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Uma pesquisa sobre as festas e folias do divino em goiás, descrivendo mais de 30 estilos musicais, danças, autos, cantos de louvação e brincadeiras encontrados em suas festas e folias. O texto aborda a inclusão do termo 'folias' no título da dissertação, pois as festividades de colinas do sul levam outro nome e louvam outra entidade além do espírito santo: nossa senhora do rosário. Além disso, o documento discute a ausência de um aspecto musical precatório nas folias em portugal e sua possível relação com o caráter historicamente 'profano' da cultura portuguesa. O texto também inclui links para ilustrações e referências a autores e documentários.
Tipologia: Notas de estudo
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Não perca as partes importantes!
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em Música da Escola de Música e Artes Cênicas da Universidade Federal de Goiás, como requisito para obtenção do título de Mestre em Música. Linha de Pesquisa : Música, Cultura e Sociedade. Orientador : Profa. Dra. Ana Guiomar Rêgo Souza
Goiânia 2017
Aos mestres e guardiões da religiosidade e da cultura populares: Em Crixás: A meus tios-avós Eclair Maciel e Inácio Neves (em memória) – que infelizmente nos deixou antes de ver este trabalho pronto. Foram as principais fontes orais e de arquivo pessoal sobre o município, e agradecemos também a todos seus filhos – em nome de Inácio “Nevim”, também importante em nossa pesquisa por seu artigo “A Mula e o Xará ” (2014). A meus tios-avós Joaquim Xavier Maciel (em memória) – com quem mais aprendi sobre a Festa do Divino e a cultura crixaense – e Ana Ferreira (em memória); e também a todos seus filhos – em nome de Nel, meu amigo e anfitrião na pesquisa de campo. Ao guia Severo (viola e 1ª voz) e seu irmão Sebastião (violão e 2ª voz) – detentores de vastos conhecimentos e práticas populares que passam aos filhos como missão. Aos antigos foliões e mestres da cultura crixaense: tanto os que ainda estavam vivos à época de nossa pesquisa, como Seu Matheus Seabra, quanto os falecidos que contribuíram com depoimentos por meio de registros audiovisuais, como Inácio Viola. Aos pesquisadores e divulgadores da Festa do Divino, de suas Folias e da cultura típica de Crixás: Delmira Xavier Ferreira , Maria Madalena de Lima, José Asmar, Ursulino Leão, André Machado (em memória), Nequito e outros. Aos parentes, amigos e colaboradores tios Bem Maciel e Joana, tios Nequinho e Arlene e seus filhos Adriana, Juliana e Augusto, além de respectivos marido e esposa. E especialmente a meus avós Olímpio Araújo e Nair Maciel (em memória), com quem tive o privilégio de conhecer a vida no campo e que me transmitiram a cultura e religiosidade populares que incluem a Festa e as Folias do Divino. Hoje sinto imenso orgulho de ter recebido essa “herança caipira” – a ponto de escolher o tema para a Dissertação.
Em Colinas do Sul: A José Nilo, mestre do Batuque da Rainha – principal anfitrião nas pesquisas no município, nos inserindo nas Folias e Festa da Caçada da Rainha com a maior generosidade. Alan Kardeks, ex-secretário de cultura de Colinas do Sul – que nos guiou nas pesquisas, facilitou acessos e repassou informações mesmo após deixar o cargo político. Luiz Coelho, ancião da cultura colinense que nos concedeu a entrevista mais elucidativa sobre o complexo panorama popular local, em 2013 – para uma pesquisa anterior
ao mestrado. Em 2015, já na pesquisa para o Mestrado, ele se considerava aposentado das Folias, mas participou de seu Arremate causando grande comoção nos presentes.
Em Pirenópolis: Ao Museu do Divino, Secretaria de Cultura e seus prestativos funcionários. Ao regente da Banda Phoênix Afonso Aurélio e Seu Vicente, pela entrevista.
E a todos os foliões, pouseiros, cozinheiras, ajudantes e envolvidos com as Festas e Folias de Pirenópolis, Crixás e Colinas do Sul – que nos receberam e trataram tão bem, além de transmitir e ensinar valores culturais e humanos preciosos para este trabalho e para a vida!
Parentes, amigos, colaboradores e incentivadores: A meus tios Zé Cézar e Arlene – primeiros incentivadores para que eu ingressasse no Mestrado, após 14 anos afastado da Academia. A meu irmão Marco Antônio e meu cunhado Júlio Pastore – doutores que tiveram enorme boa vontade e disposição para ensinar, aconselhar e repassar dicas valiosas sobre o universo acadêmico a um inexperiente mestrando. A minha irmã Denise, que me forneceu precioso material sobre a Festa do Divino: primeiramente, o documentário produzido por ela própria “Viva Todos que Prestaram Atenção” (2002, em parceria com o hoje cineasta Carlos Cipriano) para seu TCC na área de Comunicação; também me disponibilizou todos os registros de sua pesquisa sobre a Festa do Divino em Crixás; e livros sobre o tema no Brasil que foram referenciais para este trabalho. A minha irmã Luciana e meu cunhado Gregory Mark, que me incluíram nos trabalhos musicais em que toquei durante o Mestrado: me proporcionaram a gravação do CD da banda Indústria Orgânica – liderada pelo casal – e diversas apresentações com a cantora. A meus sobrinhos João, Francisco, Cecília (em memória), Antônio, Anna Izabel (minha afilhadinha), Miguel e Maria – fontes de alegria e carinho que me deram força e persistência para prosseguir perante as dificuldades. A Nini Teatini Clímaco – meu maior exemplo de vida, aos 98 anos, sempre estimulando e orgulhosa dos projetos dos netos; e a meu avô João Clímaco (em memória) – que, mesmo falecido precocemente, deixou-nos um legado humano, ético, moral e religioso fundamental na formação dos netos, inclusive para a conduta nas pesquisas aqui realizadas. A todos os meus primos, primas, tios e tias – exemplos em suas escolhas e batalhas profissionais, muitos com sólida carreira acadêmica determinantes em minha opção...
The present work addresses a variety of rhythms and music genres that are presented during the traditional festivals of “Folias do Divino Espírito Santo” in the state of Goiás – Brazil, particularly in the towns of Crixás, Pirenópolis and Colinas do Sul, where the field research took place. Based on a comparative study between the program of each one of the events and the cultural expressions present in it, we tried to understand their particular features as well as the common points in them. The aim of the work was to identify different styles, investigating their possible origins and the historic processes they went through in each one of these places - according to their geographical location in the state region and the time of their foundation. This work justifies itself by the difficulties in identifying expressions (or even elements) that represent the popular culture of the state – even more in a way that could be defined as typical, traditional and, above all, exclusive. The work is based on the “Cultural History” approach, which allows the inclusion of oral sources as well as group memories, together with the documents and sources that are usually considered official – which, in the case of the traditional festivals in Goiás, are scarce and sparse. This approach widened the coverage of the research subject and the possibilities of its analysis stemmed from the concept of “Social Representation” – which involves precisely the negotiation and the conflicts between the society’s segments, institutions, entities and people (public or anonymous) on the subject concerned. One other concept that supports this research is the “Hybridism” or “Hybridization”, which is applied here to cultural manifestations formed by the blending between elements of different origins and historical periods, or even formed by two or more distinct manifestations. The research revealed more than 30 music styles, dances, acts, hymns of praise and frolics – almost all of them present in some historical period in the festivals and “folias do Divino” in the state of Goiás (and in the state of Tocantins, which was previously part of Goiás). The vast majority of these cultural expressions have a popular nature but we have also identified many with erudite aspects. Another relevant result of this research was that one third of these manifestations is practically extinct from Goiás’ culture: many of them became threatened with extinction precisely at the moment they were excluded from the festivals or “folias do Divino” – which are often their last cultural refuge. We have confirmed the musical diversity related to the various events of these festivals as a remarkable characteristic in all the places where the research took place, which leads to another important theoretical support used here: the “Identitary Processes”. This concept helps us in the conducted assessments regarding when, how, and foremostly why certain expressions have been excluded over the years; as well as the reasons why some other expressions have remained as part of the festivals and “folias” up to the present. These are the processes which determine the choices of the events, of the manifestations and their relevance inside the general programming in each one of the communities: they determine, therefore, their own cultural identity. In the Final Considerations, it became evident the coincidental or similar processes between the concerned towns and others, especially those with colonial origins. These processes can shape a Cultural Identity related to the whole of the state of Goiás which is represented by the festivals and “folias do Divino Espírito Santo”.
Keywords : Festivals of “Divino”; “Folias”; Musical Manifestations; Representations; Cultural Identity
Link “Negróide Pesquisa” – canal no YouTube com todos os vídeos disponíveis: https://www.youtube.com/channel/UCOHCdYQv0_0wYCLfvdNp6uw/videos
Links dos vídeos na sequência em que aparecem na Dissertação:
Link 1: Banda de Couro – Festa do Divino 2015 de Pirenópolis (GO) https://www.youtube.com/watch?v=BzS9YiVuAeA
Link 2: Congada – Festa do Divino 2016 de Pirenópolis (GO) https://www.youtube.com/watch?v=D9MgWoJTsDE&index=14&list=UUOHCdYQv0_0wY CLfvdNp6uw
Link 3: Dança do Congo – Festa do Divino 2015 de Pirenópolis (GO) https://www.youtube.com/watch?v=7eo7Cq9QcJE&list=UUOHCdYQv0_0wYCLfvdNp6uw &index=
Link 4: Banda Phoênix – Cortejo Imperial, Festa do Divino 2015 de Pirenópolis (GO) https://www.youtube.com/watch?v=LMmyrwLdCv
Link 5: Orquestra e Coral Nª Sra. do Rosário – Missa do Divino 2015 em Pirenópolis https://www.youtube.com/watch?v=HczXoH657Q
Link 6: Desfile dos grupos musicais e culturais – abertura das Cavalhadas, Pirenópolis https://www.youtube.com/watch?v=iAhhxGNVfUc
Link 7: Cantorio de Chegada – Folia do Divino de Crixás, 2015 https://www.youtube.com/watch?v=I-xzgXiWBXQ
Link 8: Saudação ao Arco – Folia do Divino rural de Pirenópolis (GO), 2015 https://www.youtube.com/watch?v=yG__LiGWStY
Link 9: Louvação ao Altar – Folia do Divino urbana de Pirenópolis (GO), 2015 https://www.youtube.com/watch?v=F-TakrACrn
Link 10: Bendito de Mesa – Folia do Divino urbana de Pirenópolis (GO), 2015 https://www.youtube.com/watch?v=ZzQnV2Al5W
Link 11: Bendito de Mesa – Folia do Divino de Crixás (GO), 2015
https://www.youtube.com/watch?v=XaYil4-ncv
Link 12: Cantorio de Tirar Esmola – Folia do Divino de Crixás (GO), 2015 https://www.youtube.com/watch?v=g-pLsXyo-2o
Link 13: Dança do Xá (ou “Chá”) – Folia do Divino rural de Pirenópolis (GO), 2015 https://www.youtube.com/watch?v=nEidfMhq1rQ
Link 14: Catira e Moda-de-Viola – Folia do Divino de Crixás no palco do Encontro, 2009 https://www.youtube.com/watch?v=Sbh1m2ozYZI&t=9s
Link 15: Catira e Moda-de-Viola – Folia do Divino e Nª Sra. do Rosário, Colinas do Sul https://www.youtube.com/watch?v=bIZv8aZgW8Y
Link 16: Recortado – Folia do Divino de Crixás no palco do Encontro de Culturas https://www.youtube.com/watch?v=mgG0vF5p3_k
Link 17: Veadeira – Folia do Divino de Crixás no palco do Encontro de Culturas da Chapada https://www.youtube.com/watch?v=5XbRQTiTmqU
Link 18: Curraleira 1 – Folia do Divino e Nª Sra. do Rosário, Colinas do Sul (GO), 2015 https://www.youtube.com/watch?v=r2OHJ0a290w
Link 19: Curraleira 2 – Folia do Divino e Nª Sra. do Rosário, Colinas do Sul (GO), 2015 https://www.youtube.com/watch?v=SiEnDhS7ln
Link 20: Minuana – Folia do Divino e Nª Sra. do Rosário, Colinas do Sul (GO), 2015 https://www.youtube.com/watch?v=lGGggMjf6SY
Link 21: Carolina – Folia do Divino e Nª Sra. do Rosário, Colinas do Sul (GO), 2015 https://www.youtube.com/watch?v=Ea_rztAjCc
Link 22: Canto de Despedida – Folia do Divino de Crixás (GO), 2015 https://www.youtube.com/watch?v=26vu8okeGU4&t=9s
Link 23: Canto de Despedida – Folia do Divino e Nª Sra. do Rosário, Colinas do Sul (GO) https://www.youtube.com/watch?v=bEyJCTQlzMc
Link 24: Dança do Ponto – Folia do Divino de Crixás (GO), 2015 https://www.youtube.com/watch?v=D6EwKj1yc3o
significativos e constantes. A Festa do Divino de Pirenópolis mantém a característica de diversidade musical da mesma festa realizada na então capital do Império, Rio de Janeiro, no século XIX, relatada por Martha Abreu (1999). Também contempla a descrição de Maynard Araújo sobre festa “polarizadora” de outras festas, de danças e de gêneros musicais:
Nós a recebemos de Portugal. O folclore europeu aqui se modificou para se adaptar às realidades brasileiras, e as diferenças regionais devem concordar com a estrutura social (...). Deslocou-se no calendário ao chegar em terras brasileiras, o que provocou algumas modificações, mas, ao mesmo tempo, ela se tornou a polarizadora de várias festas populares do calendário folclórico (...). É uma festa em que não é a esperança que domina, mas sim o agradecimento, daí os grandes, tradicionais e populares divertimentos de acordo com as regiões: cavalhada, tourada, bailados do Moçambique, da congada e do caiapó e danças do batuque, jongo, cateretê, cururu e fandango. (ARAÚJO, 2007, p. 9) A Festa do Divino revelou-se como um evento de cultura popular de grande abrangência e incidência em território goiano, em um primeiro levantamento de literatura e em minhas pesquisas anteriores ao mestrado – para compor e arranjar trilhas sonoras e trabalhos autorais, e ainda para o programa de rádio Espírito da Música (veiculado pela Rádio Universitária e via Internet), do qual fui pesquisador, programador e redator. As “diferenças regionais” que Maynard Araújo cita, podem ser observadas em regiões distintas do Estado de Goiás, onde a Festa do Divino adquire feições próprias em cada local, com diferentes gêneros, danças e brincadeiras (como os foliões chamam as manifestações “profanas” das folias). Atuando como músico profissional e compositor, tenho recebido encomendas – por parte de produtores de documentários, espetáculos de dança e peças de teatro – de trilhas sonoras para trabalhos que tratam de assuntos e temas regionais, ou que têm locações ou cenários no Estado. Nesses casos, buscam uma música que seja típica de Goiás, com ritmos, gêneros musicais e cânticos próprios ou elementos característicos. Por outro lado, como músico e compositor dos grupos “Umbando”, “Sertão” e “Negróide”, tenho desenvolvido trabalhos autorais em que utilizo elementos da cultura popular do Estado, sejam rítmicos, melódicos, harmônicos e/ou poéticos, resultantes de um trabalho pessoal de pesquisa. Portanto, constatei por experiência própria que não é tarefa fácil identificar, no universo plural reinante, elementos identitários de uma cultura goiana. Nós, músicos, acabamos esbarrando na dificuldade dessa identificação e do acesso a materiais sobre expressões artísticas que possam representar diferentes regiões de Goiás, capazes de caracterizar culturas e a tradições do povo goiano.
Observo ainda que Goiás é pouco reconhecido nacionalmente como um estado rico em cultura popular ou detentor de grande diversidade de manifestações tradicionais, difundidas e conhecidas por todo país, como acontece com outros estados brasileiros. O que parece ser reconhecido como representativo do Estado, numa primeira instância de observação, consistindo-se em uma das mais frequentes manifestações culturais populares na região, é a Catira – ou o Catira, como os foliões geralmente falam, executada tanto nas “Folias do Divino” como nas “Folias de Reis”. Herança principal dos paulistas, que a chamam de Cateretê, a Catira é encontrada na região Sudeste e também no Centro Oeste (CASCUDO, 2001), não sendo, a princípio, um elemento que destacaria Goiás no cenário da cultura popular nacional em termos de originalidade ou exclusividade. A partir do meu contato, desde a infância, com as Folias do Divino do município goiano de Crixás, de onde é procedente toda minha família materna – tradicionalmente envolvida com tais Folias, achei pertinente incluí-lo na presente pesquisa. Afinal, tenho acesso fácil e direto aos eventos que compõem a Festa do Divino crixaense, mediado por parentes próximos e interessados em divulgar sua cultura, além de acervos particulares e produções locais. Por meio do contato familiar com a Festa do Divino em Crixás, pude, assim, acompanhar processos históricos e culturais pelos quais ela passou durante as últimas quatro décadas – particularmente as folias, que no município ocupam a maior parte da programação total da Festa. Ademais, minha própria irmã, Denise Clímaco, em seu Trabalho de Conclusão de Curso na área de Comunicação da Universidade Federal de Goiás (UFG), produziu um documentário sobre o tema, talvez o único de caráter não-doméstico, junto ao hoje cineasta Carlos Cipriano. Intitulado “Viva Todos que Prestaram Atenção!”, esse documentário se constituiu em trabalho de grande importância para esta dissertação. Meu contato em Pirenópolis com sua Festa do Divino foi mais recente, mas ainda anterior ao ano de 2010, ano em que esta recebeu o título de Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil pelo IPHAN, o que a tornou reconhecida como a festa em louvação ao Espírito Santo mais relevante no Estado e uma das mais importantes do país. Diante de tal reconhecimento nacional, julguei ser fundamental a inclusão de Pirenópolis em nossa pesquisa, possibilitando um rico estudo comparativo entre as Festas do Divino das duas cidades, que foram fundadas na mesma época e contexto, ou seja, após as descobertas de ouro e posterior exploração das minas que iniciaram o povoamento desta região. Entretanto, Crixás e Pirenópolis são cidades diferentes em muitos aspectos, inclusive em relação à suas Festas do Divino: as folias pirenopolinas, por exemplo, ocupam menos de um terço da programação geral de sua Festa, ao contrário de Crixás. Além do mais, os registros audiovisuais realizados durante essas festas
instrumentos musicais, ritmos, danças e gêneros musicais caracterizam as Folias? Quais elementos musicais estruturais caracterizam as “Festas e Folias do Divino” em cada um dos municípios goianos selecionados? Buscando responder a essas questões, a pesquisa teve como objetivo geral a investigação das “Festas e Folias do Divino” nos municípios de Crixás, Colinas do Sul e Pirenópolis, enfocadas sob o viés das representações sociais e identitárias. O estudo e a divulgação do patrimônio cultural do Estado de Goiás por si justificam essa pesquisa, uma vez que ainda é pouco conhecido no Brasil e mesmo do povo goiano, o que inclui músicos e pesquisadores que lidam profissionalmente com o tema. Assim, esse trabalho facilitará as pesquisas ligadas à cultura popular goiana – em particular às suas Festas do Divino, além de favorecer o cultivo da memória dos cidadãos que são sujeitos dessa pesquisa. Mais recentemente, o tratamento da cultura popular deixou de estar vinculado unicamente aos campos do folclore, para se ampliar para antropologia, musicologia e história cultural, dentre outros. O método de pesquisa utilizado neste trabalho foi o da abordagem qualitativa, num contexto em que documentos oficiais e religiosos foram relacionados a documentos e fontes de irmandades, gravações de várias épocas e ainda depoimentos de antigos foliões, pesquisadores e mestres da cultura popular, ou seja, a memória individual e coletiva que formam a trama histórica desse evento religioso-cultural que remete aos primórdios de Goiás e do Brasil. A revisão de literatura se constituiu como a primeira etapa desse trabalho, evidenciando o que já foi investigado e registrado sobre o tema: livros, artigos, monografias, dissertações e teses de mestrado. Buscou-se também obras de autores que versam sobre o histórico dos municípios selecionados, sobre as Festas e Folias do Divino, sobre as manifestações culturais populares no estado de Goiás e sobre os autores e conceitos ligados ao embasamento teórico que fundamenta esse trabalho: a noção de cultura como o resultado de articulações simbólicas (GEERTZ, 1989; CASTORIADIS, 1995), a noção de representações sociais (CHARTIER, 1990; PESAVENTO, 2003) e o enfoque de processos identitários (HALL, 2006). A etapa seguinte aponta para um levantamento documental, para a pesquisa realizada em arquivos institucionais e arquivos pessoais, sobretudo nos municípios em questão; levantamento de possíveis LPs, CDs e gravações sobre toques e cantos populares do Estado de Goiás, de outros estados brasileiros e dos próprios municípios enfocados, especialmente os agregados à Festa e à Folia do Divino; vídeos, entrevistas e reportagens
colhidos na internet ; e principalmente fotos, filmagens e gravações realizadas pelo pesquisador. A exploração de fontes orais foi também de grande importância, já que se pretendia chegar a dados através dos relatos colhidos em entrevistas semiestruturadas, realizadas com integrantes das “Festas e Folias do Divino” observadas: com o público presente, com pessoas antigas da cidade, com músicos participantes, com cidadãos diversos e autoridades locais, dentre outras. A pesquisa de campo foi de fundamental importância nesse processo, já que o pesquisador acompanhou de perto a realização desses eventos, oportunidade em que pôde também gravar, filmar, fotografar e, sobretudo, observar, in loco , as manifestações acontecendo. A parte da pesquisa de campo que acompanha os eventos aconteceu de maio a julho de 2015, com pré-produção e alguns registros nos dois anos anteriores e etapa complementar no ano seguinte. Portanto, foram necessários quatro anos para contemplar toda a programação das Festas nas três cidades.. Outro momento da pesquisa refere-se à compilação, decupagem e análise das gravações das manifestações e entrevistas – o material coletado nas pesquisas de campo. O registro e as transcrições das músicas e ritmos observados foram recursos importantes que possibilitaram o contato com o material básico para a análise e interpretação musicais. A análise de gravações em LP’s, CD’s, sites e outras mídias sobre toques e cantos populares presentes em Goiás e outros estados brasileiros, principalmente os que têm a Festa do Divino como evento geral agregador de manifestações diversas, constitui um passo interessante nessa abordagem metodológica, a título de comparação e até de possível influência, levando em consideração semelhanças e diferenças, permanências e reelaborações, ressignificações e novas criações, possibilitando confirmar as pressuposições apresentadas no corpo desse projeto. Este procedimento deixou evidente quais elementos dessas manifestações revelam escolhas e peculiaridades relacionadas a Goiás, quais são encontrados também em outros estados, quais foram extintos ao longo do tempo e quais só são encontrados no estado. Para atender aos objetivos expostos, a dissertação foi estruturada em cinco capítulos. O primeiro deles, intitulado “Goiás e a Festa do Divino”, investiga a antiga louvação ao Espírito Santo no Estado e suas festas: começa com uma breve contextualização da colonização de Goiás e de seu povoamento inicial, quando estão inseridas historicamente as fundações de Crixás, Pirenópolis e São Félix – extinto arraial colonial que deixou as heranças culturais para Colinas do Sul. Prosseguindo o Capítulo 1, buscamos um histórico das festividades em devoção ao Divino no Brasil colonial, que foi demonstrada ocorrerem ainda em alto-mar, nas naus portuguesas que navegavam em direção ao Novo Mundo. Após abarcarem por aqui, a louvação dos portugueses ao Espírito Santo se espalhou pelos pioneiros