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ele se queixa de que no capitalismo “o objeto constituído adquire uma ... tica ao “marxismo científico”, quer di- ... 174 • MUDAR O MUNDO SEM TOMAR O PODER.
Tipologia: Notas de aula
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CRÍTICA MARXISTA 173
O livro de John Holloway é um ensaio admirável, cheio de idéias suges- tivas e verdadeiramente radical – no sen- tido original do termo: “ir à raiz dos problemas”. Quaisquer que sejam suas lacunas e imperfeições, mostra, de um modo exemplar, o poder subversivo e crítico da negatividade. Sua meta é ambiciosa e atual: “refinar e aguçar a crítica marxista ao capitalismo”. Os capítulos filosóficos funda- mentais tratam do fetichismo e da feti- chização. Baseiam-se criativamente em Marx, Lukács e Adorno. Holloway de- fine o fetichismo como a separação do fazer e do feito e a quebra do fluxo co- letivo do fazer. Este é um ponto de vis- ta fértil, mas Holloway aparentemente identifica todas as formas de objetivi- dade com o fetichismo. Por exemplo, ele se queixa de que no capitalismo “o objeto constituído adquire uma identi- dade durável”. Bem, uma boa cadeira
produzida no socialismo não se torna- ria “um objeto com uma identidade du- rável”? Sua recusa em distinguir entre alienação e objetivação (segundo a nota 22 do cap. 4) – um erro que o jovem Lukács não cometeu, apesar da sua auto-crítica tardia de 1967) – conduz a uma negação da materialidade objetiva dos produtos humanos. Outro argumento forte é sua crí- tica ao “marxismo científico”, quer di- zer, aquelas teorias que tentam alistar a certeza do lado do socialismo e afirmam explicar e predizer a mudança histórica de acordo com “leis científicas”. Essa parte é uma das mais importantes do livro e uma contribuição significativa para uma abordagem crítica e marxista da política. Entre os “marxistas científicos”, Holloway inclui a obra de Kautsky, o livro Que fazer? (1902), de Lênin, e Re- forma ou revolução? (1899), de Rosa
m a rx ista
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Luxemburgo. Entretanto, ele ignora o panfleto de Rosa Luxemburgo: “A crise da social-democracia”, de 1915, que representa uma ruptura metodológica radical com a doutrina da certeza cien- tífica, graças a uma decisiva nova for- mulação: a alternativa histórica entre “socialismo ou barbárie”. Esse ensaio é um verdadeiro momento de reorienta- ção na história do marxismo, precisa- mente pelo fato de introduzir o “princí- pio de incerteza” na política socialista. E assim chegamos ao ponto mais polêmico que dá título ao livro: “mu- dar o mundo sem tomar o poder”. Holloway sugere inicialmente que to- das as tentativas de mudança revolucio- nárias até aqui falharam, pois se basea- vam no paradigma de mudança por meio da conquista do poder estatal. No entanto, ele reconhece, na nota 8 da p. 217, que a evidência histórica não é suficiente, já que todas as tentativas de mudar o mundo sem tomar o poder também falharam, até agora. Ele tenta, portanto, apoiar seu argumento na dis- tinção, introduzida no Capítulo 3, mas que perpassa todo o livro, entre poder de , a capacidade de fazer coisas, e poder sobre , a capacidade de comando sobre os outros para que façam o que quere- mos que façam. Revoluções, segundo Holloway: “(...) deveriam promover o primeiro e desfazer o segundo”. Con- fesso que não estou convencido dessa distinção. Penso não ser possível existir nenhuma forma de vida coletiva e de ações dos seres humanos sem alguma forma de “poder sobre”.
Explico agora minhas objeções. Elas têm a ver com a idéia de democra- cia , um conceito que quase não apare- ce no livro, ou que é despachado como “um processo definido pelo estado de tomada de decisão influenciada eleito- ralmente” (p. 97). Penso que a demo- cracia deve ser um aspecto central em todos os processos de tomada de deci- sões sociais e políticas e particularmen- te num processo revolucionário – um argumento apresentado de forma notá- vel por Rosa Luxemburgo em sua críti- ca (fraterna) aos bolcheviques (ver seu ensaio A revolução russa , escrito em 1918). Democracia significa que a maio- ria tem poder sobre a minoria. Não um poder absoluto: ele tem limites, e deve respeitar a dignidade do outro. Mas, ainda assim, ela possui poder sobre. Isto se aplica a todos os tipos de comunida- des humanas, incluindo as comunida- des zapatistas, sobre as quais Holloway escreveu bastante. Por exemplo: em 1994, após algumas semanas, os zapatistas decidiram parar a luta arma- da e negociar uma trégua. Quem deci- diu? As comunidades zapatistas discu- tiram e a maioria – talvez tenha havido mesmo consenso geral – decidiu que o conflito armado deveria cessar. As co- munidades então deram ordem ao co- mando do EZLN para cessar fogo. Eles tinham poder sobre os comandantes. E, finalmente, os próprios comandantes obedeceram às ordens das comunidades e instruíram os combatentes zapatistas para cessar fogo: eles tinham poder so-
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dos expropriadores”. Mas eu não creio que qualquer “Não”, por mais bárba- ro, possa ser uma “força propulsora”, como Holloway sugere na página 205: eu não acho que o suicídio, ficar louco, o terrorismo e todos os tipos de respostas anti- humanas ao sistema possam ser “pontos de partida” para a emancipação. Concordo com a conclusão do li- vro – sem um fim. Estamos todos bus- cando nosso caminho, ninguém pode dizer que encontrou a única e verda- deira estratégia. E todos temos de apren- der com a experiência viva das lutas, como as dos zapatistas.