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Guias e Dicas
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O moderno reescreve o romântico: diálogo entre Castro Alves ..., Notas de aula de Poética

produção poética do século XIX ao século XX através da análise dos poemas “O 'adeus' de Teresa” de. Castro Alves e “Teresa” de Manuel Bandeira. O poeta.

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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O moderno reescreve o romântico: diálogo entre Castro Alves e Manuel Bandeira 1
Revista eletrônica de crítica e teoria de literaturas
Comunicações dos fóruns
PPG-LET-UFRGS – Porto Alegre – Vol. 03 N. 02 – jul/dez 2007
O moderno reescreve o
romântico: diálogo entre Castro
Alves e Manuel Bandeira
Dinara de Ávila Foresti*
Resumo: É possível ser observada a trajetória da
produção poética do século XIX ao século XX através
da análise dos poemas “O ‘adeus’ de Teresa” de
Castro Alves e “Teresa” de Manuel Bandeira. O poeta
moderno, Manuel Bandeira, despoja-se do lirismo
convencional para fazer poesia do cotidiano, do
prosaico e com linguagem mais acessível e casual.
Bandeira, ao parodiar a poesia de Castro Alves, canta
seu amor e encantamento por “Teresa”. Porém,
percorre caminho distinto daquele percorrido por
Castro Alves − o caminho da modernidade.
Palavras-chave: romantismo; modernismo; paródia.
Abstract: The course of the poetic production from
the 19th century to the 20th century can be observed
through the analysis of the poems “O 'adeus' de
Teresa” by Castro Alves and “Teresa” by Manuel
Bandeira. The modern poet Manuel Bandeira does not
work with traditional thematic and writes daily,
prosaic poetry, with accessible and casual language.
Bandeira, when parodying Castro Alves’ poetry, sings
his love and infatuation for “Teresa”. However, he
follows a distinct path form Castro Alves - the
modernity path.
Keywords: romanticism; modernism; parody.
A leitura dos poemas “O ‘adeus’ de Teresa” do poeta romântico Castro Alves e
“Teresa” do poeta moderno Manuel Bandeira instigam no leitor o interesse pela realização de
uma análise comparada. As emoções despertadas pelo lirismo convencional da leitura do
primeiro o imediatamente desestabilizadas pela forma, linguagem e conteúdo irônico do
segundo. Todavia, fica evidente entre os dois poemas certa cumplicidade devido ao lirismo
confidencial, desencadeado pelos últimos versos do poema de Bandeira. Condições que
justificam a análise que segue.
Conforme Alfredo Bosi (1994, p.120), Antônio Frederico de Castro Alves (Bahia,
1847-1871), poeta do Romantismo brasileiro, começa a se fazer conhecido em 1865, época da
decadência do Brasil puramente rural e do crescimento da cultura urbana associada a ideais
democráticos. Segundo o teórico, devido a essas transformações, mudam também os modelos
poéticos. Apesar do intimismo de Lamartine e de Musset continuarem como fonte de
inspiração, é a sátira inovadora de Vitor Hugo que determina a nova tendência. Para Bosi
(1994, p.120), o que torna Castro Alves um “poeta novo” é sua posição libertária e também a
*
Dinara de Ávila Foresti é especialista em Literatura Brasileira pela URI.
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O moderno reescreve o romântico: diálogo entre Castro Alves e Manuel Bandeira 1

Revista eletrônica de crítica e teoria de literaturas

Comunicações dos fóruns

PPG-LET-UFRGS – Porto Alegre – Vol. 03 N. 02 – jul/dez 2007

O moderno reescreve o

romântico: diálogo entre Castro

Alves e Manuel Bandeira

Dinara de Ávila Foresti*

Resumo: É possível ser observada a trajetória da produção poética do século XIX ao século XX através da análise dos poemas “O ‘adeus’ de Teresa” de Castro Alves e “Teresa” de Manuel Bandeira. O poeta moderno, Manuel Bandeira, despoja-se do lirismo convencional para fazer poesia do cotidiano, do prosaico e com linguagem mais acessível e casual. Bandeira, ao parodiar a poesia de Castro Alves, canta seu amor e encantamento por “Teresa”. Porém, percorre caminho distinto daquele percorrido por Castro Alves − o caminho da modernidade.

Palavras-chave: romantismo; modernismo; paródia.

Abstract: The course of the poetic production from the 19th century to the 20th century can be observed through the analysis of the poems “O 'adeus' de Teresa” by Castro Alves and “Teresa” by Manuel Bandeira. The modern poet Manuel Bandeira does not work with traditional thematic and writes daily, prosaic poetry, with accessible and casual language. Bandeira, when parodying Castro Alves’ poetry, sings his love and infatuation for “Teresa”. However, he follows a distinct path form Castro Alves - the modernity path.

Keywords: romanticism; modernism; parody.

A leitura dos poemas “O ‘adeus’ de Teresa” do poeta romântico Castro Alves e “Teresa” do poeta moderno Manuel Bandeira instigam no leitor o interesse pela realização de uma análise comparada. As emoções despertadas pelo lirismo convencional da leitura do primeiro são imediatamente desestabilizadas pela forma, linguagem e conteúdo irônico do segundo. Todavia, fica evidente entre os dois poemas certa cumplicidade devido ao lirismo confidencial, desencadeado pelos últimos versos do poema de Bandeira. Condições que justificam a análise que segue. Conforme Alfredo Bosi (1994, p.120), Antônio Frederico de Castro Alves (Bahia, 1847-1871), poeta do Romantismo brasileiro, começa a se fazer conhecido em 1865, época da decadência do Brasil puramente rural e do crescimento da cultura urbana associada a ideais democráticos. Segundo o teórico, devido a essas transformações, mudam também os modelos poéticos. Apesar do intimismo de Lamartine e de Musset continuarem como fonte de inspiração, é a sátira inovadora de Vitor Hugo que determina a nova tendência. Para Bosi (1994, p.120), o que torna Castro Alves um “poeta novo” é sua posição libertária e também a

  • (^) Dinara de Ávila Foresti é especialista em Literatura Brasileira pela URI.

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clareza com que expressa seu fascínio pela mulher amada. O poeta, afirma Bosi (1994, p.120), proporciona uma lírica erótica mais forte, limpa e menos culposa. Em “O ‘Adeus’ de Teresa”, Castro Alves, exterioriza, de forma bastante clara, fortes sentimentos amorosos: O ‘Adeus’ de Teresa Antônio de Castro Alves 1 A vez primeira que eu fitei Teresa, 2 Como as plantas que arrasta a correnteza, 3 A valsa nos levou nos giros seus... 4 E amamos juntos... E depois na sala 5 “Adeus” eu disse-lhe a tremer co’a fala... 6 E ela, corando, murmurou-me: ‘adeus’. 7 Uma noite... entreabriu-se um reposteiro... 8 E da alcova saía um cavaleiro 9 Inda beijando uma mulher sem véus... 10 Era eu... Era a pálida Teresa! 11 ‘Adeus’ lhe disse conservando-a presa... 12 E ela entre beijos murmurou-me: ‘adeus!’ 13 Passaram-se tempos... sec’los de delírio 14 Prazeres divinais... gozos do Empíreo... 15 ... Mas um dia volvi aos lares meus. 16 Partindo eu disse _ ‘Voltarei!... descansa!...’ 17 Ela, chorando mais que uma criança, 18 Ela em soluços murmurou-me: ‘adeus!’ 19 Quando voltei... era o palácio em festa!... 20 E a voz d’Ela e de um homem lá na orquestra 21 Preenchiam de amor o azul dos céus. 22 Entrei!... Ela me olhou branca... surpresa! 23 Foi a última vez que eu vi Teresa!... 24 E ela arquejando murmurou-me: ‘adeus!’ De acordo com a tradição romântica, Castro Alves preocupa-se com a questão formal de seu poema. Faz uso de versos decassílabos com rimas externas e consoantes, do tipo emparelhadas, sendo que os versos 3, 6, 9, 12, 15, 18, 21 e 24 apresentam rimas alternadas entre si. O poema de Castro Alves relata o processo de conhecimento e descoberta amorosa entre o eu-lírico e Teresa até chegar ao rompimento dessa relação. Cada uma das quatro estrofes, em seu primeiro verso, apresenta uma marca de tempo referente ao romance entre o casal: A vez primeira que eu fitei Teresa (V.1) Uma noite... entreabriu-se um reposteiro... (V.7) Passaram tempos... sec’los de delírio (V.13) Quando voltei... era o palácio em festa!... (V.19)

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9 E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas. Com o poema “Teresa”, Bandeira apresenta uma nova visão do romance cantado por Castro Alves; faz uso de lirismo irônico e transformador. Em Estrutura da Lírica Moderna, Hugo Friedrich (1978, p.17) enfatiza que “transformar” é o comportamento que domina a poesia moderna no que diz respeito tanto ao mundo como à língua. Segundo Friedrich (1994, p.18-19), os poetas, ao se libertarem do estilo convencional − que satisfaz o hábito do leitor −, adquirem mais intensidade em seu fazer poético e, quanto maior for a “libertação do poeta”, maior será a incompreensibilidade de sua poesia. O que para o teórico é uma primeira característica da vontade estilística. Alfredo Bosi (1994, p.438) destaca que, no movimento modernista brasileiro, a poesia foi o gênero literário que sofreu alterações mais radicais. De acordo com o teórico, Manuel Bandeira, junto com Mário de Andrade e Oswald de Andrade deram à poesia um novo vigor com o rompimento dos padrões tradicionais e o uso de formas livres. Em “Teresa”, há liberdade na forma e linguagem − características modernas. No poema em estudo, a pontuação ocorre apenas no último verso da produção poética, a linguagem empregada é coloquial e a temática amorosa é “recheada” com termos prosaicos. Condições que geram um impacto no leitor convencional, pois o lirismo usado por Castro Alves é desconstruído por Bandeira, alterando a imagem de Teresa já há muito tempo construída. Bandeira compõe seu poema “Teresa” com nove versos livres, distribuídos em três tercetos. O esquema rítmico é variado, os versos 1, 7 e 8 são eneassílabos. O verso 8 pode também ser aceito como decassílabo heróico, conforme mostram os exemplos a seguir: V.1: 9 (3-5-7-9-) V4: 8 (3-5-8-) V.7: 9 (3-5-7-9) V.8: 9 (6-9) ou 10 (6-10) O poema não apresenta rimas consoantes, apenas toantes e internas: Versos 1, 2, 3: VI, Tinha, pareCIa; Versos 4, 5, 6: Novo, CORpo; Versos 7, 8, 9: NAda, mistuRAram, Águas. As marcas de tempo também estão presentes no poema de Bandeira. São três os encontros do casal relatados pelo eu-lírico e em cada um dos encontros o tempo transcorrido provoca alterações nas impressões que o eu-poético nutre em relação à Teresa. Igualmente são

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três os versos que compõem cada uma das três estrofes, sendo que o primeiro verso de cada estrofe é responsável pelas indicativas de tempo. A primeira vez que vi Teresa (V.1) Quando vi Teresa de novo (V.4) Da terceira vez não vi mais nada (V.7) O primeiro encontro entre o eu-lírico e Teresa é bastante frio, banal, chegando a ser irônico, pois ele a vê fragmentada (pernas, cara). Considera suas pernas e sua cara estúpidas, para isso o sujeito poético lança mão de figuras de linguagem distintas: V.2: Achei que ela tinha pernas estúpidas  metáfora V.3: Achei que a cara parecia uma perna  comparação A comparação estabelecida entre a cara e a perna reforça a metáfora anterior, pois se a perna é estúpida, a cara segue a mesma classificação, o que denota certo grau de infantilidade de Teresa perante o olhar do eu poético. Aparentemente, Teresa não desperta no sujeito-lírico sentimento amoroso ou mesmo atração carnal enquanto mulher. Na segunda estrofe do poema de Manuel Bandeira, o eu poético amadurece a imagem infantil e ingênua que teve no primeiro encontro ao sentir os olhos de Teresa mais velhos que o corpo. Destaca-se, então, a idéia de tempo transcorrido, capaz de realizar mutações tanto no campo físico como no campo sentimental. Para expressar essas idéias, novamente o poeta faz uso de figuras de linguagem: Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo (V.2) Olhos muito mais velhos que o resto do corpo  comparação Comparando os olhos com o corpo, percebe-se que os olhos representam sensualidade, maturidade, o que o corpo de Teresa ainda não desperta no poeta. Olhos velhos  metáfora Mas a imagem ingênua que Teresa desperta no eu-lírico devido ao seu corpo é substituída por uma impressão de Teresa mulher em função da percepção que o eu poético tem do seu olhar. Nessa situação, o eu-lírico mantém impressões contraditórias a respeito de Teresa. Ao mesmo tempo em que a vê mulher através de seus olhos, não a percebe sensual ao observar seu corpo. Olhos x corpo  metonímia Olhos X corpo  antítese Através da antítese, torna-se latente a idéia de tensão, ruptura, inquietude e desencontro do eu-poético. Ele perturba-se ao perceber que alimenta sentimentos contraditórios e desarmônicos perante seu objeto de desejo. Então, abre parênteses e dá uma

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CARA, Salete de Almeida. A poesia lírica. 4 ed. São Paulo: Ática, 1998.

COELHO, Nelly Novaes. Literatura e Linguagem. Petrópolis: Vozes, 1994, p. 59-114.

FRIEDRICH, Hugo. Estrutura da lírica moderna. São Paulo: Duas Cidades, 1978.