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Este documento discute os efeitos da decisão do supremo tribunal federal (stf) no controle concreto e atuação do senado federal, com ênfase na relação entre os poderes e o sistema híbrido de controle de constitucionalidade no brasil. O texto analisa um caso recente e os recentes desenvolvimentos legais relacionados às propostas de modificação do modelo de controle de constitucionalidade. Além disso, o documento aborda as exigências constitucionais para a declaração de inconstitucionalidade e os efeitos vinculantes das decisões do stf.
Tipologia: Notas de aula
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Ano 50 Número 200 out./dez. 2013 189
OriOne Dantas De MeDeirOs
Orione Dantas de Medeiros é doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPe), mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba (UFPe) e professor adjunto da Universidade Federal do rio Grande do norte (UFrn).
A Constituição da República Federativa do Brasil foi promulgada em 5 de outubro de 1988. Em seus 25 anos de vigência, apesar da compulsão com que tem sido emendada, a Carta Magna de 88 foi capaz de promover a transição de um regime autoritário para um Estado democrático de direito e continua a nos prometer um caminho para a construção de um país mais livre, mais justo e mais democrático. No tocante ao controle de constitucionalidade, pode-se afirmar que a Constituição inovou ao adotar o modelo híbrido, caracterizado pela combinação de elementos do controle difuso e do controle concentrado (VIVEIROS, 2012). Nesses vinte e cinco anos, verificou-se uma progressi-
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va ascendência do controle concentrado sobre o controle difuso, iniciada com a aprovação da Emenda Constitucional no^ 3/93, que instituiu a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) e a Arguição de Descumpri- mento de Preceitos Fundamentais (ADPF), e consolidada com a Emenda Constitucional n o^ 45/2004, com a criação da Súmula Vinculante e do instituto da Repercussão Geral. Não obstante o constituinte de 1988 ter rejeitado o instituto do con- trole jurisdicional preventivo (abstrato), a jurisprudência do STF vem tentando introduzir a fiscalização preventiva no caso concreto, mediante o Mandado de Segurança (MS). Um exemplo recente é o MS 32033 (ainda em julgamento no Supremo até a presente data), impetrado pelo senador Rollemberg para suspender a tramitação do Projeto de Lei no^ 4.470/ (convertido, no Senado Federal, no PLC no^ 14/2013).^1 Ademais, no que se refere à relação entre os Poderes, o que se veri- fica é um protagonismo alcançado pelo Poder Judiciário, especialmente pelos órgãos de cúpula. É fato notório nos dias atuais o papel de defesa das minorias desempenhado pela Suprema Corte contra decisões de eventual maioria, muitas vezes provocando tensões entre o Parlamento e o Judiciário. A manifestação desse protagonismo tem ocorrido sob duas vertentes que, embora semelhantes, possuem traços distintos: a “judicialização da política” e o “ativismo judicial”. Tudo leva a crer que o ativismo judicial tem sido fomentado pelo siste- ma brasileiro de controle de constitucionalidade, o qual combina aspectos do controle difuso norte-americano e do abstrato europeu-kelseniano, sendo considerado um dos mais abrangentes do mundo, denominado aqui de controle híbrido de constitucionalidade. Por outro lado, em consequência desse ativismo judicial, tramitam no Congresso Nacional várias propostas que têm por finalidade modificar o modelo de controle de constitucionalidade das leis. Tome-se como exemplo a aprovação, pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, da proposta de Emenda Constitucional que visa a alterar a quantidade mínima de votos de membros de tribunais para declaração de inconstitucionalidade de leis, a condicionar o efeito vincu- lante de súmulas aprovadas pelo Supremo Tribunal Federal à aprovação pelo Poder Legislativo e a submeter ao Congresso Nacional a decisão sobre a inconstitucionalidade de Emendas à Constituição.
(^1) O Projeto de Lei n o (^) 14/2013 estabelece novas regras para a distribuição de recursos do fundo partidário e para o horário de propaganda eleitoral no rádio e na televisão. O relator do MS, o ministro Gilmar Mendes, concedeu, no dia 24 de abril, liminar que suspendeu a tramitação do projeto até o julgamento do mérito da ação, por vislumbrar “possível viola- ção do direito público subjetivo do parlamentar de não se submeter a processo legislativo inconstitucional” (BRASIL, 2013a).
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Arguição de Descumprimento de Preceito Fun- damental (ADPF), assim disposto: “A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei” (CF/88, art. 102, §1o). Em relação à Ação Declaratória de Consti- tucionalidade, prescreve a Constituição, em seu art. 102, § 2o, que: “As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Fede- ral, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vincu- lante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e in- direta, nas esferas federal, estadual e municipal”. Essa redação do § 2 o^ foi dada pela EC n o 45, de 8 de dezembro de 2004. O texto ante- rior, redigido pela EC no^ 3/93, dispunha: “As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia con- tra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e do Poder Executivo”. A vigente Constituição Federal consagrou novos institutos e inovações no controle de constitucionalidade por via de Ação Dire- ta. Destaque-se a ampliação do número de legitimados para a instauração do controle abstrato perante o Supremo Tribunal Federal, quebrando-se o monopólio, até então existen- te, do Procurador-Geral da República. Prevê o art. 103: “Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: o Presidente da República; a Mesa do Senado Federal; a Mesa da Câmara dos Deputados; a Mesa de Assembléia Legislati- va ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; o Governador de Estado ou do Distrito Federal; o Procurador-Geral da República; o Conselho
Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; partido político com representação no Congres- so Nacional; confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional”. O rol de legitimados para a propositura das Ações Diretas contempla órgãos, pessoas e enti- dades. Por um lado, a ampliação da legitimação ativa tem democratizado o acesso ao Supremo Tribunal Federal; por outro, tem provocado um considerável aumento^3 das referidas Ações Diretas perane essa Corte Suprema. Outra significativa inovação da Lei Maior foi a introdução da denominada inconstitucionali- dade por omissão, reconhecida nas hipóteses de inércia do legislador ordinário em face de uma exigência constitucional de legislar. Duas novas ações foram especialmente introduzidas com o fim de reparar a omissão legislativa inconstitu- cional: por um lado, o Mandado de Injunção (CF/88, art. 5 o^ , LXXI) e, por outro, a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão – ADO (CF/88, art. 103, § 2o). Esta última ação, integrante do sistema de controle abstrato de normas, foi delineada pelo constituinte de 1988 nos seguintes termos: “Declarada a inconstitu- cionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das provi- dências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias”. Desse modo, pode-se afirmar que o controle concentrado, abstrato, passou a desempenhar papel preeminente no sistema de controle de constitucionalidade brasileiro, a partir
(^3) Estatística do STF, Controle concentrado. ADI – decisão final: julgado um total de 3.125; decisão liminar: 419; aguardando julgamento: 1.230; total distribuído: 4. (período de 1988 a 31 de agosto de 2012). ADO – julgadas: 7; aguardando julgamento: 11 (dados de 2008 a 31 de agosto de 2012). ADC – decisão final: 20; decisão liminar: 5; aguar- dando julgamento: 5; total distribuído: 30 (dados de 1993 a 31 agosto de 2012). ADPF – decisão final: 145; decisão liminar: 14; aguardando julgamento: 97; total distribuído: 256 (dados de 1993 a agosto de 2012).
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da Constituição de 1988, mas convivendo lado a lado com um amplo sistema difuso, o que resultou em um modelo híbrido, complexo, com características próprias, sui generis. Tal assertiva decorre não só do fato de terem sido previstas quatro ações distintas na Via Direta (ADI, ADC, ADO e ADPF) e da ampliação dos entes legitimados para a instauração desse processo concentrado de controle abstrato, mas também da permanência, ao lado desse controle concentrado, de um sistema difuso, já tradicional em nossa ordem jurídica, que atribui competência aos juízes e aos tribunais para afastar a aplicação da lei in concreto, ou seja, pela via incidental. Por meio de inúmeras ações, como o habeas corpus, o Mandado de Segurança (coletivo), a Ação Popular, o Mandado de Injunção (coletivo), o habeas data e a Ação Civil Pública, os legitimados podem questionar indiretamente a constitucionalidade das leis. Após a Emenda Constitucional n o^ 45/2004, com a previsão dos insti- tutos da Repercussão Geral e da Súmula Vinculante, o modelo de controle de constitucionalidade no Brasil tendeu a promover uma aproximação entre o controle difuso e o controle concentrado. Em linhas gerais, esse é o perfil do controle híbrido de constitucionalidade adotado no Brasil a partir da Constituição de 1988.
3. Controle difuso: considerações gerais acerca do Recurso Extraordinário, da Repercussão Geral e da Súmula Vinculante
O controle difuso, também conhecido como controle por via de exceção ou incidental, permite ao juiz ou ao tribunal realizar, no caso concreto, a análise sobre a compatibilidade de lei ou ato normativo com a Constituição. Quando o Poder Judiciário aprecia uma controvérsia constitucional suscitada diante de um caso concreto a ele submetido, em sede de ações diversas (mandado de segurança, habeas corpus, habeas data, ação civil pública, ação popular etc.), estamos diante do denominado controle difuso, concreto, incidental. Ao discorrer acerca do controle difuso e de seus aspectos constitu- cionais e processuais no mandado de segurança e na ação civil pública, assinala Ivo Dantas (2010, p. 177) que:
“Na hipótese de controle incidental ou difuso, poderá ele ser exercido em qualquer tipo de ação, ou seja, de natureza cível, penal, trabalhista, tributária, etc., em processos de conhecimento, cautelar ou de execução, sendo de destacar que, ocorrendo a arguição, esta é feita em relação processual onde a lide a resolver-se tem por objeto matéria estranha ao controle, entrando a arguição apenas como incidente, e por isto mesmo, podendo ser arguida em qualquer grau ou juízo.”
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base no art. 103-A 9 da CF/88, introduzido pela EC no^ 45/2004, e na Lei n o^ 11.417/06, editou a Súmula Vinculante n o^ 10, de 27 de junho de 2008, determinando que: “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte”.^10 Em matéria de Recurso Extraordinário, importa observar que a Emenda Constitucional no^ 45/2004 trouxe duas importantes alterações no tocante ao cabimento do referido recurso perante o Supremo Tribunal Federal. A primeira é a ampliação das hipóteses de cabimento do Recurso Extraordinário, passando-se a dispor que o recurso também será cabível quando a decisão recorrida tiver julgado válida lei local contestada em face de lei federal (CF/88, art. 102, III, d). Tal competência, até então, era do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em sede de recurso especial. Todavia, a competência repassada ao STF concerne ao exame da controvérsia, em Recurso Extraordinário, tão somente quando a decisão recorrida julgar válida lei local (ato legislativo propriamente dito, em sentido estrito) contes- tada em face de lei federal. Se o conflito for de ato (atos administrativos em geral) de governo local contestado em face de lei federal, a compe- tência permanece com o STJ, em sede de recurso especial (CF/88, art. 105, III, b).
(^9) Veja CF/88: “Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à adminis- tração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cance- lamento, na forma estabelecida em lei” (BRASIL, 1988). (^10) STF. Súmula Vinculante no (^) 10, Data de Aprovação: Sessão Plenária de 18/6/2008 (BRASIL, 2011).
A segunda alteração trazida ao Recurso Ex- traordinário pela EC no^ 45/2004 foi a exigência de que o recorrente demonstre a Repercussão Geral^11 das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o STF examine a admissão do Recurso Extraordinário. A Constituição Federal, no § 3 o^ do art. 102, traz a seguinte redação: “No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tri- bunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros”. Por determinação desse dispositivo, a de- monstração da Repercussão Geral das questões constitucionais discutidas no caso passou a ser pressuposto constitucional de admissibilidade do Recurso Extraordinário pelo Supremo Tri- bunal Federal, na forma da lei. Em caso negativo
(^11) A Arguição de Relevância prevista na EC n o (^) 7/77 e a Medida Provisória n o^ 2.226, de 4/9/2001, são precedentes da Repercussão Geral no ordenamento brasileiro. Neste sentido, confira Dantas (2009).
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percussão Geral, somente poderá ser decidida pelo Plenário do STF, por dois terços dos seus membros (oito ministros). Em outras palavras, as Turmas não dispõem de competência para recusar o Recurso Extraordinário em razão da inexistência da Repercussão Geral; elas somente poderão decidir, se for o caso, pela existência da Repercussão Geral, mediante o mínimo de quatro votos, situação na qual o Recurso Extra- ordinário será admitido sem a necessidade de manifestação do Plenário. Negada a existência da Repercussão Geral (sempre pelo Plenário), a decisão valerá para todos os Recursos sobre matéria idêntica, que serão indeferidos liminarmente, salvo revisão da tese, tudo nos termos do Regimento Interno do STF^12. Na prática, o instituto da Repercussão Geral tem funcionado, produzindo resultados em quantidade. Os dados estatísticos do Supremo Tribunal Federal são reveladores. Até 31 de agosto de 2012, o Tribunal já havia reconhe- cido 423 temas com Repercussão Geral. Isso representa, em termos percentuais, 71,21% do total de pedidos. Os temas negados foram 156 (26,26%); os temas em análise, 15 (2,53%).^13 Até a presente data, já foram julgados 117 casos de Recursos Extraordinários, cujas ma- térias tiveram Repercussão Geral reconhecida. Em um dos casos, o STF impediu o terceiro mandato consecutivo de prefeito em municípios distintos, ao julgar o Recurso Extraordinário (RE 637485) interposto por Vicente de Paula de Souza Guedes contra acórdão do TSE que confirmou decisão de cassar o diploma dos candidatos eleitos para os cargos de prefeito
(^12) Confira as Emendas Regimentais nos (^) 21 a 24 do STF e a Portaria n o^ 177, de 26/11/2007 (BRASIL, 2013b), pois aí se encontra a regulamentação da matéria do Recurso Extraordinário no âmbito do Supremo Tribunal Federal. (^13) Repercussão Geral. Estatísticas e relatórios (BRASIL, 2012b).
e vice-prefeita do município de Valença (RJ) no pleito de 2008. Por decisão majoritária, os ministros deram provimento ao recurso, ao entender que o TSE poderia ter modificado antiga jurisprudência sobre a matéria, mas, para isso, deveria modular os efeitos da decisão, por motivo de segurança jurídica. Por fim, vale registrar que são inúmeras as matérias abrangidas pela Repercussão Geral, incluindo temas vinculados a direito tributário, administrativo, eleitoral, previdenciário, civil, penal, entre outros.
3.1. Efeitos da decisão do STF no controle concreto e atuação do Senado Federal
Conforme já demonstrado, no controle difuso, em qualquer caso, seja perante o juízo singular de primeiro grau, seja perante os tri- bunais, o que se busca é o simples afastamento da aplicação da lei ao caso concreto. Os efeitos da decisão serão os mesmos, independente- mente do órgão de que tenha sido emanada. A decisão no controle difuso só alcança as partes do processo (eficácia inter partes), não dispõe de efeito vinculante e, em regra, produz efeitos retroativos (ex tunc). Por que a decisão só alcança as partes do processo? Porque, no controle difuso, o interessado, no curso de uma ação, requer a declaração da inconstitucionalidade da norma com a única pretensão de afastar a sua aplica- ção ao caso concreto. Logo, é somente para as partes que integram o caso concreto que o juízo estará decidindo, constituindo a sua decisão uma resposta à pretensão daquele que arguiu a inconstitucionalidade. Desse modo, a pronúncia de inconstitu- cionalidade não retira a lei do ordenamento jurídico, pois, em relação a terceiros, não parti- cipantes da lide, a lei continuará a ser aplicada, integralmente, ainda que supostamente esses
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no controle incidental, seria por meio da apro- vação de uma Súmula Vinculante pelo próprio Supremo Tribunal Federal.
3.2. Súmula Vinculante
O instituto da Súmula Vinculante foi criado pela Emenda Constitucional n o^ 45/2004 (a de- nominada Reforma do Judiciário). Antes só se falava em efeito vinculante ou caráter vinculante das decisões do STF, no âmbito do controle concentrado, nas Ações Diretas. O texto consti- tucional anterior, redigido pela EC no^ 3, de 17 de março de 1993, dispunha: “Art. 102. (...) § 2 o^ As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia con- tra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e ao Poder Executivo”. A Lei n o^ 9.868, de 10 de novembro de 1999, ampliou o caráter vinculante ao determinar, em seu art. 28, parágrafo único, que a declaração de constitucionalidade ou de inconstituciona- lidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconsti- tucionalidade sem redução de texto, tem eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal. Posteriormente, com a EC n o^ 45/2004, o texto do art. 102, § 2 o, foi revisto nos termos seguintes: “As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalida- de produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal”.
Por outro lado, a ausência de força vinculan- te nas decisões proferidas pelo STF no âmbito do controle concreto faz com que milhares de processos judiciais com o mesmo objeto cheguem ao conhecimento da Corte Suprema para que ela declare, em cada caso, o entendi- mento inúmeras vezes já assentado. Na busca de solução para tal problema, com consequências insuportáveis ao jurisdicionado, o constituinte brasileiro, por meio da EC no^ 45/2004, introdu- ziu no sistema de controle brasileiro a figura da Súmula Vinculante. Para a edição de Súmula Vinculante pelo STF, a Constituição Federal exige, especial- mente, a observância de quatro requisitos cumulativos, a saber: matéria constitucional; existência de reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal sobre essa matéria constitucio- nal; existência de controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a Administração Pú- blica; e o fato de a controvérsia acarretar grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. A Lei n o^ 11.417, de 19 de dezembro de 2006, publicada no Diário Oficial da União de 20 de dezembro de 2006, regulamentou o art. 103-A da Constituição Federal e alterou a Lei no^ 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Cabe inicialmente observar que a Súmula se limita à matéria constitucional. Nesse sentido, coube ao STF a titularidade para editar, revisar e cancelar enunciado de Súmula Vinculante (art. 2 o, caput, da Lei no^ 11.417/06). O Supremo Tribunal Federal poderá apro- var, rever ou cancelar Súmula Vinculante: por iniciativa própria (de ofício) ou por iniciativa de qualquer dos legitimados na Constituição e na lei. Eis um dos pontos positivos da lei: a am- pliação do rol de legitimados a provocar o STF. A Súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas deter- minadas, acerca das quais haja, entre órgãos
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judiciários ou entre esses e a Administração Pública, controvérsia atual que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica (art. 2 o, § 1 o, da Lei no^ 11.417/06). Seguindo a lógica das leis que tratam do controle abstrato de constitucionalidade (Lei no^ 9.868/99, arts. 22 e 27; Lei no^ 9.882/99, art. 11), o legislador repetiu a regra geral, ao admitir que a Súmula terá eficácia imediata, podendo o Supremo Tribunal Federal, por decisão de 2/3 (dois terços) dos seus membros, restringir os efeitos vinculantes ou decidir que só tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excep- cional interesse público (art. 4o). A Lei no^ 11.417/06, em seu art. 7o, estatui que a decisão judicial ou do ato administrativo que contrariar enunciado de Súmula Vinculante, negar-lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente poderá ser objeto de Reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo dos recursos ou de outros meios admissíveis de impugnação. Entretanto, contra omissão ou ato da Admi- nistração Pública, o uso da Reclamação só será admitido após esgotamento das vias administra- tivas. Seguindo-se a crítica de Ivo Dantas, esse dispositivo é de constitucionalidade duvidosa (DANTAS, 2010, p. 235). Ao julgar procedente a Reclamação, “o Su- premo Tribunal Federal anulará o ato adminis- trativo ou cassará a decisão judicial impugnada, determinando que outra seja proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso” (art. 7 o, § 2o). Se a Reclamação estiver sendo ajuizada contra uma decisão administrativa que o ad- ministrado entenda haver violado enunciado de Súmula Vinculante, o STF, acolhendo a Reclamação, dará ciência à autoridade prolatora e ao órgão competente para o julgamento de re- curso, que deverão adequar as futuras decisões
administrativas em casos semelhantes, sob pena de responsabilização pessoal nas esferas cível, administrativa e penal (Lei n o^ 9.784/99, art. 64- B, acrescido pela Lei no^ 11.417/06). Várias questões foram suscitadas, no âmbito doutrinário, acerca da Súmula Vinculante. Uma delas se refere à possibilidade de o STF conferir efeito vinculante às suas atuais súmulas, isto é, àquelas súmulas que já estavam vigentes na data de publicação da EC no^ 45/2004. É possível desde que a súmula seja confirmada por deci- são de 2/3 (dois terços) dos ministros do STF e publicada na imprensa oficial^15. Finalmente, já passados mais de 8 anos da aprovação da Emenda Constitucional n o 45/2004, que trouxe novos institutos de direito processual constitucional ao sistema jurídico pátrio, como a súmula dotada de efeito vin- culante, regulamentada pela Lei no^ 11.417/06, o Supremo Tribunal Federal, por um lado, já aprovou, até o presente momento, um número de 32 (trinta e duas); por outro, existem várias propostas de súmula vinculante aguardando a apreciação da Corte.
4. Controle abstrato: Ações Diretas
A Constituição de 1988 consagra, ao lado do controle concreto, o controle abstrato, consubs- tanciado na jurisdição outorgada ao Supremo Tribunal Federal para as Ações Diretas de In- constitucionalidade, quando são impugnados leis ou atos normativos federais ou estaduais, por ofensa à Constituição Federal. Trataremos aqui, resumidamente, dos aspectos mais gerais das Ações Diretas, ou seja, da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO),
(^15) As atuais súmulas do Supremo Tribunal Federal somente produzirão efeito vinculante após sua confirmação por dois terços de seus integrantes e publicação na imprensa oficial (EC no^ 45/06, art. 8o).
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tidos do mínimo grau de abstratividade e generalidade. Atos normativos em sentido formal, que tenham objeto e destinatário certos, não im- portando a esfera de competência da qual provenham, só se submetem ao controle de constitucionalidade judicial do tipo concreto (difuso) (BRASIL, 1992). Com base na exigência de generalidade e abstração da norma, que deve disciplinar relações in abstracto, a jurisprudência do Supremo Tri- bunal Federal tem excluído do controle de constitucionalidade todo ato administrativo que tenha objeto determinado e destinatários certos, ainda que ele seja editado sob a forma de lei (lei meramente formal). Estes são os chamados atos de efeito concreto (MARTINS; MENDES, 2007, p. 177). O objeto da ADI é a lei ou o ato normativo federal ou estadual impug- nado, desde que editados posteriormente à promulgação da Constituição Federal. Frise-se: federal ou estadual. Nesse sentido, o direito municipal (Lei Orgânica e leis e atos normativos municipais) não pode ser im- pugnado em sede de ADI, perante o STF. O direito municipal somente poderá ser declarado inconstitucional pelo STF no âmbito do controle difuso, quando uma controvérsia concreta chega ao Tribunal por meio do Recurso Extraordinário, ou, excepcionalmente, por meio de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). A Ação Direta de Inconstitucionalidade visa à defesa da ordem constitucional, possibilitando a extirpação de lei ou ato normativo in- constitucional do sistema jurídico. Não se visa – como ocorre no controle incidental – à garantia de direitos subjetivos, à libertação de alguém no acatamento de uma lei inconstitucional. O autor da ADI não atua na qualidade de alguém que postula interesse próprio, pessoal, mas na condição de defensor do interesse coletivo, traduzido na preservação da higidez do ordenamento jurídico. Diferentemente do que ocorria no regime da Carta de 1967/69, em que a legitimação ativa para a Ação Direta de Inconstitucionalidade per- tencia exclusivamente ao Procurador-Geral da República, a Constituição de 1988 ampliou significativamente o rol dos legitimados ao exercício do controle concentrado. Isso tem sido um dos mais importantes fatores de transformação da jurisdição constitucional no Brasil. O procedimento da ADI, nos termos disciplinados na Lei n o^ 9.868/99, tem incorporado os principais dispositivos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e a experiência desse Tribunal ao julgamento de Ações Diretas de Inconstitucionalidade genérica, introduzidas no sistema constitucional brasileiro com a EC no^ 16/65. Prescreve o artigo 3 o^ da Lei n o^ 9.868/99 que o autor deve indicar o dispositivo impugnado, os fundamentos jurídicos do pedido em relação a cada uma das impugnações e o pedido, com suas especificações. Deverá
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a inicial conter cópia do ato impugnado e procuração quando a peça for suscitada por advogado (BRASIL, 2003). Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado (art. 27, Lei no^ 9.868/99). A falta desse mecanismo de fixação dos efeitos prospectivos da de- claração de inconstitucionalidade asfixiava o sistema de controle, pois acabava por obrigar os Tribunais, muitas vezes, a se abster de emitir um juízo de censura, declarando a constitucionalidade de leis manifesta- mente inconstitucionais. Limitar os efeitos era preciso para adequá-los às situações da vida.^16 Por último, cumpre ressaltar que a Lei no^ 9.868/99, em seu art. 28, parágrafo único, previu a eficácia erga omnes e o efeito vinculatório das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nos processos de controle de constitucionalidade. Antes a EC n o^ 3/93 só previa eficácia contra todos e efeito vinculante nas decisões definitivas de mérito nas ações declaratórias de constitucionalidade. A Emenda Constitucional no 45/2004 unificou os efeitos e elevou o instituto ao nível constitucional. Quanto à Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC), há um aspecto que a diferencia da ADI. Trata-se do pedido do autor, que, na ADI, é pela declaração da inconstitucionalidade da lei ou do ato nor- mativo federal ou estadual, enquanto, na ADC, é pela declaração da constitucionalidade da lei ou do ato normativo federal. Por essa razão, doutrinariamente se diz que a ADC é uma ADI de sinal trocado. Quanto aos legitimados para propor a ADC, a redação original da EC no^ 3/93 previa os seguintes legitimados: o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados e o Procurador- -Geral da República. O artigo 13 da Lei no^ 9.868/99, em conformidade com o texto cons- titucional, como não poderia deixar de ser, reproduziu o dispositivo constitucional. A Emenda Constitucional n o^ 45/2004, contudo, estendeu o direito de ação a todos os órgãos e entes previstos no artigo 103 da Constituição, equiparando-os, assim, aos legitimados da ADI.
(^16) Pela ADI 4029-DF, o STF não declarou a inconstitucionalidade da Lei n o (^) 11.516/ (criou o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), originária de Medida Provisória que tramitou no Congresso Nacional (CN) em desconformidade com o rito legislativo. O Tribunal deu um prazo de dois anos para que o CN edite nova norma para garantir a continuidade da autarquia. Com a decisão, a lei em questão e as demais MPs convertidas em lei sob o rito previsto na Resolução 1/2002 foram validadas, e o CN deverá seguir, daqui para frente, o trâmite previsto na Constituição Federal (BRASIL, 2012c).
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Federal, unicamente, o poder de cientificar o legislador inadimplente, para que este adote as medidas necessárias à concretização do texto constitucional. Nesse sentido, não assiste ao Supremo Tribunal Federal criar regras, em face dos próprios limites fixados pela Lei Maior, em sede de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, § 2o^ , da CF/88). Essa prerrogativa de expedir provimentos normativos compete ao órgão legislativo em mora.
4.3. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF)
Por último, outro mecanismo de controle abstrato da constitucionali- dade das normas, previsto na Constituição Federal de 1988, é o instituto da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), denominada também de Ação. Essa ação veio completar o sistema de controle de constitucionalidade concentrado no Brasil. Sua previsão se encontra no artigo 102, § 1 o, da Constituição de 1988. Regulamentada só depois de mais de dez anos, pela Lei n o^ 9.882, de 3 de dezembro de 1999, a ADPF veio preencher um espaço até então não contemplado pelas ADIs. Os exemplos mais notórios são a possibilidade de impugnação de atos normativos municipais em face da Constituição da República e o cabimento da ação quando houver controvérsia envolvendo direito pré-constitucional. Também por meio dessa Ação Direta, pode ser impugnado qualquer ato do Poder Público de que resulte lesão ou ameaça de lesão a preceito fundamental decorrente da Constituição Federal. Esse novo instituto representou uma relevante alteração no sistema de controle de constitucionalidade. Até a instituição da ADPF, o direito municipal e o direito pré-constitucional não podiam ter a sua validade em abstrato impugnada perante o STF, uma vez que, conforme já demonstra- do, a ADI e a ADC só admitem como objeto de questionamento as leis e os atos normativos praticados na vigência da Constituição Federal de 1988. O pressuposto essencial para o ajuizamento da ADPF é o descum- primento de “preceito fundamental”, expressão que nem a Constituição, nem a Lei definem, remetendo-se à doutrina e à jurisprudência a sua compreensão (MENDES, 2011, p. 36). Por tratar-se de um conceito in- determinado, de alto teor axiológico em sua definição, o instituto se viu envolvido em inúmeras controvérsias. A primeira questão a ser enfrentada seria definir o termo “descum- primento”, sem confundi-lo com a noção de inconstitucionalidade lato sensu. Na técnica jurídica, o termo “cumprimento” significa ato ou efeito de cumprir, satisfazer um dever legal (SILVA, 1994, p. 592) ou executar algo; seu oposto, portanto, é a não satisfação ou não execução, desviando- -se daquilo que se prescreve.
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A segunda questão diz respeito ao sentido e ao alcance da expressão “preceito fundamental”. Em relação ao alcance da expressão, o preceito compreende apenas os princípios, e não as regras constitucionais? O que é fundamental, exigido pela Constituição? Em relação à primeira questão, André Ramos Tavares sustenta que o termo “preceito” não se identifica com o mero princípio, tampouco com a mera regra, mas que deve ser tomado como norma constitucional; em relação à segunda questão – a expressão “preceito fundamental” –, traduz-se o que é imprescindível, basilar ou irrecusável no ordenamento constitucional. São eles, precisamente, por um lado, parcela dos princípios constitucionais, bem como, por outro, regras cardinais de um sistema constitucional, constituídas essencialmente por um conjunto normativo assegurador de direitos humanos (TAVARES; ROTHENBURG, 2001, p. 152-153). A noção do que é fundamental conduz, em uma interpretação fina- lista e sistemática, a superar a ideia de que todo princípio constitucional, por si só, seria fundamental. Convém reconhecer que os princípios têm distintas potencialidades e que, para o alcance do conceito, há que partir da determinação do âmbito de incidência de cada princípio e avançar em direção àqueles preceitos que se impregnam de valores transcendentes, que têm aplicação não apenas em certos setores, mas na totalidade do or- denamento constitucional, isto é, princípios como valores fundamentais, que governam a Constituição, o regime, a ordem jurídica (BONAVIDES, 2010, p. 288-289). Desde a aprovação da Lei n o^ 9.882/99 até 31 de agosto de 2012, foram propostas, perante o STF, 256 ADPFs, das quais 145 já foram julgadas em decisão final, 14 em decisão liminar e 97 aguardam julgamento (BRASIL, 2012a). A primeira ADPF admitida pelo STF foi a de no^ 4, na qual se pro- curava evitar lesão a preceito fundamental e dirimir controvérsia sobre ato normativo efetivado pelo Presidente da República quando fixou o salário mínimo por meio da Medida Provisória n o^ 2.019, de 20 de abril de 2000. Ressalte-se, por fim, o julgamento recente da ADPF n o^ 54 – o caso do aborto de feto anencéfalo. Foi concedida, em 2 de agosto de 2004, monocraticamente, liminar requerida para determinar o sobrestamento dos processos e das decisões não transitadas em julgado e para reconhecer o direito constitucional da gestante de submeter-se à operação terapêu- tica de parto de fetos anencefálicos. Na sessão de 20 de outubro 2004, o Tribunal negou referendo à liminar concedida. O julgamento final se deu na sessão plenária do dia 12 de abril de
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paralisação do trabalho pelos servidores públicos, eles teriam de seguir a lei de greve do setor privado. O Supremo, nesse sentido, tornou-se ativista? O ministro respondeu: “Esse é o problema”, porque, “ao se elaborar uma lei ou ao se indicar quando ela será aplicada, se conduz a um poder político de dizer: a normatividade é essa”. Explicou Moreira Alves que, antes, ao receber pedidos judiciais para que o Congresso aprovasse uma lei, via Mandado de Injunção ou ADO, o STF apenas fazia uma comunicação aos parlamentares de que eles es- tavam demorando para garantir um direito à população. Em sua opinião, o Mandado de Injunção é um instituto que não possibilita a criação de normas, mas apenas constitui um instrumento de alerta ao Congresso Nacional para que ele crie as normas. Outro aspecto revelador do ativismo judicial, que não existia na época do ministro Moreira Alves, refere-se à sentença aditiva, segundo a qual o tribunal acrescenta regras à lei a fim de que uma decisão seja cumprida. Isso aconteceu em pelo menos dois casos julgados, com grande repercussão: no julgamento que autorizou as pesquisas de células-tronco (ADI – 3.510-DF), quando o STF criou regras para a realização dessas pesquisas (BRASIL, 2010); e na demarcação da reserva Raposa Serra do Sol (PET – 3388), quando os ministros fixaram novas condições para que a terra fosse devolvida para os indígenas. Na verdade, o STF vem assumindo o perfil de um verdadeiro Tribu- nal Constitucional, mais preocupado em resolver grandes questões do país, e, por isso, passou a indicar qual é o direito a ser aplicado mesmo na falta de leis. O problema é saber justamente se a Constituição outorga esse poder ou se ele foi criado pelo próprio STF. O certo é que existe essa tendência no Tribunal, e, pelos últimos julgamentos da Corte, pode-se concluir que é uma tendência irreversível, a curto prazo. O grande desafio do STF é ficar no terreno do razoável, e não começar a criar normas absolutamente “novas” em matéria de direito. Trata-se de tarefa bastante difícil e polêmica, que o Tribunal tem levado adiante, en- frentando questões relevantes e populares, que dividem a opinião pública do país, tais como: “a relação homoafetiva e a entidade familiar” (ADI 4.277-DF e ADPF 132-RJ), decidida em 5 de maio de 2011; “o aborto de feto anencéfalo” (ADPF 54), decidida em 12 de abril de 2012; e “as cotas raciais em universidades” (RE 597285), tema com repercussão geral, julgado em 9 de maio de 2012. No âmbito do controle difuso, lembremos o julgamento da Reclama- ção no^ 4.335-5/AC, no qual há uma tentativa de mutação constitucional do art. 52, X, da CF/88, pela via interpretativa. A questão posta é a seguinte: se uma decisão anterior proferida em sede de controle difuso poderia ter
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validade erga omnes sem a edição de Resolução Suspensiva pelo Senado Federal. Tudo indica que, se a tese da mutação constitucional for vitoriosa no STF, estaremos diante de uma nova perspectiva no controle difuso. Entre as críticas relacionadas à posição mais política do STF ou ao ativismo judicial, merece destaque a Proposta de Emenda Constitucional que visa a estabelecer limites à Corte Suprema. Trata-se de proposta aprovada por unanimi- dade pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, que autoriza o Congresso a sustar atos normativos do Poder Judiciário. A proposição, de autoria do Deputa- do Nazareno Fonteles, altera o artigo 49, V, da CF/88 para consignar ao Congresso Nacional competência para sustar também os efeitos de decisão judicial que implicar usurpação de competência privativa do Poder Legislativo. No mesmo sentido, na Proposta de Emenda Constitucional no^ 33/2011, que tramita na Câ- mara dos Deputados e já foi aprovada pela CCJ, o mesmo parlamentar propõe, entre outras coi- sas, a ampliação – de seis para nove – do número mínimo de ministros do STF necessários para declarar a inconstitucionalidade de normas. Com isso, o proponente acredita que contribui para reduzir o ativismo judicial na Suprema Corte. Argumenta-se que: “Em prejuízo da democracia, a hipertrofia do Judiciário vem des- locando do Legislativo boa parte do debate de questões relevantes, como as ações afirmativas de cotas raciais e a questão das células-tronco” (CONSULTOR JURÍDICO, 2011). No campo doutrinário, as críticas ao STF são generalizadas. A principal delas se refere à falta de legitimidade da Suprema Corte para decidir sobre questões de natureza política, normativa, fazendo as vezes do legislador, o que viola o princípio republicano da separação dos poderes. Para respaldar tal postura, é necessário conferir maior legitimidade ao STF. No entanto,
para que isso aconteça, teria de ser feita uma re- forma, alterando-se a escolha de seus membros: uma parte seria indicada pelo Presidente da República, sem o referendum do Senado Federal, e a outra parte, eleita pelo Congresso Nacional, com mandato determinado, como acontece com os membros dos Tribunais Constitucionais, por exemplo, em Portugal. Outra proposta de reforma no modelo bra- sileiro, menos radical, no âmbito do controle abstrato, seria inserir a fiscalização judicial preventiva de algumas matérias, tais como: tributária, administrativa, previdenciária. Essa proposta foi defendida pelo ministro do STF Dias Toffoli, quando comentou a fiscalização preventiva adotada em Portugal. Para ele, o controle preventivo de constitucionalidade poderia ser uma boa solução para problemas enfrentados pelos brasileiros. O controle de leis antes da sanção presidencial, na visão do ministro, seria admitido em duas hipóteses: nas normas tributárias e nas leis sobre remu- neração de servidor público – neste último caso, porque faz com que muitos aposentados ou funcionários públicos de outras carreiras peçam equiparação. Em suas palavras: “Estas duas espécies de leis, editadas em todos os entes da federação (União, estados, Distrito Federal e municípios), são as mais questionadas quanto à constitucionalidade. Evitaríamos inúmeras ações se o STF já pudesse definir sua validade” (SCRIBONI, 2011). São propostas que, por um lado, transforma- riam o controle híbrido de constitucionalidade em um sistema misto complexo, no qual haveria parte das leis controlada por um órgão político e parte controlada por um órgão jurisdicional, sendo a última palavra do órgão político. Por outro lado, transformaria o Supremo Tribunal Federal em um autêntico Tribunal Constitucio- nal. Isso, contudo, não seria tarefa de um Poder Reformador, em razão dos limites constitucio-