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Papel da Transferência e Contratransferência na Psicoterapia, Notas de aula de Psicanálise

Um estudo qualitativo sobre o papel da transferência, contratransferência e interpretação da transferência no processo psicoterapêutico, baseado na análise de sessões de supervisão. O documento discute as características desses fenômenos inconscientes e as diferenças de expressão em duas modalidades diferentes de tratamento psicanalítico: face-a-face e em cadeira-divã. Além disso, o texto aborda as teorias de klein, heimann e racker sobre a transferência e a contratransferência, e as suas importâncias no processo terapêutico.

O que você vai aprender

  • Como Heimann concebe a contratransferência?
  • Quais são as importâncias da transferência e da contratransferência no processo psicoterapêutico?
  • Como a interpretação da transferência pode ajudar no processo terapêutico?
  • Qual é a definição de transferência, de acordo com a teoria de Klein?
  • Quais são as diferenças entre a transferência em tratamento psicanalítico face-a-face e em cadeira-divã?

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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Mauricio_90 🇧🇷

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O papel da transferência, da contratransferência e da interpretação da
transferência no processo psicoterapêutico: um estudo qualitativo
Luís Filipe Vicente da Costa de Oliveira Neves
Dissertação Apresentada ao ISMT para Obtenção do Grau de Mestre em Psicologia Clinica
Orientador: Professora Doutora Esmeralda Luísa Macedo
Co-Orientador: Mestre Luís Filipe de Jesus Calado Madeira
Coimbra, junho 2016
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O papel da transferência, da contratransferência e da interpretação da

transferência no processo psicoterapêutico: um estudo qualitativo

Luís Filipe Vicente da Costa de Oliveira Neves

Dissertação Apresentada ao ISMT para Obtenção do Grau de Mestre em Psicologia Clinica Orientador: Professora Doutora Esmeralda Luísa Macedo Co-Orientador: Mestre Luís Filipe de Jesus Calado Madeira

Coimbra, junho 2016

Agradecimentos

Um agradecimento a todos os meus familiares, amigos, professores e colegas que ao longo destes anos me ajudaram a atingir este objetivo. Felizmente são muitos, mas permitam-me que destaque a minha filha, os meus sobrinhos e os meus pais.

Um agradecimento especial ao Professor Doutor Carlos Farate pela forma como soube transmitir-me o gosto pela Psicanálise ao longo do Mestrado. Um destaque também para o apoio prestado pela orientadora Professora Doutora Esmeralda Macedo e o pelo co-orientador Mestre Filipe Madeira.

E por fim…

A todos aqueles que me aceitam como eu sou Obrigado

Introdução

O êxito do tratamento psicanalítico depende, em grande medida, da capacidade do psicoterapeuta em lidar com fenómenos inconscientes que surgem na relação psíquica com o paciente, nomeadamente os fenómenos da transferência e da contratransferência. Torna-se, assim, particularmente importante aprofundar o estudo destes fenómenos, cuja identificação e adequado manejo, nomeadamente pelo recurso à interpretação dos conteúdos psíquicos inconscientes (emoções, sentimentos, fantasias) transferencialmente projetadas na pessoa do terapeuta. Comecemos, então, por delinear teoricamente os conceitos em causa, traçando, muito em particular, a sua evolução histórica sucinta no campo psicanalítico Na psicanálise, designa-se por transferência o processo pelo qual o paciente re- experiencia, no setting terapêutico da psicanálise, as representações do Self e do objeto, as relações objetais do seu passado, os desejos e as fantasias a elas associados pela sua projeção inconsciente na pessoa do psicanalista (Zimerman,1999). Por outras palavras, este fenómeno inconsciente traduz a projeção na pessoa do analista de sentimentos e desejos inconscientes dirigidos originalmente a pessoas que, por motivos diversos e de diversa polaridade afetiva e libidinal, foram importantes no decorrer da infância. Apesar de vinculada aos eventos do passado, a transferência é um fenómeno que se manifesta, não raro subtilmente, no “aqui e agora” da sessão terapêutica. O conceito de transferência foi sofrendo modificações ao longo da história da psicanálise. Surge com Freud (1895) no tratamento de pacientes histéricas e foi apresentado pela primeira vez na obra “Estudos sobre a histeria” que publicou conjuntamente com Breuer em 1895. O termo transferência, começa por designar uma das possíveis formas de resistência dessas pacientes à psicoterapia. Esta resistência consistia em a paciente transferir para a figura do analista afetos inconscientes e originalmente vinculados à figura de outra pessoa importante do seu passado, mais particularmente ao imago parental em causa em um determinado momento da sessão analítica. Se no início Freud considerou que a transferência estava essencialmente associada à histeria, mais tarde reconhece o valor espontâneo e universal deste fenómeno. O material transferido está ligado ao passado e ao presente, à história do paciente e às suas relações com os pais, ou os seus substitutos, e com o próprio psicoterapeuta. Desta forma vai-se esclarecendo um mundo de lembranças e esquecimentos, fantasias e sofrimentos.

suas pulsões e fantasias inconscientes. Como já foi referido, esta ideia de Klein ganha maior expressão com a sua conceção sobre a identificação projetiva. Bion (1962) trabalha o fenómeno transferencial a partir do seu modelo “continente- conteúdo”, da relação original mãe-filho a partir da revisão criativa do conceito kleiniano de identificação projetiva Já Winnicott (1960) entende que a transferência deve ser compreendida como uma nova relação a que o paciente acede na “área intermediária de jogo e ilusão” que institui o processo terapêutico da psicanálise, a partir da evolução dos fenómenos transicionais para a simbolização. Realça a importância do reconhecimento, pelo analista, da importância e significado da regressão do Self infantil do paciente, e recomenda a sua cuidada gestão contratransferencial, em particular pela capacidade de conter e transformar os ataques destrutivos da parte mais primitiva e carenciada da mente dos pacientes. Finalmente podemos referir as diferenças entre as perspetivas clássicas e contemporânea do conceito de transferência. Enquanto que a primeira aborda a transferência como um processo pelo qual o paciente transfere para o analista sentimentos associados a experiências passadas com objetos internos significativos (amor sexual, ódio, ciúme, inveja), valorizando o ganho de insight no processo psicanalítico, a segunda concebe a transferência como um processo que acompanha todo o tratamento psicanalítico, como uma “experiência total” que diz respeito não apenas ao passado psíquico do paciente, mas também, e sobretudo, ao “aqui e agora” da relação com o psicoterapeuta.

Contratransferência Com a mudança da compreensão da transferência, a contratransferência tornou-se mais presente na psicanálise, passando também a ter um papel fundamental no processo terapêutico. A discussão sobre a contratransferência passou por várias etapas, iniciando-se com a introdução do termo por Freud em 1910. Seguiram-se, de um modo mais significativo, a publicação do artigo de Paula Heimann em 1950 e as importantes contribuições ulteriores de H. Racker (1952). Freud começou por interpretar a contratransferência como uma “obstrução” à liberdade de compreensão do analista. Mais tarde surge uma mudança de paradigma com Heimann (1950), que considera que a contratransferência inclui todos os sentimentos que o analista pode experimentar com o paciente. Para Heimann o analista tem de ser capaz de conter e processar psiquicamente os sentimentos que são originados pelo impacto que o

material psíquico (emoções, sentimentos e fantasias conscientes e inconscientes) projetado pelo paciente tem em si. Voltando à génese do conceito de contratransferência, este foi preconizado por Freud (1910) no Congresso de Nuremberga. No seu texto sobre “ As perspetivas futuras da terapêutica psicanalítica ” (1910, 1915), Freud define a contratransferência como um fenómeno relacional da clínica analítica intimamente vinculado à transferência e considera que reações emocionais inconscientes do analista são um obstáculo tenaz ao avanço do tratamento analítico, do qual o último deverá libertar-se a fim de não influenciar o tratamento psicanalítico. Realça, ainda, a importância da análise pessoal para o manejo da contratransferência. Nesta linha de pensamento Ferenczi (1928), considerado por muitos autores o precursor da perspetiva contemporânea sobre a contratransferência (Lagache, 1980) realça a possível interferência dos sentimentos pessoais do analista na sua resposta às fantasias e emoções projetadas transferencialmente pelo paciente. Para este autor (1928) é importante que o terapeuta esteja atento aos seus próprios sentimentos, na “escuta” empática do paciente em sessão. Heimann (1950) reforça ainda mais a relevância deste fenómeno inconsciente ao considerar que a sua identificação e posterior elaboração constituem a ferramenta de trabalho mais importante do analista. A contratransferência é entendida como o modo de sentir do analista em relação ao material trazido pelo paciente à sessão e implica o processamento psíquico destes sentimentos pelo analista e o seu reenvio ao paciente devidamente elaborados e transformados. Segundo Heimann (1950) o prefixo “contra” vai para além da ideia de oposição, já que inclui a respostas emocional do analista em relação ao seu paciente. Para além disso, a possibilidade de o terapeuta conter e analisar os sentimentos, afetos e fantasias transferidos pelo paciente enriquece a sua capacidade interpretativa, já que os terapeutas que ignoram ou iludem os sentimentos contratransferenciais acabam por interpretar de um modo pobre e superficial o material trazido pelo paciente a sessão. Para que tal não aconteça, é preciso aceitar os sentimentos em relação ao paciente por mais perturbadores que possam apresentar-se na mente do analista. (Heimann, 1950) Outra contribuição relevante para o desenvolvimento deste conceito, surgiu através de Racker (1960) ao introduzir os conceitos de contraidentificação projetiva concordante e complementar. O primeiro conceito refere-se à identificação inconsciente do terapeuta a um aspeto significativo do Self do paciente, enquanto que o segundo envolve a identificação projetiva a alguma caraterística não elaborada psiquicamente pelo paciente e inconscientemente externalizada na pessoa do terapeuta.

sentido é necessário que analista e paciente trabalhem em conjunto para a produzir, ainda que seja o analista a fazer a interpretação. A análise da contratransferência é também necessária, para que os sentimentos pessoais do analista não entravem o processo de cura do analisando. A tomada de consciência das resistências e dos afetos contratransferenciais vai permitir ao analista compreender aquilo que o paciente lhe transmite. Para isso é necessário que o analista esteja sujeito a um trabalho de autoanálise e de supervisão, no que diz respeito à parte do seu inconsciente que é implicada na inter-relação com o paciente.

Em função da problemática definida para o projeto de investigação em que este estudo se baseia, definimos os seguintes objetivos empíricos:

  1. Identificar as caraterísticas e o momento de emergência na sessão psicoterapêutica da transferência, da contratransferência e da interpretação da transferência, através da análise do material clínico das sessões em processo de supervisão;
  2. Analisar as diferenças na expressão destas 3 variáveis em duas modalidades diferentes de tratamento psicanalítico que, no caso deste estudo, são a psicoterapia em face-a-face e a psicoterapia em divã, conduzidas por terapeutas com a mesma formação teórica e experiência clínica sobreponível. Compreender como estes conceitos estão a ser utilizados por psicoterapeutas psicanalíticos, a fim de aprofundar o conhecimento sobre como ela se manifesta na prática clínica.

METODOLOGIA

Tipo de Estudo Trata-se de um estudo empírico qualitativo sobre o material narrativo, registado em áudio, de um processo de supervisão em grupo que decorreu em setting privado durante 1 ano.

Participantes Participaram no processo de supervisão quatro clínicos com formação psicanalítica e com larga experiência clínica em psicanálise e em psicoterapia psicanalítica e um psicanalista titular com funções didáticas (Supervisor).

A partir da aplicação da versão em língua portuguesa do Therapeutic Identity Questionnaire (Thld, Sandell et al.) aos clínicos participantes e da versão em língua portuguesa do Clinical Data Form (CDF, Westen et al.) aos pacientes é possível apresentar a seguinte caraterização para as díades em análise neste estudo

Díade A (Terapeuta A / Paciente A) Dados da Terapeuta: Idade – 36 anos Género – F Anos de trabalho (experiência) – 12 anos Anos terapia pessoal – 7 anos Orientação teórica – Psicanálise

Dados da Paciente: Idade – 26 anos Género – F Tempo de tratamento – 40 meses Habilitações literárias – Formação Superior (Licenciatura) Avaliação global de funcionamento – Sintomas graves / Problemas recorrentes Nível habitual de funcionamento personalidade – Problemas significativos em viver a sua vida Qualidade das relações românticas – Pobres / Pouco estáveis Qualidade das relações de amizade – Relativamente próximas / Razoavelmente estáveis Diagnóstico (DSM IV-R) – Perturbação mista de ansiedade e depressão

Díade B (Terapeuta B / Paciente J) Dados da Terapeuta: Idade – 40 anos Género – F

Modelo de análise

Foi utilizada a análise de conteúdo temático-categorial para a descrição objetiva e sistemática do conteúdo manifesto da comunicação, tendo por base as narrativas produzidas a partir da transcrição das sessões de supervisão em análise para cada uma das díades em estudo. De uma maneira geral, podemos dizer que a análise de conteúdo está entre dois polos: o desejo de rigor e a necessidade de descobrir, de ir além das aparências. Para Bardin (1977) ela possui duas funções:

  1. Uma função heurística: enriquece a exploração e aumenta a possibilidade da descoberta;
  2. Uma função de «administração da prova», já que há um conjunto de hipóteses (que servem de diretrizes) para serem verificadas; Como referimos acima, neste projeto foi efetuada a análise do discurso da paciente e terapeuta em ambiente psicoterapêutico a partir da sua supervisão em contexto de pequeno grupo especializado Seguindo o método de Bardin (1977), a organização da análise foi efetuada em três etapas:
  3. A pré-análise: a fase de organização propriamente dita, cujo objetivo foi sistematizar as ideias iniciais. Nesta etapa escolheram-se os documentos (gravações) a serem submetidos à análise;
  4. A exploração do material – todo o trabalho de análise e categorização do material (enumeração)
  5. O tratamento dos resultados obtidos e a interpretação – tratar os resultados em bruto de forma a serem válidos. Com resultados significativos e fiéis foi possível adiantar interpretações a propósito dos objetivos previstos.

Conceitos operativos para cada uma dos temas (variáveis) em análise

Transferência : Caraterizada como “situação total” (M. Klein), inclui a “neurose de transferência” e a transferência atual, em que sentimentos, emoções, atitudes e experiências passadas, se referem à fantasia objetal inconsciente projetada pelo paciente no terapeuta. Engloba todos os aspetos inconscientes da relação analítica, incluindo a comunicação não- verbal.

Contratransferência : caraterizada pelos sentimentos, atitudes e associações do terapeuta em reação às comunicações e comportamentos do paciente, é um instrumento psíquico que, quando devidamente utilizado, possibilita a compreensão dos processos inconscientes em causa em uma determinada sessão terapêutica (Heimann, 1950)

Interpretação da transferência: caraterizada pelas intervenções do analista que pretendem objetivar e tornar compreensivas para o paciente, as fantasias inconscientes que ele projeta transferencialmente no analista

Categorias, subcategorias, indicadores e unidades de registo

As categorias são operações de classificação de elementos constitutivos de um conjunto por diferenciação e reagrupadas por subcategorias, com critérios pré-definidos. A “categorização tem como primeiro objetivo (da mesma maneira que a análise documental) fornecer, por condensação, uma representação simplificada dos dados em bruto” (Bardin,1977, p.146-147). As categorias foram construídas para que não pudessem existir em mais de uma divisão, ou seja, o mesmo elemento não podia ser classificado em várias categorias. Esta grelha de análise apresenta ainda subcategorias temáticas e as unidades de registo (recortes a nível semântico) que correspondem ao segmento de conteúdo a considerar como unidade base, visando a categorização.

Apresentação e análise dos resultados

Para a apresentação e análise de resultados foram criadas “minitabelas” para as sessões de supervisão em análise para cada uma das díades (A tabela completa, bem como a narrativa da sessão terapêutica a que se refere, poderão ser consultadas em “Apêndices”)

aproximação homossexual (amorosa e estruturante da sua sexualidade feminil) em um momento da sessão em que a transferência materna de A é identificável.

Tabela 2 : Transferência

A paciente partilha com a PSY uma ansiedade claustrofóbica “Olhe, ontem estive a pensar nisto de ser meia fóbica”. O desenvolvimento de resistências, em este caso de natureza transferencial, indicam uma tentativa da paciente se defender da ansiedade claustrofóbica, provocada pelo receio de uma proximidade excessiva da terapeuta. Refira-se que as defesas psíquicas em causa são egóicas, sendo mobilizadas pela transferência amorosa no feminino que envolve o par terapêutico. Aliás, os comentários de A. em redor deste momento transferencial (que, também é verdade, dá conta da firme aliança terapêutica entre ambas) ilustram bem o caráter psiquicamente estruturante desta fase da sessão ”Ai não sei! Isto das relações é muito complicado”, ou ainda “(…) Como é que as pessoas fazem para estar juntas muitos anos? (olhando para a terapeuta)”. Com efeito, é a transferência positiva, que autoriza A. a “ocupar-se” de uma reflexão sobre a organização da libido sexual em relação marital adulta, sem vínculo erotizado, o que é coerente com o tema central da sessão, e, como é natural, o momento sentimental da vida da paciente que lhe subjaz. Importa reforçar, mais uma vez, a importância da análise da transferência pelo terapeuta, a fim de poder aproveitar todas as possibilidades de trabalho psíquico “abertas” pela psicoterapia psicanalítica.

Tema Categorias Subcategorias (^) Unidades de registo Indicadores e

Transferência

Expressão^ Modo de Pensamentos^ Preocupação “Olhe, ontem estive a pensar nisto de ser meia fóbica”

Tipo Amorosa

“Pensei no casamento e, se por um lado, gostava muito de casar, é um sonho que sempre tive. Por outro lado, começo a pensar, e sufocada” quanto mais penso, fico aflita,

Configuração Implícita e referida à relação terapêutica^ “Ai não sei! Isto das relações é muito complicado! Como é que as pessoas fazem para estar juntas muitos anos? (Olha para a terapeuta)”

Tabela 3 : Interpretação da Transferência

A interpretação dos sintomas, neste caso transferenciais, não remete para um acontecimento único, a sua forma é em função de um conjunto de fatores que remontam à infância. Por esta razão o trabalho analítico não deve tentar resolver os sintomas um a um, mas abordá-los no contexto do estado psíquico do paciente em sessão.

Com efeito, a intervenção da PSY, “É como se precisasse de uma certa distância de segurança em relação aos outros, como se tivesse medo de, se estiver muito perto dos outros, se descontrolar ou se desorganizar”, configura uma interpretação da transferência “a dois tempos”, embora o segundo tempo, que é propriamente o “tempo” em que o comentário da paciente e a reação da PSY são significados, perca em grande medida a dimensão de interpretação transferencial, já que se dilui em uma referência à relação com os outros e ao medo, algo indiferenciado, de “se descontrolar ou se desorganizar” que contrasta com a “entrada” no 1º tempo “parecia fóbica da terapeuta, até me disse que estava muito perto, ao género: “chegue-se para lá…xó xó já está muito perto! Até ajustei a cadeira, como deve ter reparado” em que a aproximação à tomada de consciência do “ enactment ” homossexual amoroso, entre A e a PSY parece estar prestes a “emergir”, o que autoriza a que possa ser atribuído um caráter defensivo a esta intervenção da terapeuta

Tema Categorias Subcategorias (^) Unidades de registo Indicadores e

Transferencial^ Interpretação

Tipo Parcial^ “Hoje a A fóbica da terapeuta(...)”^ começou a falar do seu lado fóbico, e parecia

Natureza Compreensiva

“É como se precisasse de uma certa distância de segurança em relação aos outros, como se tivesse medo de, se estiver muito perto dos outros, se descontrolar ou se desorganizar”

Objetivo Manutenção do “setting”^ “(...)e parecia fóbica da terapeuta, até me disse que estava^ muito perto, ao género: “chegue muito perto!” Até ajustei a cadeira, como deve ter-se para lá…xó xó já está reparado…”

Tabela 5 : Transferência

Tema Categorias Subcategorias (^) Unidades de registo Indicadores e

Transferência

Modo de Expressão Pensamentos

Clivagem e repressão da parte adulta do Self em “enactment” com a PSY Sessão terapêutica “(...) a estabilidade, a cumplicidade, o amor, oParece que preciso dos dois. O Carlos é estar juntos aventura, a ambição...O Luís (^). Com o L é mais o sonho, a. aprendo sempre algo novo, ele fala dos pacientes. Eu gosto muito de o ouvir. Ele também diz que aprende comigo. Ele é mais descontraído, faz o que lhe apetece (...)”

Tipo Homossexual estruturante

Sessão terapêutica “Talvez o melhor era viver mulher, assim não vivia sozinha, mas com uma tinha a minha liberdade”

Configuração Implícita e referida à relação terapêutica

menos de mim” (referindoNão. Se lhe disser acho que ele vai gostar-se à possibilidade do Carlos conhecimento do “devaneio” amoros/ da PSY “Carlos” tomar o com o lado infantil/ PSY “Luís mente) ” coloquial da sua “Talvez o melhor era viver com uma mulher, assim não vivia sozinha, mas tinha a minha liberdade”

O “ enactment ” é um fenómeno inconsciente, neste caso da paciente, que visa forçar a psicoterapeuta a sentir as suas configurações internalizadas, ou seja, tenta levar a analista a comportar-se de tal forma que o seu ato confirme uma fantasia transferencial. Trata-se da união do inconsciente da paciente com a do psicoterapeuta que tem lugar durante a análise de uma situação regressiva. Nesta análise, existem momentos de enamoramento, que reproduzem as relações objetais caraterísticas da triangulação edípica. “Talvez o melhor era viver com uma mulher, assim não vivia sozinha, mas tinha a minha liberdade”. A paciente refere-se inicialmente a 2 partes suas – a parte “Carlos” e a parte “Luís” – a primeira deseja um aprofundamento da relação com a PSY, “aprender” a intimidade de mulher, resolver a difícil identificação homossexual à mãe e a segunda – a parte “Luís” - preferindo uma relação casual e coloquial em que se fale de curiosidades, se tirem dúvidas sobre a sexualidade, num registo adolescente. Nesta sessão, a paciente deseja estar com a PSY- Carlos, mas receia “sufocar” e, deste modo, falta a sessões anteriores e

“acomoda-se” defensivamente a uma relação com a PSY- Luís, companheira de curiosidades e esclarecedora de dúvidas sobre amores, traições e histórias de namoros. Curioso, o “ enactment ” que a terapeuta sustenta com o Self adolescente de A, ao “assumir” psiquicamente o papel de uma “PSY- Luís” em cumplicidade adolescente com a paciente durante a maior parte desta sessão. Podemos, então, considerar que “Luís” representa psiquicamente, para A, a parte regressiva (adolescente) da sua mente que, nesta fase do tratamento psicanalítico, ainda tenta impedir a necessária emergência da parte designada de “Carlos”, representando, esta última, um Self adulto capaz de se identificar de um modo cúmplice, feminil e pós-edipiano, à PSY mulher-adulta com quem está em relação terapêutica

Díade B – sessão em supervisão

Tabela 6: Contratransferência

Tema Categorias Subcategorias (^) Unidades Indicadores de registo e

Contratransferência

Expressão^ Modo de Pensamentos

Exercício metafórico reflexivo Sessão de supervisão (SS)nos seus sintomas alimentares, na sua notória deterioraçãoà medida que a ouço a descrever a doença do avô em J., física e no fantasma da debilitação incapacitante e mesmo de morte a ela associados...”

Tipo^ Contraidentificação concordante ao ego da paciente

Sessão terapêutica (ST) “É uma doença desperta sentimentos de impotência, raiva e situação muito difícil para todos. Lidar com a culpabilidade”

Configuração^ Explícita e não referida à relação terapêutica^ “É uma situação muito difícil para todos(...)”

Polaridade Negativa

Racionalização defensiva “(...)Lidar com a doença desperta sentimentos de impotência, raiva e culpabilidade” (em reação à injunção culpabilizante do pai referida por J em sessão)

Racker (1953) distinguiu dois tipos de contratransferência, segundo a forma de identificação: a contratransferência concordante, em que o analista se identifica ao seu ego do paciente, e a contratransferência complementar, na qual o analista se identifica a um objeto interno do paciente, ou, pelo menos, a um aspeto dele.