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A Pré-História da Mente: Origens da Arte, da Religião e da Ciência, Notas de estudo de Pré-História

Steven mithen explora as origens da mente humana, unindo as disciplinas da arqueologia e da psicologia evolutiva. Registrando os principais achados arqueológicos e as interpretações sobre o aparecimento do homo sapiens sapiens, ele discute as transformações dos instrumentos utilizados pelos ancestrais e as possíveis bases cognitivas necessárias para o desenvolvimento de arte, religião e ciência. Mithen questiona se as mentes atuais refletam a estrutura do mundo pleistoceniano e se os módulos mentais atuais são universais.

O que você vai aprender

  • Como as mentes modernas se relacionam com a estrutura do mundo pleistoceniano?
  • Qual foi a importância da recapitulação da evolução da mente durante o desenvolvimento?

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Garrincha
Garrincha 🇧🇷

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PUENTE, M. T. G. E. de la La Psicología en la Atención...
Educar, Curitiba, n. 24, p. 283-288, 2004. Editora UFPR 283
MITHEN, S. A pré-história da mente uma busca das origens
da arte, da religião e da ciência. São Paulo: Unesp, 2002
Nara L. C. Salamunes *
Considerando que a chave para o entendimento da mente moderna está
situada no período aproximado de seis milhões de anos de evolução que sepa-
ram as mentes humanas das dos chimpanzés, após terem tido estas espécies
um ancestral comum, Steven MITHEN, arqueólogo nascido na Inglaterra, pre-
tende realizar a união das subdisciplinas “Arqueologia cognitiva” e “Psicolo-
gia evolutiva” no livro A pré-história da mente, publicado originalmente em
inglês, em 1996. Registrando os principais achados arqueológicos ocorridos
até metade dos anos noventa, que nos permitem supor as ações desenvolvidas
por nossos ancestrais ao forjarem sua sobrevivência, MITHEN indica os princi-
pais instrumentos utilizados por eles e suas transformações ao longo do tem-
po. Com base em resultados de pesquisas arqueológicas significativas e ex-
tensamente indicadas, ele faz um belo registro das interpretações sobre o apa-
recimento do Homo sapiens sapiens, afirmando que, até isso acontecer, não
havia arte, religião ou ciência. Infere sobre diferentes processos adaptativos
que se desenvolveram em diferentes períodos evolutivos dessa espécie, e,
apoiando-se na Psicologia, acredita que a partir da arquitetura mental huma-
na da atualidade, construída durante milhões de anos de evolução, pode-se
refazer a pré-história da mente.
Seu interesse sobre o assunto se deu a partir da leitura de um artigo de
Thomas WYNN, de 1919, que alegava que a mente humana está pronta há 300
mil anos. WYNN afirmara isso tomando por base o machado de mão fabricado
pelo Homo erectus e pelo Homo sapiens arcaico, e, apoiando-se na idéia de
que a ontogênese recapitula a filogênese, de Ernest HAECKEL, buscara nos pe-
ríodos de desenvolvimento infantil descritos por Piaget os argumentos para
sua alegação. Para WYNN, os criadores do machado de mão possuíam um pen-
samento operatório-formal, pois, para produzirem tal ferramenta, precisari-
am elaborar hipóteses sobre que movimentos aplicar para chegarem ao for-
mato desejado. No entendimento de WYNN, isso evidenciaria que a mente da-
* Mestre em Educação – Universidade Federal do Paraná (UFPR). Doutoranda em
Informática na Educação – Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
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MITHEN, S. A pré-história da mente − uma busca das origens

da arte, da religião e da ciência. São Paulo: Unesp, 2002

Nara L. C. Salamunes *

Considerando que a chave para o entendimento da mente moderna está situada no período aproximado de seis milhões de anos de evolução que sepa- ram as mentes humanas das dos chimpanzés, após terem tido estas espécies um ancestral comum, Steven MITHEN , arqueólogo nascido na Inglaterra, pre- tende realizar a união das subdisciplinas “Arqueologia cognitiva” e “Psicolo- gia evolutiva” no livro A pré-história da mente , publicado originalmente em inglês, em 1996. Registrando os principais achados arqueológicos ocorridos até metade dos anos noventa, que nos permitem supor as ações desenvolvidas por nossos ancestrais ao forjarem sua sobrevivência, MITHEN indica os princi- pais instrumentos utilizados por eles e suas transformações ao longo do tem- po. Com base em resultados de pesquisas arqueológicas significativas e ex- tensamente indicadas, ele faz um belo registro das interpretações sobre o apa- recimento do Homo sapiens sapiens , afirmando que, até isso acontecer, não havia arte, religião ou ciência. Infere sobre diferentes processos adaptativos que se desenvolveram em diferentes períodos evolutivos dessa espécie , e, apoiando-se na Psicologia, acredita que a partir da arquitetura mental huma- na da atualidade, construída durante milhões de anos de evolução, pode-se refazer a pré-história da mente. Seu interesse sobre o assunto se deu a partir da leitura de um artigo de Thomas WYNN, de 1919, que alegava que a mente humana está pronta há 300 mil anos. WYNN afirmara isso tomando por base o machado de mão fabricado pelo Homo erectus e pelo Homo sapiens arcaico , e, apoiando-se na idéia de que a ontogênese recapitula a filogênese, de Ernest HAECKEL , buscara nos pe- ríodos de desenvolvimento infantil descritos por Piaget os argumentos para sua alegação. Para WYNN, os criadores do machado de mão possuíam um pen- samento operatório-formal, pois, para produzirem tal ferramenta, precisari- am elaborar hipóteses sobre que movimentos aplicar para chegarem ao for- mato desejado. No entendimento de WYNN, isso evidenciaria que a mente da-

  • Mestre em Educação – Universidade Federal do Paraná (UFPR). Doutoranda em Informática na Educação – Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

queles ancestrais era compatível à mente do homem atual, pois teria chegado ao nível máximo de desenvolvimento intelectual descrito por PIAGET. MITHEN se pergunta se o aparecimento da arte e a colonização global não teriam exigi- do novas bases cognitivas e considera que WYNN estaria certo ao se apoiar nas explicações psicológicas disponíveis ao seu tempo para supor o funciona- mento intelectual dos ancestrais, a partir dos vestígios deixados por eles, e por buscar a teoria da recapitulação de HAECKEL. Embora MYHEN não esteja convicto de que ocorra a recapitulação da evolução da mente durante o de- senvolvimento, ele adota o procedimento de WYNN para propor as fases arquitetônicas da evolução da mente. E se pergunta: existirá uma correspon- dência entre os estágios de desenvolvimento das mentes das crianças atuais e a evolução das mentes dos ancestrais humanos? Ao discutir proposições teóricas diferentes das de PIAGET, as quais reduz à concepção da mente como uma esponja ou um computador, MITHEN apre- senta as idéias de Jerry FODOR , de Howard GARDNER e dos evolucionistas COSMIDES e TOOBY. Discute ainda temas como psicologia, biologia e física in- tuitiva e, a partir disso, constrói seus argumentos sobre a arquitetura mental moderna. MITHEN se indaga se FODOR não vê modularidade nos sistemas cen- trais da mente pela dificuldade que normalmente se tem de observar as “inte- ligências” trabalhando em harmonia, como expõe GARDNER, e busca nos traba- lhos de Leda COSMIDES e John TOOBY , psicólogos evolucionistas, a resposta a essa questão. Esses autores afirmam que a mente é um mecanismo evoluído, construído e ajustado em resposta às pressões seletivas enfrentadas pelos an- cestrais da espécie humana no período Pleistoceno e que as mentes atuais permanecem adaptadas à caça e à coleta. Acreditam eles que a mente é com- posta por módulos múltiplos, decorrentes dos processos de seleção natural ocorridos na lida humana a partir de determinados problemas adaptativos. Tais módulos estariam embutidos na mente ao nascer e seriam universais entre as pessoas, sendo ativados em diferentes momentos do desenvolvimen- to individual, fornecendo regras e informações para resolução de problemas. Com isso, os ancestrais humanos teriam tido vantagens seletivas e seus genes teriam se espalhado pela população, codificando tal organização mental em seus descendentes. MITHEN lembra que caçadores-coletores modernos, existentes em algu- mas partes do mundo e estudados por representantes da antropologia, ao for- jarem sua sobrevivência, não estão a resolver um único problema adaptativo, mas a mediar suas ações também pela conotação social que estas apresentam. Como era de se esperar, MITHEN questiona se os módulos mentais atuais refle- tem a estrutura do mundo pleistoceniano. Recorre, então, a estudos da psi-

a afirmação de que PIAGET vê a mente como uma esponja ou um computador, pois, ao contrário, PIAGET aponta as limitações das perspectivas condutistas por não considerarem que o sujeito é ativo no processo de conhecer. As ações e a sua relação com o funcionamento e o desevolvimento mental são despre- zadas por MITHEN em todo o seu livro, apesar de VYGOTSKY, WALLON e PIAGET registrarem que é delas que se chega ao pensamento. Como se falar da origem da mente humana desconsiderando a idéia de que o fazer, isto é, a transforma- ção ativa, precede o compreender? Se as afirmações e estudos de PIAGET sobre a questão não são satisfatórias, por se basearem nos estudos das ações e rea- ções de crianças e adolescentes, como insinua MITHEN , talvez estudos com animais possam indicar algumas evidências: animais resolvem problemas que, obviamente, não compreendem logicamente. Mesmo que não se concorde que a origem do pensamento está na ação e sim o contrário, como sugere LÉCUYER (2002), não se pode deixar de tocar na questão ao se falar nos proces- sos de formação da mente. Se entre os seres humanos decisões e estratégias são tomadas muitas vezes sem que o sujeito saiba o porquê, será que as ações dos ancestrais humanos não tiveram papel fundamental na pré-história da constituição da mente do Homo sapiens sapiens? MITHEN , nesse livro, inclui a idéia de que a cognição influencia apenas marginalmente a percepção. Essa dicotomia entre percepção e processos cognitivos, que ele busca em FODOR, também foi denunciada por PIAGET. Para este, a percepção é a tomada direta de contato entre atividades perceptivas exercidas pelo sujeito ao prolongar esquemas assimiladores de ação com os objetos do meio. Nessa perspectiva, a percepção nunca é independente da ação; é um prolongamento da assimilação e da organização vital, portanto, constituinte da cognição. De forma reducionista, ele afirma que Piaget argu- menta a existência de três programas de utilidade geral rodando na mente: a assimilação, a acomodação e a equilibração. Ora, para PIAGET (1976) assimi- lação e acomodação são dois processos fundamentais que constituirão os com- ponentes de todo equilíbrio cognitivo. O primeiro é a incorporação de ele- mentos exteriores aos esquemas sensoriomotores ou conceituais do sujeito. O segundo é a necessidade em que se acha a assimilação de levar em conta as particularidades dos elementos a serem assimilados. O equilíbrio entre esses dois processos indissociáveis pode ser definido como adaptação. A equilibração, ou sistemas processuais múltiplos e permanentes de auto- regulação ( PIAGET , 1983), cujas formas superiores compõem as operações da inteligência é, juntamente com a maturação biológica, as experiências físicas e lógico-matemáticas e as interações sociais, fator de desenvolvimento cognitivo. Se tais processos, simplificadamente aqui apresentados, são in-

terpretados como um “programa geral”, é de se desafiar sua replicação em sistemas informáticos. Somente assim talvez se possa imaginar um programa que se autoconservasse, fosse auto-regulável e, ao mesmo tempo, construísse formas continuamente mais elaboradas de processos adaptativos aos diferen- tes contextos. É isso que acontece com o sujeito estudado por PIAGET. As fases de desenvolvimento que ele descreve, acrescente-se, são subproduto de sua teoria, mas facilmente verificáveis transculturalmente. Concordamos com MITHEN quando afirma que WYNN estava certo ao buscar os estudos ontogenéticos de PIAGET , mas não por ele tentar estabelecer os paralelismos simplificados entre o desenvolvimento filogenético e ontogenético da espé- cie humana, como tenta fazer MITHEN , reunindo forçosamente diferentes ex- plicações teóricas. WYNN estava certo por buscar resultados de pesquisas que adotaram o método ontogenético de análise com rigor. Um dos méritos de MITHEN nesse livro é trazer resultados de pesquisas situadas em diferentes concepções epistemológicas, evidenciando aspectos plausíveis de cada uma delas. Ele acaba por revelar que concepções inatistas permanecem presentes nas tentativas de explicação da organização e do fun- cionamento mental, apesar de evidências empíricas mostrarem que elas em si são insuficientes. Não é por outra razão que educadores, psicólogos e arque- ólogos não iniciados na teoria piagetiana titubeiam entre o empirismo e o inatismo. MITHEN faz uma concatenação cuidadosa das interpretações que selecio- na sobre a mente, mas comete deslizes ao avançar na análise de áreas diferen- tes da arqueologia, sua área específica de atuação. O apontamento de alguns desses deslizes não significa que a tentativa de leitura interdisciplinar seja inválida, mas sua retomada carece de um estudo cuidadoso de algumas pro- posições teóricas. Ao falar da modularidade da mente segundo KARMILOFF - SMITH , ele sequer aborda o domínio notacional que essa autora salienta como um domínio específico de conhecimento em pé de igualdade ao lógico-mate- mático, ao físico e ao lingüístico e isso tem significativa relação com o apare- cimento da arte, da escrita e com a capacidade de se produzir ciência, entre outros aspectos. Entende-se que a fluidez cognitiva proposta por MITHEN tem compatibilidades com a teoria da equilibração de PIAGET , embora MITHEN não tenha se permitido tomar consciência desse aspecto. Fica o desafio de se pen- sar a fluidez cognitiva para além das inteligências múltiplas e dos módulos mentais e de se continuar investigando se ela já não estaria presente na mente humana dos caçadores e coletores, ao que o estudo de MITHEN não parece responder suficientemente. Em que pese sua argumentação elaborada, ressal- te-se um estudo interdisciplinar deve buscar superar a justaposição de disci-