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Paraplegia Espástica Familiar: Um Caso Clínico e Genético, Notas de estudo de Genética

Este documento discute um caso de paraplegia espástica familiar, uma neuropatia autossômica recessiva que afeta indivíduos de uma mesma família. O texto apresenta informações sobre a história clínica dos afetados, a transmissão genética da doença e a importância de estudos genéticos em contextos clínicos. O documento também cita diversas publicações relacionadas à paraplegia espástica e à genética humana.

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Luiz_Felipe
Luiz_Felipe 🇧🇷

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PARAPLEGIA ESPASTICA FAMILIAL
DISCUSSÃO GENETICO-CIENTIFICA A PROPÓSITO DE UMA
FAMÍLIA DE AFETADOS
AGUINALDO GONÇALVES*
Poucos anos após as primeiras descrições clínicas deste agravo (Erb, 1875
e Charcot, 1876), ainda no século passado, Strümpell descreveu seu substrato
histopatológico, correspondendo a uma leucodistrofia difusa do sistema nervoso
central, embora predominante nos tratos espinhais piramidais (Pratt, 1967),
levando à rigidez e limitação da marcha e deformidade em flexão e hipotrofia
dos membros inferiores (Dassen & Fustinoni, 1949). Os reflexos encontram-se
exarcebados. O sistema sensorial, controles esfincterianos, motricidade das
extremidades superiores e nível intelectual estão preservados (Nelson, 1971).
Do ponto de vista genético, existem relatos de, na mesma região, o
mesmo pesquisador detetar famílias com diferentes modos de herança. De
fato Van Bogaert (1952) descreveu quatro famílias atingidas por paraplegia
espástica: três em que a doença se manifestou de acordo com o modelo autos¬
sômico dominante e, na outra, autossômica recessiva, caracterizando-se, assim,
a doença, por apresentar o fenômeno da heterogenia genética (Fuhrmann &
Vogel, 1969). De qualquer modo, é de desenvolvimento progressivo,o
presente ao nascimento, sendo, portanto, imprópria a designação "congênita",
atribuída por alguns autores (Tips, 1964).
Em nosso meio, conhece-se o estudo realizado por Carpilovski, 1960, em
grande família brasileira, de ascedência branca. No caso, observou-se sua
transmissão por gene autossômico dominai, com aparecimento clínico da condição
na idade adulta (38, 33 ± 1,74 anos),o influenciando a viabilidade ou
fertilidade dos afetados.
Latu sensu, a paraplegia espástica familial se diferencia com relativa faci-
lidade das demais afecções neuro-leucodistróficas: a de células globóides (ou
doença de Krabbe ou esclerose difusa), a leucodistrofia metacromática e a
leucodistrofia ortocromática. A primeira apresenta como recurso diagnóstico
sua evolução clínica, achados laboratoriais e características genéticas. Clinica-
mente, trata-se de doença pediátrica, de aparecimento no primeiro ano de vida:
ao período de comprometimento neurológico (em que quadros de paraplegia po-
dem ocorrer), segue-se o estágio neuro-vegetativo, antecedendo o óbito (Hagberg,
* Professor Assistente, Departamento de Epidemiologia, Faculdade de Saúde Pública.
Universidade deo Paulo; Pesquisador III, Conselho Nacional de Desenvolvimento
Cientifico e Tecnológico.
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PARAPLEGIA ESPASTICA FAMILIAL

D I S C U S S Ã O G E N E T I C O - C I E N T I F I C A A P R O P Ó S I T O D E U M A F A M Í L I A D E A F E T A D O S

_AGUINALDO GONÇALVES_*

Poucos anos após as primeiras descrições clínicas deste agravo (Erb, 1875 e Charcot, 1876), ainda no século passado, Strümpell descreveu seu substrato histopatológico, correspondendo a uma leucodistrofia difusa do sistema nervoso central, embora predominante nos tratos espinhais piramidais (Pratt, 1967), levando à rigidez e limitação da marcha e deformidade em flexão e hipotrofia dos membros inferiores (Dassen & Fustinoni, 1949). Os reflexos encontram-se exarcebados. O sistema sensorial, controles esfincterianos, motricidade das extremidades superiores e nível intelectual estão preservados (Nelson, 1971). Do ponto de vista genético, existem relatos de, na mesma região, o mesmo pesquisador detetar famílias com diferentes modos de herança. De fato Van Bogaert (1952) descreveu quatro famílias atingidas por paraplegia espástica: três em que a doença se manifestou de acordo com o modelo autos¬ sômico dominante e, na outra, autossômica recessiva, caracterizando-se, assim, a doença, por apresentar o fenômeno da heterogenia genética (Fuhrmann & Vogel, 1969). De qualquer modo, é de desenvolvimento progressivo, não presente ao nascimento, sendo, portanto, imprópria a designação "congênita", atribuída por alguns autores (Tips, 1964). Em nosso meio, conhece-se o estudo realizado por Carpilovski, 1960, em grande família brasileira, de ascedência branca. No caso, observou-se sua transmissão por gene autossômico dominai, com aparecimento clínico da condição na idade adulta (38, 33 ± 1,74 anos), não influenciando a viabilidade ou fertilidade dos afetados.

Latu sensu, a paraplegia espástica familial se diferencia com relativa faci- lidade das demais afecções neuro-leucodistróficas: a de células globóides (ou doença de Krabbe ou esclerose difusa), a leucodistrofia metacromática e a leucodistrofia ortocromática. A primeira apresenta como recurso diagnóstico sua evolução clínica, achados laboratoriais e características genéticas. Clinica- mente, trata-se de doença pediátrica, de aparecimento no primeiro ano de vida: ao período de comprometimento neurológico (em que quadros de paraplegia po- dem ocorrer), segue-se o estágio neuro-vegetativo, antecedendo o óbito (Hagberg,

*** Professor Assistente, Departamento de Epidemiologia, Faculdade de Saúde Pública. Universidade de São Paulo; Pesquisador I I I , Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico.**

1971). Laboratorialmente, pode haver eliminação de sulfatídeos urinados, porém este não é um sinal específico de leucodistrofia das células globóides (Hagberg, 1965). Geneticamente, trata-se de afecção recessiva, não associada à idade materna. A leucodistrofia metacromática apresenta uma forma juvenil e outra adulta. A primeira se inicia entre os 6 e 10 anos, com transtornos oculares e auditivos, nistagmo, marcha atáxica e alterações psíquicas; o afetado evolui para estado espástico grave, que, às vezes, se associa a ataxia cerebelosa, cegueira e demência total. A segunda inicia-se na puberdade, com alterações visuais, da linguagem e da marcha; em alguns pacientes, há paresias e tetraparesias; são possíveis também os quadros bulbares e atetóticos, o eventual predomínio do quadro psíquico maseara a doença neurológica. O diagnóstico envolve tal evolução clínica, aumento dos ventrículos cerebrais na pneumoencefalografia e hiperproteinorraquia. Geneticamente, sua transmissão também é autossômica recessiva, desconhecendo-se a freqüência do gene (Beker, 1968). A leuco- distrofia ortocromática é neuropatia desmielinizante degenerativa que se mani- festa também como paraplegia espástica, porém seu quadro clínico envolve outros sinais como amaurose, ptose palpebral e atrofia do nervo óptico. Do ponto de vista citológico, na leucodistrofia metacromática há grande variabilidade de inclusões dentro da oligodendroglia, algumas das quais amorfas, enquanto outras com estrutura lamelar bem definida, diferindo das células glo- bóides da doença de Krabbe que apresentam áreas bem delimitadas, relativa- mente translúcidas, e com depósitos moderadamente osmiófilos, favorecendo assim a hipótese de sua possível origem de elementos mesodérmicos em oposição a elementos da macroglia (Nelson, 1971).

OBSERVAÇÃO

J. C , 27 anos, solteiro, procedente de Manduri (SP), atendido no Ambulatório de Neuroclínica com queixa de dificuldade ao deambular, por fraqueza de membros inferiores, há 10 anos; há 17 anos, episódios de cefaléia frontal bilateral, sem fatores desencadeantes, contínua, sem irradiação e que regride com analgésicos.* Exame físico — Paciente, magro, fácies miopático, com acromegalia nasal, dentes em mau estado, fígado palpável a um centímetro do rebordo costal na linha hemiclavicular com características normais. Exame neurológico — Marcha pareto-espástica, motilidade ativa diminuída em todos os segmentos, hipertrofia dos músculos dos membros supe- riores, hipotrofia dos membros inferiores, hipertonia elástica, Romberg positivo. Antecendentes anamnésicos — Negadas intercorrênciaa gestacionais e natais; em relação ao desenvolvimento neuropsicomotor, a única alteração é o controle anal atingido aos sete anos; o interrogatório sobre passado mórbido registrou apenas doenças próprias da infância (sarampo, varicela); em relação à escolaridade, atingiu o terceiro ano primário com aproveitam ente razoável. A investigação dos antecedentes familiares

*** Estudado pelo Prof. Jeová Barros da Silva, Assistente do Departamento de Neuropsiquiatria da Faculdade de Cienças Médicas e Biológicas de Botucatu.**

A hipótese de mutação se justificaria por ser ela a causa mais freqüente pelo aparecimento de uma afecção hereditária em família onde anteriormente esta não existia (Gates, 1960). No caso, sua exclusão é impossível, mas sua ocorrência é pouco provável, pois poderia tratar-se apenas de mutação autos¬ sômica dominante em cálula parental germinativa (Penrose, 1957). Levando em conta as evidências apresentadas pelo heredograma, ainda que os outros padrões mendelianos não possam ser seguramente excluídos, parece tratar-se de herança autossômica recessiva (Thompson & Thompson, 1971), pois: a — São afetados apenas indivíduos da mesma irmandade e não progenitores, descendentes ou outros parentes, i.e., a doença apresenta preva- lência familial horizontal e não vertical; b — Os afetados são descendentes de casamento consanguíneo. Os demais elementos da família, inclusive um dos progenitores, quando não se casam com indivíduos aparentados, não apre- sentam descendência afetada. A doença autossômica dominante tende a desenvolver manifestações clínicas num período tardio da vida (Motulsky <& Hechet, 1964), mas caracteristicamente, aparece em várias gestações, definindo uma prevalência horizontal e vertical, e pessoas não afetadas não transmitem a afecção a seus filhos (Clarke, 1965), desde que a penetrância do gene seja completa. Embora não se trate de herança ligada ao sexo, esta igualmente poderia ser objeto de cogitação, pois ambos os afetados são do sexo masculino, podendo a normalidade dos descendentes do segundo casamento da mãe advir do tamanho reduzido da amostra. Pressuposta a hipótese de herança autossômica recessiva, a probabilidade de recorrência da condição em gestação posterior da genitora dos afetados se torna bastante pequena, apesar de j á existirem dois afetados, principalmente pelo fato de o atual esposo não ser aparentado.

RESUMO

Foi estudada uma família com dois elementos afetados por paraplegia espástica familial, provenientes de casamento consanguíneo, neuropatia de inte- resse genético por apresentar o fenômeno de heterogenia genética. O meca- nismo de transmissão hereditária é discutido concluindo-se por possível herança autossômica recessiva.

SUMMARY

Familial spastic paraplegia: clinical-genetic discussion a propôs of an affected sibship.

Because of the genetic heterogeny of this condition, a family with two brothers affected by familial spastic paraplegia, descendent from a consaguinous manage, is reported. The envolved hereditary transmission mechanism is discussed being concluded as possibly the autossomic recessive one.

RESUMO

Foi estudada uma família com dois elementos afetados por paraplegia espástica familial, provenientes de casamento consanguíneo, neuropatia de inte- resse genético por apresentar o fenômeno de heterogenia genética. O meca- nismo de transmissão hereditária é discutido concluindo-se por possível herança autossômica recessiva.

SUMMARY

Familial spastic paraplegia: clinical-genetic discussion a propos of an affected sibship.

Because of the genetic heterogeny of this condition, a family with two brothers affected by familial spastic paraplegia, descendent from a consaguinous manage, is reported. The envolved hereditary transmission mechanism is discussed being concluded as possibly the autossomic recessive one.

REFERENCIAS

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