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Os jesuítas e a pedagogia brasílica: forma de lidar com a ..., Slides de Pedagogia

Fundaram, segundo Saviani (2008), uma pedagogia, a brasílica, esse ato educativo que mistura aspectos da cultura nativa para o ensino da moral e fé cristã. Uma ...

Tipologia: Slides

2022

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Eixo: Historiografia e História da Educação
Os jesuítas e a pedagogia brasílica: forma de lidar com a realidade das
matas nas terras da América Portuguesa
Autora: Jéssica Cristine de Melo
Universidade Federal de Alfenas- UNIFAL-MG
2016
Resumo:
O objetivo do presente trabalho é o estudo da pedagogia dos jesuítas: Manuel da Nóbrega
e José de Anchieta, e o modo como a usaram para converter os índios para o cristianismo.
Os jesuítas vieram não somente a fim de conversão à Fé católica, mas com o intuito de
“civilizar” os gentios. Sabe-se que colonização, catequese e educação são elementos que
se entrelaçam no período colonial brasileiro. Esse entrelaçamento aconteceu em um palco
real, concreto, que foi a América Portuguesa do século XVI, arena em que os jesuítas
enfrentaram a realidade e a cultura das matas, das selvas, de habitantes com cultura mais
que milenar. Eles tiveram então, de se adaptarem a realidade das matas brasílicas, e de
acordo com esta realidade encarar a missão. A metodologia utilizada para a pesquisa
foram análises de algumas cartas jesuíticas, sobretudo as de Manuel da Nóbrega e de José
de Anchieta, que tratam do assunto pedagogia, em que foi possível verificar a
singularidade específica no modo de inculcar nos homens do Novo Mundo a religião e a
moral cristã, que comprovam a tese formulada por Saviani da criação de uma pedagogia
inventada por Nóbrega e por Anchieta, apropriada para os índios das matas da América
Portuguesa: a pedagogia brasílica. Pode-se concluir com análises feitas dos documentos,
que Nóbrega e Anchieta lançaram mão de recursos dos mais variados, dentre eles:
confissões por meio de intérpretes, conservação de aspectos importantes da cultura nativa
que não contrariavam a religião e fé católica, como a sua dança, os seus cantos, o uso de
instrumentos e, sobretudo, a língua; criação de orações, sermões e catecismos na língua
tupi, peças de teatro para ensinar conteúdos cristãos. Essa pedagogia utilizada por estes
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Eixo: Historiografia e História da Educação

Os jesuítas e a pedagogia brasílica: forma de lidar com a realidade das

matas nas terras da América Portuguesa

Autora: Jéssica Cristine de Melo Universidade Federal de Alfenas- UNIFAL-MG 2016

Resumo: O objetivo do presente trabalho é o estudo da pedagogia dos jesuítas: Manuel da Nóbrega e José de Anchieta, e o modo como a usaram para converter os índios para o cristianismo. Os jesuítas vieram não somente a fim de conversão à Fé católica, mas com o intuito de “civilizar” os gentios. Sabe-se que colonização, catequese e educação são elementos que se entrelaçam no período colonial brasileiro. Esse entrelaçamento aconteceu em um palco real, concreto, que foi a América Portuguesa do século XVI, arena em que os jesuítas enfrentaram a realidade e a cultura das matas, das selvas, de habitantes com cultura mais que milenar. Eles tiveram então, de se adaptarem a realidade das matas brasílicas, e de acordo com esta realidade encarar a missão. A metodologia utilizada para a pesquisa foram análises de algumas cartas jesuíticas, sobretudo as de Manuel da Nóbrega e de José de Anchieta, que tratam do assunto pedagogia, em que foi possível verificar a singularidade específica no modo de inculcar nos homens do Novo Mundo a religião e a moral cristã, que comprovam a tese formulada por Saviani da criação de uma pedagogia inventada por Nóbrega e por Anchieta, apropriada para os índios das matas da América Portuguesa: a pedagogia brasílica. Pode-se concluir com análises feitas dos documentos, que Nóbrega e Anchieta lançaram mão de recursos dos mais variados, dentre eles: confissões por meio de intérpretes, conservação de aspectos importantes da cultura nativa que não contrariavam a religião e fé católica, como a sua dança, os seus cantos, o uso de instrumentos e, sobretudo, a língua; criação de orações, sermões e catecismos na língua tupi, peças de teatro para ensinar conteúdos cristãos. Essa pedagogia utilizada por estes

dois jesuítas foi inclusive contestada por autoridades religiosas da Igreja e da própria Companhia de Jesus. Mas o que importava para eles era uma conversão dos índios para ad maiorem Dei gloriam.

Palavras Chave: jesuítas, pedagogia brasílica, século XVI

Introdução:

Saviani (2008, p. 6), em “História das Ideias Pedagógicas no Brasil”, denota a palavra “pedagogia” e mais especificamente seu adjetivo “pedagógico” como o modo de operar, de realizar o ato educativo. Desse modo, ele entende que as ideias pedagógicas dos jesuítas no período colonial não podem ser circunscritas como mera derivação da concepção religiosa católica, ou seja, reduzidas à catequese, mas se estabeleceram como práticas educativas elaboradas para fins de incorporação da América Portuguesa ao Império Português.

Portanto, colonização, catequese e educação são elementos que se entrelaçam no período colonial brasileiro (SAVIANI, 2008). Esse entrelaçamento aconteceu em um palco real, concreto, que foi a América Portuguesa do século XVI, arena em que os jesuítas enfrentaram a realidade e a cultura das matas, das selvas, de habitantes com cultura mais que milenar. Nesse embate de culturas nasceu o que Saviani nomeou de “pedagogia brasílica”, um modo de operar a educação, de intervir na prática educativa do Novo Mundo, de enfrentar a realidade das matas (SAVIANI, 2008).

Assim, o presente artigo deseja entender quais práticas os jesuítas tiveram de adaptar a realidade local a fim de que alcançassem seu objetivo principal: converter os gentios para maior glória de Deus.

História da Educação: A história da educação na América Portuguesa teve como protagonistas, no seu início, os religiosos da Companhia de Jesus. No ano de 1549, os primeiros jesuítas chegaram ao porto da Bahia, enviados e financiados pelo rei de Portugal, Dom João III.

missionária, o seu objetivo maior era recrutar soldados para Cristo a fim de salvar o mundo da vida material, dos pecados da carne, para se alistarem ao exército, espiritual, de Cristo, juntando-se ao exército de um Rei temporal, defensor da Igreja Católica (LOYOLA, 1966). Segundo Serafim Leite (2004), o lema de Inácio de Loyola era tudo para a maior glória de Deus, frase que aparece várias vezes em seus escritos. Com esse regime de verdade, os jesuítas vieram para a América Portuguesa e enxergavam os nativos das matas como afastados de Deus, aliados dos demônios, não conhecedores da salvação, por isso desejavam arduamente sua conversão, já que eram pagãos e não infiéis.

De acordo com Adone Agnolin (2007) a missão jesuítica se implanta na interação entre poder temporal e espiritual. Os missionários eram os mediadores de uma cultura para os nativos americanos, assim, deveriam antes de converter os gentios, “converter o Evangelho” de acordo com a cultura local, e sucessivamente converter a cultura local de forma a associar à cultura ocidental. (AGNOLIN, 2007, pp.194).

Desse modo, a educação jesuítica não se restringe à educação escolar, ela tem como maior objetivo converter os gentios à Fé Católica e os formar nos valores e padrões europeus. Segundo Faria (2005) “a escola era encarada para formar o verdadeiro povo de Deus, ou (para ser fiel aos Exercícios Espirituais ) para formar ‘Soldados de Cristo’”. (FARIA, 2005, p.48)

Os jesuítas foram peças fundamentais para o início da história da educação no Brasil. Foram eles os primeiros professores; criaram uma pedagogia própria para alcançar êxito em sua missão, a pedagogia brasílica. Assim, os jesuítas por meio da experiência em terras brasílicas, adaptaram e até mesmo modificaram seus próprios pensamentos e próprias atitudes na relação com os gentios. Fundaram, segundo Saviani (2008), uma pedagogia, a brasílica, esse ato educativo que mistura aspectos da cultura nativa para o ensino da moral e fé cristã.

Uma dessas liberdades para adaptação, para maior produção de frutos, Pe. Manuel da Nóbrega se coloca desde o início da catequização como defensor da prática da

processo de produção dos Exercícios Espirituais, e mais adiante fundou a Companhia de Jesus com a função de criar “soldados para Cristo” (LEITE, 2004, p. 3-4).

confissão por meio de um intérprete, porque para ele, o mais importante era que o gentio confessasse os seus pecados. Diante da necessidade de entrar na realidade dos nativos do Novo Mundo, se intrometer, e realizar a missão, os primeiros jesuítas, liderados por Nóbrega, conservaram aspectos importantes da cultura nativa que não contrariavam a religião e fé católica, como a sua dança, os seus cantos, o uso de instrumentos e, sobretudo, a língua. Criaram orações, sermões e catecismos na língua tupi para ensinar conteúdos cristãos. José de Anchieta foi o expoente máximo dessa tarefa, criando já em 1556 a “gramática da língua mais falada do Brasil”, produzindo catecismos, peças de teatro, doutrinas, orações em tupi, misturando elementos da cultura nativa à cultura cristã.

Manuel da Nóbrega : Segundo Faria (2005) Manuel da Nóbrega nasceu em Braga, Portugal, em 17 de outubro de 1517, estudou em Salamanca e bacharelou-se em Cânones pela Universidade de Coimbra (14/6/1541). Em 21 de novembro de 1544 entrou para a Companhia de Jesus, sendo nomeado em 1549 por D. João III como chefe da missão religiosa enviada ao Brasil. Ele chega à Bahia em 29 de março de 1549, na esquadra do primeiro governador-geral, Tomé de Sousa. Fundou a Casa de Água dos Meninos, voltada à educação dos jovens índios. De julho de 1551 a janeiro de 1552 permaneceu em Pernambuco. Ainda em 1552, Nóbrega foi para São Vicente, fundando a Confraria do Menino Jesus, colégio onde meninos externos aprendiam doutrina católica, leitura, escrita, canto, flauta e latim. Em 1553, Roma criou a Província do Brasil; nomeado provincial em 9 de junho de 1553, Nóbrega deixou de subordinar-se à Província portuguesa da Companhia e à autoridade do bispo de Salvador; participou, em 1554, da fundação de São Paulo de Piratininga e em março de 1565, participou da fundação da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Em 24 de julho de 1567 tornou-se reitor do Colégio do Rio de Janeiro, onde morreu em 17de outubro de 1570. (FARIA, 2005, pp.9)

Saviani (2008) denomina Manuel da Nóbrega como um jesuíta realista diante das condições locais da América Portuguesa. Desse modo, a primeira fase da educação jesuítica foi marcada pelo plano de instrução marcado por Nóbrega, que consistia no ensino do português aos índios juntamente com o ensino da doutrina cristã, a escola de ler e escrever e com a opção do ensino de canto e música instrumental. Desse modo, havia

Este collegio dos meninos de Jesus vai em muito crescimento, e fazem muito fructo; porque andam pelas aldeias com prégações e cantigas de Nosso Senhor pela lingua, que muito alvoroça a todos, do que largamente se escreverá por outra via; (Carta de Pe. Manuel da Nóbrega para o Padre Provincial de Portugal

  • Bahia, 1552) Entretanto, as críticas aumentam com a vinda do bispo Fernando Sardinha, que chegou à Bahia em 1551. A espera por sua chegada foi aguardada ansiosamente por Nóbrega, porém, ele questiona algumas práticas adotadas pelos jesuítas, dentre estes adotadas pelo próprio Nóbrega.

De acordo com os escritos de Inácio de Loyola, as normas e fórmulas da Companhia de Jesus deveriam ser adaptadas de acordo com a realidade local, entretanto, na adaptação de algumas práticas, Nóbrega fora criticado pelo bispo Sardinha. Em respeito a sua função na Ordem da Companhia, Nóbrega escreve uma carta ao Mestre Simão a fim de esclarecer suas dúvidas nas práticas. Neste trecho da carta, podemos entender mais do que se tratava a pedagogia brasílica, e as adaptações feitas por Nóbrega:

Com a vinda do Bispo se moveram algumas duvidas, nas quaes eu não duvidava porque sam soberbo e muito confiado em seu parecer, as quaes nos pareceu bem communical-as com Vossa Reverendissima para que as ponha em disputa entre parecer de letrados e me escreva o que devo fazer. Primeiramente: si se poderão confessar por interprete a gente desta terra que não sabe falar nossa lingua; (...) Item: ha costume nestas partes de se permitirem os Gentios nas egrejas, á missa juntamente com os Crhristãos, e não os deitam fora por os não escandalisar: si se guardará o direito antigo ou si se permitirá estarem todos de mistura? Item: si nos abraçarmos com alguns costumes deste Gentio, os quais não são contra a nossa Fé Catholica, nem são ritos dedicados a idolos, como é cantar cantigas de Nosso Senhor em sua lingua pelo seu tom e tanger seus instrumentos de musica, que elles em suas festas , quando matam seus contrarios, e quando andam bebados, e isto para os attrair a deixarem outros costumes essenciaes, e, permittindo-lhes e aprovando-lhes estes, trabalhar por lhes tirar os outros, e assim o prégar-lhes a seu modo em certo tom, andando, passeando e batendo nos peitos, como elles fazem, quando querem persuadir alguma cousa, e dizel-a com muita eficácia, e assim tosquiarem-se os meninos da terra, em que casa temos, a seu modo, porque a similhança é causa de amor , e outros costumes similhantes a estes? Item: como nos haveremos acerca dos Gentios que nos vêm a pedir o baptismo, e não têm camisas nem roupas para se vestirem: si, sómente por razão de andarem nús, tendo o mais apparelhado, lhe negaremos o

baptismo e a entrada na egreja , á missa e doutrina; porque parece que andar nú é contra a lei da natureza, e, quem a não guarda pecca mortalmente, e o tal não é capaz de receber Sacramento, e por outra parte eu não sei quanto tanto Gentio se poderá vestir, pois tantos mil annos andou sempre nú, não negando ser bom persuadir-lhes, e pregar-lhes, que se vistam e mettel-os nisto quanto puder ser? Item: se é licito fazer guerra a este Gentio e captival-os hoc nomine et titulo que não guarda a lei de natura por todas vias? (Carta de Pe. Manuel da Nóbrega a Pe. mestre Simão – Bahia, 1552, grifos meus). Neste trecho da carta podemos entender melhor do que se trata a pedagogia brasílica denominada por Dermeval Saviani: confissão por intérprete, presença dos gentios na igreja juntamente com os cristãos, o cantar as cantigas da fé no modo dos índios, realização do batismo nos gentios nus. Estas são algumas práticas realizadas por Nóbrega que se diferiam das aprendidas em Portugal, entretanto, ele as realizava com o intuito maior de obter êxito no processo de catequização. Para ele tudo se devia fazer para a maior glória de Deus, e deveriam tentar de todas as formas que pudessem converter e atrair os gentios à fé católica, para enfim, formar um novo mundo sob a óptica católica e europeia. Por isso segundo Saviani, Nóbrega é realista, pois vê como deve realizar seu plano de salvação daquelas almas, a partir da realidade destes. Ao final do trecho citado da carta, Nóbrega escreve que é por causa do amor que se permite estas semelhanças, assim, ele menciona o amor à missão evangelizadora, amor aos irmãos, os gentios, e segundo a dedicação aplicada sempre em busca do objetivo principal da missão salvífica^2 : resgatar almas para a glória de Deus. O bispo Fernandes Sardinha morreu em terras brasílicas, o barco em que estava naufragou e ele e outros membros da embarcação foram mortos por índios canibais. Podemos ver com as cartas que as práticas de Manuel da Nóbrega não se alteraram mesmo após as críticas do bispo. O trecho da carta que segue é do no de 1557, e onde relata ainda o uso de intérpretes nas confissões: o padre Navarro confessava por si só, os outros Padres por interpretes; e foi desta maneira, posto que todos confessassem, sempre sobejavam muitos, que não se podiam confessar; (Carta de Pe. Manuel da Nóbrega a Pe. Ignacio, quadrimestre de janeiro até abril de 1557).

(^2) Dissertação de mestrado do Prof Dr. Luiz antonio Sabeh onde se conclui que o principal motivo da missão jesuítica está em salvar almas.

pudéssemos, e assim ordenados de ir pedir de comer pelas casas, e os mais dos dias, dois que estamos na cidade, imos comer com os criados do Governador, o qual dá de comer com seus criados a todos o que não têm e querem alli ir tomar (Carta de Pe. Manuel da Nóbrega ao Padre Mestre Simão- Bahia, 1552) Assim, os pedidos eram destinados ao sustento dos meninos, pois os jesuítas se mantinham com o ideal que trouxera desde os primeiros jesuítas, e queriam deixar claro comprometimento em seguir a Ordem que prega por votos, entre eles, votos de pobreza, obediência e castidade. Desse modo, pode-se notar a partir de alguns trechos de cartas que Nóbrega é realista em relação à situação que se depara para a conversão dos gentios da América Portuguesa, e se mostra disposto a enfrentar a realidade das matas a fim de seu objetivo maior que era a salvação dos gentios. Outro jesuíta que teve bastante contato com Nóbrega e sua forma pedagógica foi José de Anchieta, criador da primeira gramática na língua indígena e outros meios pedagógicos como o teatro a fim de despertar os gentios para o seguimento da doutrina católica. É dele que vamos falar agora:

José de Anchieta : Segundo Faria (2005) José de Anchieta nasceu em 19 de março de 1534, nas Ilhas Canárias, onde aprendeu a ler e a escrever um pouco de latim e português, sendo o castelhano a sua língua materna. Aos 14 anos, foi enviado ao Colégio das Artes, anexo à Universidade de Coimbra. Em 1551, noviço na Companhia de Jesus, terminou os estudos de Lógica, ingressando nos de Metafísica, quando adoeceu gravemente, tendo de interrompê-los. De acordo com Quirício Caxa (1965), “não tendo já os médicos que fazer, tendo novas os Padres da terra do Brasil, ser muito sadia, determinaram, com parecer também dos médicos, que fosse enviado a ela, e que poderia ser que com o novo céu, nova terra, novos ares e novos mantimentos, houvesse nele e em sua disposição alguma mudança” (p. 17). Em 1553, com apenas 19 anos, viajou para a América portuguesa, sob a chefia de padre Luís da Grã. Depois de uma breve passagem pela Bahia, permaneceu 12 anos em São Vicente, participando, em 1554, da fundação do Colégio de São Paulo em Piratininga, colégio no qual foi o único mestre. Elevado ao sacerdócio, em 1566

passou a exercer o superiorato. Morreu na capitania do Espírito Santo em 9 de junho de 1597 (DAHER, Apud FARIA, 2005, pp. 9) Segundo Saviani (2008) Anchieta possuía as mesmas ideias educacionais que se encarnavam como ideias pedagógicas que visavam atingir aquelas mesmas finalidades inerentes à filosofia educacional presente na doutrina da Contra Reforma e presentes no plano educacional de Nóbrega que estava posto em prática. Como hábil conhecedor de línguas, Anchieta logo dominou a língua geral falada pelos índios, e organizou uma gramática que foi usada no trabalho pedagógico da América portuguesa. (pp.44) José de Anchieta chega à América Portuguesa em 1553 e em pouco tempo ele já domina a língua indígena. Em carta datada de 1554 ele afirma estar adiantado em relação à língua e já esboça o que se constituirá a sua gramática: Quanto á lingua eu estou adiantado, ainda que é mui pouco, pera o que soubera se não se me não ocupara em ler gramatica; todavia tenho coligido toda a maneira dela por arte, e pera mim tenho entendido quasi todo seu modo; (Carta do Irmão José de Anchieta aos Irmãos enfermos de Coimbra, São Vicente, 1554) Esta rapidez com que Anchieta demonstra em aprender a língua indígena faz parte da pedagogia brasílica iniciada por Nóbrega. Com o aprendizado da língua do outro (o índio), seria mais fácil a sua conversão. Em Nóbrega começou-se a tradução da doutrina para a língua indígena, porém com Anchieta esta ação tornou-se ainda mais fecunda. Entretanto, ainda havia a dificuldade de tradução de palavras e expressões da fé católica, devido a nada de semelhante com a cultura dos gentios. Anchieta relata algumas dificuldades no trecho da carta: Dando-lhe pois a primeira lição de ser um só Deus todo poderoso, que criou todas as cousas, etc., logo se lhe imprimiu na memoria, dizendo que lhe rogava muitas vezes que criasse os mantimentos para a sustentação de todos,, mas que pensava que os trovões eram estes Deus; porém agora que sabia haver outro por que dos nomes da Santissima Trindade êstes dois sómente pode tomar, pela razão de que se podem dizer em sua lingua; mas o Espirito Santo, para o qual nunca achamos vocabulo proprio, nem circunloquio bastante, ainda que o não sabia nomear, sabia-o contudo crêr como nós lhe diziamos. (Carta do Irmão José de Anchieta ao Geral Diogo Lainez, São Vicente, 16/04/1563, grifos meus) No trecho citado José de Anchieta relata a dificuldade de tradução da palavra Espírito Santo, de fazê-la representar algo da cultura indígena.

Neste trecho pode-se perceber mais uma vez a pedagogia brasílica, onde o jesuíta deseja adaptar os dogmas da fé de acordo com a realidade local. Anchieta no trecho da carta pede o afrouxamento das regras da igreja, de modo que se não for parentesco entre irmãos, entre outros possam ser realizados os matrimônios, para que os jesuítas pudessem realizar os sacramentos e para que despertassem o interesse nos gentios a aderirem à fé católica.

As missas tinham forte presença dos gentios, que ajudavam os padres cantando em seu modo e tocando instrumentos, estes, muitas vezes fabricados pelos próprios índios: Estamos, como lhes hei escrito, em esta aldeia de Piratininga, onde temos uma grande escola de meninos, filhos de Indios, ensinados já a ler e escrever, e aborrecem muito os costumes de seus pais, e alguns sabem ajudar a cantar a missa: estes são nossa alegria e consolação, porque seus pais não são mui domaveis, posto que sejam mui diferentes dos das outras aldeias, porque já não matam nem comem contrarios, nem bebem como dantes. (Cópia de outra, ou complemento anterior da mesma data, 15/03/ Os gentios tinham o costume da antropofagia, onde matavam seus inimigos de guerra em um ritual, e na morte dos inimigos, muitas vezes se utilizavam de partes de seus ossos para fabricação de instrumentos musicais: e ele o havia morto e então mandou a uma de suas mulheres que tirasse a canela da perna que tinha guardada, de que sóem fazer flautas. (Carta do Irmão José de Anchieta ao Geral Diogo Lainez, São Vicente, 08/01/1565) A pedagogia brasílica permitia aos gentios a utilização destes instrumentos em missas e ritos da fé católica, pois o que mais importava aos padres jesuítas não era o modo em que era feito estes instrumentos, mas a participação dos gentios na fé católica, mesmo que ao seu modo, o intuito era maior, era a conversão e a salvação de suas almas. Atitudes que causavam estranhamento aos superiores e aos padres visitadores que vinham a inspecionar as missões. Outro instrumento bastante usado que nos remete a pedagogia brasílica são as peças teatrais escritas por José de Anchieta, que eram usadas como recursos pedagógicos na conversão e no ensino dos gentios. O Auto da Pregação Universal segundo Hernandes (2008) é considerado o primeiro auto de Anchieta, que fora encenado em São Paulo de Piratininga, no início de 1561 ou 1562. Estes autos, ainda segundo o autor, tinham o

objetivo de encantar e ensinar os princípios cristãos, com o pano de fundo da realidade das matas brasílicas.

Considerações finais Os jesuítas, por meio de um discurso pautado na salvação de almas, foram peças fundamentais para o início da história da educação no Brasil. Foram eles os primeiros professores; criaram uma pedagogia própria para alcançar êxito em sua missão, a pedagogia brasílica. Por meio da experiência em terras brasílicas, adaptaram e até mesmo modificaram seus próprios pensamentos e próprias atitudes na relação com os índios. Fundaram, segundo Saviani (2008), uma pedagogia, a brasílica, esse ato educativo que mistura aspectos da cultura nativa para o ensino da moral e fé cristã.

Com o objetivo maior de salvação de almas, os primeiros jesuítas conservaram aspectos importantes da cultura nativa que não contrariavam a religião e fé católica, como a sua dança, os seus cantos, o uso de instrumentos e, sobretudo, a língua. Criaram orações, sermões e catecismos na língua tupi para ensinar conteúdos cristãos. José de Anchieta foi o expoente máximo dessa tarefa, criando já em 1556 a “gramática da língua mais falada do Brasil”, produzindo catecismos, peças de teatro, doutrinas, orações em tupi, misturando elementos da cultura nativa à cultura cristã.

Referências Bibliográficas:

AGNOLIN, Adone. Jesuítas e selvagens : a negociação da fé no encontro catequéticoritual americano-tupi (séculos XVI-XVII). São Paulo: Humanitas Editorial, 2007. ANCHIETA, J. Cartas, informações, fragmentos históricos e sermões (1554-1594). Belo Horizonte: Itatiaia: São Paulo: Editora Universidade de São Paulo, 1988. BOSI, A. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.

BOURDIEU, Pierre. A Economia das Trocas Linguísticas: O que Falar Quer Dizer ; prefácio Sérgio Miceli. 2. Ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1998. CLASTRES, P. A Sociedade contra o Estado : pesquisa de antropologia política. Tradução de Theo Santiago. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1978 (Ciências Sociais).