sociedade civil brasileiros na ampliação dos direitos e da democracia em nosso país. Agregamos a estas a construção – ainda que posterior a esta cronologia – de uma outra política pública que se destaca hoje como um desafio especialmente relevante no mun- do e no âmbito do Mercosul. Assim como as demais, a política de Segurança Alimentar foi pautada por uma campanha popular, conhecida como “Ação da Cidadania Contra a Fome”. Os textos a seguir recuperam a trajetória de constituição do Estado brasileiro e de algumas das políticas públicas que tiveram uma destacada participação da sociedade na sensibilização do Estado para o problema social e na elaboração e conquista de uma legislação que busca garantir a efetivação, ainda que tardia, de direitos universais. A aprovação da chamada “Constituição Cidadã” significou o momento de vitória de um projeto democrático de reforma do Estado brasileiro e o engajamento de um setor importante da sociedade civil, protagonizado por movimentos sociais nesta construção democrática. Esta vitória, no entanto, coincidiu com um vigoroso movimento neolibe- ral que se disseminou no mundo todo, acompanhando as crises dos Estados nacionais frente à reorganização global da economia e do mundo do trabalho e ao fim da Guerra Fria. Crises econômicas, fiscais, inflacionárias, abertura fi- nanceira e industrial provocaram, de forma diferenciada, a busca dos Estados latino-americanos por soluções que incluíram a adoção de ajustes fiscais e propostas neoliberais de reformas do Estado. No Brasil este movimento ocorre a partir do governo de Fernando Collor de Melo (1990), observando-se então um forte refluxo na implementação das políticas aprovadas na Constituição, dois anos antes. Uma “contra-reforma” neoliberal passa então a frear a aprovação das leis que viriam a regulamentar as novas políticas constitucionais de direitos. Estabelece-se uma forte disputa entre os setores democráticos presentes na sociedade e em diversos governos sub-nacionais e os setores que defendem as novas reformas. Além da morosidade e do retrocesso na aprovação da le- gislação de garantia de direitos, o orçamento nacional é fortemente ajustado às novas exigências dos mecanismos internacionais que buscam equacionar o pagamento da dívida externa. Uma nova legislação (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF) busca inserir os municípios nas políticas de ajuste, limitando as suas possibilidades de atender às novas demandas por direitos atribuídas aos municípios pelo processo de descentralização. Os textos que seguem apresentam o relato desta disputa que provoca, em muitos casos, o contraste entre uma legislação avançada e a extrema limitação dos resultados obtidos em cada área de política pública. Apresentam a mobili- zação constante de segmentos democráticos da sociedade civil que avançam na participação cidadã e no controle social, construindo sistemas de informações

Mudanças recentes no

Estado brasileiro

a reforma do modelo nacional desenvolvimentista – entre a garantia de direitos e a abertura do mercado

Cibele Franzese

Graduada em Direito pela Uni- versidade de São Paulo e mes- tranda em Administração Pública e Governo pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo.

Introdução

O Estado brasileiro vem, ao longo dos anos, passando por diferentes refor- mas. Todavia, não obstante a implementação de uma série de modificações na maneira de sua organização e atuação, algumas características de modelos anteriores permaneceram, resultando em um Estado complexo, que convive ao mesmo tempo com aspectos não superados – como o patrimonialismo – e novas tendências – como a modernização administrativa e princípios da ad- ministração pública gerencial. A própria formação do Estado brasileiro foi um processo de “mudança gradual”, em que elites emergentes e tradicionais coexistiriam através de um processo de acomodação “onde observa-se a permanência das estruturas an- tigas, delineando-se um processo em que ocorre a “colocação de novos rótulos em velhas garrafas” (DINIZ e BOSCHI, 1996, p.13). Nesse sentido, um panorama da Reforma do Estado no Brasil pode apresen- tar diferentes marcos históricos de análise, que são sem dúvida importantes e influenciam as características do atual modelo de Estado – desde o legado do modelo de colonização português (1500 a 1822) e o Império (de 1822 a 1889), passando pela proclamação da República e pela política dos governadores ( a 1930); a revolução de 30 e o primeiro governo do Presidente Getulio Vargas (1930 a 1945); os governos militares pós 1964; o período de redemocratização e a Constituição de 1988; as privatizações no governo do Presidente Fernando Collor de Mello (1989 a 1992), o plano econômico que levou à estabilização da moeda (que passou a ser denominada Real) e os dois governos do Presi-

Uma breve contextualização histórica: o Estado Nacional
Desenvolvimentista no Brasil

O território que se transformou no Brasil foi colonizado por Portugal, de quem se tornou independente em 1822, passando de colônia a Império. Foi Império até 1889, quando foi proclamada a República. Em 1891, entrou em vigor a primeira Constituição Federal Brasileira, estabelecendo como grande novidade que o Brasil se tornava uma República Federativa, constituída por dois níveis de governo – os estados e a União. É interessante observar que no Brasil, ao contrário do que ocorrera nos Estados Unidos, a formação de um Estado federativo se deu a partir de uma dinâmica de descentralização, distribuindo o poder, antes centralizado na mão do imperador, às oligarquias locais, presentes nos territórios que passaram a ser denominados estados. Nos Estados Unidos, ao contrário, a formação da federação foi resultado de um processo de cen- tralização no qual os estados – pré-existentes à União – decidiram abrir mão de parte de sua autonomia para que fosse criado um governo central. Apesar dessa considerável diferença, a primeira Constituição Federal Brasileira seguiu em grande parte o modelo norte-americano. Do período pós-constituição até 1930 as oligarquias estaduais foram con- quistando progressiva autonomia, com destaque para os estados com maior poder econômico, advindo da exportação de café – notadamente São Paulo e Minas Gerais. Nesse período o Brasil tinha eleições, com sufrágio restrito a uma pequena parte da população (masculina e proprietária, o chamado “voto censitário”), e controladas pelas oligarquias locais. Essa situação levou a uma alternância entre os governadores desses dois estados – representantes dos fazendeiros de café de São Paulo e Minas Gerais – no comando da Presidência da Republica, acordo que ficou conhecido como “política dos governadores”. Essa política perdurou até o ano de 1930, quando por disputas internas nas oligarquias locais, formou-se uma nova coalizão entre alguns dos estados brasileiros – favorecendo-se de uma cisão no acordo entre São Paulo e Minas Gerais – que culminou em uma “revolução”, que conduziu ao poder o político gaúcho Getulio Vargas. O governo do Presidente Getúlio Vargas, iniciado após a revolução de 1930, é considerado um marco na história do Estado brasileiro. Nesse período ocorreu uma forte centralização do Estado, que passou a intervir na economia e nas relações sociais de forma marcante, auxiliado por um processo de burocratiza- ção da administração e apoiado no autoritarismo. Nos quinze anos da ditadura Vargas (de 1930 a 1945), o Estado brasileiro passa de uma estrutura de Estado federal-oligárquica, na qual os governadores gozavam de significativo poder e autonomia, para um modelo nacional-centralizado. (FORJAZ, 1982) A centralização do Estado se deu a partir da nomeação, pelo Presidente, de interventores federais nos estados, da implementação de um Departamento Administrativo do Serviço Público em nível federal (o DASP) e sua replicação em departamentos estaduais (os chamados “daspinhos”). A função principal

dos DASPs estaduais era controlar os interventores, de forma a impedir que, com o passar do tempo, estes fossem cooptados pelas oligarquias estaduais e passassem a privilegiar os interesses locais em detrimento dos federais. Esse processo de centralização levou à construção de uma extensa máquina buro- crática, sem controle do Legislativo, nem mesmo da sociedade. Esse mesmo Estado autoritário e centralizado investiu fortemente no controle da sociedade, burocratizando e cooptando grupos sociais, de forma a implementar no Brasil o que já se desenvolvia na Itália de Mussolini e passou a ser denominado de corporativismo. Esse modelo apóia-se em uma capacidade do governo de incorporar conflitos sociais como se fossem questões estatais e não pertencessem de fato ao espaço da sociedade, verificando-se “uma ten- dência de que o Estado se antecipe à ação potencialmente conflitiva de grupos e classes sociais, atendendo parcialmente às suas demandas e instaurando um formato que situa de antemão os parâmetros da participação desses grupos” (DINIZ e BOSCHI, 1996, p.14). Esse padrão de relações entre Estado e sociedade pode ser claramente observado na legislação trabalhista e sindical promulgadas no Brasil nessa época, onde o Estado se relacionava com a sociedade civil por meio das corporações profissionais. Essa estrutura corporativa permitiu que o governo tivesse domínio sobre a classe trabalhadora sindicalizada por uma série de instrumentos legais. Dentre eles destacam-se a necessidade de autorização do governo para que qualquer sindicato pudesse começar a existir e a contribuição sindical – uma verba responsável pela sustentabilidade dos sindicatos, que não advinha da contri- buição de seus filiados, mas do desconto de um dia de trabalho de qualquer trabalhador formalmente contratado, sendo o recolhimento e a distribuição deste dinheiro administrados pelo governo federal. Além dos instrumentos legais o governo influenciava diretamente a ação dos sindicatos cooptando suas lideranças de forma a amenizar possíveis conflitos. A figura desse líder cooptado ficou conhecida, por metáfora, como “pelego” – palavra que significa tecido que fica entre a cela e o cavaleiro, com a função de amortecer o impacto durante a cavalgada. O controle do governo sobre a estrutura sindical e a adoção de políticas salariais, instituindo os primeiros salários mínimos, também representaram, ao lado do controle cambial e do estabelecimento de cotas de exportação, me- canismos de intervenção do Estado na economia. A caracterização do modelo de Estado Nacional Desenvolvimentista brasileiro se deu, tanto em razão dessa atuação estatal reguladora, como também por uma forte intervenção direta do Estado na economia. Houve investimento público – em empresas mistas e estatais – em uma série de áreas (minério de ferro, produção de motores para caminhões e aviões etc), destacando-se a criação da Companhia Siderúrgica Nacional, em 1941 (SKIDMORE, 1982). A lógica das corporações também marcou a política de proteção social da Era Vargas, originando um modelo pouco inclusivo, “limitado, na prática, aos