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O Jogo da Pelota e o Cosmo Maia Profa. Dra. Maria Angela Barbato Carneiro
Adentrar pelo estudo da história em busca das origens dos jogos, não tem sido uma tarefa fácil, porque depende da investigação de vestígios nem sempre evidentes de textos, materiais de museus, relatos de experiências, etc, que envolvem diversas áreas do conhecimento.
Nessa perspectiva, sabe-se que o jogo é tão antigo quanto o homem, sobre a face da Terra. Porém o lúdico também fez parte do mundo animal onde Groos (apud Granon,
- dividiu-o em três importantes categorias: jogos de motricidade, jogos de pares de comportamento especializado e jogos sociais.
Os primeiros, também são considerados jogos de exercício entre os filhotes dos a garantirem o equilíbrio. Os segundos envolvem pares de comportamento especializado, como o acasalamento e jogos sociais, realizados entre animais adultos e mais jovens.
É, entretanto, na espécie humana que o jogo assume um papel fundamental por apresentar uma forma mais avançada e, simultaneamente contraditória. A primeira característica pode ser atribuída pelo fato promover no sujeito uma ação dinâmica que supõe mudanças qualitativas no desenvolvimento, quer na perspectiva do sentimento, como do conhecimento, da motricidade e da emoção.
Quanto à contradição, ela se observa porque ele só tem sentido dentro de um contexto, apresentando sinais absolutamente contrários, por um lado, mas complementares,por outro, como a liberdade e a regra, o modelo e a criatividade, a tristeza e o riso, a mobilidade e a imobilidade.
Ele se constitui também em um misto de sagrado e profano, envolvendo desde crenças religiosas até os mais diversos prazeres. É, contudo, importante salientar que uma das características mais relevantes que envolve o lúdico é o simbolismo. Há quem afirme que essa é uma singularidade humana diferenciando-nos das demais espécies animais.
Todo jogo se move no domínio da ficção, da fantasia da invenção, daquilo que foge da realidade ordinária através das fantasias imaginativas... (CARNEIRO: 1990, p. 21). Jogar, tal como diversas outras linguagens do homem é, acima de tudo, um processo de comunicação e expressão, que se inicia a partir do nascimento através dos movimentos faciais e corporais, antes mesmo da aquisição da oralidade. Tal prática vai evoluindo da imitação até atingir o jogo simbólico, momentop em que é possível realizar a representação de algo sem a sua presença.
Assim, a arte, o desenho, a dança, o teatro, a música, se integram ao lúdico dada a possibilidade de simbolização.
Entretanto, a comunicação e a expressão não ocorrem apenas no campo da infância, provocando o desenvolvimento das crianças, mas no plano dos adultos, mostrando a tentativa de os homens interagirem com os deuses, apresentando uma relação dialógica entre o sagrado e o profano. É o caso, entre outras modalidades do Jogo da Pelota^1 , encontrado entre os diversos grupos que habitaram a mesoamérica desde os primeiros anos da nossa era.
A importância que o Jogo da Pelota^2 teve na época pré-hispânica se pode verificar pelos numerosos resquícios arqueológicos de campos que foram descobertos ao longo de toda mesoamérica ; desde Querétaro ao norte, até Honduras e El Salvador ao Sul, e desde Papanda na costa do Golfo do México até Techuantepec na costa do Pacífico ( SHEFFLER et al. :1999 p. 13)^3.
Não se sabe exatamente o seu local de origem ou a data do seu aparecimento, porém parece ter surgido entre os Olmecas na região próxima à cidade de Vera Cruz.
Um grande número de campos também denominados “canchas”^4 foram encontrados desde a península de Iucatán até o sul dos Estados Unidos.
O jogo era uma mistura de resistência física, de competição, aliado à uma cerimônia sagrada destinada ao deus Sol. É importante destacar que a tradição oral
(^1) Pelota foi o nome dado pelos indígenas pré-hispânicos à bola, portanto a denominação de Jogo da Pelota refere-se à uma modalidade do jogo da bola.
(^3) Tradução nossa. (^4) Cancha é o nome dos campos em espanhol.
Sabe-se que com a chegada da noite, colocavam a bola, pelota, em um prato limpo junto com os protetores de couro , chamados bragueros^5 e os demais apetrechos que utilizavam.Depois deixavam o equipamento em um suporte de madeira e faziam adoração, utilizando palavras supersticiosas e súplicas de muita devoção, suplicando que a partida lhes fosse favorável. Ao término da cerimônia religiosa acendiam um braseiro sobre o qual colocavam alguma alimentação, pão, guisado e vinho, que comiam na manhã seguinte.
Dentro dos campos também se realizavam rituais de guerra. Muitos deuses eram adorados no jogo. Em alguns casos, como por exemplo entre os astecas, que haviam lugares específicos nas quadras onde essas imagens permaneciam. Era comum a representação dos deuses nos aros como podemos observar na figura 3. No entanto nem todos eles estavam relacionados à atividade.
(^5) Grifos nossos.
Figura 2. Campo do Jogo da Pelota Museu Arqueológico do México/ Foto Acervo da Autora
Muitos sacrifícios humanos também estavam associados a esse jogo, pois principalmente nas descobertas de Veracruz há lápides que mostram figuras sendo decapitadas e com o sangue saindo do peito na forma de serpente. Tais procedimentos eram justificados uma vez que, através deles, buscavam-se favores do deuses.
Haviam duas formas de jogar. A primeira ocorria dentro dos campos com aros, onde ele própria servia enquanto marcador para que a bola passasse no seu interior. Um feito excepcional que ocorria quando era arremessada pelos quadris dos jogadores. A outra ocorria em campos em que embora existissem os aros a marcação era feita em altares redondos.
Como era uma atividade sagrada, às vésperas os participantes realizavam uma série de rituais com os objetos que utilizariam no jogo e oferendas aos deuses para que o encontro fosse favorável.
Figura 3. Aros do Jogo da Pelota nos quais estão esculpidas as imagens de desuses Museu Arqueológico do México Foto:/ Acervo da autora
Dada a rudeza do jogo e os acidentes que ocorriam, os participantes protegiam-se com uma roupa adequada de algodão ou de um tipo de estopa. Usavam “ braquileras”^6 além de cinturões almofadados de couro para proteger os quadris e, até mesmo, os ombros.A figura 5 apresenta a imagem de um jogador da pelota, enquanto na figura 6 está um cinturão de couro almofadado usado como protetor.
(^6) Braguilera era uma aparato para proteger o pênis.
Figura 5. Jogador com sua indumentária Museu de Arqueologia Foto/ Acervo da autora
Alguns grupos parecem ter utilizado também tacos de madeira para jogar a bola, como a pelota em determinados locais era de crânios humanos.
Havia uma crença entre os diferentes grupos mesoamericanos que o Sol poderia se apagar e que para que isso não ocorresse deveria ser alimentado não apenas com oferendas, mas com sangue humano, daí essa modalidade também estar associada a sacrifícios humanos.
A vida e a morte também giravam em torno do jogo. Há duas versões referentes a ele. Uma de que o time perdedor era sacrificado e a outra que isso ocorria com os ganhadores que ofereciam seu sangua para a fertilidade da terra e para o deus Sol.
Afinal, qualquer que fosse o destino dos jogadores o jogo era acima de tudo um ato religioso, luta entrte a vida e a morte, os vencedores e os perdedores. Figira 7 está a representação do jogo encontrada no códice Bórgia.
Figura 6. Cinturão de couro almofadado Museu Arqueológico de Oaxaca Fot/: Acervo da autora
