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Estilo de Vida Minimalista em Documentários da Netflix: 'Minimalism' e 'Minimalismo Já', Notas de estudo de Cultura

Este texto analisa como o estilo de vida minimalista é apresentado nos documentários 'minimalism: a documentary about the important things' (2015) e 'minimalismo já' (2021), ambos da dupla the minimalists, formada por joshua fields millburn e ryan nicodemus, disponíveis na plataforma de streaming netflix. O texto discute as ideias de minimalismo, a busca por significado na sociedade atual e a forma como os the minimalists expressam e propagam o estilo de vida.

O que você vai aprender

  • Quais são as diferenças entre as produções 'Minimalism: A Documentary About The Important Things' e 'Minimalismo Já'?
  • Qual é a relevância do minimalismo na sociedade atual?
  • Quais são as ideias principais do minimalismo apresentadas nos documentários?
  • Como os The Minimalists expressam e propagam o estilo de vida minimalista?

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Jacirema68
Jacirema68 🇧🇷

4.5

(122)

227 documentos

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE COMUNICAÇÃO E ARTES
CENTRO DE ESTUDOS LATINO-AMERICANOS
SOBRE CULTURA E COMUNICAÇÃO
MINIMALISMO NA NETFLIX
Uma análise sobre o consumo alternativo1
ANDRÉIA SARACCHI FIGUEIREDO2
Orientador: Prof. Dr. Eduardo Nunomura
São Paulo
2022
2Pós-graduanda em 'Mídia, Informação e Cultura' pelo Centro de Estudos Latino-Americanos sobre Cultura e
Comunicação (CELACC) e Bacharela em 'Rádio, TV e Internet' pela Faculdade Cásper Líbero.
1Trabalho de conclusão de curso apresentado como condição para obtenção do título de Especialista em Mídia,
Informação e Cultura.
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Baixe Estilo de Vida Minimalista em Documentários da Netflix: 'Minimalism' e 'Minimalismo Já' e outras Notas de estudo em PDF para Cultura, somente na Docsity!

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA DE COMUNICAÇÃO E ARTES

CENTRO DE ESTUDOS LATINO-AMERICANOS

SOBRE CULTURA E COMUNICAÇÃO

MINIMALISMO NA NETFLIX

Uma análise sobre o consumo alternativo^1 ANDRÉIA SARACCHI FIGUEIREDO^2 Orientador: Prof. Dr. Eduardo Nunomura São Paulo 2022 (^2) Pós-graduanda em 'Mídia, Informação e Cultura' pelo Centro de Estudos Latino-Americanos sobre Cultura e Comunicação (CELACC) e Bacharela em 'Rádio, TV e Internet' pela Faculdade Cásper Líbero. (^1) Trabalho de conclusão de curso apresentado como condição para obtenção do título de Especialista em Mídia, Informação e Cultura.

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo entender o que é o minimalismo, de que forma se manifesta e questiona a sociedade pós-moderna, além de compreender o discurso das pessoas por trás do movimento. Para isso, vamos analisar de que forma o estilo de vida é apresentado por meio dos documentários disponíveis na plataforma de streaming Netflix, " Minimalism: A Documentary About The Important Things " (2015) e " Minimalismo Já " (2021), ambas estreladas pela dupla conhecida como The Minimalists, formada por Joshua Fields Millburn e Ryan Nicodemus. Palavras-Chaves: Minimalismo; Produções Minimalistas; Influenciadores Minimalistas; The Minimalists. ABSTRACT This article has the objective of understanding minimalism, the ways in which it manifests itself and questions post-modern society, as well as understanding the message of the people behind the movement. In order to do this, we will analyze the way in which this lifestyle is presented in the documentaries available on streaming platform Netflix, " Minimalism: A Documentary About The Important Things " (2015) and " The Minimalists: Less is Now " (2021), both starred by the pair known as The Minimalists, formed by Joshua Fields Millburn and Ryan Nicodemus. Keywords: Minimalism; Minimalist Productions; Minimalists Influencers; The Minimalists. RESÚMEN Este trabajo tiene como objetivo comprender qué es el minimalismo, cómo se manifiesta y cuestiona la sociedad posmoderna, así como comprender el discurso de las personas detrás del movimiento. Para ello, analizaremos cómo se presenta el estilo de vida a través de los documentales disponibles en la plataforma de streaming Netflix, “ Minimalism: A Documentary About The Important Things ” (2015) y “ Minimalismo Já ” (2021), ambos protagonizados por el dúo conocido como The Minimalists , formado por Joshua Fields Millburn y Ryan Nicodemus. Palabras-clave: Minimalismo; Producciones minimalistas; Influenciadores minimalistas; The Minimalists.

indivíduo tem de transcender ao materialismo, pela busca centrada no autoconhecimento e talvez, pode-se dizer, autorrealização" (2021, p.3). Em outro momento, conclui-se que pessoas não-minimalistas buscam a autorrealização por meio de bens de consumo que causam cansaço e ansiedade, já que essa é uma busca inatingível (p.5). Partindo do pressuposto de que os produtos têm significados pessoais e sociais (DOMINGUES, MIRANDA. 2018, p.88), e "pessoas compram coisas não somente pelo que estas coisas podem fazer, mas também pelo que elas significam" (Levy, 1959, p. 118)^8 , é importante ressaltar aqui que o minimalismo não é uma "subcultura" pois "não pregam a revolução estrutural, mas a mudança individual" (Rojas; Mocarzel. 2015, p.135)^9. Então se trata apenas de um estilo de vida alternativo que busca eliminar os excessos e deixar apenas o que considera essencial, trazendo uma nova forma de enxergar o mundo por meio de reflexões e mudanças comportamentais. Outro ponto extremamente relevante de se trazer para esta discussão é que, ser ou aderir ao movimento, se trata de uma escolha pessoal, um privilégio daqueles que têm a opção de escolher entre possuir algo ou não. Em muitos casos, esses indivíduos vêm de lugares de abundância, em maior ou menor escala, antes de adotar o estilo de vida. Em outras palavras, não podemos considerar minimalista a pessoa que "[...] não ganha muito, vive no limite e já consome o mínimo possível por falta de recursos [...]"^10. Mas mesmo assim, a autora Bruna Mesa no livro Minimalismo Baixa Renda: Simplificando a Vida e Poupando Gastos afirma que é possível aplicar o estilo de vida de acordo com a realidade de cada indivíduo (ebook, 2020). A HISTÓRIA DOS MINIMALISTAS EM 132 MINUTOS Todo movimento tem seus representantes e é aí que entram The Minimalists , uma dupla formada pelos norte-americanos Joshua Fields Millburn e Ryan Nicodemus, que se tornaram porta-vozes do assunto por meio de blogs, podcasts, livros, filmes e eventos. No livro Tudo O Que Importa (2021), eles relembram como aderiram ao estilo de vida, assim (^10) MESA, Bruna. Minimalismo Baixa Renda: Simplificando a Vida e Poupando Gastos. Ebook, 2020. (^9) ROJAS, A. A.; MOCARZEL, M. M. V. Da cultura visual à cultura material: o minimalismo como forma de expressão na sociedade de consumo. Alceu, v.16, n. 31, p. 131-140, 2015. (^8) LEVY, S.J. Symbols for Sale, Harvard Business Review, n. 37 (July-August), pp. 117-124, 1959.

como nos documentários Minimalism: A Documentary About The Important Things (2015) e Minimalismo Já (2021)^11. Por meio dessas obras audiovisuais, os dois refletem sobre a sociedade atual, em alguns momentos com a ajuda de outros profissionais ou adeptos do estilo, e contam sobre a infância difícil e as longas jornadas de trabalho durante a vida adulta em troca de um grande salário, que os ajudavam a comprar tudo o que sempre sonharam e tantas outras coisas que nem precisavam. Vale comentar que as histórias, as opiniões e até mesmo os dados trazidos, ajudam a embasar a visão do espectador a favor do minimalismo. No caso da dupla já mencionada, a transição para o minimalismo aconteceu depois que Millburn passou por uma série de eventos que o fez olhar para as suas posses com uma nova visão. Ele percebeu que grande parte do que possuía não lhe era útil ou trazia felicidade, e as memórias estavam dentro de nós e não nas coisas. Ao perceber que o melhor amigo estava diferente, Nicodemus quis saber o por quê e, em pouco tempo, ele também acabou aderindo ao movimento. Com essas ideias em mente, e outras que iremos discutir mais adiante, o objetivo deste trabalho é analisar como o minimalismo é apresentado nos documentários Minimalism: A Documentary About The Important Things (2015) e Minimalismo Já (2021), ambos disponibilizados na plataforma de streaming Netflix, que conta mundialmente com mais de 214 milhões de assinantes^12. Partindo principalmente dos discursos de Millburn e Nicodemus que se auto intitulam The Minimalists, vamos tentar entender a forma como eles expressam o estilo de vida para o mundo e propagam seus ideais, por meio dos discursos proferidos nas produções. O documentário Minimalismo Já (2021) começa com o seguinte questionamento: "Por que acha que essa ideia de minimalismo ou simplificação está em alta no momento? É porque temos a chance de ter muita coisa". Essa afirmação corresponde ao ideal de hipermodernidade e marca a "nova era histórica de consumo" (2012, p. 56) observada pelos autores Gilles Lipovetsky e Jean Serroy na obra A cultura-mundo: Resposta a uma sociedade desorientada (Companhia das Letras, (^12) Netflix statistics: How many subscribers does Netflix have? Worldwide, US member count and growth: Disponível em: <https://www.insiderintelligence.com/insights/netflix-subscribers/#:~:text=As%20of%20Q3%202021%2C%20N etflix,same%20time%20period%20last%20year>. Acesso em 26 Jan. 2022. (^11) As citações, assim como as traduções, foram retiradas das legendas das produções "Minimalism: A Documentary About The Important Things" e "Minimalismo Já", disponibilizadas pela Netflix.

e Leo Longo, o Couple of Things^13 , que se autodenominam minimalistas, eles disseram que aderiram à uma vida com menos por ser uma forma de viabilizar o projeto que era importante para ambos. O "esforço" que fizeram lá no começo, hoje já não existe mais e, como apontado pela Diana Boccara "o minimalismo ia nos ajudar a ter menos, ia nos ajudar a realizar". Uma vez que se adaptaram a essa vida, não viram mais sentido em viver com mais. Então, tomando a experiência da dupla como exemplo, podemos concluir que o interesse em aderir ao movimento não vem necessariamente de uma vida caótica, do sentimento de vazio, da falta de propósito ou nem mesmo de estar à beira do colapso financeiro, como muitos relataram nas produções. Optar por uma vida com menos pode ser uma saída para aqueles que desejam outras coisas além de acumular patrimônios físicos. Como apontado por Leo Longo: Eu vejo que na maioria das vezes, a transição de uma vida "normal", vamos dizer consumista, materialista ou hiper materialista, para a vida com menos, ou uma vida minimalista, ela nasce às vezes de um trauma, de uma decepção, ela nasce de um estrangulamento, de uma asfixia por ter muita coisa ou nasce dessa decepção que é uma vida cheia de coisa, mas na verdade com muito pouco valor. Enfim, e pra gente, não nasce assim. [...] Minimalismo é, de fato, uma condição intencional de estilo de vida.^14 QUEM TEM TEÓRICOS, TEM TUDO O Minimalismo enquanto arte tem a sua origem datada em torno dos anos 1950 e 1960, mas como o autor David Batchelor deixa claro, esse adjetivo tem sido usado para denominar "um conjunto tão amplo de escultura e pintura (e outras formas de arte) que perdeu quaisquer limites a que alguma vez possa (ou não) ter se proposto" (2001, p.6). Também afirma que em geral trabalhos geométricos, de aparência austera, monocromática ou abstrata podem receber essa classificação (2001, p.6-7). O próprio escritor afirma que não existe um consenso sobre o que é ou o que foi este tipo de arte, assim como não há um entendimento sobre o que poderia "significar ou representar", e que as interpretações são geralmente divergentes (2001, p.7). Dado que a (^14) Diana Boccara e Leo Longo em entrevista à essa autora realizada pela plataforma de videochamada Google Meets, no dia 15/01/2022. (^13) Em 2015, eles se desfizeram de quase tudo que tinham para colocar um sonho em prática, o Around the World in 80 Music Videos , em que gravaram vídeo clipes com artistas ao redor do mundo. Depois disso e de volta ao Brasil, eles continuaram a viver com malas de 23kg, morando em Airbnb's e produzindo projetos com mais significado. A série documental "What If Collab", disponível na Amazon Prime Video, mostra a dupla viajando por 8 cidades espalhadas pelo globo, gravando com artistas locais e refletindo sobre a forma como nos relacionamos com os lugares e as pessoas.

definição fluiu por meio das gerações para indicar diferentes formas de expressão, acontece que no século 21 passou a ser um termo descritivo de um modo de vida que não necessariamente provém historicamente deste movimento artístico, mas pode dividir características estéticas e a ideia de limitar-se à essência da vida e das coisas. Um conceito muito atribuído ao minimalismo está ligado à frase "menos é mais", que de tão repetida já se tornou um clichê mundo afora, mas o que poucos sabem é que foi criada pelo arquiteto alemão Ludwig Mies van der Rohe, um dos mais importantes do século 20, principalmente pelo seu envolvimento com o modernismo, enquanto movimento arquitetônico^15. Para entender a relevância do minimalismo no cenário atual, basta observar o aumento do interesse pelo assunto nos últimos anos, com auxílio da ferramenta Google Trends. O filtro foi feito por meio do uso de palavras-chave como "minimalist" e "minimalism" por território: Estados Unidos, Brasil e Todo Mundo, desde 2004. Termo de Pesquisa: " minimalist " | Período de tempo: 2004 - Presente | Território: Todo mundo. Extraído da ferramenta Google Trends, em 01/02/2022. Termo de Pesquisa: " minimalist " | Período de tempo: 2004 - Presente | Território: Estados Unidos. Extraído da ferramenta Google Trends, em 01/02/2022. (^15) ARCHDAILY Team; BARATTO, Romullo. Menos é mais: Mies van der Rohe, pioneiro do movimento moderno. Archdaily, 2021. Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/959169/menos-e-mais-mies-van-der-rohe-pioneiro-do-movimento-moderno. Acesso em: 29 Mai 2022.

Note que o interesse pela palavra sempre esteve presente, com picos em determinadas épocas, mas não podemos afirmar que a busca tinha como objetivo o estilo de vida, já que o termo também é utilizado para designar outras expressões (como arte, moda, design, digital, etc…). Nos Estados Unidos, assim como nos demais países do mundo, houve uma maior procura que poderia estar relacionada com crises econômicas e a busca por estilos de vida que se adequassem ao momento. Vale perceber a existência de picos a partir 2015 que poderia ser explicado pela estreia do documentário Minimalism: A Documentary About The Important Things (2015). Para compreender melhor a análise sobre os conteúdos audiovisuais, iremos nos apoiar principalmente sobre a obra A Sociedade de Consumo , publicada em 1970 pelo sociólogo e filósofo francês Jean Baudrillard, considerado um dos principais pensadores da pós-modernidade que identificou o mal-estar da contemporaneidade^16. Já A Cultura-Mundo de 2008, dos também franceses Gilles Lipovetsky e Jean Serroy, ajudará na compreensão das distintas formas que o mundo hipermoderno vem moldando a cultura. Podemos entender a relação entre o minimalismo e as reflexões de Baudrillard quando este diz: A pressão psicológica e social da mobilidade, do estatuto, da concorrência a todos os níveis (rendimento, prestígio, cultura, etc.) torna-se cada vez mais pesada para todos. Necessita-se de mais tempo para se recriar e reciclar, para recuperar e compensar o desgaste psicológico e nervoso causado por múltiplos danos: trajectos domicílio/trabalho, superpopulação, agressão e "stress" contínuos. Em última análise, o preço mais elevado da sociedade de consumo é o sentimento de insegurança generalizada que ela engendra… (1995, p. 35) Essa passagem pode se relacionar com as vivências "pré-minimalistas" de Millburn e Nicodemus, quando eles se recordam da infância com poucos recursos, a iniciação no mercado de trabalho e o vício em ganhar cada vez mais dinheiro, para gastar com bens de consumo que trariam satisfação momentânea. Isso porque as "necessidades da ordem de produção" é o que constitui o foco de satisfação na sociedade de crescimento, em detrimento das "necessidades do homem" (1995, p.66-67). Podemos classificá-los de certa forma como os "rejeitados" do autor, aqueles que são incapazes de suportar o ritmo (1995, p. 35). Quando os minimalistas criticam o já citado american dream , de certa forma estão criticando diretamente o "american way of life" caracterizado por Baudrillard como uma padronagem sociológica "tal indivíduo faz parte de tal grupo porque consome tais bens e (^16) BIOGRAFIA - JEAN BAUDRILLARD. UOL, 09 mar. 2007. Disponível em: https://educacao.uol.com.br/biografias/jean-baudrillard.htm. Acesso em: 27 mar. 2022.

consome tais bens porque faz parte de tal grupo" (p.70). Isso significa que somos estimulados pela publicidade cada vez mais assertiva e sedutora a consumir signos pertencentes ao nosso mundo, ou daquele que almejamos fazer parte. Na sequência, reflete sobre a existência de "uma síndroma muito 'moderna' do anticonsumo que, no fundo, é metaconsumo" (p.91), a tendência da classe média consumir com ostentação (p.91) e como aqueles que já atingiram "determinado estatuto social", impõem limites para os que desejam tornar-se como eles (p.92). Isso vai de encontro com as reflexões anteriores a respeito do ciclo vicioso de compras ao qual somos impostos e estamos expostos. Vira o consumo pelo consumo, o desejo pelo novo e por estar na moda. Porém, ao mesmo tempo, a sociedade atual demonstra estar procurando alternativas para uma vida com mais significado, priorizando o que realmente é essencial, tal qual a ideia exposta pelos The Minimalists. Outro ponto interessante que o autor francês traz é a necessidade do indivíduo se diferenciar, como um ser personalizável, "[...] diferentes uns dos outros, mas em conformidade com modelos gerais e de acordo com um código aos quais se conformam, no próprio acto de se singularizarem". (1995, p.93) Dito isto, podemos pensar essa fala de duas formas, tanto do ponto de vista consumista, quando a pessoa adquire bens simbólicos que a faça se sobressair; quanto do anticonsumo, quando há a recusa ou até mesmo a indiferença perante o incentivo às compras. Tendo como exemplo as histórias dos The Minimalists, durante boa parte da vida adulta, eles tentaram ser diferentes por meio das posses compradas e do status social conquistado. Contudo, ao aderirem a um estilo de vida minimalista, passaram a chamar a atenção pela diferenciação que essa escolha proporciona em uma sociedade que incentiva o mais, o querer e o ter. Em complemento a isto, Baudrillard ainda diz: As diferenças assim codificadas, longe de dividir indivíduos, torna-se assim material de troca. Ponto este que é fundamental para a definição do consumo: 1) não mais como prática funcional dos objectos, possessão, etc; 2) não mais como simples função de prestígio individual ou de grupo; 3) mas como sistema de comunicação e de permuta, como código de signos continuamente emitidos, recebidos e inventados, como linguagem. (1995, p. 94) É interessante perceber que mais do que possuir e ser reconhecido, a personalização do indivíduo é uma forma de comunicar ao mundo, por meio dos itens, as nossas próprias crenças. Neste contexto, podemos refletir sobre os diferentes jeitos de se decorar uma casa, já

A tabela em seguida ajuda a exemplificar melhor a dimensão do público desses influenciadores a partir dos números de seguidores na rede social Instagram e na plataforma de vídeos Youtube. MARCA INFLUENCIADORES NACIONALIDADE INSTAGRAM (Seguidores) YOUTUBE (Inscritos) The Minimalists 568mil 348mil Joshua Fields Millburn Americano 95,1mil Ryan Nicodemus Americano 78,2mil Matt D'Avella Matt D'Avella Americano 379mil 3,28 milhões Colin Wright Colin Wright Americano 28,3mil 10,3mil Joshua Becker Joshua Becker Americano 90,5mil 226mil Tabela: Dados colhidos em 26/01/2022. A partir da análise dos dois documentários, podemos reparar que na primeira produção, Minimalism: A Documentary About The Important Things (2015), os relatos da dupla, assim como suas experiências, se intercalam com as declarações de especialistas em assuntos relacionados ou adeptos do estilo de vida. Já no segundo, eles se tornam ainda mais protagonistas, mas em ambos a questão em torno do movimento é tocada de forma objetiva com o uso da palavra "menos". Em um mundo em que a palavra "mais" sempre aparece em destaque e em publicidades, é interessante notar como o seu antônimo ganha um novo significado para outro grupo de pessoas. Figura 2: Pôster de "Minimalism: A Documentary About The Important Things (2015). Fonte: IMDb. Figura 3: Pôster de "Minimalismo Já" (2021). Fonte: IMDb.

Do ponto de vista do conteúdo, a produção de 2015 começa com o relato pessoal de Nicodemus sobre a forma como vivia antes, seguido de imagens que demonstram sua liberdade hoje. Na sequência, já podemos ver os depoimentos de especialistas, autores e adeptos de uma vida mais simples, que procuram explicar o comportamento humano e a busca por mais por meio da evolução, da psicologia e das vivências. Dão a entender que a insatisfação faz parte da natureza dos indivíduos e isso é estimulado para manter o vício em adquirir sempre novos itens de desejo, o que acaba sendo potencializado com a ajuda das redes sociais e da publicidade, que nos impactam a todo momento com o ideal de como nossas vidas poderiam ou deveriam ser. Em seguida, assistimos aos relatos pessoais de como a dupla entrou para o mundo do "menos é mais" e Millburn completa que todas as suas posses, atualmente, precisam ter um propósito ou adicionar algo em sua existência. Vemos o protagonista montar uma mala para passar 10 meses em uma tour pelos Estados Unidos e logo nos tornamos companheiros de viagem da dupla, que passa por cidades e realiza eventos para divulgar o livro deles. É curioso notar que ao longo do documentário o público vai aumentando de tamanho: começa com poucos curiosos em uma cidade, e chega a lotar uma famosa livraria de Los Angeles. Para entendermos melhor quem são essas pessoas que se colocam em cima do palco ou como protagonistas de um documentário, somos apresentados ao passado da dupla, em que eles dividem o envolvimento dos pais com drogas, a relação com dinheiro e bens à medida que iam crescendo. O american dream é introduzido de uma forma que explica o comportamento dos americanos ao longo dos anos, com especialistas trazendo suas visões sobre o barateamento de produtos especialmente vindos da China e a facilidade de fazer compras online a qualquer momento. Tudo isso aumenta o nosso consumo, o tamanho das nossas casas e até faz com que algumas pessoas aluguem depósitos para guardar os excedentes. Neste momento, o documentário aborda o espaço do ponto de vista arquitetônico e somos apresentados rapidamente ao conceito de Tiny Houses , um outro movimento que se destacou depois da crise econômica de 2008, em que consiste em residências pequenas, com marcenaria que ajuda a tornar o espaço prático, dinâmico e acolhedor^18. Vale pontuar que este tema também ganhou uma série na Netflix chamada Movimento Tiny House (2019). A partir disso, o documentário Minimalism: A Documentary About The Important Things (2015) explica que o desejo de muitos americanos por residências maiores, com (^18) COELHO, Yeska. CASACOR. O que é Tiny House? Conheça a história do movimento e lindos projetos. Disponível em: https://casacor.abril.com.br/sustentabilidade/tiny-house/. Acesso em 14 Fev. 2022.

nos posicionam no sistema de status, baseado no que a propaganda ou a mídia diz sobre eles. Na sequência, é introduzido o assunto sobre consumo no mundo da moda e os objetos do momento, como são sazonais, e mais uma vez a economista citada coloca em perspectiva que esses conceitos "incorporam a ideia de que você pode jogar as coisas fora não quando elas não servem mais, mas quando não têm mais aquele valor social". No final, as compras não nos torna mais inteiros, nem nos satisfaz, além de causar também a degradação da natureza em prol de sustentar o modelo econômico vigente. Vale destacar a fala de Millburn dizendo que todas as roupas que tem são as suas preferidas, uma reflexão interessante de se fazer quando pensamos em nossos próprios armários. No documentário, Colin Wright surge como um adepto do estilo de vida que divide a sua trajetória: ele administrava um estúdio e tinha o desejo de viajar pelo mundo, sem nunca ter saído do país, então sentia que tinha falhado. Decidiu começar um blog, largou o trabalho em Los Angeles e saiu à procura do que realmente desejava para si. "E agora carrego tudo que possuo nas minhas costas". Esse relato também corrobora com a questão levantada anteriormente sobre o fato de que as motivações para se tornar minimalista, não estão necessariamente ligadas a momentos de crise, mas também podem ser um meio de alcançar objetivos e realizar sonhos, que às vezes o apego material nos impede. Em uma de suas apresentações para o público, Millburn responde a um espectador falando "[...] não acho que há algo errado com o consumismo. O problema é o consumismo compulsório. Comprar coisas porque isso é o que você deveria fazer". Esse relato diz muito sobre a forma como esses minimalistas em questão se relacionam com o capitalismo, já que não propõem uma quebra de paradigma, mas apenas a mudança individual. Essa fala também vai de encontro com a ideia desenvolvida por Baudrillard quando fala: Tanto na lógica dos signos como na dos símbolos, os objectos deixam de estar ligados a uma função ou necessidade definida , precisamente porque correspondem a outra coisa, quer ela seja a lógica social quer a lógica do desejo, às quais servem de campo móvel e inconsciente de significado. (p.77, 1995) Courtney Carver, a criadora do Projeto 333, entra em cena contando sobre como seu armário era lotado de roupas e se propôs o desafio de usar apenas 33 itens durante três meses. O resultado fez com que ela percebesse o que realmente precisava ali e o que de fato usava, sem ninguém realmente notar a pouca variação de peças. Sobre isso, Baudrillard reflete que o nosso desejo em obter determinado objeto não está ligado ao "precisar", mas sim a uma

necessidade de diferenciação que nunca se satisfaz (p.78, 1995). Ao mesmo tempo, é interessante notar que ao quebrarmos o ciclo vicioso de tentarmos ser diferentes, assim como Carver fez, percebemos que a grande maioria das pessoas, aquela que buscamos aprovação, não se importa realmente com o que estamos vestindo. O fato é que o julgamento existe e a vontade de "estar na moda" também, mas a verdade é que, em geral, os indivíduos estão mais preocupados com as suas próprias vidas, do que com a peça que o colega do lado está usando. Na reta final do documentário, criticam fortemente a publicidade infantil e tentam mostrar como aplicar o minimalismo dentro de uma família, principalmente se há crianças envolvidas: é preciso explicar a elas o que isso significa. O já mencionado Joshua Becker conta da sua experiência e, pelos relatos, dá a entender que os filhos e a esposa lidam de formas diferentes com a filosofia de "viver com menos". Uma observação relevante sobre a narrativa do documentário é que a fala dos personagens em geral pode ser resumida em: "minha vida era bagunçada e caótica, havia um sentimento de vazio, tinha muitos objetos, mas depois que aderi ao minimalismo, me tornei quem sempre quis ser". Parece sempre ter a transição do "conturbado" e "vazio" para "controlado" e "inteiro", talvez porque são sensações universais do mundo pós-moderno, o que pode atrair ainda mais pessoas para o movimento. Antes de finalizar o longa, Nicodemus deixa escapar que nem mesmo ele, um dos Minimalistas, é certeiro o tempo todo com a forma que lida com o consumo e o mundo ao redor, mas que aderir ao movimento é se questionar constantemente: O minimalismo é sobre viver com propósito. Então cada escolha que faço, cada relacionamento, cada coisa, cada dólar que gasto, não sou perfeito, claro, mas constantemente me pergunto: 'Isso está me adicionando valor?'. Essa fala vai de encontro com o que Lipovetsky e Serroy disseram quando refletem sobre o papel dos desejos na atualidade "[...] cultura-mundo designa a espiral da diversificação das experiências consumistas e ao mesmo tempo um cotidiano marcado por um consumo cada vez mais cosmopolítico^19 " (LIPOVETSKY; SERROY. 2012, p.15). De certa forma, podemos concluir que não há uma receita aplicável a todos os indivíduos do mundo, principalmente no caso do minimalismo, por se tratar de uma escolha pessoal. (^19) Definição de Cosmopolítico: Que anda por todas as partes do mundo. Que cerca o mundo. DICIONÁRIO ONLINE DE PORTUGUÊS. Disponível em: https://www.dicio.com.br/cosmopolitico/. Acesso em 4 abr

neste caso, quanto mais sucesso, maior o apartamento e quando a nossa casa já não é o suficiente para abrigar tudo que possuímos, podemos sempre recorrer ao aluguel de depósitos. À medida que ganhamos mais espaço, enchemos com mais coisas. Então precisamos de mais espaço e recorremos a depósitos alugados ou a casas maiores. E nunca paramos para pensar: "O que é essencial? O que é necessário?", "O quanto essas coisas agregam valor à minha vida?". É interessante pensar em tudo o que esse comentário pode significar quando pensamos nas necessidades humanas de preencher espaços vazios, tanto do ponto de vista físico do mundo material, quanto do campo existencial. Estamos sempre em busca de nos sentirmos inteiros e a publicidade, como o próprio documentário expõe na sequência, abusa do nosso calcanhar de Aquiles quando produz anúncios que fazem com que as pessoas se sintam "inconscientemente [...] inadequados se não tivermos aquele determinado produto". Como já mencionado anteriormente, neste documentário voltamos às origens dos The Minimalists por meio de encenações e relatos pessoais. Millburn reflete que os problemas de sua mãe com a bebida e a culpa que ele sentia em relação a isso fez com que enxergasse no 'dinheiro' a solução para uma vida melhor. Já Nicodemus relembra dos momentos em que trabalhava com seu pai pintando as casas de pessoas mais abastadas, e ao perguntá-lo quanto dinheiro era necessário para possuir um lugar como aquele, a resposta foi 50 mil dólares. A partir daquele momento, esta passou a ser a meta do jovem. Annie Leonard, diretora executiva do Greenpeace nos Estados Unidos, apresenta neste segundo documentário dados sobre as longas jornadas de trabalho, férias insuficientes e a falta de comunidade que parece ter se tornado a regra na América. Já o diretor da Foundation for Economic Education , T.K. Coleman, expõe o ciclo infinito de consumo em que nos encontramos: Quando conseguimos tudo que queremos, nos damos conta que erramos no que achávamos que nos faria felizes, porque o cérebro normaliza essas coisas. Depois de alguns meses, você normaliza e diz: 'Foi ótimo na época, mas agora tenho outros desejos, outros sonhos'. O autor Dave Ramsey afirma que o já mencionado american dream fala sobre a sensação de liberdade, mas que isso não acontece por meio de um montante de dinheiro, mas sim, acumulando cada vez mais coisas. Como solução para isso, sugere que o indivíduo precisa [...] aprender a controlar suas supostas 'necessidades' para criar uma rede de segurança na sua vida e ter uma independência com dinheiro o suficiente para se dar ao luxo de poder recusar trabalho. Em vez de ficar cheio de dívidas, comprando

coisas que não precisa com dinheiro que você não tem para impressionar pessoas que não gosta. É interessante perceber como esses comentários beiram o clichê, mas mesmo assim, precisam ser repetidos quando notamos que grande parte das pessoas parece viver suas vidas no "piloto automático" em relação ao consumo, desejando, comprando, acumulando, em um loop infinito em busca de uma felicidade inalcançável. Um dos momentos mais envolventes de Minimalismo Já (2021) é quando Millburn está relatando sua experiência em lidar com as coisas da mãe depois do seu falecimento: uma casa cheia de pertences acumulados ao longo de uma vida toda. Em um primeiro momento, sua intenção era guardar tudo o que pudesse, mas ele se depara com algo que o faz refletir e mudar de ideia. Joshua encontra caixas com as lições de casa de quando era garoto e isso o faz pensar que manter tudo isso foi uma forma da mãe guardar memórias dele, mesmo que ela não abrisse aquelas caixas há anos. Conclui que "nossas lembranças não estão nas coisas". Em seguida, colocam em pauta as dívidas que as pessoas costumam fazer para manter as aparências e ser recompensado socialmente. Leonard mais uma vez reproduz uma fala interessante sobre como mudou a forma de nos compararmos: Quando as necessidades básicas são supridas, os humanos determinam o que é o suficiente a partir das pessoas ao nosso redor. Daí que veio a expressão: 'A grama do vizinho é sempre mais verde'^21. Julgamos os móveis, as roupas e o carro com base nas pessoas ao nosso redor. Antigamente, essas pessoas tinham condições financeiras parecidas [...]. Mas agora, com a televisão e as redes sociais, existe a expansão vertical do nosso grupo de referência. Agora comparo meu cabelo ao da Jennifer Aniston. Comparo minha casa à da Kim Kardashian. Millburn relata que conseguiu identificar o propósito do minimalismo com a pergunta "Como sua vida pode ser melhor com menos?" e assim, diminuindo suas posses, ele teria mais tempo para o que realmente importava: sua saúde, suas relações, sua criatividade, suas finanças e poderia contribuir de forma mais significativa além de si mesmo. Ainda diz que ele e sua família não têm muitas coisas, mas tudo que possuem "agrega valor às nossas vidas" e tem uma função, um propósito. (^21) Esta é a tradução retirada da legenda disponível na Netflix. Na fala original é dito "Keeping Up With The Joneses", que segundo Cambridge Dictionary (tradução nossa): "sempre querer possuir os mesmos objetos caros e as mesmas coisas que seus amigos e vizinhos, por estar preocupado em parecer menos socialmente importante que eles". Disponível em: https://dictionary.cambridge.org/pt/dicionario/ingles/keep-up-with-the-joneses Acesso em 19 Fev. 2022.