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Este texto discute as ideias fundamentais do estruturalismo linguístico, incluindo a natureza das estruturas subjacentes à organização e administração, a importância de estudar as relações entre os elementos e não apenas os elementos individuais, e a definição de estrutura como um modelo explicatório abstrato. O texto também distingue a sincronia e a diacronia, e discute a importância de estudar as relações entre os elementos e a formação de sistemas efetivos.
Tipologia: Notas de estudo
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O objetivo deste texto é o exame das idéias centrais que conformam o estruturalismo como abordagem metodológica às ciências sociais e, em especial às ciências da gestão. Nele discutimos as definições básicas dos conceitos que orientaram o desenvolvimento do estruturalismo original e procuramos explicitar os passos essenciais na aplicação do método estruturalista às pesquisas em ciências da gestão. Concluímos com uma análise das críticas à abordagem estruturalista.
Palavras-chave : método; estruturalismo; administração; pesquisa; ciências da gestão.
The purpose of this paper is to assess the central ideas of the structuralism methodological approach to social sciences, chiefly to management sciences. Definitions of the concepts concerned to original structuralism are discussed. Based on this discussion an attempt is made to explain the essential steps to apply the structuralism method on management sciences researches. We conclude the paper with an assessment of main criticism against structuralism approach.
Key words : method; structuralism; administration; research; management sciences.
Hermano Roberto Thiry-Cherques
O estruturalismo é uma construção teórica iniciada pelo etnólogo Claude Lévi- Strauss. A partir das suas postulações, o entendimento estruturalista ganhou corpo e se desdobrou em dois planos. O primeiro fundamentou uma das correntes filosóficas que animaram a segunda metade do século XX. O segundo irradiou sua epistemologia para os mais diversos campos das ciências humanas e sociais. Dentre esses campos figura o das ciências da gestão, entendida como compreendendo os estudos organizacionais e os estudos administrativos.
Como movimento filosófico, o estruturalismo tem um papel decisivo na trajetória que envolve o embate entre o positivismo lógico, a fenomenologia, a fenomenologia existencial e o historicismo. Embora o corpo teórico do primeiro estruturalismo tenha perdido homogeneidade, os seus preceitos iniciais continuam a ser uma das fontes da problematização sobre as quais se verte a ontologia e a gnosiologia contemporâneas.
Enquanto método, processo organizado, lógico e sistemático de pesquisa das ciências humanas e das ciências sociais, o estruturalismo tem fortuna variada. Em alguns ramos, como o da psicologia, o da lingüística e o da crítica, ocupa um papel central. Em outros, ou bem foi absorvido pelas linhas metodológicas posteriores ou foi incorporado apenas fragmentariamente. Nas ciências da gestão tem pouca influência direta. Mas os seus desenvolvimentos, como o estrutural- funcionalismo e o estruturalismo genético, embasam uma gama significativa de estudos e pesquisas. É o caso do marco de inflexão teórico representado por trabalhos como os de Amitai Etzioni (1967), ou de Peter Blau (1970), ou de contribuições metodológicas de grande impacto, como as de Talcott Parsons (1960), Michel Foucault (1972, 1979) e Pierre Bordieu (2001; 2002).
A perspectiva estruturalista propõe o abandono do exame particular dos objetos a que se consagra. Estuda as estruturas subjacentes ao organizar e ao administrar, formadas pelos elementos que os caracterizam enquanto traços inerentes ao espírito humano. Desconsidera as organizações e as formas de administrar, tomadas como manifestações de outras coisas – como segmento social, agente econômico, ator político, etc. – que não elas mesmas. Seu propósito é a constituição de modelos arquetípicos de todas as organizações e de todas as formas de organizar.
Nem sempre o método estruturalista e os métodos que derivam do estruturalismo são facilmente entendidos pelos pesquisadores. Esta dificuldade é observada no embasamento de dissertações, de teses e de pesquisas aplicadas. Tem raízes no
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Foi esta a dificuldade com que se deparou o etnólogo francês Claude Lévi- Strauss. Preso entre instrumental metodológico da sua época e a realidade concreta observada, ele se viu obrigado a decidir entre duas linhas de conduta. Ou bem obedecia aos cânones estabelecidos da ciência e desprezava o que havia constatado, ou bem, e esta foi a sua escolha, se dedicava à construção de uma base teórica que permitisse a superação do dilema.
O estruturalismo, que sofre influências do pensamento dialético, da fenomenologia existencial e até da geologia (Lévi-Strauss, 1971), mas que nasce das pesquisas de campo e não do raciocínio especulativo, é uma tentativa de reconciliar a teoria com a prática. Lévi-Strauss procurou uma ponte entre o lógico e o empírico, um fundamento que pudesse dar conta da diversidade do mundo, um instrumental que fosse deduzido, ele também, do real. Algo que não fosse a simples descrição do empírico imediato, que não resvalasse para o devaneio, para a pura abstração. Que fosse uma teoria do possível.
A base científica criada por Lévi-Strauss, se propõe justamente isto: desenvolver uma teoria do logicamente possível, construída a partir do real concreto. É fruto de uma convicção teórica, da insatisfação e do acaso. A noção teórica foi apreendida de Marcel Mauss (1968), um antropólogo de grande envergadura, e que sustentava ser “a vida social um mundo de relações simbólicas” (1973a). A insatisfação procedia do contraste entre o verificável na vida social, notadamente na vida das sociedades primitivas, e os ensinamentos que daí se podiam tirar. O acaso envolveu as peripécias da derrota francesa no começo da Segunda Guerra Mundial e a comunidade de intelectuais refugiados em Nova York, tempo e lugar em que Lévi-Strauss tem acesso aos progressos teóricos da lingüística estruturalista de Saussure.
Freqüentando os seminários de outro exilado, Roman Jakobson (1973), pesquisador e teórico da lingüística estruturalista, Lévi-Strauss aprendeu que enquanto a filologia clássica considerava que a língua era uma espécie de espelho da realidade (teoria mimética), entendendo que cada vocábulo possuía uma relação natural com a coisa que refere, Saussure se preocupou com a sistematização dos sinais, vindo a criar uma nova ciência, a semiologia, baseada na teoria da arbitrariedade do signo. Uma ciência segundo a qual as relações entre os vocábulos e o mundo se estabelecem não por leis imanentes da natureza, mas por operações derivadas de relações estruturais profundas do espírito humano (Teixeira, 1998, p. 35).
O ponto de partida da lingüística de caráter estruturalista é a idéia de que a
O Primeiro Estruturalismo: Método de Pesquisa para as Ciências da Gestão (1)
linguagem não pode estar limitada às relações entre as palavras e as coisas (Hughes & Sharrock, 1999, p. 418). De modo que a forma correta de interpretar a linguagem é como sistema diferenciado, em que as unidades lingüísticas devem ser caracterizadas pelos papéis que desempenham e identificadas pelo contraste que apresentam entre si, deixando de lado a função referencial. O problema do signo se concentra na relação entre o significado (o conceito) e o significante (a imagem acústica). O foco é o da língua (o construído), não o da fala (o dado). Com isto, a lingüística se desembaraçou do sujeito que fala, da psicologia do falante, da genealogia dos significados, para se concentrar na logicidade da língua e do discurso (Dosse, 1993, p. 73). As unidades ou elementos lingüísticos formam estruturas subjacentes a qualquer idioma e a qualquer discurso. Formam relações de concordância, de subordinação e de ordem, que constituem estruturas invariantes universais.
Transpostas para o mundo das relações sociais, as premissas do estruturalismo lingüístico permitiram a Lévi-Strauss desenvolver uma construção teórica de superação do contraditório entre a realidade observável e o que pode ser coligido, ordenado e transmitido, entre o concreto e o que pode ser objeto de ciência. A sua proposta é a de:
. considerar não o fenômeno consciente e as relações que mantêm entre si os elementos diretamente observáveis, mas a voltar-se para a estrutura - inconsciente - que sustenta e ordena estes elementos e estas relações; . estudar não mais os elementos, mas, ao contrário, privilegiar a descrição e a análise das relações entre os elementos; . se concentrar na ordenação destas relações como sistemas inteligíveis, não como invenções do espírito nem como simples abstrações, mas como relações, que ainda que baseadas no empírico, são também racionais, isto é, são passíveis de serem representadas por esquemas lógico-matemáticos; . se restringir aos sistemas efetivos, isto é, aos sistemas de relações simultâneas em um tempo dado (os sistemas sincrônicos), e abandonar toda a idéia de origem e formação histórica dessas estruturas (a diacronia); . identificar as leis gerais destes sistemas, seja por indução, seja por dedução lógica.
É munido dessas idéias que Lévi-Strauss declara o programa do primeiro estruturalismo, do que vai desencadear a revolução metodológica de que nos ocupamos agora.
O Primeiro Estruturalismo: Método de Pesquisa para as Ciências da Gestão (1)
Enquanto outras formas de pensamento se concentram na elucidação dos sistemas – de como as coisas funcionam – ou focam diretamente fenômenos isolados, a idéia central do estruturalismo é a de que a estrutura – o conjunto de relações – é o determinante na explicação dos objetos psicossociais. Distingue- se, portanto, do historicismo, do positivismo lógico e da fenomenologia.
O estruturalismo não nega as condicionantes históricas. Ele só se opõe à história que pretende estudar os elementos isolados, em lugar de tomar consciência dos seus nexos. Tem da história uma noção operacional, não filosófica. Contra o historicismo, Lévi-Strauss (1958, p. 6-8) argumentou que as sociedades não são etapas de um desenvolvimento que chega até hoje (a “lógica hegeliana do progresso”), que o historicismo não considera as diversidades no espaço, as descontinuidades no tempo e que utiliza uma única categoria de compreensão. Contra o pensamento dialético e o historicismo em geral, o estruturalismo descrê que seja possível reconstruir a história dos fenômenos sociais desde seu interior. O estruturalismo aceita que existam causas, relações causais e mudanças, até mesmo de caráter histórico (relações diacrônicas), mas não crê que tais relações sejam determinantes na compreensão do mundo que nos cerca.
Embora também faça uso de técnicas lógico-formais de análise da linguagem, o estruturalismo se afasta da idéia de que o conhecimento possa ser obtido somente pelo esclarecimento conceitual, pelo esclarecimento dos significados dos enunciados. O estruturalismo se diferencia do conceito de estrutura do empiricismo lógico, ao afirmar que a relação precede a seus termos e a forma precede o conteúdo. No estruturalismo não existem elementos primeiros determinantes (elementos isolados). O que há são sistemas de relações entre fenômenos.
O estruturalismo substitui a ênfase atomista dos fenômenos como entidades unívocas e mutuamente independentes pela elaboração de modelos de ordem geral que enfatizam as relações entre os fenômenos. Com isto tira o foco da investigação de qualquer elemento particular. Até mesmo, e principalmente, tira o foco do sujeito e das questões a ele relacionadas, como a subjetividade, o pathos , a liberdade individual, para enfatizar a condição humana, seus limites e restrições inconscientes e os padrões que a conformam. O estruturalismo é uma filosofia sem sujeito.
Outra distinção importante a ser feita é entre a posição original do estruturalismo e a das correntes de pensamento dele derivadas. O primeiro estruturalismo examina as estrutura em um momento determinado. Distingue a sincronia – o estado do campo de estudo como sistema de elementos – da diacronia – a sucessão dos estados sincrônicos. A análise sincrônica é a análise de um estado. A análise diacrônica é a análise no tempo de elementos concretos (não história); de estruturas
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que se sucedem. O primeiro estruturalismo se atém às estruturas sincrônicas, aos modelos de vida social que se explicam como invariantes no tempo e no espaço.
A oposição estruturalista entre os elementos é referida a uma condição estática, dentro de um sistema de relações de elementos presentes. Enquanto a hegeliana, por exemplo, é dinâmica. É referida aos elementos contraditórios que levam a um sistema distinto, onde estes contraditórios já não mais existem isoladamente (Kronenfeld & Decker, 1979, p. 512). No estruturalismo interpretamos a resultante de uma cadeia diacrônica de elementos que ingressaram na estrutura no primeiro estado sincrônico.
As estruturas são não-causais. Não revelam a origem dos elementos nem o modo como operam, mas as condições, as formas de relações, que se definem por sua sintaxe, isto é, pelas leis de concordância, de subordinação e de ordem a que estão sujeitos os elementos. A prova do modelo é a sua eficácia explicativa.
À diferença de outras linhas de pensamento, como o marxismo e a fenomenologia, no estruturalismo o termo /estrutura/ é conceituado como algo inacessível à observação e à descrição observacional. O estruturalismo procura captar os fenômenos humanos aquém da consciência que deles se tem, escolhendo como terrenos de estudos privilegiados as ordens de fatos muito insignificantes e desprovidas de implicações práticas (Lévi-Strauss, 1971).
As estruturas são modelos de explicação (formas ontológicas). A propriedade que caracteriza uma estrutura não é inferida da abstração a partir dos objetos, mas da abstração reflexiva, como a do pensamento lógico-matemático (Piaget, 2003, p. 20). É próprio da abstração reflexiva ser tirada não dos objetos, mas das ações que se podem fazer sobre eles, tais como reunir, ordenar, corresponder. São operações de composição, de caráter dedutivo (construção apriorística) e não de indução (análise regressiva). Há estrutura quando os elementos estão reunidos em uma totalidade, apresentando algumas propriedades como totalidade e quando as propriedades dos elementos dependem, total ou parcialmente, dessas características de totalidade (Goldmann, 1979).
O estruturalismo considera a existência de estruturas superficiais (as que detectamos diretamente por observação) e estruturas profundas (as estruturas lógicas, que subjazem sob o aparente e o imediato) (Lévi-Strauss, 1958, p. 28). As últimas se reportam às primeiras. Por exemplo: a estrutura superficial do discurso está referida à estrutura profunda do conjunto de regras de linguagem. Cada estrutura superficial pode estar referida a várias estruturas profundas e cada estrutura profunda pode ser referência de várias estruturas superficiais. O número de estruturas profundas possíveis é limitado. Além disso, a estrutura tem
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O método consiste em ordená-los segundo uma perspectiva unificante. Ele está voltado para a identificação de um sistema relacional de elementos, das suas propriedades e do conjunto de estados e transformações possíveis pelos quais estes elementos e relações podem passar.
O estudo das propriedades consiste em examinar as condições que tornam possível à estrutura passar de um estado a outro, mediante a mudança de elementos, sem alterar o sistema estrutural. Essas passagens ou transformações assumem várias formas. Um exemplo clássico é o da transposição de uma melodia de tom para outro: todas as notas particulares podem ser alteradas, mas a melodia (a estrutura) permanece a mesma.
O estruturalista procura encontrar as totalidades. Não faz uso da análise e decomposição para encontrar os elementos supostamente últimos e determinantes. Pretende estabelecer a relação primeira da qual parte um ponto nodal - o que Roland Barthes (2000) denominou de /grau zero/ - não definido pelo seu conteúdo empírico, mas pelo fato de permitir ao conteúdo instituir-se em uma posição relacional. Barthes, buscou o grau zero da relação do escritor com a sociedade, Lévi-Strauss buscou o grau zero do parentesco e o do mito, Jakobson, o da língua, etc. (Dosse, 1993, p. 96).
Os elementos do estruturalismo aplicados às ciências da gestão são análogos aos fonemas, aos mitemas (4)^ , aos elementos químicos, às notas musicais, etc. Os exemplos de unidades constituintes de estruturas no campo das organizações e da gestão são variados. Vão desde os nós nas cadeias logísticas até os papéis em um processo de negociação. Constituem estruturas as hierarquias, as formas de sociabilidade, as regras sociais, as mentalidades, os modos de dividir o trabalho, os modos de repartir a acumulação, os valores manifestos; os códigos, as normas, etc.
Os temas da análise estrutural contrastam com os de 20 anos atrás, como os relativos à dependência de recursos, à gestão de ativos e aos custos das transações. Neste início de século, a análise estruturalista tem sido praticada em estudos sobre desempenho & racionalidade; sobre cultura organizacional e sobre produtividade & trabalho(5). Mas, praticamente, não existem limitações à aplicação do método estruturalista. Ele pode estar dirigido à elucidação da estrutura tanto de grupos elementares, entendidos como uma coleção de indivíduos, por exemplo, de empregados interdependentes que compartilham uma tarefa comum e que intercambiam para promover sua realização (derivam desse tipo de estudo as análises sobre as propriedades estruturais da liderança e sobre as estruturas (redes)
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de comunicação (6)^ ) como da totalidade dos indivíduos em um conjunto de organizações.
O estudo das estruturas no campo organizacional e administrativo, como em qualquer campo particular, consiste em descrever um sistema relacional que possa ser identificado a partir de um ponto nodal que declare o significado do que subsiste para além do diretamente manifesto e o torne inteligível. Isto é feito mediante observação, decomposição em tipos de elementos, conceitualização dos elementos e relações, elaboração de um modelo genérico explicativo e de uma interpretação, que oferece a descrição da estrutura e das perspectivas explicativas e antecipatórias que encerra.
Ao procedermos à observação devemos ter sempre em mente que a origem da estrutura não é o real, mas o espírito humano. A intenção última não é a descrever o observado - este é apenas o primeiro dos passos metodológicos - mas a de encontrar o sentido próprio que está por trás das metáforas de elaboração (Lévi- Strauss, 1971).
A pesquisa empírica é apenas um ponto de partida, não uma âncora. O método estruturalista implica superar uma descrição direta do sensível (como no empiricismo), ou do vivido (como na fenomenologia), ou de uma gênese (como no historicismo). Esta superação se encontra na estrutura, na racionalidade que jaz além do empírico (Viet, 1973, p. 84).
Iniciamos a busca pelas estruturas mediante observação para não nos apartarmos da realidade concreta. Sabemos que não se trata de buscá-la nas relações submetidas à observação. Tampouco se trata de construir uma estrutura a priori , sem observação, para depois verificar se está estrutura se ajusta ao empírico.
Devemos observar o que existe e procurar isolar os elementos estáveis (sempre parciais) que permitem comparar e classificar (Lévi-Strauss, 1958, p. 356). Para isto, todos os fatos devem ser descritos com exatidão, em si mesmos; devemos cientificar-nos dos processos concretos que os produzem; em relação com o conjunto, devemos investigar o que o faz com que mudem e o que ocorre quando são alterados (Viet, 1973, p. 87).
Como disciplina, procuramos enfocar as resultantes ( outputs ) da atividade (social) do campo observado. Uma vez reconhecidas estas resultantes, identificamos as operações que as produzem. Por exemplo, podemos descrever uma estrutura de decisão considerando os elementos chave da decisão, os
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Os conceitos dos elementos isolados devem ser destacados e reagrupados enquanto “realização de pensamentos” (Benevistes, 1966, p. 64). Notemos que os signos (as palavras, os símbolos) que utilizamos para denotar os elementos das estruturas não representam a experiência do real, mas somente conceitos. Isto é, resultam de um esforço de elaboração e, portanto, são condicionados histórica e psicologicamente (Parain-Vial, 1972, p. 77).
Uma estrutura é sempre a teoria de um sistema de aparências. Estuda a relação entre termos em seu caráter expositivo e diferencial. Por este motivo, a estrutura não pode ser apreendida diretamente na realidade concreta. É necessário estabelecer modelos teóricos que dêem conta dela.
Modelo é uma teoria específica sobre o comportamento de elementos de uma determinada classe. Por exemplo, enuncia a maneira em que os componentes de uma estrutura concreta se mantêm unidos. A noção de modelo do estruturalismo foi tomada da logística, dos modelos – descrições matemáticas do real - desenvolvidos para enfrentar o Bloqueio de Berlim, mas é puramente formal, científica (Dosse, 1993, p. 200).
Um modelo científico é uma seqüência de entidades constituída na forma ( B 1 ...., B n ( A 1 ...., A n ), R 1 ...., R p ) que satisfaz determinadas condições, sendo:
. a série B representativa das proposições básicas; . a série A representativa das proposições secundárias e . a série R representativa das relações entre algumas dessas proposições.
Nos modelos quantitativos os conteúdos da série R são grandezas. Nos modelos qualitativos são tipicamente relações classificatórias (conectivas, disjuntivas, etc.), relações de ordem (redes, seriações, correspondências) e relações topológicas (proximidade, continuidade, limite).
Os modelos lógico-matemáticos independem da realidade concreta. Os modelos das ciências factuais são construídos a partir de mensurações da realidade concreta. São submetidos a uma teoria geral em conjunto a proposições subsidiárias que os confirmam ou infirmam. Os modelos, no sentido em que o termo /modelo/ é empregado pelo estruturalismo, são construídos a partir de elementos observacionais, numéricos ou não. Servem para construir uma teoria das relações entre esses elementos: a estrutura.
A descrição dos elementos e dos sistemas relacionais nos dá modelos da
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realidade. São modelos conscientes, que ainda não são as estruturas. A análise estrutural tem como objeto os modelos inconscientes, implícitos. O modelo consciente não é uma estrutura. É um análogo. Ele é construído, isto é, ele não é uma visão do espírito, uma illuminatio (Piaget, 2003, p. 31). Serve como ponte entre o concreto (o dado , como o mito, a organização, a fala) e o inteligível (o construído , como a estrutura mítica, as formas de organizar, a língua). O modelo é que dá acesso à realidade, que nos ajuda a entender a estrutura profunda, não consciente.
A construção do modelo consiste nas seguintes operações:
A interpretação estrutural parte dos modelos descritivos. Tais modelos podem ser mecânicos (relações simples) ou estatísticos. A análise estrutural consiste em: i) proceder a experimentações com os modelos, isto é, em realizar procedimentos que permitam saber como um modelo dado reage a modificações e, ii) a efetuar comparações entre modelos de mesmo tipo e de tipos diferentes. Com isto o modelo inconsciente, a estrutura, é construído racionalmente a partir da observação empírica. O caminho dessa construção consistindo, como vimos, em observar, extrair os elementos e as relações isoláveis e modelizar , isto é, em expor a estrutura sob a configuração de um esquema formal (simbólico) (Viet, 1973, p. 90).
Ao término do passo observacional tínhamos um modelo relacional concreto de um conjunto de elementos concretos. Ao término da interpretação estrutural devemos ser capazes de enunciar uma estrutura relacional formalizada de um conjunto determinado de elementos ordenados. A análise estrutural parte, portanto, da i) conceitualização dos elementos, isto é, a passagem do concreto ao formal (ao genericamente aplicável) e, ii) da análise interpretativa, isto é, a determinação dos elementos e das relações, para chegar a realizar uma construção lógica, isto é, uma ordenação estruturada dos elementos.
No esforço interpretativo nos voltamos para o exame das propriedades essenciais
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As formas de descrever as estruturas são variadas. Elas podem ser objeto de uma enunciação linear, ou de grafos, em que a representação dos elementos (vértices) ligados por linhas que denotam as relações. As conexões podem ser recíprocas ou orientadas, isto é, considerar o sentido em que se dá a conexão (setas). Podem vir sob a forma de matrizes referidas às correlações entre os elementos. Podem ser apresentadas como relações paritárias, como nos sociogramas, que retratam as diversas formas de sociabilidade, ou como relações hierárquicas, como nos organogramas, etc. O fundamental é que tenham sentido.
Ter sentido quer dizer ter um significado lógico determinado. Os que torna a estrutura significativa é a forma como os seus elementos se relacionam, como a interdependência se manifesta. O sentido da estrutura é obtido atribuindo-se uma interpretação específica ao conjunto de elementos (referindo-os a algo) e à ordenação (enunciando a forma em que as relações constantes se dão). A estrutura é válida quando satisfaz a condição de explicar não só o observado, mas o observável. As estruturas identificadas e descritas devem ser capazes de autorizar o lançamento de novas hipóteses e de predições.
Para concluir devemos ressaltar que o método estruturalista de investigação encerra dificuldades nada desprezíveis. Basta considerar que a sociedade não tem uma estrutura, mas uma multiplicidade delas - parentesco, código de etiqueta, maneiras de cozinhar, etc. - e que os sistemas simbólicos que formam a sociedade (organizações, linguagem, regras matrimoniais, relações econômicas, arte, ciência, religião) são imensamente diversos. Além disto, as estruturas podem conter contradições; podem ser ou não ser redutíveis umas às outras, podem ser incomensuráveis e a expressão de uma estrutura na outra pode estar deformada (torção) (Parain-Vial, 1972, p. 127).
A critica ao resultado do processo de elaboração das estruturas proposta por Lévi-Strauss (1958, p. 366) consiste, precisamente, em anular as torções e em encontrar uma homologia ideal. Podemos fazer isto via a elaboração de um protocolo de realização de testes empíricos ou de consistência lógica. Qualquer modalidade de comprovação empírica, paramétrica, não-paramétrica ou mesmo a simples documentação de ocorrências (caso) é válida para os fins a que o estruturalismo se propõe: demonstrar que a estrutura é possível. O protocolo de verificação define uma atividade operatória que permite fazer corresponder uma
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experiência precisa com os conceitos dos elementos simbolizados matematicamente. A verificação pode levar à validação ou à invalidação da estrutura, sendo que a validação pode ser empírica, ou, como no caso dos mitos, ser devida ao sentimento de inteligibilidade que aportam.
O método estruturalista exige rigor e diligência para que possa apresentar resultados. Mas não só por este motivo ele não vem sendo utilizado na freqüência e amplitude condizentes com as possibilidades de avanço do conhecimento que encerra. É que desde o seu surgimento ele sofre críticas sistemáticas oriundas tanto da direita , isto é do positivismo lógico, como da esquerda do pensamento cientifico, isto é, dos adeptos dos métodos historicistas. De um lado, questiona-se a demonstrabilidade das estruturas inconscientes. De outro, a não-consideração da gênese dessas estruturas. De forma que parece legitimo, para concluir este pequeno resumo do método do primeiro estruturalismo, apresentar a contra- argumentação a estas críticas.
Alega-se, contra o estruturalismo, que as estruturas não podem ser demonstradas como universais, isto é, que não temos como saber, cientificamente, se o espírito (a racionalidade) é o mesmo para todos os seres humanos. O estruturalismo concorda que as subjetividades, por definição, são incomparáveis e incomunicáveis. Mas isto não leva à particularização da racionalidade. Ao contrário, argumentam os estruturalistas, se interagimos, como de fato o fazemos, é porque temos algo em comum para além da subjetividade, algo de que não temos consciência, isto é, uma vida mental cuja estrutura é compartilhada por toda a humanidade. A estrutura inata do espírito humano (Lévi-Strauss, 1973b).
A segunda linha de crítica contra o estruturalismo, de que abandona a gênese, a história dos fenômenos, que desconsidera as estruturas diacrônicas, não procede. Simplesmente o estruturalismo não nega a existência das estruturas diacrônicas (Lévi-Strauss, 1962, p. 40-45). Apenas afirma que não ser possível, nem útil, estudar ao mesmo tempo as estruturas e o seu processo evolutivo. A temporalidade vivida por um sujeito dentro de uma estrutura não pode ser captada e a perspectiva histórica só pode dar-se pela organização das condições conscientes. Além disto, o desenvolvimento histórico não é passível de descrição formal. Isto é, não é possível uma modelização lógico-matemática dos acontecimentos (Viet, 1973, p.
O método estruturalista considera o objeto como totalidade passível de descrição a partir dos elementos que a constituem e das relações que mantém entre si. O estruturalismo, ao construir um método de análise formal, pretende dar objetividade ao estudo do humano. Ao destacar a dimensão sincrônica do objeto, possibilita a
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