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MÉTODO MONTESSORI E INCLUSÃO ESCOLAR, Resumos de Materiais

da proposta pedagógica montessoriana estão em sintonia com a inclusão escolar? ... Atualmente nas escolas montessorianas, os momentos de linha, ou.

Tipologia: Resumos

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE EDUCAÇÃO/PPGEDU
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM EDUCAÇÃO ESPECIAL E
PROCESSOS INCLUSIVOS
Patrícia Silvestrin
MÉTODO MONTESSORI E INCLUSÃO
ESCOLAR: ARTICULAÇÕES POSSÍVEIS
Porto Alegre
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

FACULDADE DE EDUCAÇÃO/PPGEDU

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM EDUCAÇÃO ESPECIAL E

PROCESSOS INCLUSIVOS

Patrícia Silvestrin

MÉTODO MONTESSORI E INCLUSÃO

ESCOLAR: ARTICULAÇÕES POSSÍVEIS

Porto Alegre

Patrícia Silvestrin

MÉTODO MONTESSORI E INCLUSÃO ESCOLAR: ARTICULAÇÕES POSSÍVEIS

Monografia apresentada ao Curso de Especialização em Educação Especial e Processos Inclusivos do Programa de Pós- Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Orientadora: Profª. Mauren Lúcia Tezzari

Porto Alegre

“Se a ciência começasse a estudar os homens, conseguiria não só fornecer novas técnicas para a educação das crianças e dos jovens, mas chegaria a uma compreensão profunda de muitos fenômenos humanos e sociais que estão ainda envolvidos em espantosa obscuridade. A base da reforma educativa e social, necessária aos nossos dias, deve ser construída sobre o estudo científico do homem desconhecido." (MONTESSORI, 2006, p.9)

RESUMO

O presente trabalho de conclusão de especialização constitui-se como um estudo de caso que se propôs a investigar uma escola montessoriana, buscando identificar aspectos dessa proposta pedagógica que estão em sintonia com a inclusão escolar, para verificar se o referido método empregado hoje, favorece o trabalho pedagógico em uma perspectiva inclusiva. As seguintes questões orientaram esta pesquisa: Como acontece o processo de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais em uma escola montessoriana? Quais pontos da proposta pedagógica montessoriana estão em sintonia com a inclusão escolar? Como acontece a avaliação do sujeito nessa proposta metodológica? Para este estudo foi utilizada para coleta de dados entrevista estruturada com uma professora de uma escola montessoriana de Porto Alegre/RS. Além disso, foi utilizado um questionário respondido por esta mesma educadora e a observação em uma das turmas desta instituição onde estudava um aluno com transtorno global do desenvolvimento. A partir desse estudo é possível afirmar que o método construído por Maria Montessori apresenta aspectos que estão em sintonia com a proposta da educação inclusiva e que são utilizados ainda hoje nas escolas montessorianas, tais como: o respeito à individualidade dos alunos; o desenvolvimento da autonomia; o educador como mediador do conhecimento e não como figura central no processo de ensino-aprendizagem; o acompanhamento diário do processo de aprendizagem dos alunos através do registro de observações em sala de aula; o planejamento de aulas e atividades com base nesses registros tendo em vista as necessidades dos educandos. Com base nisso, foi possível constatar que estes aspectos presentes no método montessoriano desde sua proposição permanecem atuais e estão em sintonia com a perspectiva educacional inclusiva, uma vez que esta metodologia demanda currículo e avaliação flexíveis, consideração dos diferentes ritmos, das potencialidades e das necessidades de cada aluno.

Palavras-chave: Método Montessori. Trabalho pedagógico inclusivo. Respeito às necessidades dos educandos.

1 INTRODUÇÃO

Durante minhas experiências em estágios de prática docente em escolas de ensino fundamental da rede pública de ensino me deparei com crianças cujas características eram bastante diversas quanto à aprendizagem – com ritmos diferentes, formas de aprendizagem variadas e, algumas delas, por apresentarem mais dificuldades do que a maioria, acabavam tornando-se repetentes, ou até multirrepetentes, assim como muito inseguras em relação às suas possibilidades. Com o tempo eram rotuladas como “alunos-problema”. Alunos com essas características ou que viviam essas situações sempre me inquietaram e me mobilizaram na busca de qualificação profissional. Questionava- me como seria possível desenvolver um trabalho pedagógico que abrangesse toda essa diversidade da sala de aula em uma escola cuja organização curricular e escolar foi criada (e implementada desde o período moderno) visando uma homogeneização. Após concluir o Curso de Pedagogia, iniciei meu trabalho como professora em uma escola de educação infantil montessoriana. Até então na faculdade havia estudado, mas de forma pouco aprofundada, o trabalho construído pela educadora italiana Maria Montessori. Assim, desconhecia o cotidiano de uma escola montessoriana. Ao ser contratada como educadora, precisei estudar com mais profundidade sobre o método desenvolvido por Maria Montessori no início do século XX e um de seus pilares é o respeito à individualidade e aos interesses das crianças. Além disso, senti necessidade de aprofundar meus conhecimentos acerca da inclusão escolar e, por isso, busquei o curso de Especialização em Educação Especial e Processos Inclusivos oferecido pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). À medida que fui ampliando meus conhecimentos teórico-práticos, a metodologia montessoriana foi se configurando para mim como bastante favorecedora da inclusão escolar, uma vez que os alunos “trabalham” em pequenos grupos ou individualmente, com materiais pensados para eles, de acordo com suas necessidades e ritmos. Junto aos alunos, quando necessário, está o educador orientando e fazendo a mediação entre o educando e o material. Na escola montessoriana a organização do ambiente torna viável uma atenção mais

individualizada ao aluno que necessita desse atendimento. Existe uma maior autonomia entre as crianças, de forma que elas não necessitam todo o tempo do professor para atendê-las e, com isso, o educador tem a possibilidade de auxiliar cada criança individualmente ou em pequenos grupos, sem preocupar-se que esse atendimento individualizado vai gerar desorganização em sala. Dessa forma, meu trabalho teve como objetivo investigar sobre os processos inclusivos em uma escola montessoriana, atentando aos pontos da metodologia que estão em sintonia com a inclusão escolar, para verificar se o referido método hoje empregado nesta escola favorece o trabalho pedagógico em uma perspectiva inclusiva. Com base nisso, foram propostas as seguintes questões orientadoras: Como acontece o processo de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais em uma escola montessoriana? Quais pontos da proposta pedagógica montessoriana estão em sintonia com a inclusão escolar? Como acontece a avaliação do sujeito nessa proposta metodológica? Para investigar sobre os processos inclusivos na metodologia montessoriana, realizei entrevista e observação em uma escola que utiliza este método da rede particular do município de Porto Alegre/RS. Nessa escola fui acolhida por uma educadora que cedeu sua turma composta por treze alunos, na qual há um menino diagnosticado com transtorno global do desenvolvimento. Os estudos advindos dessa pesquisa foram sistematizados em quatro capítulos. No capítulo Caminhos Metodológicos descrevo como foi realizada a pesquisa. No capítulo Breve História da Educação Especial , apresento um pouco sobre a história da educação especial, além de abordar sobre a história de Maria Montessori e a construção de sua metodologia. No capítulo A metodologia de Montessori e a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais, escrevo sobre minhas análises relacionando a metodologia montessoriana, a pesquisa na escola de Porto Alegre e a educação inclusiva. E, por fim, no capítulo Algumas considerações sobre a proposta montessoriana e a educação inclusiva apresento minhas considerações finais sobre este estudo investigativo.

Sendo assim, meu trabalho foi realizado em uma escola montessoriana de Ensino Fundamental da rede particular de Porto Alegre/RS. Escolhi esta instituição, pois tive a oportunidade de conhecê-la ao participar de um curso de formação para professores montessorianos promovido por essa escola. Além disso, nesse curso pude observar e conhecer um pouco da organização escolar para o Ensino Fundamental, que era novidade para mim, já que a instituição em que eu trabalho é exclusivamente de Educação Infantil. Porém, neste dia, não consegui obter muitas informações a respeito das questões estruturais e curriculares do Ensino Fundamental, uma vez que o curso foi voltado mais à Educação Infantil. Mas esta escola havia despertado a minha curiosidade, pois eu ainda não tinha conhecimento de que a metodologia de Montessori poderia ser aplicada desde o ensino de crianças muito pequenas até o superior. Dessa forma, essa curiosidade me levou a refletir acerca do processo de inclusão escolar a partir dos pressupostos dessa metodologia, o que deu origem a este trabalho. Para isso, estudei uma forma de abordagem desse tema e considerei interessante entrar em contato com essa instituição montessoriana que eu havia visitado. Sendo assim, enviei um e-mail à supervisora pedagógica da escola explicando sobre meu trabalho de conclusão de curso e se seria possível realizar uma observação e entrevista nessa instituição, respeitando o sigilo ético sobre os dados de identificação dos envolvidos na pesquisa. A supervisora, que neste trabalho denominarei Carmem , mostrou-se bastante receptiva e disponível em participar de minha pesquisa, inclusive disponibilizou sua aula de Língua Portuguesa da Agrupada^1 VI , correspondente à 8º e 9º ano juntos, para que eu realizasse a observação, prontificando-se também a participar da entrevista. Esta turma foi escolhida, pois ela é composta por treze alunos, sendo que um deles possui diagnóstico de Síndrome de Asperger, que em meu trabalho denominarei Marcos. A educadora Carmem tem formação em Pedagogia e Gestão Escolar e trabalha na escola há doze anos. Atualmente é supervisora da referida escola no turno da manhã e também professora de Língua Portuguesa para as agrupadas (^1) A organização das turmas na metodologia montessoriana são por agrupamentos de idades. Nesta instituição as turmas se constituem em: Nido – Escola de Bebês: crianças de 4 meses a 2 anos agrupadas; Agrupada I: crianças de 2 a 3 anos; Agrupada II: crianças de 4 a 5 anos; Agrupada III: de 6 a 7 anos; Agrupada IV: de 8 a 9 anos; Agrupada V: 5º e 6º anos do Ensino Fundamental; Agrupada VI: 7º e 8º anos do Ensino Fundamental; Agrupada VII: 9º ano do Ensino Fundamental. Esses dados foram retirados da página virtual da Instituição. Como nesse ano a escola optou por não abrir vagas para o 7º ano do Ensino Fundamental, na Agrupada VI foram reunidos alunos do 8º e 9º anos do Ensino Fundamental.

correspondentes aos anos finais do Ensino Fundamental (Agrupadas V, VI e VII). Além disso, acompanha Marcos desde seu ingresso na escola, na Agrupada IV (composta por crianças de 8 a 9 anos). Elaborei para a entrevista um roteiro de caráter estruturado, pois segui rigorosamente as questões pré-formuladas para obter as informações desejadas. Além disso, utilizei-me também do diálogo estabelecido com a professora em sala de aula, durante minha observação. O roteiro utilizado para a entrevista foi o seguinte:

  1. Qual é a sua formação e a dos professores da escola em geral?
  2. Existe alguém na escola com formação específica em educação especial e inclusão escolar?
  3. É oferecido algum tipo de formação aos professores da escola?
  4. Para qual faixa etária leciona?
  5. Quantos alunos há em sua turma?
  6. Quantos têm necessidades educacionais especiais?
  7. Existe um limite de alunos por turma? Há uma redução de alunos na turma em que há alunos de inclusão?
  8. Quantos professores e/ou auxiliares trabalham contigo em sala de aula?
  9. Quais são as principais dificuldades encontradas no trabalho inclusivo na metodologia montessoriana?
  10. Na sua opinião, quais pontos da proposta pedagógica da escola estão em sintonia com a inclusão escolar.
  11. Que tipo de necessidade especial tem o aluno de inclusão? Ele possui um laudo médico?
  12. Ele frequenta algum tipo de tratamento ou terapia fora da escola?
  13. Existe uma comunicação entre os profissionais que atendem essa criança na escola e fora dela? Qual o objetivo dessa comunicação?
  14. Existe algum tipo de atendimento especializado para esse aluno na escola? Que tipo de atendimento é esse?
  15. Existem adaptações curriculares para os alunos com necessidades especiais?
  16. Existem conteúdos mínimos que os alunos precisam saber até o final do ano? Os alunos de inclusão conseguem atingir esses conteúdos?
  17. Existe repetência? Como é avaliada a progressão e a repetência dos alunos em geral e do aluno com necessidades especiais?
  18. Ao aceitar alunos com necessidades especiais, houve a necessidade de modificar a estrutura da escola para acolher estas crianças? As perguntas da entrevista foram formuladas buscando envolver aspectos significativos da pedagogia montessoriana e do trabalho realizado na escola em questão, com vistas a obter os dados necessários para dar conta do objetivo da presente pesquisa. As informações coletadas durante a observação e a entrevista foram registradas por mim para serem posteriormente analisadas no decorrer da escrita da monografia.

filhos de Deus, agora tinham pacto com o demônio e deveriam ser combatidos, assim como as bruxas e os hereges. Por volta do século XVII, quando estado e igreja começam a se separar, surgiram os hospícios, onde eram confinados todos aqueles considerados diferentes da norma, “adentravam seus muros usurários, mulheres de conduta extravagante, visionários, paralíticos, criminosos” (BUENO, 1997, p.165). Nessa época, acreditava- se que a deficiência física, mental ou a loucura eram irremediáveis, portanto criaram- se os hospícios para internar os considerados “anormais”. O isolamento era visto como uma “forma de proteção do meio social de manifestações individuais que interferiam na nova ordem social” (BUENO, 1997, p.165), já que a deficiência e a loucura eram consideradas irreversíveis nessa época, além de ainda não haver uma diferenciação entre ambas. Somente na segunda metade do século XVIII é que começam a ser criadas as primeiras instituições para deficientes, como em Paris. Essas iniciaram acolhendo crianças cegas e surdas e, assim como os hospícios, se utilizavam da internação de seus pacientes. Além disso, nesses institutos acreditava-se em uma “cura” para as deficiências, ou a

[...] minimização do “mal” de seus usuários, decorrente do fato de, mesmo antes do seu surgimento, as iniciativas de preceptores e a existência de cegos e surdos que exerciam algum tipo de atividade com sucesso comprovarem a possibilidade de algum tipo de aprendizagem. (BUENO, 1997, p.166) Sendo assim, essas crianças eram submetidas aos cuidados de médicos nessas instituições, onde poderiam ser estudadas e “testadas” suas habilidades. Por meio disso, adaptaram-se outras formas de comunicação para os surdos, como a linguagem de sinais, e as letras em relevo para os cegos. Buscava-se compensar a deficiência desenvolvendo-se outros conhecimentos e habilidades no deficiente para que ele pudesse vir a se tornar útil à sociedade, apesar de que a autonomia desses indivíduos era pouco estimulada e isso os tornava dependentes da instituição fazendo com que a grande maioria residisse o resto de sua vida nesses institutos (BUENO, 1997). Embora fosse permitido o regime aberto, esse geralmente era utilizado pelos usuários oriundos de famílias abastadas

Com efeito, esses institutos se transformaram em asilos, preenchendo basicamente a função de organizadores de mão-de-obra barata, que retiravam os desocupados da rua e os encaminhavam para o trabalho

obrigatório, manual e tedioso, parcamente remunerado, quando não em troca de um prato de comida e um catre no “maravilhoso espaço do asilo- oficina”. (BUENO, 1997, p. 167)

Isaías Pessotti (1984), também afirma que nesse período, hospitais, como o de Bicêtre e o Salpêtrière em Paris, Bethlehem na Inglaterra, dentre outros na Europa, se abriram para acolher os deficientes e os indivíduos de condutas desviantes. Sendo assim, acabaram por se tornar instituições residenciais para essas pessoas como opção intermediária entre não punir nem abandonar e não sobrecarregar “o governo e a família com sua incômoda presença” (p. 24). Nesse período em que a ciência começa a ganhar destaque nas explicações dos fenômenos da natureza e separa-se da superstição religiosa, a medicina passou a buscar uma cura para a anormalidade. Com isso, no confinamento de hospitais e hospícios, os deficientes e loucos eram estudados por médicos, que na busca de uma cura ou “minimização do mal”, desenvolviam técnicas variadas para “corrigir” esses indivíduos. Jean Marc Gaspard Itard (1774-1838) foi um médico francês considerado precursor da educação especial devido ao seu trabalho com Victor de Aveyron, menino que foi encontrado vagando pelas florestas de La Caune no Sul da França em 1797. Durante esse período Victor foi capturado algumas vezes, pois sempre escapava do cativeiro, até que em 1800 foi encontrado e internado no asilo de Saint Affrique. Considerado de responsabilidade pública, o menino selvagem foi enviado à Paris aos cuidados de Itard que o submeteu a um exame minucioso de Philippe Pinel, psiquiatra francês bastante conceituado na época. “O diagnóstico de Pinel é desolador: Victor não é um indivíduo desprovido de recursos intelectuais por efeito de sua existência peculiar, mas um idiota essencial como os demais idiotas que conhece no asilo de Bicêtre” (PESSOTTI, 1984, p. 36). Itard, não concordando com o laudo de Pinel, acreditava que a deficiência do selvagem se devia não a uma questão orgânica, mas sim à falta do contato social que o tornasse civilizado. Dessa forma, custeado anualmente pelo governo, o menino selvagem passa a residir no Instituto Nacional de Surdos-Mudos, em Paris, a cargo de Itard e de Madame Guérin, governanta contratada pela Administração para auxiliar Itard nessa tarefa (BANKS-LEITE; GALVÃO, 2000). O objetivo desse médico francês era educar e civilizar Victor e para isso desenvolveu diversas e inventivas (para a época) estratégias e técnicas.

com traços de idiotia, “a recordar, a comparar, a falar, a escrever, a contar, etc.” (TEZZARI, 2009, p. 86). Após a morte de Esquirol, Séguin deixou o Instituto e fundou em Paris uma escola para crianças consideradas deficientes mentais. “O trabalho com os alunos em sua escola durava mais de seis horas por dia e, para potencializá-lo, Séguin projetou e fabricou uma grande variedade de jogos” (TEZZARI, 2009, p. 88). Este educador valorizava bastante o lúdico no ensino de seus alunos, e acreditava que os exercícios deveriam seguir uma sequência de dificuldade iniciando primeiramente pelo mais fácil até atingir o nível mais difícil. Além disso, seu método partia daquilo que o aluno já conhecia para depois desenvolver seus conhecimentos.

Sua proposta era de uma educação que considerava a pessoa integralmente: os aspectos físicos, as suas funções, os aspectos psicológicos (segundo os conhecimentos existentes nessa área na época), os interesses, os sentimentos, a atividade física e a experiência. Destacava a importância do contexto, bem como das experiências e das vivências que o sujeito ali teria e de todas as ações do cotidiano (como vestir-se, tomar banho, alimentar-se). (TEZZARI, 2009, p. 98-99) Séguin foi um grande inovador na educação dos deficientes mentais, sua proposta também previa o desenvolvimento da autonomia do indivíduo em uma época em que se acreditava na deficiência como sinônimo de dependência. A inovação metodológica desse pesquisador serviu de inspiração para outros estudiosos, dentre os quais está a médica-educadora Maria Montessori que, entusiasmada pelas obras e feitos de Séguin, baseou sua pedagogia principalmente nesse autor. Como será visto no próximo item, muitos dos aspectos metodológicos de Montessori têm como base o método pedagógico de Séguin. É possível perceber através dessa contextualização histórica, que foi basicamente a partir da iniciativa de médicos, “que do estudo das crianças anormais e da pesquisa das vias mais adequadas para a sua recuperação, soube deduzir critérios válidos também para a educação dos normais” (MANACORDA, 2002, p. 307). A partir da dedicação e do interesse desses estudiosos é que ocorreu uma evolução nos métodos pedagógicos e muitos deles são utilizados até hoje. Isso acontece, pois os deficientes físicos e os mentais, após a superstição e a perseguição da igreja católica e protestante, foram considerados um “problema”

médico e por isso deveriam ser enviados a instituições e hospitais para que fossem estudados por médicos em busca de uma “cura”.

3.1 Maria Montessori e um pouco de sua história

Maria Montessori nasceu em 31 de agosto de 1879 na Itália, em uma cidade chamada Chiaravelli. Era filha de Alessandro Montessori, um homem de princípios conservadores e “hábitos militares”, e Renilde Stoppani, uma mulher que cultivava o hábito de leitura, o que era inusitado para a época, já que a educação de mulheres, sobretudo em cidades como Chiaravelli, era pouco estimulada (NICOLAU, 2005). Desde cedo Maria demonstrava ser uma criança curiosa e interessada em aprender e para isso contava com o apoio e incentivo de sua mãe em seus estudos, por consequência apresentava um excelente desempenho escolar (NICOLAU, 2005). Por gostar e demonstrar bons resultados em Matemática, aos doze anos ela decidiu que seria engenheira. Dessa forma, à contra gosto de seu pai que desejava que ela fosse professora (formação típica para as moças da época), Montessori passou a estudar na Regia Scuela Tecnica Michelangelo Buonarroti , em Roma, onde a grande maioria de alunos era composta por meninos. Apesar de ser constantemente incomodada por seus colegas por ser uma das únicas meninas da escola, Maria não desanimou frente às adversidades e obtinha boas notas nos exames. Isso se deve também ao estímulo de sua mãe que, em casa, auxiliava-a nos estudos repassando e discutindo a matéria com a filha (TEZZARI, 2009). Embora Montessori nutrisse uma paixão pela Matemática, não seguiu formação acadêmica nessa área, “mas não em razão do desejo de seu pai. Mais tarde, o que ela mesma denominou de “força ordenadora que é superior ao indivíduo” fez com que em 1890, após ter haver realizado novo exame com ótimas notas, decidisse repentinamente, estudar medicina” (TEZZARI, 2009, p. 112). Essa decisão foi desaprovada por seu pai, que ainda desejava que sua filha seguisse formação na área da educação. Além disso, era praticamente impossível uma mulher ser aceita na escola de medicina. “Em 1892, passou nos exames que a tornaram elegível a estudar medicina. Aos poucos, foi sendo aceita pelos colegas. Ela e o pai quase não se falavam” (NICOLAU, 2005, p. 6), devido a sua escolha acadêmica, mas por outro lado, sempre teve o apoio de sua mãe. Algumas versões

2009, p. 120). Médicos colegas de Montessori foram encarregados de organizar essa Liga. Nesse tempo a “dottoressa” foi convidada pelo ministro da Instrução Pública, Guido Baccelli, a articular conferências sobre metodologias na educação de crianças com deficiência, essas aulas seriam ministradas a professores em formação. Com o objetivo de aprofundar seus conhecimentos na área da Pedagogia, Montessori “matricula-se no curso de filosofia e de psicologia experimental na Universidade de Roma. Envolve-se também com um curso livre de antropologia nessa mesma universidade e busca métodos em uso nas escolas primárias para crianças normais” (NICOLAU, 2005, p. 9). Essa médica se utilizou bastante da psicologia para compreender a criança e suas necessidades, por meio dessa percepção e sensibilidade ao indivíduo, ela pesquisou, principalmente em Séguin, materiais e técnicas para auxiliar no desenvolvimento cognitivo, motor e psíquico das crianças deficientes das instituições onde trabalhou. Montessori foi convidada pelo diretor geral do Instituto Romano dos Beni Stabili, o engenheiro Eduardo Tálamo, a ocupar-se da educação de crianças pequenas e carentes em um conjunto habitacional. A aceitação desse encargo deu origem à Casa Dei Bambini, fundada em 6 de janeiro de 1906. Esse projeto teve como objetivo principal reduzir as despesas dessa companhia imobiliária com manutenção, através do intuito de “reunir os filhos pequenos de operários que residiam num conjunto de habitações populares, a fim de que não ficassem abandonados pelas escadas, não sujassem as paredes e não criassem desordem” (MONTESSORI, 1988, p.133-134). Dessa forma, a Casa dei Bambini , ou Casa da Criança, foi projetada dentro do próprio condomínio em uma de suas salas vagas. Pelo o que Maria Montessori relata em um dos capítulos de seu livro A criança (1976), aquela instituição privada não poderia ser vista como uma obra social, uma vez que o objetivo era abater as despesas com manutenção por meio de ocupar o tempo ocioso dos filhos dos inquilinos. Portanto os gastos destinados à “escola” eram unicamente os “habituais de um escritório, ou seja, móveis e utensílios suplementares. Por isso, começou-se por fabricar os móveis em vez de adquirir bancos escolares” (MONTESSORI, 1988, p. 136). Neste sentido, a configuração da sala era diferente para os padrões da época, e acredito que também para os padrões de hoje. Era uma casa voltada para a criança, com mesas, cadeiras, poltronas entre outros móveis da altura delas e também com materiais (atividades e

jogos) voltados para elas. Montessori (1988) conta que em um primeiro momento os materiais eram guardados em um armário grande e robusto trancado por chaves que ficavam no bolso da professora, e esta era encarregada da distribuição dos mesmos às crianças. Mais tarde, houve um dia em que a professora se atrasara e os educando impacientes pela espera descobriram que ela havia se esquecido de trancar o armário, e com isso decidiram eles mesmos distribuírem os materiais entre si. Depois desse dia Montessori decidiu que seria mais interessante que os materiais ficassem à disposição das crianças em estantes ao alcance delas. Na Casa dei Bambini, Montessori buscou aplicar o método que ela utilizava com os deficientes, em crianças com idades entre 3 a 6 anos, para constatar a eficácia dessa pedagogia também para os “normais”.

Não obstante, empenhei-me em tentar uma educação científica dos sentidos, a fim de testar as eventuais diferenças de reações entre as crianças normais e as deficientes, e, sobretudo, para procurar uma correspondência, que se me afigurava interessante, entre as reações de crianças normais mais jovens e de crianças deficientes de idade maior. (MONTESSORI, 1988, p.137) Dentro de pouco tempo ela se surpreendeu com os bons resultados apresentados pelas crianças, relatados pela professora encarregada de apresentar os materiais aos alunos: “a criança, depois de haver trabalhado, ficava mentalmente mais forte e saudável que antes. Foi preciso tempo para que eu me convencesse de que não era uma ilusão” (MONTESSORI, 1988, p. 135). Essa constatação de Montessori é possível perceber em um relato que ela faz de uma situação de sala de aula, em que observa uma menina de aproximadamente três anos de idade. Segundo o que consta a menina estaria repetindo diversas vezes o mesmo exercício (retirando e colocando uma série de cilindros de diâmetros diferentes em seus respectivos encaixes) com tamanha concentração e empenho que mesmo sendo trocada de lugar ela não se dispersava e continuava compenetrada no seu exercício.

3.2 O método desenvolvido por Montessori

Segundo Márcio Ferrari (2008), Montessori dizia que “seu método não contrariava a natureza humana e, por isso, era mais eficiente do que os tradicionais” (p. 32). Para isso, ela acreditava também que o professor necessitava de uma formação específica para este método, pois ao contrário de outras metodologias, na