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A Evolução da Despesa Pública em Portugal: Um Análise da Evolução das Suas Componentes, Notas de estudo de Evolução

Uma análise da evolução da despesa pública em portugal, desde meados do século xx até 2004. O autor examina as diferentes componentes da despesa pública, suas tendências e as causas subjacentes, incluindo a instauração da democracia, a burocracia excessiva e os sistemas de incentivos perversos. O texto também discute a questão do peso ideal do estado e a importância da participação democrática na política orçamentária.

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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O Monstro
A Figura 1 mostra a evolução da despesa pública em Portugal, desde meados do século
passado até 2002. O diagrama está dividido em fatias, para se poder ver a evolução das suas
componentes. Ao nível agregado, os dados sugerem 3 episódios de forte aumento da despesa
pública: 1974-1976, 1980-1981 e 1990-1993. Seria, no entanto, errado procurar nesses
episódios as razões que levaram ao aumento do peso do Estado na economia. Aliás, a figura é
até muito sugestiva no que respeita à causa fundamental: a instauração da Democracia.
Ao nível desagregado, a evolução das despesas não foi uniforme. A componente que
maior aumento registou nos últimos 30 anos foi a das transferências correntes, onde estão
incluídas as pensões de reforma e os subsídios de desemprego. A segunda componente que mais
cresceu foi a das despesas com pessoal, que reflectem o nível de intervenção do Estado em áreas
tão diversas como a Saúde, a Educação, a Justiça e a Segurança Pública. Também as despesas
de capital, que incluem as obras públicas, registaram um aumento relativamente ao nível médio
verificado durante a Ditadura, embora menos significativo. Os subsídios às empresas e as
despesas com juros da dívida pública também aumentaram após a Revolução, mas voltaram
depois a baixar, no âmbito da transição para o Mercado Único e para a Moeda Única,
respectivamente.
É sabido que em Portugal há grandes desperdícios na utilização dos recursos públicos.
Nomeadamente, devido ao excesso de burocracia e a sistemas de incentivos perversos, que
resultam em despesas sem retorno e em baixa produtividade. Mas, se nos últimos anos a despesa
do Estado aumentou o que aumentou, tal foi certamente o resultado de uma interacção entre
políticos e eleitores, que os últimos tiveram oportunidade de sancionar. No conjunto, nada
impede que o aumento registado na despesa pública tenha correspondido a um desejo por parte
da maioria dos eleitores de uma maior intervenção do Estado e, em particular, de uma maior
coesão social.
Há quem defenda que o aumento da despesa pública é uma perversão da Democracia.
Porque aqueles que mais beneficiam com as despesas do Estado tendem a organizar-se para as
manter ou mesmo para as aumentar. Quando os grupos de pressão são politicamente muito
influentes, as despesas públicas podem assumir um comportamento do tipo "roldana", tendo
mais facilidade na subida do que na descida. O receio de que o escrutínio eleitoral seja
insuficiente para travar a subida da despesa pública tem levado alguns países a adoptar tectos
para a despesa pública. No nosso país, essa ideia tem vindo a ganhar adeptos.
Mas a fixação de um tecto para a despesa pública depara-se com uma dificuldade
fundamental: qual o peso ideal do Estado? Em teoria, a intervenção do Estado na economia
envolve um compromisso entre prestação de serviços públicos e distorções provocadas pelos
impostos. Quando o peso do Estado é muito reduzido, o que se poupa em distorções não
compensa as insuficiências na prestação de serviços essenciais, como o Estado de Direito, a
segurança, a supervisão económica e financeira. Quando o peso do Estado na economia é
demasiado grande, o efeito negativo dos impostos tende a dominar, resultando em menor
eficiência. Algures no meio estará a dimensão do Estado que maximiza a eficiência,
Mas a política orçamental não se deve guiar apenas por critérios de eficiência. As
sociedades podem estar dispostas a sacrificar um pouco de eficiência económica para beneficiar
de maior coesão social. E sobre essa escolha, a Teoria Económica tem pouco a dizer. Ao
contrário do que se passa com o défice orçamental, que por envolver questões de equidade inter-
geracional deve estar sujeito a limitações, o peso do Estado na economia (tal como a
distribuição das receitas e a estrutura da tributação), é uma matéria essencialmente política e por
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O Monstro

A Figura 1 mostra a evolução da despesa pública em Portugal, desde meados do século passado até 2002. O diagrama está dividido em fatias, para se poder ver a evolução das suas componentes. Ao nível agregado, os dados sugerem 3 episódios de forte aumento da despesa pública: 1974-1976, 1980-1981 e 1990-1993. Seria, no entanto, errado procurar nesses episódios as razões que levaram ao aumento do peso do Estado na economia. Aliás, a figura é até muito sugestiva no que respeita à causa fundamental: a instauração da Democracia.

Ao nível desagregado, a evolução das despesas não foi uniforme. A componente que maior aumento registou nos últimos 30 anos foi a das transferências correntes, onde estão incluídas as pensões de reforma e os subsídios de desemprego. A segunda componente que mais cresceu foi a das despesas com pessoal, que reflectem o nível de intervenção do Estado em áreas tão diversas como a Saúde, a Educação, a Justiça e a Segurança Pública. Também as despesas de capital, que incluem as obras públicas, registaram um aumento relativamente ao nível médio verificado durante a Ditadura, embora menos significativo. Os subsídios às empresas e as despesas com juros da dívida pública também aumentaram após a Revolução, mas voltaram depois a baixar, no âmbito da transição para o Mercado Único e para a Moeda Única, respectivamente.

É sabido que em Portugal há grandes desperdícios na utilização dos recursos públicos. Nomeadamente, devido ao excesso de burocracia e a sistemas de incentivos perversos, que resultam em despesas sem retorno e em baixa produtividade. Mas, se nos últimos anos a despesa do Estado aumentou o que aumentou, tal foi certamente o resultado de uma interacção entre políticos e eleitores, que os últimos tiveram oportunidade de sancionar. No conjunto, nada impede que o aumento registado na despesa pública tenha correspondido a um desejo por parte da maioria dos eleitores de uma maior intervenção do Estado e, em particular, de uma maior coesão social.

Há quem defenda que o aumento da despesa pública é uma perversão da Democracia. Porque aqueles que mais beneficiam com as despesas do Estado tendem a organizar-se para as manter ou mesmo para as aumentar. Quando os grupos de pressão são politicamente muito influentes, as despesas públicas podem assumir um comportamento do tipo "roldana", tendo mais facilidade na subida do que na descida. O receio de que o escrutínio eleitoral seja insuficiente para travar a subida da despesa pública tem levado alguns países a adoptar tectos para a despesa pública. No nosso país, essa ideia tem vindo a ganhar adeptos.

Mas a fixação de um tecto para a despesa pública depara-se com uma dificuldade fundamental: qual o peso ideal do Estado? Em teoria, a intervenção do Estado na economia envolve um compromisso entre prestação de serviços públicos e distorções provocadas pelos impostos. Quando o peso do Estado é muito reduzido, o que se poupa em distorções não compensa as insuficiências na prestação de serviços essenciais, como o Estado de Direito, a segurança, a supervisão económica e financeira. Quando o peso do Estado na economia é demasiado grande, o efeito negativo dos impostos tende a dominar, resultando em menor eficiência. Algures no meio estará a dimensão do Estado que maximiza a eficiência,

Mas a política orçamental não se deve guiar apenas por critérios de eficiência. As sociedades podem estar dispostas a sacrificar um pouco de eficiência económica para beneficiar de maior coesão social. E sobre essa escolha, a Teoria Económica tem pouco a dizer. Ao contrário do que se passa com o défice orçamental, que por envolver questões de equidade inter- geracional deve estar sujeito a limitações, o peso do Estado na economia (tal como a distribuição das receitas e a estrutura da tributação), é uma matéria essencialmente política e por

conseguinte deve estar sujeita ao escrutínio democrático. Se os contribuintes acharem que os impostos pagos não compensam os benefícios, podem sempre votar em programas políticos orçamentalmente menos exigentes. Mas também devem ter a liberdade para escolher o contrário.

Em defesa do argumento, note-se que a despesa pública se reduziu significativamente em vários países da Europa ao longo da última década, sem que para tal tenha sido necessário criar novas instituições. Em Portugal, após três décadas de convergência da despesa pública para o nível médio da União Europeia, no último acto eleitoral os eleitores parece terem-se rendido à ideia de um choque fiscal. O que, dada a situação orçamental de partida, obrigaria a uma atitude muito agressiva por parte do governo em matéria de controlo da despesa pública.

Apesar de os salários dos funcionários públicos terem sido praticamente congelados e não obstante toda a propaganda associada a alguns cortes nas despesas sociais, a evidência mais recente sugere que o Monstro continua à solta: de acordo com a Comissão Europeia, tanto a despesa total como a despesa corrente primária do Estado em percentagem do PIB atingiram em 2003 novos máximos absolutos (Quadro 1). A estimativa para 2004 é ligeiramente menor, mas pertence ainda ao reino das previsões.

O facto de as despesas públicas continuarem a aumentar não augura em favor de um choque fiscal durante a presente legislatura. Até ao momento, o sucesso conseguido na frente do défice parece dominar a opinião pública, ofuscando o facto de a trajectória da despesa ser incompatível com o cumprimento da promessa eleitoral. Mas muito me surpreenderia se em 2005 o nível de tributação e o peso do Estado na economia não estivessem bem no centro do debate político.

Miguel Lebre de Freitas

Semanário Económico, 14-5-