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como estratégia educativa/integrativa na formação médica”, que há ... Will Smith interpreta o Dr. Bennet Omalu, um patologista nigeriano.
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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Não perca as partes importantes!
Dossiê - parte ii
Cine e Medicina: o uso do cinema como
estratégia educativa/integrativa na
formação médica
ISSN - 2525-
Dr. Cláudio Sérgio Medeiros Paiva Dr. Eduardo Sérgio Soares Sousa
Dra. Alessandra Sousa Braz Caldas de Andrade Dr. André Telis de Vilela Araújo Dra. Ângela de Siqueira Figueiredo Dra. Cidalia de Lourdes de Moura Santos Dra. Cristianne da Silva Alexandre Dr. Constantino Giovanni Braga Cartaxo Dra. Eutília Medeiros Freire Dra Isabel Barroso Augusto Formiga Dra Joria Viana Guerreiro Dr. José Eymard de Moraes de Medeiros Filho Dr. José Gomes Batista Dra Juliana Sampaio Dra. Leina Yukari Etto Dr. Maurus Marques de Almeida Holanda Dr. Marcelo Gonçalves Sousa Dra Mônica Souza de Miranda Henriques Dra. Rilva Lopes de Sousa-Muñoz Dra. Rosália Gouveia Filizola Dr. Severino Ayres de Araújo Neto
Dra. Valderez Araújo de Lima Ramos Dr. Zailton Bezerra de Lima Junior
Dra. Ana Maria Revorêdo da Silva Ventura Instituto Evandro Chagas - Pará Dra. Carla Helena Augustin Schwanke Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Brasil Dr. Celmo Celeno Porto Universidade Federal de Goiás Dr. Clécio de Oliveira Godeiro Júnior Universidade Federal do Rio Grande do Norte Dr. Edmundo Chada Baracat Universidade de São Paulo Dra. Eloisa Silva Dutra de Oliveira Bonfa Universidade de São Paulo Dr. Emerson Leandro Gasparetto Universidade Federal do Rio de Janeiro Dra. Emília Inoue Sato Universidade Federal de São Paulo Dr. Emilio Carlos Elias Baracat Universidade Estadual de Campinas Dr. Eymard Mourão Vasconcelos Universidade Federal da Paraíba Dr. João Modesto Filho Universidade Federal da Paraíba Dr. José Maria Soares Júnior Universidade Federal de São Paulo Dra. Lúcia da Conceição Andrade Universidade de São Paulo Dra. Maria José Pereira Vilar Universidade Federal do Rio Grande do Norte Dra. Melania Maria Ramos de Amorim Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira - Pernambuco
MP &
M e d i c i n a
& P e s q u i s a Nº 1 - janeiro/junho 2014
Alexandro Carlos de Borges Souza Matheus Bernardo Barros de Oliveira
E ditorial 7
artigos
Foucault : as relações de poder na sua microfísica no filme “Concussion” 9
abordagem à relação Médico-paciente a Partir de uma Obra Cinematográfica: Wit, Uma Lição de Vida 17
a transexualidade na década de 20: uma abordagem sobre o filme “A Garota Dinamarquesa” 37
Uma revisão integrativa de Manifestações e impactos da Depressão na infância 47
Clube de Compras Dallas: análise do estigma social - HiV/aids 57
rEsumos
Cine e Medicina: protagonismo dos extensionistas na escolha dos filmes 73
Cine e Medicina: Ressignificação de valores 75
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A revista Medicina e Pesquisa prossegue nesta edição sua par- ceria com o projeto de extensão “Cine e Medicina: O uso do cinema como estratégia educativa/integrativa na formação médica”, que há dois anos promove a exibição de filmes seguida de rodas de conver- sas no Centro de Ciências Médicas. Levando em conta as Diretrizes Curriculares Nacionais para a área médica, que incentivam a adoção de novas metodologias para o ensino, o Cine e Medicina busca o apoio da arte cinematográfica, uma expressão de alto impacto, que combina diversas formas de arte (música, encenação, literatura, fotografia, entre outras) numa única obra, para fomentar discussões pertinentes ao desenvolvimento do senso crítico e profissional dos alunos participantes. Outro dos objetivos do projeto é incentivar a troca de expe- riências e sensibilidades com o público participante das sessões, abertas a toda a comunidade acadêmica da Universidade Federal da Paraíba. Esta edição, a exemplo da anterior, traz cinco artigos e dois resumos de painéis do Encontro de Extensão – ENEX, como forma de incentivar a iniciação científica dos extensionistas. Abre esta edição o artigo “Foucault : as relações de poder na sua microfísica no filme Concussion”, dos alunos Pabllo Zarpellon, Camilla Amorim e Maria Elisa Azevedo, que explora o conceito de microfísica do poder, tal como proposto pelo filósofo Michel Fou- cault, para analisar o filme Um Homem entre Gigantes (EUA, 2015, no original, Concussion). A obra narra a luta de um neuropatologista contra a poderosa NFL, liga norte-americana de futebol americano, para provar os danos neurológicos causados pela prática esportiva. Por sua vez, o artigo “Abordagem à Relação Médico-Paciente a Partir de uma Obra Cinematográfica: Wit, uma lição de vida”, dos es- tudantes Carlos Jardel Costa Sousa e Gabriel Dias Américo, sob orien- tação dos docentes Eduardo Sérgio Soares de Sousa, Lourenço de Mi- randa Freire Neto e Virgínia Ângela Menezes Lucena e Carvalho, realiza uma revisão integrativa da literatura sobre as relações entre médicos e pacientes. A discussão é fomentada pelo filme, que retrata os últi- mos meses de vida de uma professora universitária, portadora de uma doença terminal, que se submete a um tratamento experimental. O terceiro artigo desta edição, “A Transexualidade na Década de 20: uma abordagem sobre o filme A Garota Dinamarquesa”, in-
editorial E d i t o r i a l
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(^) vestiga o sofrimento psíquico vivenciado pela protagonista da obra, Lili, e sua relação com sua parceira Gerda Wegerner, na sua luta para conseguir a mudança de sexo e da sua recolocação social no contex- to da época. O texto foi produzido pelos discentes Renan Martins da Silva Cardoso, Amanda Cacaes Modesto Accioly e Arthur Gomes Ca- valcante,sob orientação dos docentes Eduardo Sergio Soares Sousa e Virginia Ângela Menezes de Lucena e Carvalho. Em “Uma Revisão Integrativa de Manifestações e Impactos da Depressão na Infância”, os autores Camila Tosta Metzker (aluna), Ri- vando Rodrigues de Sousa Oliveira (professor do Departamento de Medicina Interna do CCM) e Maria Clotilde Lima Bezerra de Mene- zes (psiquiatra do Hospital Universitário Lauro Wanderley) analisa como se dá o estabelecimento de sintomas depressivos e quais os impactos causados durante a infância. A reflexão foi provocada pelo filme Como Estrelas Na Terra – Toda Criança É Especial (Índia, 2007). O último artigo desta edição, “Clube de Compras Dallas: Aná- lise do Estigma Social - HIV/Aids”, realiza uma revisão integrativa do tema estigma social em portadores de HIV/AIDS, associando com uma análise reflexiva e crítica do filme Clube de Compras Dallas (EUA, 2013). Os autores foram os alunos Guilherme da Cunha Araujo, Mirely Gomes Gadelha de Oliveira e Hiago Dantas Medeiros. Esta edição encerra-se com os resumos “Cine e Medicina: Protagonismo dos extensionistas na escolha dos filmes”, dos discen- tes Camila Amorim Polonio, Melissa Toscano Montenegro de Morais e Rômulo Kunrath Pinto Silva, sob orientação do prof. dr. Eduardo Sérgio Soares Sousa, e "Cine e Medicina: ressignificação de valores", dos extensionistas André Machado Miranda, Jairo Soares de Oliveira Santos e Leonardo Araújo Moura, apresentados no ENEX-UFPB. O projeto Cine e Medina não seria possível sem os apoios dos professores Lourenço de Miranda Freire Neto e Virgínia Ângelo Me- nezes de Carvalho e Lucena, bem como do servidor do CCM Alexan- dro Carlos de Borges Souza. Os editores, por sua vez, agradecem à Reitora da UPFB, Professora Doutora Margareth de Fátima Formiga Melo Diniz, pelos esforços envidados no fomento à Pesquisa, Ensino e Extensão desta instituição, bem como ao Professor Doutor Seve- rino Aires de Araújo Neto (Assessor de Pesquisa e Pós-Graduação) e à equipe técnica.
Professor doutor Cláudio Sérgio Medeiros Paiva Professor doutor Eduardo Sérgio Soares Sousa editores
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introdução
De início, é importante ressaltar que este artigo irá articular as relações de poder, em sua microescala, com o filme Um Homem entre Gigantes (título original: Concussion ), exibido para os estudantes de medicina da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) com o intuito de ajudá-los no processo de formação acadêmica. Sabemos que Foucault acreditava na possibilidade de lutar con- tra os padrões impostos pela sociedade, sejam eles de comportamen- to ou de pensamento. Entretanto, o autor considera impossível nos livramos das relações de poder.^1 Para compreender o poder em sua microescala, a etimologia da palavra é importante. Poder vem do latim vulgar potere , que subs- tituiu o latim clássico posse. Este é a contração de potis esse, “ser ca- paz”, “autoridade”, ou seja, a palavra exprime força, persuasão, contro-
abstract
introduction : Foucault, in his book Microphysics of Power, works on the idea of power relations in his microscale. However, it does not seek to construct a theory of power, but tries to elucidate the mechanisms by which these relations develop. objective : From this it, is possible to make a parallel between power in its microscale and the suggested film: Concussion , in which we can perceive a series of examples that express what Foucault says. Method : For this, the work was used as main reference, but also articles of support were used in the research on the work of Foucault. result : The book was chosen because it is a reference in Power, cited in many articles and essays on the subject. In addition, the definition of power in the dic- tionary of philosophy and in the dictionary of policy are extremely important in the understanding of the term. Conclusion : The con- cepts of power relations, both in micro and macro scales, are pre- sent in the film Concussion. Their developments have resulted in a change in the rules of the National Football League (NFL) that deal with the context of the film.
Keywords: Power relations, Foucault, Power, Microphysics of power, Science and power.
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le, regulação, e assim por diante. A etimologia nos leva às definições presentes no dicionário de política e no dicionário de filosofia. Neste último, entende-se que poder é a capacidade de se conseguir algo, seja pelo direito, por controle ou por influência, podendo ser exercido conscientemente ou não. Já no dicionário de política, encontramos a definição na sua forma mais elástica, diferenciando-o em várias for- mas: poder social, político, constituinte, moderador, potencial, entre outros, sendo sempre associado à figura da autoridade que o exerce, seja o poder social que o pai tem em relação aos filhos ou a capacidade do Governo de dar ordens. O poder, nesse caso, evoca a capacidade de governar e de se fazer obedecer. É importante dizer que Foucault não estudou o tema para construir uma teoria do poder^1 , mas, sim, para identificar os sujeitos atuando sobre outros sujeitos, e o funcionamento desse processo de sujeição e de dominação dos indivíduos. Com isso, Foucault estuda o poder nas extremidades e não em sua forma central, como o faz a maioria. Ou seja, ele procura entender como a punição e o poder de punir se constroem em instituições locais e regionais e nos discursos, podendo ser caracterizado como micropoder ou subpoder. Para Foucault, há várias formas de governar, sendo que mui- tas pessoas podem governar – o chefe em relação ao empregado, o professor em relação ao aluno, o diretor de um colégio em relação aos professores1. Qualquer um poderá exercer o poder, isso vai de- pender do contexto e da habilidade de cada um em produzir conhe- cimento e utilizá-lo em próprio benefício. A concepção foucaultia- na amplia a visão funcionalista do poder, dizendo que todo o poder presente nas organizações é ilegítimo e informal, e é indissociável das práticas sociais. Detalhando um pouco mais a visão de Foucault, percebemos que a governabilidade exercida pelo Governo no Estado é uma forma específica e complexa de poder, que tem como alvo a população e como ferramentas técnicas e essenciais os dispositivos de segurança e um conjunto de saberes 1. Porém, a microfísica do po- der se estabelece entre os indivíduos, de forma individual, gerando objetos de conhecimento buscados pelos indivíduos na tentativa de conhecer os outros e si mesmos, não importando a Foucault se esses objetos de conhecimento são falsos ou verdadeiros, se são objetivos ou subjetivos. Foucault tenta elucidar como as práticas disciplinares utilizadas na escola, no exército, na família, na empresa se consti- tuem em estratégias de poder que disciplinam o corpo 1 , provocando gestos, atitudes, condutas e posturas.
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Partindo de um entendimento prévio sobre a concepção de po- der foucaultiana, na qual o poder também se apresenta nas relações interpessoais e se expressa de acordo com a capacidade de o sujeito compreender o outro e a si mesmo, podemos perceber que o filme Concussion é impregnado de exemplos que mostram muito bem as relações de poder no cotidiano. Há muitos personagens que exem- plificam o que Foucault diz em Microfísica do Poder^1 , ou seja, estes conseguem entender a si próprios e ao outro dentro de um contexto e com isso conseguem persuadir, agir sobre o outro. De forma mais simplificada, temos um cientista cuja descober- ta tende a mudar a visão que as pessoas têm sobre um esporte, que deixa de ser uma simples paixão para os fãs e esportistas – entre eles os profissionais – e passa a ser uma escolha individual na qual está em jogo a saúde, a qualidade de vida do praticante e, mais importante, a vida. Nesse cenário, temos as pessoas que se preocupam com o abalo econômico que essa descoberta pode causar, como é exemplificado no questionamento de um dos personagens: “Pense nas mães impe- dindo os filhos de praticarem o esporte e nas universidades e escolas deixando de incentivar a prática do futebol americano”. Por outro lado, há também a intolerância de alguns fãs, que se sentem ofendidos por achar que tal descoberta suscita a extinção do esporte ou por ser uma descoberta de um cientista estrangeiro. Percebemos, portanto, que há uma série de interesses, e algumas dessas pessoas irão usar toda a sua habilidade em obter conhecimento sobre o outro e de si para alcançar um objetivo, seja usando a lei, a força ou a influência política, sendo estes alguns dos dispositivos ativados nas relações de poder.
4 Como as relações de poder se apresentam dentro do enredo do filme?
Logo no início do filme, o comissário da NFL, Chris Jones, liga para um dos médicos da Liga, após ler a revista que acabara de publicar os resultados da pesquisa do Dr. Omalu. Jones pergunta se há com o que se preocupar, e o médico responde que Omalu aparentemente não era ninguém. Nesse exemplo, nota-se que a preocupação inicial do co- missário era o quão forte era o poder por trás da informação: se era um médico já conhecido, se a revista em questão poderia ser um problema, se seria muito complicado refutar as afirmações contidas no estudo. A princípio, para a NFL, era muito cômodo refutar o conteúdo do artigo, visto esta instituição também ser composta por um conjun- to de médicos com um certo conhecimento sobre o assunto. Foucault diz que, nas relações de poder, um dos objetivos do indivíduo que quer dominar – no caso, a NFL – é conhecer sobre quem se quer exercer a
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(^) dominação, e a NFL o faz no momento em que ela tem acesso ao perfil do Dr. Omalu: um médico pouco conhecido e que trabalhava prati- camente sozinho, estrangeiro. Nesse caso, uma forma eficaz de des- construir o que Omalu afirmava em seu trabalho científico era usar cientistas médicos para estabelecer o contraditório. Outra forma de exemplificar o poder na sua microescala, tra- balhada por Foucault, está relacionada ao fato de o filme apresentar a informação de que a NFL usava cientistas e pesquisas para ratificar a ideia de que não havia risco de o futebol provocar lesões cerebrais nos seus jogadores. Foucault diz que uma das formas de exercer o poder é utilizar o conhecimento – não interessando se verdadeiro ou não – em benefício próprio. Esse é um dos obstáculos mais difíceis que o Dr. Bennet Omalu encontra primeiramente, uma vez que a força de per- suasão dos médicos da NFL, seus pronunciamentos por meio da mídia televisiva norte-americana, faz com que o trabalho de Omalu perca força; era um homem entre os gigantes da Liga Nacional de Futebol. Por outro lado, a principal ferramenta de Omalu foi a razão e a persistência, fundamentais para o médico nigeriano ganhar poder, visto que outros casos foram surgindo, dando força para o trabalho. Esta força não está necessariamente ligada ao ganho de poder cedido por alguém, mas ao fato de Omalu ter sido capaz de usar o conheci- mento a seu favor para obtê-lo, apresentando nas entrevistas os em- basamentos que o fizeram defender que o futebol causa a Encefalo- patia Traumática Crônica. Esta característica é apontada por Foucault como imanência do poder, ou seja, a impossibilidade de se transmitir o poder pode ser vista neste contexto do filme. O poder tem várias formas de estabelecer, seja pela ameaça, disparidade econômica, por formas de institucionalização (dispositi- vos tradicionais, estrutura jurídica etc.), entre outros. As formas aqui apresentadas foram todas expressas no filme Concussion. A ameaça sofrida por Omalu, que ocorre em vários momentos, foi bem marcante na primeira ligação recebida por ele em sua casa: “ Quer tornar covarde esse país? Quer afeminar o futebol americano? Dê o fora, antes que façam a sua autópsia ”. A partir deste momento, Omalu percebe que a integridade física dele e de sua esposa correm perigo. A partir daí, nota-se a relação de poder entre Omalu e um possível fã do esporte. O poder estabelecido pela disparidade econômica é marcante numa sequência em que Cyril Wedit, chefe do IML da cidade, conversa com Omalu e o alerta sobre quão grande é a NFL, dizendo que a cidade de Pittsburgh gastou 233 milhões de dólares na construção do novo es- tádio de futebol, enquanto escolas foram fechadas e os impostos foram aumentados. Diz ainda que essas pessoas – dirigentes e comissários da
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(^) tender que é impossível nos livrar das relações de poder, assim como podemos entender que as relações de poder não são necessariamente ruins para a sociedade. Como vimos, Dr. Bennet Omalu usou as rela- ções de poder – favoráveis em alguns momentos – para trazer a ver- dade sobre um dos esportes mais amados pelos norte-americanos, com o discurso de que todos devemos saber o risco que corremos em relação a uma determinada prática. Muitos dos jogadores que mor- reram foram tachados, inicialmente, como loucos ou covardes, o que não se sabia era que eles eram vítimas de um sistema que escamoteou a verdade sobre as possíveis consequências deste esporte: pelo menos 28% dos jogadores irão sofrer com esse problema. A descoberta de Omalu teve como principal ferramenta a razão, a ciência, o conheci- mento de si mesmo e da NFL, assim conseguiu utilizar as relações de poder em benefício da sociedade.
referências
1 Foucault M. Microfísica do poder. 8ª ed. Rio de Janeiro: Graal; 1989.
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resumo
introdução : A relação médico-paciente é permeada de condicio- nantes socioculturais. Assim, é imprescindível refletir sobre seus aspectos formativos, a fim de entender as ações de ambos os indiví- duos componentes deste vínculo. O filme Wit (Uma Lição de Vida) , de 2001, abre espaço para a discussão desta temática, ao retratar os últimos meses de vida de uma professora universitária, portadora de uma doença terminal, que se submete a um tratamento experi- mental. Durante o período de testes, a personagem passa a ser vista como uma cobaia. Sua identidade é reduzida a sinais vitais e nú- meros em uma prancheta, retratando a impessoalidade no contato entre profissional de saúde e paciente. objetivos : Compreender a interação dos fatores constituintes da relação médico-paciente na produção de diferentes cenários nos serviços de saúde. Métodos : Revisão integrativa da literatura através da busca de artigos científi- cos na base de dados SciELO considerando o limite temporal de 2010 a 2016, publicadas no Brasil e no idioma português. O seguinte des- critor, devidamente indexado conforme os Descritores em Ciências da Saúde, foi utilizado: relação médico-paciente. Foram encontrados
abordagem à relação Médico-paciente
a Partir de uma Obra Cinematográfica:
Wit, Uma Lição de Vida
C arlos J ardEl C osta sousa^1 gabriEl dias amériCo 1 E duardo sérgio soarEs dE sousa^2 lourEnço dE miranda FrEirE nEto^3 virgínia  ngEla mEnEZEs dE luCEna E C arvalho 4
(^1) Estudante de Medicina da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) (^2) Professor Titular do Centro de Ciências Médicas da UFPB (^3) Professor do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da UFPB,
Vice-coordenador do Projeto Cine & Medicina (^4) Professora Titular do Centro de Ciências Médicas da UFPB
- autor para correspondência Eduardo Sérgio Soares Sousa esergiosousa@uol.com.br
A r t i g o
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dynamics that originate from the doctor-patient binomial, the film instigates health professionals to reflect on and improve their work processes and health-disease conception, centralizing the promo- tion of care in the integrality of the individual.
Keywords: Autonomy, Humanization in Health, Physician-Patient Relationship, Cinema, Medical Course
introdução
“Tão importante quanto conhecer a doença que o homem tem, é conhecer o homem que tem a doença” (Osler, 1898).
A relação médico-paciente, assim como outras formas de re- lacionamento interpessoal, se configura como um produto dinâmico do contexto sociocultural. Ela transita pelos processos subjetivos e sociais dos sujeitos e envolve uma multiplicidade de fatores políti- cos, pessoais, científicos, comunicacionais e macroestruturais^1. Nes- te sentido, para entender como esta ligação sofreu transformações em diferentes momentos históricos, é pertinente analisar a trajetó- ria da Medicina, desde a sua gênese até os dias atuais 2. A história médica pode ser categorizada em pelo menos três momentos distintos, os quais apresentam desdobramentos signifi- cativos na relação médico-paciente. A princípio, a arte médica, prin- cipalmente a ocidental, se limitava a um conhecimento místico, com poucos recursos técnicos e entremeado de questões filosóficas, além de leis naturais e divinas que regiam o estado de saúde e doença do homem. Este modelo, chamado de hipocrático, era baseado exclusi- vamente no diálogo e na interpretação da anamnese, incluindo todos os aspectos da vida do paciente (psicológico, social, nutricional e es- piritual), conciliando com o exame físico. A relação médico-paciente era fundamentada na proximidade do contato humano como forma de descoberta dos males que afligiam os pacientes. A partir do século XVIII, a ciência médica – inserida em um contexto de revolução técnico-científica – passou por profundas mudanças conceituais e instrumentais, avançando significativamen- te na criação de exames de imagem, análises laboratoriais sofistica- das e medicamentos cada vez mais efetivos. As doenças são progres- sivamente categorizadas e controladas através dos estudos das áreas da bioquímica, farmacologia, genética, dentre outras. Tais saberes colaboraram para a evolução de um modelo biomédico, com o dis- curso científico centrado na doença como patologia. 3, Com o aparato tecnológico à sua disposição, o médico passou
a se utilizar, cada vez menos, da relação com o seu enfermo como fonte de informação diagnóstica. Nesse contexto cientificista, o pro- fissional se valia exclusivamente de uma medicina instrumentaliza- da e mecânica. Conduzia sua arte médica baseando seu raciocínio apenas em evidências tecnológicas, diminuindo, assim, o interesse pela experiência do paciente, pela sua subjetividade, delimitando a complexidade do ser humano ao restringi-lo a abordagens objetivas, quantificáveis e distantes da realidade do sujeito. 5, Foi somente a partir da década de 1960 que grupos de profis- sionais e populares insatisfeitos com este modo de conceber a Me- dicina passaram a refletir sobre os processos de trabalho. Ressurgiu, assim, aos poucos, a necessidade de se manter uma estreita relação com o paciente, retomando a concepção holístico-humanista do pe- ríodo hipocrático, mas de forma complementar ao cientificismo. Neste novo panorama, além de o paciente ter sua saúde com- preendida como um leque de fatores biopsicossociais que intera- gem, resultando em processos patológicos, ele teve assegurados o direito de participação e de autonomia no que diz respeito à opção terapêutica, conforme preceitos legais, morais e éticos. Percebe-se que a relação médico-paciente sofre muitas alte- rações dependendo do seu contexto cultural. Ao longo deste tra- balho, serão dissecados alguns pontos de discussão sobre os cons- tituintes desta importante relação na atualidade, a começar pela análise, sob a perspectiva social, deste tema. O vínculo entre médico e paciente, por sua própria natureza assimétrica^7 , constitui uma relação de poder, de modo que o saber médico é referenciado pelo imaginário popular como um instru- mento de certeza e poder de coerção 5. Afinal, para uma das partes é outorgado o domínio do conhecimento, o que por si só já determina um maior grau hierárquico, e há ainda a possibilidade de adentrar nos mais sigilosos segredos e intimidades da vida do outro. Além dis- to, cabe ao médico o poder de instituir mudanças bruscas na vida do paciente, sob pena de o paciente não ter a sua saúde restabelecida pelo não cumprimento das demandas do profissional. Na outra extremidade relacional, encontra-se o paciente, que, em decorrência de sua patologia, se apresenta física e psiquicamente fragilizado diante do adoecimento. O enfermo, nesta circunstância, transfere inconscientemente ao médico respostas emocionais: sen- timentos como esperança, admiração e anseio pela resolução de seu problema. Tais afetos delineiam no médico figuras diversas e fantasio- sas, como o pai que cuida ou, mais comumente, a imagem angelical. Todavia, vale ressaltar que esta relação pode ser bastante confli- tuosa, especialmente quando se trata de pacientes que simulam sinto-