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Ennio possebon discute o modulor de le corbusier, uma teoria de proporções e medições aplicáveis universalmente à arquitetura e mecânica. Le corbusier procurou um utensílio para medir visuais e geométricas, que facilitasse sua escrita e traria benefícios à composição arquitetônica.
Tipologia: Notas de aula
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O MODULOR DE LE CORBUSIER:
FORMA, PROPORÇÃO E MEDIDA NA ARQUITETURA
RRRRR^ ESUMO^ AAAAABSTRACT
Ennio Possebon *
e Corbusier È um dos ra- ros arquitetos, n„o sÛ do sÈculo XX, mas de toda a HistÛria da Arquitetu- ra, que propÙs uma teoria de propor- Áıes e forneceu descriÁıes de como foram aplicadas em seus projetos. Mais ainda, pretendeu e propÙs que sua teoria fosse utili- zada por outros. Seus desenhos e projetos s„o, por esta raz„o, um fÈrtil terreno para o estudo da Geometria na sua conex„o com a Arquitetura.
O M”DULO DE OURO
Segundo John Summerson, ì[...] nos primeiros anos da Se- gunda Guerra Mundi- al Le Corbusier criou o sistema que se cha- mou ëModulorí. Modulor È uma pala- vra composta a partir de module, ou seja, unidade de me- dida, e section d¥or ou secÁ„o de ouro: a divis„o de uma reta de tal modo que o segmento menor est· para o maior assim como o segmen- to maior est· para o todo. O Modulor È um sistema de propor- cionamento do espaÁo arquitetÙnico baseado neste critÈrio geomÈtrico, e oferece toda uma gama de dimen-
sıes. As dimensıes medianas est„o relacionadas com o corpo humano; as dimensıes extremas aplicam-se, por um lado, aos detalhes diminu- tos dos instrumentos de precis„o e, por outro lado,†‡ escala dos grandes projetos de planejamento.î^2
Na obra de Le Corbusier, transparece, alÈm do olhar atento para a criaÁ„o de uma arquitetura consoante com as transformaÁıes sociais, trazidas pelas tecnologias despontantes no sÈculo XX, um pensamento lÛgico, racional e disciplinador, ao buscar um traÁado orientador do projeto, baseado na proporÁ„o ·urea. E, aÌ, ele n„o È
menos cl·ssico que Palladio ou Alberti, ao retomar um tipo de con- trole de projeto t„o essencialmente pertencente ëa RenascenÁa.
A PORTA DOS MILAGRES DE LE CORBUSIER
ìA matem·tica È o magistral edifÌ- cio imaginado pelo homem para com- preender o Univer- so. Nela encontra- se o absoluto e o in- finito, o apreensÌvel e o n„o-apreensÌvel, e est· rodeada de altos muros diante dos quais pode-se passar e de novo passar sem proveito nenhum. Neles ‡s vezes abre-se uma porta, entra-se e aÌ se est· no lugar onde se encontram os deuses e as cha- ves dos grandes sis- temas. Estas portas s„o as portas dos milagres, e, franqueada uma delas, j· n„o È o homem quem atua, porÈm o Universo que se manifesta e diante dele desenrolam-se os pro- digiosos tecidos das combinaÁıes sem limites. Estais no paÌs dos n˙- meros. Deixai-vos permanecer nele, maravilhados diante de tanta luz in- tensamente espalhada.î 3
ìEstais no paÌs dos n˙meros. Deixai-vos permanecer nele, maravilhados diante de tanta luz intensamente espalhada.î (Le Corbusier)
2 S UMMERSON , John. in A linguagem cl·ssica da Arquitetura, p.116. 3 L E CORBUSIER, in Modulor1, p. 69. (Trad. nossa.)
cala humana ó tanto para a Arqui- tetura quanto para a Mec‚nica. Des- de o inÌcio do sÈculo XX ele vinha observando em obras de arquitetu- ra aquilo que chamou de ìo ‚ngulo reto dirigindo a composiÁ„oî. Tam- bÈm encontraram resson‚ncia nele as palavras de Choisy com sua His- tÛria da Arquitetura (1902), especi- almente quando trata de traÁados re- guladores ao explicar a organizaÁ„o de composiÁıes arquitetÙnicas.
Na revista L¥ Esprit Nouveau, junto com outros, Le Corbusier pro- duz artigos teÛricos, base doutrin·- ria para sua atividade projetual pos- terior. ìA grande ind˙stria deve ocupar-se com a edificaÁ„o e esta- belecer em sÈrie os elementos da casa. Deve ser criado o estado de espÌrito da sÈrie: de construir casas em sÈrie, de habitar casas em sÈrie, de conceber casas em sÈrie.î 6 E aqui a normatizaÁ„o se torna ques- t„o fundamental.
Depois que publica o artigo ìOs traÁados reguladoresî na L¥ Esprit Nouveau, em 1921, Le Corbusier conhece os livros de Matila Ghyka, sobre a proporÁ„o ·u- rea, que lhe confirmam e demons- tram matematicamente assuntos que j· o ocupavam. E tambÈm em suas pinturas, experimenta a plasticidade sobreposta a uma rigorosa geometria.
Posteriormente, por volta dos anos 1940, as idÈias desenvolvidas por Wittkower a respeito do Renascimento, da proporÁ„o e dos traÁados reguladores de projetos tambÈm encontrar„o resson‚ncia em Le Corbusier. Embora tenha expres-
sado algumas crÌticas ‡ arquitetura renascentista, por ver nas suas cons- truÁıes, quando rigorosamente ori- entadas pela geometria, e por vezes segundo complexas estruturas, a pressuposiÁ„o de um observador ideal que teria de se colocar no cen- tro da obra e perceber como um todo, simultaneamente, todos os de- talhes. Contra essa interpretaÁ„o ele argumenta, ent„o, que o observador concreto sempre est· de pÈ, tem o foco de vis„o a mais ou menos 1, m de altura e est· em movimento pelo espaÁo, apreendendo, a cada vez, e no decorrer do tempo, as suas v·rias perspectivas. Tem percepÁıes diferenciadas a cada momento e, enfim, uma estatura que deve ser sempre considerada.
Nos anos de ocupaÁ„o da Fran- Áa durante a Segunda Guerra Mun- dial, instituiu-se o AFNOR , um Ûrg„o cuja funÁ„o era auxiliar a reconstru- Á„o do paÌs. Industriais, engenheiros e arquitetos foram convocados a
participar do empreendimento. Le Corbusier foi um deles.
ìO AFNOR propıe normatizar os objetos da construÁ„o e seu mÈtodo È simplista: simples aritmÈtica aplicada aos usos e utensÌlios dos arquitetos, engenheiros e industriais. Parece-me arbitr·rio e pobre. As ·rvores, por exemplo, com seu tronco, seus ramos, suas folhas e nervuras, me afirmam que as leis de crescimento e combina- Á„o podem e devem ser mais ricas e sutis. Um laÁo geomÈtrico tem de in- tervir nestas coisas e sonho instalar nas obras que mais tarde cobrir„o o paÌs, um enredado de proporÁıes tra- Áado sobre o muro ou apoiado nele, feito com ferros laminados e soldados, que ser· a regra da obra, o modelo que inicia a sÈrie ilimitada das combi- naÁıes e das proporÁıes. O pedreiro, o carpinteiro e o serralheiro ir„o aÌ escolher as medidas para seus traba- lhos, os quais, diversos e diferencia- dos, ser„o testemunhos da harmonia. Tal È o meu sonhoî. 7
6 In ìCasas em sÈrieî, L¥ Esprit Nouveau, 1921, citado em L E C ORBUSIER, Modulor 1, p. 31. (Trad. nossa.) 7 L E CORBUSIER, in Modulor 1, p. 34. (Trad. nossa.)
ìNos anos de ocupaÁ„o da
FranÁa durante a Segunda
Guerra Mundial, instituiu-se
o AFNOR, um Ûrg„o cuja
funÁ„o era auxiliar a
reconstruÁ„o do paÌs.î
Em 1943, Le Corbusier propıe a seu assistente Hanning uma tare- fa: ìTome um homem com o braÁo levantado com 2,20 m de altura, inscreva-o em dois quadrados superpostos de 1,10 m, coloque-o a cavalo sobre os dois quadrados e um terceiro quadrado resultante lhe dar· uma soluÁ„o. O ëlugar do ‚n- gulo retoí deve poder ajud·-lo a co- locar o terceiro quadrado. Com este enredado, regido por um homem instalado no seu interior, estou se- guro que chegar· a uma sÈrie de medidas que poder„o colocar de acordo a estatura humana (o bra- Áo levantado) e a Matem·tica.î 8
Essa indicaÁ„o, um tanto enig- m·tica quando meramente lida, en- tretanto, continha o germe do que viria a ser claramente desenvolvido no traÁado final do modulor. Era ainda uma primeira intuiÁ„o.
Mas daÌ surgiu o primeiro tra- Áado, em 25 de setembro de 1943, que sofreria uma retificaÁ„o realiza- da por Elisa Maillard, trÍs meses depois, em 26 de dezembro de
o uruguaio Justino Serralta e o fran- cÍs Maisonnier, e foi relatado no Modulor 2. Esse traÁado produz duas sÈries de valores baseados na proporÁ„o ·urea, ent„o chamadas ìsÈrie vermelhaî e ìsÈrie azulî, esta ˙ltima correspondendo aos valores referidos ao duplo quadrado.
Essa rede de proporÁıes antropometricamente combinadas, recebeu depois a denominaÁ„o ìmodulorî (sugerida a Le Corbusier por Robert Lancrey-Javal, doutor em Direito). O modulor, na sua pri- meira vers„o, tinha como base um homem com 1,75 m (a altura mÈ- dia de um francÍs), de onde resul- tavam suas medidas principais. Tec- nicamente foi definido da seguinte maneira: ìO modulor È um aparato de medida fundamentado na estatu- ra humana e na matem·tica. Um homem com o braÁo levantado d· os pontos determinantes de ocupa- Á„o do espaÁo: o pÈ, o plexo solar, a cabeÁa e a ponta dos dedos com o braÁo levantado ó trÍs interva- los que definem uma sÈrie de secÁıes ·ureas de Fibonacci; e ain- da por outra parte, a matem·tica, que oferece a variaÁ„o mais imedi- ata e significativa de um valor: o simples, o dobro e as duas secÁıes ·ureas. ì^9 Em sÌntese, a unidade, a duplicidade e a proporÁ„o ·urea ó o modulor. Essa rÈgua de proporÁıes com- bina-se, assim, atravÈs do ponto das duas sÈries de segmentos ·ureos, que ele chamou de ìvermelhaî e ìazulî, com a estatura humana nos seus principais pontos de ocupaÁ„o do espaÁo. Num momento posterior,
a altura padr„o do homem ser· retificada para 6 pÈs ou 182,88 cm. (altura mÈdia de um inglÍs), valor esse que ir· satisfazer mais, em vir- tude de os valores em polegadas corresponderem com mais proximi- dade ‡ sÈrie Fibonacci que se forma na sÈrie azul: 3, 5, 8, 13, 21, 34 ...
Le Corbusier quer contribuir para o jogo das normatizaÁıes ne- cess·rias a uma produÁ„o em sÈrie, racional e eficiente, de elementos prÈ-fabricados. Mas quer evitar tam- bÈm o empobrecimento formal pro- duzido por normatizaÁıes efetuadas pelo mÌnimo esforÁo. Quer colocar no lugar do trivial, do monÛtono e sem graÁa o harmonioso, o diverso, o elegante. E remover o obst·culo que resulta da incompatibilidade das medidas centÌmetro e polegada.
ìO modulor rege as longitudes, as superfÌcies e os volumes, manten- do sempre a escala humana, pres- tando-se a infinitas combinaÁıes e assegurando a unidade na diversi- dade: benefÌcio inestim·vel, milagre dos n˙meros.î 10
Quando elege a proporÁ„o ·urea como princÌpio estruturador do seu enredado de proporÁıes (modulor), Le Corbusier preocupa-se em acoplar nele a estatura humana (estabelecida no padr„o mÈdio de 1,82 m ou 6 pÈs) e pretende com isso criar um disposi- tivo proporcionador das medidas de sua arquitetura. E neste aspecto pare- ce se colocar em perfeita sintonia com o conceito vitruviano de sime- tria, de comodulaÁ„o. A proporÁ„o ·urea È o mÛdulo que engendra as
8 Idem, op. cit., p. 35. (Trad. nossa.) 9 L E CORBUSIER, in Modulor 1, p. 52. (Trad. nossa.) 10 Idem, op. cit., p. 88. (Trad. nossa.)
Sobre o modulor, o rigoroso Ernst Neufert, a despeito de algumas crÌticas com relaÁ„o ‡s aproximaÁıes e arredondamentos de medidas esta- belecidos nas sÈries vermelha e azul, comentou em seu livro A industria- lizaÁ„o das construÁıes:
ì[...] È importante que um ar- quiteto de tanta popularidade como Le Corbusier tenha dedicado sua atenÁ„o ao problema das medidas na construÁ„o e que tenha coloca- do em primeiro plano necessidades arquitetÙnicas que haviam sido dei- xadas de lado, como pouco acerta- das, substituÌdas por normatizado- res mec‚nicos e exclusivistas.
N„o menos importante È o fato de que para desenvolver as constru- Áıes se possa jogar com proporÁıes baseadas na secÁ„o ·urea. 13 î
E Wittkower comenta em So- bre a arquitetura na idade do humanismo, em tom um tanto exa- gerado e claramente apologÈtico:
ì[...] Todos sabemos que quan- do a geometria n„o-euclidiana pas- sou a ser a base da vis„o moderna do universo no final do sÈculo XIX e inÌcio do XX, produziu-se uma ruptu- ra b·sica com o passado, mais pro- funda atÈ que aquela entre o univer- so hierarquizado e escol·stico da Idade MÈdia e o matem·tico e euclidiano de Leonardo, CopÈrnico e Newton. Que repercussıes teve e ter· sobre a proporÁ„o nas artes e a subs- tituiÁ„o das medidas absolutas do espaÁo e do tempo por uma nova re- laÁ„o din‚mica espaÁo-tempo?
O modulor de Le Corbusier constitui uma resposta preliminar. ¿ luz da HistÛria aparece com a inten- Á„o fascinante de coordenar a tradi- Á„o com o nosso mundo n„o- euclidiano. Em primeiro lugar por- que toma como ponto de partida o homem e seu entorno, e n„o um conjunto de univers·lias. Com isto Le Corbusier acerta o passo das nor- mas absolutas com o das relativas.
PorÈm, tenta uma nova conso- lidaÁ„o neste nÌvel. Os velhos sis- temas de proporÁıes eram o que po- derÌamos chamar de sistemas de m„o ˙nica, por constituÌrem desen- volvimentos coerentes de conceitos b·sicos, geomÈtricos ou numÈricos (mais aritmÈticos). Outro tanto ocorre com o modulor de Le Corbusier. Seus elementos s„o ex- tremamente simples: quadrado, du- plo quadrado e as secÁıes ·ureas. Estes elementos se fundem num sis- tema de razıes geomÈtricas e numÈ- ricas: o princÌpio b·sico da simetria se combina com as duas sÈries di- vergentes de n˙meros irracionais derivados da secÁ„o ·urea.
A despeito do que esta opini„o possa suscitar, se trata, sem d˙vida, da primeira sÌntese coerente desde a decomposiÁ„o dos velhos siste- mas, sÌntese que reflete a natureza da nossa prÛpria civilizaÁ„o e È, ao mesmo tempo, um testemunho de nossa tradiÁ„o cultural. E, igual- mente como as proporÁıes da geo- metria plana utilizadas na Idade MÈdia e as proporÁıes musicais e aritmÈticas do Renascimento, o sis- tema dual de magnitudes irracio-
nais de Le Corbusier segue depen- dendo dos conceitos que o pensa- mento pitagÛrico-platÙnico legou ‡ humanidade do Ocidente.î^14
Num encontro com Albert Einstein, Le Corbusier relata que, apÛs ouvir suas explicaÁıes e co- ment·rios, e depois de ter verifica- do matematicamente os esquemas do modulor, teria assim resumido seu parecer a respeito: ìUma esca- la de proporÁıes que torna o mau difÌcil e o bom f·cilî. 15 Essa boa receptividade ele encontrou tambÈm entre numerosos matem·ticos, enge- nheiros e arquitetos. O modulor re- almente despertou, na Època, um significativo interesse no ambiente profissional e acadÍmico.
Com o passar dos anos o inte- resse se esmaeceu e o prÛprio Le Corbusier acabou pondo de lado sua obsess„o inicial e o uso persistente e sistem·tico do sistema. E, desafor- tunadamente, tambÈm deixou de ser estudado com a profundidade que merece o que representou esse im- portante processo surgido dentro da obra de um dos mais representativos arquitetos do sÈculo XX.
O PRODUTO MODULOR
John Summerson tambÈm afir- ma: ìLe Corbusier defendeu inten- samente o Modulor como um siste- ma que, se amplamente adotado, poderia solucionar muitos dos pro- blemas de padronizaÁ„o na ind˙s- tria e, ainda, dar harmonia ao con- junto do meio fÌsico. Talvez isso pu- desse ter acontecido. PorÈm desde
13 N EUFERT, Ernst. in Industrializacion de las construciones, p. 35. (Trad. nossa.) 14 W ITTKOWER, Rudolf. in Architectural principles in the age of humanism, p. 537-538. (Trad. nossa.) 15 L E C ORBUSIER, in Modulor1, p. 55. (Trad. nossa.)
a sua publicaÁ„o, em 1950, o inte- resse por esse sistema vem diminu- indo. Estou inclinado a pensar que, como em outras situaÁıes seme- lhantes, a import‚ncia real do Modulor est· em que ele È parte da aparelhagem mental de seu autor e lhe permite realizar projetos t„o originais como a capela de Ronchamp ó um edifÌcio de forma t„o livre que chega a ser quase uma escultura abstrata ó, seguro de seu completo domÌnio dos procedimen- tos racionais.î 16
Summerson parece ter alguma raz„o quando afirma que a raciona- lidade conquistada por Le Corbu- sier, ao aprofundar-se na pesquisa da proporÁ„o ·urea e sua express„o sistematizada, que È o Modulor, tem um valor relativo, isto È, vale como ferramental de projeto de seu autor, porÈm n„o pode como tal servir a mais ninguÈm.
Mas tambÈm essa afirmaÁ„o tem valor relativo. Pois ao esforÁo de Le Corbusier para chegar atÈ este pretendido produto final, o Modu- lor, subjaz todo um processo de pensamento organizacional de projeto que tem a proporÁ„o ·urea como cÈlula-m„e e se desdobra em harmonias derivadas dela. E o que tem valor maior, finalmente, È a compreens„o que hoje temos desses desdobramentos que ele pÙde exe- cutar, operando com este paradig- ma, e n„o aquilo que ele bem- intencionadamente, mas talvez equi- vocadamente, tenha sonhado em oferecer ‡ cultura do sÈculo XX como produto. O resgate e o aprofundamento no estudo desse processo de busca de uma comodu-
laÁ„o, que est„o contidos no seu tra- balho, È que podem ser de imenso valor.
Ou seja, se o Modulor n„o pÙde servir como produto final, pronto e acabado para ser usado por outros È, no mÌnimo, um imen- so manancial de pesquisa para uma profunda imers„o no significado real e mais profÌcuo do que pode a Geometria, quando bem compreen- dida, significar para o trabalho do arquiteto. Mas mesmo arquitetos e teorizadores que tiveram o velho mestre como a grande figura inspiradora de uma arquitetura ra- cional, liberta das formas do pas- sado, criativa e inovadora, parecem ter deixado de lado esse aspecto de sua obra.
Mas a carÍncia dos tempos sempre acaba por despertar potencialidades latentes. Klaus- Peter Gast, por exemplo, È uma bem-vinda alteraÁ„o dessa situaÁ„o com seu livro Le Corbusier. Paris- Chandigarh, recentemente publica- do (2000).
PoderÌamos discutir a estÈtica de suas obras, questionar atÈ que ponto Le Corbusier conseguiu, por esse seu geometrizar, resultados sig- nificativos e expressivos. Mas, inde- pendente disso, sua atuaÁ„o como arquiteto-geÙmetra, que È ineg·vel, est· longe de ser entendida e divulgada tanto quanto o s„o tantos outros aspectos exemplares e conhe- cidos de sua obra. E dentro do ‚m- bito desta pesquisa, nossa Ínfase È justamente no processo geometri- zador por meio do qual eram gera- dos seus projetos.
Recentemente, Frings, num ar- tigo sobre a ocorrÍncia e o papel que a proporÁ„o ·urea desempenhou na teoria da Arquitetura, escreve duras e unilaterais crÌticas ao traba- lho de Le Corbusier, embora, em exame de detalhes, tambÈm possam ser justificadas em parte. E como contraponto ao que j· foi exposto atÈ agora, cabe aqui tambÈm a sua apresentaÁ„o:
ìO Modulor, na proposta de Le Corbusier, combina quadrado e secÁ„o ·urea, mas como resultado n„o oferece nada alÈm de um siste- ma modular. Da sÈrie azul de n˙me- ros (secÁ„o ·urea da altura total) e da sÈrie vermelha (altura do umbi- go) resulta uma seq¸Íncia de medi- das de 27 a 226 cm (e mais alÈm) em degraus de 27 e 16 cm. Na fun- Á„o desempenhada pelo umbigo como origem da sÈrie vermelha, Le Corbusier alude ‡ tradiÁ„o do homo vitruvianus e ‡s especulaÁıes relacionadas com as harmonias num cosmos antropocÍntrico, bem mostrados numa figura emblem·- tica no livro Modulor 2.î
O Modulor tem, entretanto, al- gumas deficiÍncias. Primeiro, em- bora Le Corbusier pretenda que seja usado para todas as dimensıes, verticais e horizontais, ele prioriza a dimens„o vertical. AlÈm disso, È baseado em aproximaÁıes aos n˙- meros da sÈrie Fibonacci. E desde que as sÈries azul e vermelha podem ser combinadas ao sistema, ele se torna t„o el·stico que a secÁ„o ·u- rea acaba sendo difÌcil de detectar. Neufert critica, numa ediÁ„o mais
16 S UMMERSON , John.in A linguagem cl·ssica da Arquitetura, p.117.