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O Serviço Social Brasileiro na Contemporaneidade, Resumos de Fundamentos de Moda

Este texto analisa os fundamentos históricos e teórico-metodológicos do serviço social brasileiro nas décadas de 80, 90 e início do século xxi. Destaca a relação do serviço social com a igreja católica na formulação de seus primeiros objetivos político-sociais, orientados por posicionamentos de cunho humanista conservador. Aborda a influência do pensamento marxista e da vertente pós-moderna no serviço social brasileiro, bem como os desafios enfrentados pela profissão diante das transformações societárias, como a precarização do trabalho e a redefinição dos sistemas de proteção social. O texto também discute a maturidade alcançada pelo serviço social brasileiro na pesquisa e na produção de conhecimentos, com a expansão dos programas de pós-graduação na área.

Tipologia: Resumos

2024

Compartilhado em 16/05/2024

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natalia-soriano-5 🇧🇷

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Os fundamentos históricos e teórico metodológicos do Serviço Social

brasileiro na contemporaneidade

Maria Carmelita Yazbek Professora da Faculdade de Serviço Social da UNLP/Argentina e da PUC/SP

Os fundamentos históricos e teórico metodológicos do Serviço Social brasileiro na contemporaneidade

Apresentação

Este texto coloca em questão os fundamentos históricos e teórico/metodológicos do Serviço Social brasileiro na contemporaneidade, particularizando as décadas de ͺͲ, ͻͲ e os primeiros anos do século XX). Algumas referências acerca do Serviço Social latino‐americano também serão apresentadas. Parte do pressuposto de que a profissão e o conhecimento que a ilumina, se explicam no movimento histórico da sociedade. Sociedade que é produto de relações sociais, de ações recíprocas dos homens entre si, no complexo processo de reprodução social da vida. O mundo social é um mundo de relações.

São múltiplas as mediações que constituem o tecido de relações sociais que envolvem esse processo de produção e reprodução social da vida em suas expressões materiais e espirituais. Essas relações que constituem a sociabilidade humana, implicam âmbitos diferenciados e uma trama que envolve o social, o político, o econômico, o cultural, o religioso, as questões de gênero, a idade, a etnia etc. Dimensões com as quais se defronta cotidianamente o Serviço Social e em relação às quais se posiciona quer do ponto de vista explicativo quer do interventivo, considerados nesta abordagem como dimensões de uma mesma totalidade.

A análise dos principais fundamentos que configuram o processo através do qual a profissão busca explicar e intervir sobre a realidade, definindo sua direção social, constitui o principal objetivo deste texto. É necessário assinalar que essa análise das principais tendências históricas e teórico metodológicas da profissão, sobretudo nas três últimas décadas não é tarefa fácil ou simples, pois exige o conhecimento do processo histórico de constituição das principais matrizes de

  • de idéias e conteúdos doutrinários do pensamento social da )greja Católica, em eu processo de institucionalização no Brasil; s
  • das principais matrizes teórico metodológicas acerca do conhecimento do social na sociedade burguesa;

Tecer algumas considerações sobre este processo é buscar compreender diferentes posicionamentos, lógicas e estratégias que permearam o pensamento e a ação profissional do serviço social em sua trajetória e que persistem até os dias atuais com novas articulações, expressões e redefinições.

Quanto ao primeiro aspecto, é por demais conhecida a relação entre a profissão e o ideário católico na gênese do Serviço Social brasileiro, no contexto de expansão e secularização do mundo capitalista. Relação que vai imprimir à profissão caráter de apostolado fundado em uma abordagem da "questão social" como problema moral e religioso e numa intervenção que prioriza a formação da família e do indivíduo para solução dos problemas e atendimento de suas necessidades materiais, morais e sociais. O contributo do Serviço Social, nesse momento, incidirá sobre valores e comportamentos de seus "clientes" na perspectiva de sua integração à sociedade, ou melhor, nas relações sociais vigentes.

Os referenciais orientadores do pensamento e da ação do emergente Serviço Social tem sua fonte na Doutrina Social da )greja, no ideário franco‐belga de ação social e no pensamento de São Tomás de Aquino ȋséc. X))Ȍ: o tomismo e o neotomismo ȋretomada em fins do século X)X do pensamento tomista por Jacques Maritain na França e pelo Cardeal Mercier na Bélgica tendo em vista "aplicá‐lo" às necessidades de nosso tempoȌ.

É, pois, na relação com a )greja Católica que o Serviço Social brasileiro vai fundamentar a formulação de seus primeiros objetivos político/sociais orientando‐se por posicionamentos de cunho humanista conservador contrários aos ideários liberal e marxista na busca de recuperação da hegemonia do pensamento social da )greja face à "questão social". Entre os postulados filosóficos tomistas que marcaram o emergente Serviço Social temos a noção de dignidade da pessoa humana; sua perfectibilidade, sua capacidade de desenvolver potencialidades; a natural sociabilidade do homem, ser social e político; a compreensão da sociedade como união dos homens para realizar o bem comum ȋcomo bem de todosȌ e a necessidade da autoridade para cuidar da justiça geral.

No que se refere à Doutrina Social da )greja merecem destaque nesse contexto as encíclicas DzRerum Novarumdz do Papa Leão X))) de ͳͺͻͳ, que vai iniciar o magistério social da )greja no contexto de busca de restauração de seu papel social sociedade moderna e a DzQuadragésimo Annodz de Pio X) de ͳͻ͵ͳ que, comemorando ͶͲ anos da DzRerum Novarumdzdz vai tratar da questão social, apelando para a renovação moral da sociedade e a adesão à Ação Social da )greja.

É necessário assinalar que esta matriz encontra‐se na gênese da profissão em toda a América Latina, embora com particularidades diversas como, por exemplo, na Argentina e no Chile onde vai somar‐se ao racionalismo higienista. ȋideário do movimento de médicos higienistas que exigiam a intervenção ativa do Estado sobre a questão social pela criação da assistência pública que deveria assumir um amplo programa preventivo na área sanitária, social e moralȌ.

O conservadorismo católico que caracterizou os anos iniciais do Serviço Social brasileiro começa, especialmente a partir dos anos ͶͲ, a ser tecnificado ao entrar em contato com o Serviço Social norteamericano e suas propostas de trabalho permeados pelo caráter conservador da teoria social positivista.

posicionamento do sujeito que investiga face ao investigado e desta forma é "questão da teoria social e não problema particular desta ou daquela 'disciplina' " ȋNETTO,ͳͻͺͶ, p. ͳͶȌ.

No caso do Serviço Social, um primeiro suporte teórico‐metodológico necessário à qualificação técnica de sua prática e à sua modernização vai ser buscado na matriz positivista e em sua apreensão manipuladora, instrumental e imediata do ser social. Este horizonte analítico aborda as relações sociais dos indivíduos no plano de suas vivências imediatas, como fatos, como dados, que se apresentam em sua objetividade e imediaticidade. O método positivista trabalha com as relações aparentes dos fatos, evolui dentro do já contido e busca a regularidade, as abstrações e as relações invariáveis.

É a perspectiva positivista que restringe a visão de teoria ao âmbito do verificável, da experimentação e da fragmentação. Não aponta para mudanças, senão dentro da ordem estabelecida, voltando‐se antes para ajustes e conservação. Particularmente em sua orientação funcionalista, esta perspectiva é absorvida pelo Serviço Social, configurando para a profissão propostas de trabalho ajustadoras e um perfil manipulatório, voltado para o aperfeiçoamento dos instrumentos e técnicas para a intervenção, com as metodologias de ação, com a "busca de padrões de eficiência, sofisticação de modelos de análise, diagnóstico e planejamento; enfim, uma tecnificação da ação profissional que é acompanhada de uma crescente burocratização das atividades institucionais" ȋYAZBEK, ͳͻͺͶ, p. ͹ͳȌ.

O questionamento a este referencial tem início no contexto de mudanças econômicas, políticas, sociais e culturais que expressam, nos anos ͸Ͳ, as novas configurações que caracterizam a expansão do capitalismo mundial, que impõem à América Latina um estilo de desenvolvimento excludente e subordinado. A profissão assume as inquietações e insatisfações deste momento histórico e direciona seus

questionamentos ao Serviço Social tradicional através de um amplo movimento, de um processo de revisão global, em diferentes níveis: teórico, metodológico, operativo e político. Este movimento de renovação que surge no Serviço Social na sociedade latino‐americana impõe aos assistentes sociais a necessidade de construção de um novo projeto comprometido com as demandas das classes subalternas, particularmente expressas em suas mobilizações. É no bojo deste movimento, de questionamentos à profissão, não homogêneos e em conformidade com as realidades de cada país, que a interlocução com o marxismo vai configurar para o Serviço Social latinoamericano a apropriação de outra matriz teórica: a teoria social de Marx. Embora esta apropriação se efetive em tortuoso processo.

É importante assinalar que é no âmbito do movimento de Reconceituação e em seus desdobramentos, que se definem de forma mais clara e se confrontam, diversas tendências voltadas a fundamentação do exercício e dos posicionamentos teóricos do Serviço Social. Tendências que resultam de conjunturas sociais particulares dos países do Continente e que levam, por exemplo, no Brasil, o movimento em seus primeiros momentos, ȋem tempos de ditadura militar e de impossibilidade de contestação políticaȌ a priorizar um projeto tecnocrático/modernizador, do qual Araxá e Teresópolis são as melhores expressões.

Já o tronco latino americano do movimento, sobretudo no Cone Sul, assume claramente uma perspectiva crítica de contestação política e a proposta de transformação social. Posição que, dificilmente poderá levar à prática frente à explosão de governos militares ditatoriais e pela ausência de suportes teóricos claros.

Sem dúvida, as ditaduras que tiveram vigência no Continente deixaram suas marcas nas ciências sociais e na profissão, que depois de avançar em uma produção crítica nos anos ͸Ͳ/͹Ͳ ȋnos países onde isso foi permitidoȌ é obrigada a longo silêncio.

  • a vertente marxista que remete a profissão à consciência de sua inserção na sociedade de classes e que no Brasil vai configurar‐se, em um primeiro momento, como uma aproximação ao marxismo sem o recurso ao pensamento de Marx.

Efetivamente, a apropriação da vertente marxista no Serviço Social ȋbrasileiro e latino‐americanoȌ não se dá sem incontáveis problemas, que aqui não abordaremos, e que se caracterizam, quer pelas abordagens reducionistas dos marxismos de manual, quer pela influência do cientificismo e do formalismo metodólogico ȋestruturalistaȌ presente no "marxismo" althusseriano ȋreferência a Louis Althusser, filosofo francês cuja leitura da obra de Marx vai influenciar a proposta marxista do Serviço Social nos anos ͸Ͳ/͹Ͳ e particularmente o Método de B.(. Um marxismo equivocado que recusou a via institucional e as determinações sócio históricas da profissão.

No entanto, é com este referencial, precário em um primeiro momento, do ponto de vista teórico, mas posicionado do ponto de vista sócio‐político, que a profissão questiona sua prática institucional e seus objetivos de adaptação social ao mesmo tempo em que se aproxima dos movimentos sociais. )nicia‐se aqui a vertente comprometida com a ruptura ȋNETTO,ͳͻͻͶ, p. ʹͶ͹ e ssȌ com o Serviço Social tradic onal.i

Estas tendências, que configuram para a profissão linhas diferenciadas de fundamentação teórico‐metodológica tenderão a acompanhar a trajetória do pensamento e da ação profissional nos anos subsequentes ao movimento de Reconceituação e se conservarão presentes até os anos recentes, apesar de seus movimentos, redefinições e da emergência de novos referenciais nesta transição de milênio.

Questões para reflexão:

Como se constituem e se desenvolvem no Serviço Social brasileiro as primeiras interpretações sobre sua própria intervenção e sobre a realidade social?

Quais as principais vertentes de análise definem‐se para a profissão no âmbito do Movimento de Reconceituação?

2 O Serviço Social nos anos 80: as tendências históricas e teórico metodológicas d o debate profissional

É, sobretudo com )amamoto ȋͳͻͺʹȌ no início dos anos ͺͲ que a teoria social de Marx inicia sua efetiva interlocução com a profissão. Como matriz teórico‐ metodológica esta teoria apreende o ser social a partir de mediações. Ou seja, parte da posição de que a natureza relacional do ser social não é percebida em sua imediaticidade. ")sso porque, a estrutura de nossa sociedade, ao mesmo tempo em que põe o ser social como ser de relações, no mesmo instante e pelo mesmo processo, oculta a natureza dessas relações ao observador" ȋNETTO, ͳͻͻͷȌ Ou seja, as relações sociais são sempre mediatizadas por situações, instituições etc, que ao mesmo tempo revelam/ocultam as relações sociais imediatas. Por isso nesta matriz o ponto de partida é aceitar fatos, dados como indicadores, como sinais, mas não como fundamentos últimos do horizonte analítico. Trata‐se, portanto de um conhecimento que não é manipulador e que apreende dialéticamente a realidade em seu movimento contraditório. Movimento no qual e através do qual se engendram, como totalidade, as relações sociais que configuram a sociedade capitalista.

É no âmbito da adoção do marxismo como referência analítica, que se torna hegemônica no Serviço Social no país, a abordagem da profissão como componente da

supõe uma direção hegemonica. A questão do pluralismo, sem dúvida uma das questões do tempo presente, desde aos anos ͺͲ vem‐se constituindo objeto de polêmicas e reflexões do Serviço Social. Temática complexa que constitui como afirma Coutinho ȋͳͻͻͳ, p. ͷ ‐ͳͷȌ um fenômeno do mundo moderno e da visão individualista do homem. É o autor em questão que problematiza a proposta de hegemonia com pluralismo, no necessário diálogo e no debate de idéias, apontando os riscos de posicionamentos ecléticos ȋque conciliam o inconciliável ao apoiarem‐se em pensamentos divergentesȌ.

Assim, em diferentes espaços, o conjunto de tendências teórico‐metodológicas e posições ideopolíticas se confrontam, sendo inegável a centralidade assumida pela tradiç o marxista nesse processo.ã

Este debate se expressa na significativa produção teórica do Serviço Social brasileiro, que vem gerando uma bibliografia própria, e que tem na criação e expansão da pós‐ graduação, com seus cursos de mestrado e doutorado, iniciada na década de ͹Ͳ, um elemento impulsionador.

É importante lembrar que a pós‐graduação configura‐se, por definição, como espaço privilegiado de interlocução e diálogo entre as áreas do saber e entre diversos paradigmas teórico‐metodológicos. Neste espaço o Serviço Social brasileiro vem dialogando e se apropriando do debate intelectual contemporâneo no âmbito das ciências sociais do país e do exterior. Também neste espaço, o Serviço Social brasileiro desenvolveu‐se na pesquisa acerca da natureza de sua intervenção, de seus procedimentos, de sua formação, de sua história e, sobretudo acerca da realidade social, política, econômica e cultural onde se insere como profissão na divisão social e técnica do trabalho. Avançou na compreensão do Estado capitalista, das políticas sociais, dos movimentos sociais, do poder local, dos direitos sociais, da cidadania, da democracia, do processo de trabalho, da realidade institucional e de outros tantos

temas. Enfrentou o desafio de repensar a assistência social colocando‐a como objeto de suas investigações. Obteve o respeito de seus pares no âmbito interdisciplinar e alcançou visibilidade na interlocução com as ciências sociais, apesar das dificuldades decorrentes da falta de experiência em pesquisa, do fato de defrontar com restrições por se constituir em disciplina interventiva ȋde "aplicação"Ȍ e das dificuldades na apropriação das teorias sociais. Nesta década o serviço Social ganha espaço no CNPq como área de pesquisa.

Cabe também assinalar que nos anos ͺͲ começam a se colocar para o Serviço Social brasileiro demandas, em nível de pós‐graduação, de instituições portuguesas, e latino americanas ȋArgentina, Uruguai, ChileȌ, o que vem permitindo ampliar a influência do pensamento profissional brasileiro nestes países.

Também no âmbito da organização e representação profissional o quadro que se observa no Serviço Social brasileiro é de maturação ȋNETTO, ͳͻͻ͸, p. ͳͲͺ ‐ͳͳͳȌ. Maturação que expressa na passagem dos anos ͺͲ para os anos ͻͲ rupturas com o seu tradicional conservadorismo, embora como bem lembre o autor Dzessa ruptura não signifique que o conservadorismo ȋe com ele, o reacionarismoȌ foi superado no interior da categoria profissional" ȋp. ͳͳͳȌ. Pois, a herança conservadora e antimoderna, constitutiva da gênese da profissão atualiza‐se e permanece presente nos tempos de hoje. Essa maturidade profissional que avança no início do novo milênio, se expressa pela democratização da convivência de diferentes posicionamentos teórico‐metodológicos e ideopolíticos desde o final da década de ͳͻͺͲ. Maturação que ganhou visibilidade na sociedade brasileira, entre outros aspectos, pela intervenção dos assistentes sociais, através de seus organismos representativos, nos processos de elaboração e implementação da Lei Orgânica da Assistência Social ‐ LOAS ȋdezembro de ͳͻͻ͵Ȍ. É também no âmbito da implementação da LOAS,e de outras políticas sociais públicas, com os processos

Questão para reflexão:

Quais as tendências mais relevantes do Serviço Social nos anos ͺͲ do ponto de vista da produção de conhecimentos e do exercício profissional?

3 O Serviço Social nos anos 90: as tendências históricas e teórico metodológicas d o debate profissional

)nicialmente, não podemos esquecer que, nos marcos da reestruturação dos mecanismos de acumulação do capitalismo globalizado, os anos ͺͲ e ͻͲ foram anos adversos para as políticas sociais e se constituíram em terreno particularmente fértil para o avanço da regressão neoliberal que erodiu as bases dos sistemas de proteção social e redirecionou as intervenções do Estado em relação à questão social. Nestes anos, em que as políticas sociais vêm sendo objeto de um processo de reordenamento, subordinado às políticas de estabilização da economia, em que a opção neoliberal na área social passa pelo apelo à filantropia e à solidariedade da sociedade civil e por programas seletivos e focalizados de combate à pobreza no âmbito do Estado ȋapesar da Constituição de ͳͻͺͺȌ, novas questões se colocam ao Serviço Social, quer do ponto de vista de sua intervenção, quer do ponto de vista da construção de seu corpo de conhecimentos.

Assim, a profissão enfrenta o desafio de decifrar algumas lógicas do capitalismo contemporâneo particularmente em relação às mudanças no mundo do trabalho e sobre os processos desestruturadores dos sistemas de proteção social e da política social em geral. Lógicas que reiteram a desigualdade e constroem formas despolitizadas de abordagem da questão social, fora do mundo público e dos fóruns democráticos de representação e negociação dos interesses em jogo nas relações Estado / Sociedade.

Efetivamente, a opção neoliberal por programas seletivos e focalizados de combate à pobreza e o avanço do ideário da "sociedade solidária" que implica no deslocamento para sociedade das tarefas de enfrentar a pobreza e a exclusão social, começa a parametrar diferentes modalidades de intervenção no campo social na sociedade capitalista contemporânea Exemplos desta opção podem ser observados em diversos países do Continente latino‐americano como no Chile e na Argentina.

)nserido neste processo contraditório o Serviço Social da década de ͻͲ, se vê confrontado com este conjunto de transformações societárias no qual é desafiado a compreender e intervir nas novas configurações e manifestações da "questão social", que expressam a precarização do trabalho e a penalização dos trabalhadores na sociedade capitalista contemporânea.

Trata‐se de um contexto em que são apontadas alternativas privatistas e refilantropizadas para questões relacionadas à pobreza e à exclusão social. Cresce o denominado terceiro setor, amplo conjunto de organizações e iniciativas privadas, não lucrativas, sem clara definição, criadas e mantidas com o apoio do voluntariado e que desenvolvem suas ações no campo social, no âmbito de um vastíssimo conjunto de questões, em espaços de desestruturação ȋnão de eliminaçãoȌ das políticas sociais, e de implementação de novas estratégias programáticas como, por exemplo, os programas de Transferência de Renda, em suas diferentes modalidades.

Nessa conjuntura, emergem processos e dinâmicas que trazem para a profissão, novas temáticas, novos, e os de sempre, sujeitos sociais e questões como: o desemprego, o trabalho precário, os sem terra, o trabalho infantil, a moradia nas ruas ou em condições de insalubridade, a violência doméstica, as discriminações por questões de gênero e etnia, as drogas, a expansão da A)DS, as crianças e adolescentes de rua, os doentes mentais, os indivíduos com deficiências, o envelhecimento sem

assistência social, da criança e do adolescente, entre outras, participando amente na defesa de direitos e no controle social das políticas públicas. ativ

É importante observar que esta presença tem início em uma conjuntura contraditória e adversa, na qual os impactos devastadores sobre o processo de reprodução social da vida se fazem notar de múltiplas formas, mas, sobretudo pela precarização do trabalho e pela desmontagem de direitos.

É fundamental assinalar que as transformações societárias que caracterizam esta década, vão encontrar um Serviço Social consolidado e maduro na sociedade brasileira, uma profissão com avanços e acúmulos, que, ao longo desta década construiu, com ativa participação da categoria profissional, através de suas entidades representativas um projeto ético político profissional para o Serviço Social brasileiro, que integra valores, escolhas teóricas e interventivas, ideológicas, políticas, éticas, normatizações acerca de direitos e deveres, recursos político‐organizativos, processos de debate, investigações e, sobretudo interlocução crítica com o movimento da sociedade na qual a profissão é parte e expressão ȋcf. NETTO, ͳͻͻͻȌ.

A direção social que orienta este projeto de profissão tem como referência a relação orgânica com o projeto das classes subalternas, reafirmado pelo Código de Ética de ͳͻͻ͵, pelas Diretrizes Curriculares de ͳͻͻ͸ e pela Legislação que regulamenta o exercício profissional ȋLei n. ͺ͸͸ʹ de Ͳ͹/Ͳ͸/ͻ͵Ȍ.

Cabe ainda assinalar outra questão que vem permeou o debate dos assistentes sociais nesta conjuntura: trata‐se do movimento de precarização e de mudanças no mercado de trabalho dos profissionais brasileiros, localizado no quadro mais amplo de desregulamentação dos mercados de trabalho de modo geral, quadro em que se alteram as profissões, redefinem‐se suas demandas, monopólios de competência e as próprias relações de trabalho. Aqui situamos processos como a terceirização, os

contratos parciais, temporários, a redução de postos de trabalho, a emergência de novos espaços de trabalho como o Terceiro Setor, a exigência de novos conhecimentos técnico‐operativos, ao lado do declínio da ética do trabalho e do restabelecimento exacerbado dos valores da competitividade e do individualismo. Não podemos esquecer que a reestruturação dos mercados de trabalho no capitalismo contemporâneo vem se fazendo via rupturas, apartheid e degradação humana.

Do ponto de vista das referências teórico‐metodológicas a questão primeira que se coloca para a profissão já no início da década é o confronto com a denominada "crise" dos modelos analíticos, explicativos nas ciências sociais, que buscam captar o que está acontecendo no fim de século e as grandes transformações que alcançam múltiplos aspectos da vida social. No mundo do conhecimento começam as interferências, não sem conflitos, do denominado pensamento pós moderno, "notadamente em sua versão neoconservadora" ȋNETTO, ͳͻͻ͸, p. ͳͳͶȌ que questiona e nivela os paradigmas marxista e positivista. Estes questionamentos se voltam contra os diferentes "modelos" explicativos por suas macroabordagens apontando que nestas macronarrativas são deixados de lado valores e sentimentos fundamentais dos homens, seu imaginário, suas crenças, afeições, a beleza, os saberes do cotidiano, os elementos étnicos, religiosos, culturais, os fragmentos da vida enfim. A abordagem pós‐moderna dirige sua crítica à razão afirmando‐a como instrumento de repressão e padronização, propõe a superação das utopias, denuncia a administração e o disciplinamento da vida, recusa a abrangência das teorias sociais com suas análises totalizadoras e ontológicas sustentadas pela razão e reitera a importância do fragmento, do intuitivo, do efêmero e do microssocial ȋem si mesmosȌ restaurando o pensamento conservador e antimoderno. Seus questionamentos são também dirigidos à ciência que esteve mais a serviço da dominação do que da felicidade dos homens. Assim ao afirmar a rejeição à ciência o pensamento pós‐moderno rejeita as categorias da razão ȋda ModernidadeȌ que transformaram os modos de pensar da sociedade, mas não emanciparam o homem, não o fizeram mais feliz e não resolveram problemas de