



Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Prepare-se para as provas
Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Prepare-se para as provas com trabalhos de outros alunos como você, aqui na Docsity
Os melhores documentos à venda: Trabalhos de alunos formados
Prepare-se com as videoaulas e exercícios resolvidos criados a partir da grade da sua Universidade
Responda perguntas de provas passadas e avalie sua preparação.
Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Comunidade
Peça ajuda à comunidade e tire suas dúvidas relacionadas ao estudo
Descubra as melhores universidades em seu país de acordo com os usuários da Docsity
Guias grátis
Baixe gratuitamente nossos guias de estudo, métodos para diminuir a ansiedade, dicas de TCC preparadas pelos professores da Docsity
A literatura especializada tem destacado o papel da educação escolar na construção de uma sociedade menos desigual. A esse respeito parece haver algum.
Tipologia: Resumos
1 / 7
Esta página não é visível na pré-visualização
Não perca as partes importantes!
16 como eu ensino
A literatura especializada tem destacado o papel da educação escolar na construção de uma sociedade menos desigual. A esse respeito parece haver algum consenso de que o primeiro passo seja o de colocar em ação uma pedagogia que possibilite às crianças compreenderem o mundo à sua volta para que pos- sam imprimir mudanças nas formas de relaciona- mento existentes. Os professores e estudiosos simpáticos à ideia passaram a desenvolver, experimentar e avaliar pro- postas em todas as áreas presentes no currículo esco- lar. Com a educação física não foi diferente. Median- te contribuições da sociologia, antropologia, história, filosofia, política, semiótica e, mais recentemente, dos estudos culturais, a antiga preocupação com a aprendizagem dos movimentos foi substituída pela tematização da cultura corporal. De forma bastante sintética, a cultura corporal é uma parcela da cultura mais ampla que abarca todos os conhecimentos e re- presentações^2 relativos às práticas corporais. Práticas corporais, por sua vez, são os produtos da gestualidade sistematizada com características lú- dicas, isto é, as brincadeiras, danças, lutas, esportes e ginásticas. Logo, fazem parte da cultura corporal desde as regras da amarelinha até o desenho tático do futebol, passando pelas técnicas do balé, a histó- ria do judô e os nomes dos aparelhos de ginástica. Também compõem esse repertório a noção do espor- (^2) As representações abarcam as práticas de significação e os sistemas simbólicos que dão origem aos significados, posicionando cada pessoa como sujeito. São os significados produzidos pelas representações que conferem sentido às experiências humanas.
práticas corporais 17 te como meio de ascensão social das camadas des- privilegiadas, a utilização da ginástica para aquisição de uma determinada estética corporal, a brincadeira como atividade restrita às crianças, entre tantos ou- tros significados em circulação. Na escola, o trabalho pedagógico com as práticas corporais objetiva, principalmente, auxiliar as crian- ças a analisá-las, significá-las^3 e produzi-las, pois, afinal, constituem-se em textos elaborados pela lin- guagem corporal. A contribuição que isso pode ofere- cer para o entendimento da sociedade atual consiste, exatamente, na leitura dos significados e na compreen- são das representações que os diferentes grupos so- ciais veiculam através da sua cultura do corpo, bem como na ampliação das possibilidades e formas de expressão corporal das crianças. Aqui se está rompendo com a noção psicológica que explica o movimento como resultado de estímu- los neurais, para entendê-lo como portador de signi- ficados culturais. Nesse caso, o termo mais adequado seria “gesto”. Aliada às demais formas de expressão, é pela gestualidade que as pessoas socializam seus sentimentos, emoções e visões de mundo. O gesto é um signo. É o menor elemento da gramática produ- zida pela linguagem corporal. Organizados de forma sistemática, os gestos configuram as práticas corpo- rais, que nada mais são do que artefatos culturais. Na acepção dos Estudos Culturais, cultura é toda e qualquer ação social que expressa ou comunica um significado, tanto para quem dela participa quanto para quem a observa. Ou seja, o ato de significação é pura produção cultural. Cada atividade social cria ao seu redor um universo próprio de significados, isto é, a sua própria cultura. Assim entendida, a cultura constitui-se em meio às relações sociais nas quais (^3) Trata-se do processo de atribuição de significados que qualquer sujeito faz mediante a leitura de um texto cultural.
práticas corporais 19 Os problemas gerados pela convivência social po- dem ser identificados na cultura corporal de todas as sociedades. Cada grupo social atribui sentidos e significados diferentes às práticas corporais em conformidade com o contexto no qual se criam e re- criam. Para ilustrar, vale a pena comparar a capoei- ra a uma luta japonesa como o judô. É fácil perceber que ambas traduzem diferentes filosofias por meio da gestualidade que as caracteriza. A análise do percurso histórico de uma determi- nada prática corporal permitirá constatar que suas transformações decorreram das demandas sociais. Na Idade Média as cantigas de roda apresentavam-se como ocasião para flertes e galanteios entre jovens e adultos, mas com o tempo, passaram a ser vistas como elementos da cultura infantil. Algo semelhante aconteceu com o jogo da amarelinha, a queimada e tantas outras brincadeiras populares. É por meio de suas produções que as pessoas esta- belecem uma relação comunicativa com a sociedade. Isso implica o entendimento dos artefatos culturais como textos passíveis de leitura e significação. Assim, as práticas corporais podem ser compreendidas como meios de comunicação com o mundo, constituintes e construtoras de cultura. Cada qual é uma produção textual da linguagem corporal a ser analisada e signi- ficada. É o que torna impossível adjetivar, mensurar ou comparar práticas corporais pertencentes a gru- pos sociais distintos. Enquanto produtos culturais, precisam ser vistas, antes de qualquer coisa, como um fator de identidade cultural. Sob este prisma, não existem técnicas melhores ou piores, a não ser que se tome como referência um único modelo, atitude que não condiz com a atual so- ciedade multicultural. Cabe à instituição educativa organizar e desenvolver situações didáticas que pos- sibilitem uma profunda compreensão sócio-histórica
20 como eu ensino e política do patrimônio cultural corporal disponível, visando alcançar uma participação crítica, intensa e digna na esfera pública por todos os sujeitos. Em um contexto marcado pela diversidade, uma pedagogia que se avente democrática tem que pro- porcionar condições para romper com o circuito perverso que, ao impor padrões, exclui os corpos di- ferentes e, ao tentar alcançar as referências hegemô- nicas, fracassa em função da diversidade que coabita a sala de aula. Portanto, ganha relevância uma ação educativa que analise as relações de poder que posi- cionam determinadas práticas corporais como legíti- mas em detrimento de outras. É o que nos leva a defender uma Educação Fí- sica culturalmente orientada, por meio da qual os sujeitos terão oportunidade de analisar, ampliar e conhecer mais profundamente o próprio repertório cultural corporal, como também acessar os códigos de comunicação utilizados por diversas culturas, por meio da variedade de práticas corporais existentes. Compreender o contexto histórico da gênese e a transformação das práticas corporais que as crianças vivenciam na cultura paralela à escola, por exemplo, permitirá elucidar as relações sociais que determi- nam sua estrutura, os aspectos que escondem e suas formas de regulação. Uma ação didática organizada segundo esse princípio possibilitará uma leitura crí- tica dos modos como determinados grupos definem a realidade e como outros procuram resistir. Propõe-se aqui, portanto, duas ações pedagógicas complemen- tares: a leitura da prática corporal, a fim de que as crianças possam significar seus códigos constituin- tes, bem como sua produção no interior da escola, para que possam conferir-lhe novos sentidos. O trabalho pedagógico com as práticas corporais parte do princípio de que a criança, desde bem pe- quena, possui infinitas possibilidades para o desen-
22 como eu ensino ser encorajados a pensar, discutir e conversar sobre as práticas corporais, com a intenção de transcender os conhecimentos e representações já disponíveis. Finalmente, sugere-se a organização de ativida- des pedagógicas que ampliem o patrimônio cultu- ral corporal das crianças. Não se trata, portanto, de simplesmente reproduzir as práticas aprendidas na família, comunidade e mídia ou no interior da escola. Ao experimentá-las, conversar sobre elas, procurar compreendê-las, compará-las com outras já conhecidas e descobrir um pouco mais da sua his- tória e das trajetórias dos grupos que as produziram e reproduziram, os saberes iniciais serão revistos, ampliados e aprofundados pela ação cuidadosa e atenta do professor.