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CHAUI, MARILENA. Luís Alberto da Costa1. A suposição de que ideologia seria “qualquer conjunto encadeado de ideias” (CHAUI, 2008, p.
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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409 | ARGUMENTUM - Revista de Direito n. 14 - 2013 - UNIMAR
“O que é ideologia?” Chaui, Marilena
Luís Alberto da Costa^1
A suposição de que ideologia seria “qualquer conjunto encadeado de ideias” (CHAUI, 2008, p. 7) parece usual até mesmo no meio acadêmico. A tarefa brilhantemente empreendida pela autora é desfazer tal equívoco e explicar a ideologia como “um ideário histórico, social e político que oculta a realidade” ( Ibid idem , p. 8) e serve para sustentar as relações de poder em uma sociedade. De início, a autora formula uma breve noção de ideologia a partir da filosofia grega e do racionalismo moderno. Observa que para Aristóteles o conhecimento da realidade estava no conhecimento da causa. Quatro causas hierarquizadas formariam a realidade. As causas formal e final, mais valiosas, vinculavam-se à atividade ética e política ( práxis ); e as causas material e eficiente, menos valiosas, vinculavam-se à atividade técnica ( poiésis , o trabalho). Tal idealização foi a explicação metafísica para ocultar a realidade das relações sociais do mundo grego e medieval entre homens superiores (cidadãos gregos e senhores feudais) e homens inferiores (escravos na Grécia antiga e servos na Idade Média). Já na Modernidade, a partir de Descartes, reduzem-se as causas a apenas duas, eficiente e final. Separam-se Natureza (causa eficiente, mecânica, corpo) e Homem (causa final, liberdade, razão, espírito) do que surge como uma nova ideia de trabalho e de conhecimento fundada no domínio técnico sobre natureza, sociedade, corpo e espírito. Mas, enquanto para o burguês essa ideia de trabalho se expressa na vontade livre e controladora dos fins, para o trabalhador (assalariado, subordinado) o trabalho é uma relação mecânica. Na Modernidade, a liberdade é um conceito puramente formal, metafísico: só há vontade realmente livre para o burguês (proprietário). Essa explicação de realidade, produzida de modo idealizado, legitima a desigualdade e dominação social e impede a compreensão da realidade social. Eis, portanto, uma noção de ideologia. Em seguida, faz-se um breve histórico do termo, a começar pelos ideólogos franceses, grupo de pensadores antimetafísicos, antiteológicos e
(^1) Acadêmico do curso de graduação em Direito pela Universidade do Esta- do do Rio Grande do Norte. Auditor Fiscal da Receita Estadual do Ceará.
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antimonárquicos, que foram partidários de Napoleão, mas que, posteriormente, ao se tornarem opositores de seu regime, foram acusados por Napoleão de serem metafísicos e de distorcerem a realidade – fato que deu um sentido pejorativo ao termo. Com Auguste Comte, o termo voltou a ser empregado no sentido de atividade de formação das ideias pela observação e pelas sensações, e também passou a significar “o conjunto de ideias de uma época” ( Ibid idem , p. 25-26). Com Durkheim, a atitude ideológica ganhou o significado de não científica por ser subjetiva e tradicional, corrompida por pré-noções do cientista e desprovida de conceitos precisos. Todavia, a concepção positivista da realidade já é, ela mesma, ideológica, pois se baseia na observação de fatos que já não são as condições reais de existência, mas sim fenômenos ideologicamente produzidos e condicionados. Decerto, o conceito de ideologia adotado por Chaui se baseia no livro A Ideologia Alemã, em que Marx faz uma análise dos pensadores alemães posteriores a Hegel. Para Marx, esses filósofos (Feuerbach, Stirner e Strauss , v.g. ) tomaram um aspecto da realidade humana e o transformaram em uma ideia universal da qual se poderia deduzir todo o real. Marx condena a separação entre a produção das ideias e as condições sócio-históricas em que são produzidas. Para ele, a História é a única ciência concebida como conhecimento dialético e materialista da realidade social. A ideologia, ao oposto, distorce a História ou dela se abstrai completamente. Mesmo criticando radicalmente a filosofia hegeliana, Marx conserva alguns de seus aspectos essenciais, como “o conceito de dialética hegeliana como movimento de produção da realidade cujo motor é a contradição”. Contudo, sem idealizações, a contradição se daria em condições reais, nas relações de produção das condições materiais de existência e no modo de se pensar e interpretar essas relações, o que pode ser investigado a partir do aparecer social , mas só é compreendido quando se chega ao ser social , como, por exemplo, na compreensão do valor do trabalho a partir da mercadoria (aparecer) até o trabalho social não pago (ser social). Todavia, em nossa sociedade essas condições são invertidas: as coisas se humanizam e as pessoas se reificam, como se as ideias humanas fossem autônomas e pudessem controlar a vida dos próprios homens, e o fenômeno da ideologia é que conserva essa “realidade” e a faz “normal, natural, racional, aceitável”. As ideias, baseadas no modo como a atividade humana aparece na experiência imediata, uma inversão do real, elevam-se à condição de universais abstratos e passam a controlar a vida das pessoas. A alienação, portanto, é a forma inicial da consciência. Os homens não se percebem como produtores de sua realidade porque a ideia é tomada como anterior às relações sociais. É nesse sentido que
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pretensa equidade (e razoabilidade), baseada em “valores” desconectados das condições reais de existência, produz uma abertura semântica que só beneficia a quem tem poder suficiente para dela tirar proveito. Não obstante as possíveis ressalvas às doutrinas marxistas (ou neomarxistas) em tempos atuais, é evidente que esse mesmo conceito de ideologia permaneça situado firme e consistentemente nas condições sociais e históricas do nosso país. E, se a democracia e a nossa Constituição dirigente e social, com suas promessas de transformação da realidade, máxime seu art. 3º (erradicação da pobreza, solidarismo, justiça social, etc.) conformam a realidade histórica do nosso tempo, resta indagar: em que sentido as normas constitucionais representam o nosso modo de ser social determinado histórico-culturalmente, voltado para a transformação social? E em que sentido o constitucionalismo seria uma mera reafirmação da ideologia da classe hegemônica, ou a ascensão de uma outra classe dominante? Enfim, será então possível que o Direito, por meio de uma constituição dirigente-social-solidária, supere a barreira ideológica que o separa do ser social, das nossas reais condições de existência?
CHAUI, M. O que é Ideologia? 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 2008.
Recebido em: 18/05/ Aprovado em: 07/08/