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Neste texto, freud confirma o vínculo entre luto e melancolia e oferece novas coordenadas para entendermos a melancolia. Exploraremos essas questões com apoio no texto 'luto e melancolia' de freud e em variações possíveis que decorrem dele. Através da leitura de jacques lacan, examinaremos como freud distinguiu as modalidades de investimento da libido e os lugares e funções dos objetos no caso do luto normal e da melancolia.
O que você vai aprender
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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Benoît le Bouteiller – Tradução: Bernardo Maranhão – Revisão técnica: Carlos de Brito e Mello No edifício da teoria freudiana, a questão da pulsão ocupa, incontestavelmente, um lugar crucial. A elaboração desse conceito é feita em etapas sucessivas.^1 Os Três en- saios sobre a teoria da sexualidade (Freud , [1905] 1996) provavelmente constituem aqui um ponto de partida. A evolução da pulsão na construção teórica de Freud é importante, como atestam as modifica- ções subsequentes que o autor fará nos Três ensaios ao longo das reedições desse texto, modificações que visam reatualizar suas proposições em vista dos avanços efetuados. Esse escrito será, quando de sua publicação, qualificado por muitos como escandaloso. Com efeito, nesse trabalho Freud confirma o entrelaçamento entre a
Resumo Sigmund Freud, a partir de sua descoberta, dará novas coordenadas no que concerne à melan- colia. Esboçaremos aqui uma rápida arqueologia dessa elaboração freudiana e abordaremos o novo giro que Lacan lhe imprime. Quais são as incidências dessas construções em nossa clínica diferencial? Podem elas constituir uma chave para a apreensão de um aspecto do mal-estar de nossa civilização contemporânea? Exploraremos essas questões com apoio no texto Luto e me- lancolia, de Freud, e em variações possíveis que dele decorrem. Palavras-chave: Melancolia, Freud, Lacan, Clínica diferencial, Mal-estar de nossa civilização contemporânea. [...] tal é a melancolia, uma queda na queda. C laude rabant , 2010, p. 223. vida psíquica e o sexual, evoca a dimensão universal da homossexualidade e renova sua hipótese concernente à sexualidade infantil. Em meio à riqueza e à relevância desse texto, notemos a questão do objeto. Essa questão será consubstancial à teoriza- ção da pulsão na obra de Freud. Também o objeto como noção evoluirá ao longo dos escritos freudianos. Nos Três ensaios, Freud proporá a hipótese de uma pulsão preexistente a seu objeto e dele indepen- dente. Por outro lado, apresenta o objeto como aquilo que será de uso para o sujeito quando ele atingir a idade de não estar exclusivamente em uma organização pul- sional autoerótica. Parece-nos que o texto Luto e melancolia é uma continuação, uma
Luto e melancolia – variações com o texto de Freud consequência dessas elaborações mencio- nadas. Nesse texto Freud (1917) proporá marcos de referência para considerar a relação do sujeito com o objeto em função da estrutura psíquica. O autor distinguirá as modalidades de investimento da libido, bem como os lugares e as funções dos obje- tos no caso do luto normal , não patológico, e no da melancolia. Esses elementos são pontos de apoio preciosos para a sequência da construção teórica de Freud, e Jacques Lacan se va- lerá deles para lhes imprimir uma leitura renovada. Esses marcos de referência estabelecidos no texto de 1917 têm uma incidência em nossa clínica diferencial e são instrumentos possíveis para a leitura dos traços do mal-estar de nossa civiliza- ção contemporânea. É esse conjunto que aqui trataremos de desdobrar brevemente. De partida, evoquemos rapidamente a depressão para distingui-la desde já da melancolia. O termo “depressão” é bastante recen- te^2 ao passo que “melancolia” deita raízes profundas e antigas na história, como o atesta o aforismo 23 do livro VI dos Afo- rismos , de Hipócrates (citado por Pigeaud, 1984, p. 501-510): “Se tristeza e medo duram muito tempo, tal estado é melan- cólico”.^3 Podemos dizer que, desde Freud, a depressão é considerada na literatura psicanalítica de maneira geral como uma manifestação sintomática transestrutural. Ela não é o apanágio de uma estrutura psíquica em particular. Como sintoma, na pluralidade de suas formas clínicas, a depressão guarda um valor de verdade do sujeito, apesar da dor e mesmo da aflição vividas pelo indivíduo deprimido. São raras as ocasiões em que Lacan evoca a depressão. Entre elas, Televisão (laCan, [1974] 2003, p. 524), em que a qualifica como covardia, em referência a uma das definições que dará à ética: a do bem-dizer.^4 A covardia evocada nesse contexto não deve ser tomada de um ponto de vista moralista, e seria necessário correlacionar essa proposição de Lacan ao aporte decisivo que sua abordagem da ética recebe de Spinoza. Em breves linhas, recordemos que Spinoza dá à ética um valor de articulação entre a intelecção e os afetos.^5 Aqui, a razão e a incidência do afeto se correlacionam naquilo que Spi- noza denomina o conatus, esse esforço do ser para perseverar na via de seu próprio ser em essência e em devir. Esse conatus corresponde, acrescenta Gilles Deleuze (1968, p. 210), à “[...] função existencial da essência, isto é, à afirmação da essência na existência do mundo, [...]” que confere, então, uma potência e uma permanência. É nesse contexto que se deve tomar a covardia [ lâcheté ] em sua etimologia,^6 um laxare subjetivo, um relaxado [ relâché ], um distender [ détendre ] , um desapertado [ desserré ] que prejudica o conatus, pode- ríamos dizer com Spinoza, ou o bem-dizer, diríamos com Lacan. A dimensão preciosa do texto Luto e melancolia (Freud, [1917] 1996) se vincula ao fato de ele distinguir estruturalmente quadros clínicos que, à primeira vista, poderiam ser similares. E nos parece que as discussões que Freud tem com Karl Abraham antes e depois de Luto e melan-
Luto e melancolia – variações com o texto de Freud desejo. [...] é como objeto a do desejo, como aquilo que ele foi para o Outro em sua ereção de vivente, como o wanted ou o unwanted de sua vinda ao mundo, que o sujeito é chamado a renascer para saber se quer aquilo que deseja... (laCan, [1960] 1998, p. 689). Assim, esse objeto não deve mais ser considerado como vinculado ao registro do imaginário. Ele se extrai desse registro, como causa do desejo e não mais como objeto de desejo. O objeto a causa do de- sejo não é mais, na construção lacaniana, o objeto visado pelo desejo, e sim a causa deste. No ensino de Lacan vemos esse objeto assumir um lugar específico no matema da fantasia, bem como nas modalidades do discurso. Mais tarde, na elaboração de Lacan, o objeto a passa a ser situado como Real. Quase no final de seu ensino, o objeto a é, nas elaborações borromeanas, aquilo que está no centro e enoda os três regis- tros, os três anéis do nó. Assim, à luz de nossa clínica, graças às proposições primeiras de Freud em seu texto Luto e melancolia , podemos, com o aporte de Lacan, apreender de maneira renovada a especificidade subjetiva da melancolia. O sujeito precisa se haver com o vazio, com o furo. Nenhuma ilusão na relação objetal permite fazer barragem ao absurdo da existência. Não podendo fazer consistir o desejo do Outro, o sujeito me- lancólico é presa da queda, sem dialética possível com o objeto a, dando curso à ela- boração de uma fantasia fechada. Estando assim o desejo radicalmente em pane, a demanda não tem oportunidade de eclo- dir. O objeto cai e arrasta em sua queda o sujeito melancólico para um grande vazio e torna iminente a catástrofe permanente. Freud já havia evocado essa impos- sibilidade de separar o eu do objeto na melancolia. E é com Freud, nesse texto, que podemos distinguir a melancolia do quadro depressivo presente em um pro- cesso de luto. Essa distinção não se faz necessariamente a partir de uma descrição dos afetos, mas do ponto de vista da rela- ção do sujeito com o objeto. Encontramos assim na melancolia um deixado caído [ laissé tombé ] , uma desvalorização radical, que não se inscreve em uma construção fantasmática. É esse o ponto de atenção nodal, sem dúvida, na clínica do sujeito melancólico: a passagem ao ato, fora de toda demanda ao Outro, fora do campo da transferência, é sempre possível e pos- sivelmente radical. Trata-se disto que vou chamar, não de luto, nem da depressão por conta da perda de um objeto, mas de um remorso de um certo tipo, desencadeado por um desenlace que é da ordem do suicídio do objeto. Um remorso, portanto, a propó- sito de um objeto que entrou, de algum modo, no campo do desejo, e que, por sua ação, ou por qualquer risco que correu na aventura, desapareceu (laCan, [1960- 1961] 1997, p. 380). Talvez aqui possamos apreender o suicídio do objeto que Lacan menciona a propósito do objeto do melancólico. O sujeito, nessas circunstâncias, é incapaz da mínima abertura, do menor investimento; o mundo e os objetos que o compõem são de uma perfeita inanidade, assim como ele mesmo. Marie-Claude Lambotte pro- põe que se fale em recusa de intenção no melancólico.^7 Nada. Parece que é isso que se tor- na o significante-mestre para o sujeito melancólico. Um significante que não remeteria a nenhum outro, que não per- mitiria articulação alguma com um S 2 , e essa articulação é condição para que caia o objeto, ao mesmo tempo que advém o sujeito, desenhando, assim, o matema da
Benoît le Bouteiller – Tradução: Bernardo Maranhão – Revisão técnica: Carlos de Brito e Mello fantasia, com a punção entre S barrado e a desenhada pela articulação de S 1 com S 2.^8 Nesse processo, é posta em xeque “[...] essa enorme sutileza spinoziana do corpo-linguagem, da linguagem como cor- po ou do corpo como linguagem”, nos diz Oury, e podemos compreendê-lo porque [...] é aí que se aloja o desejo em sua inacessibilidade ontológica, conatus que luta a cada segundo contra a tagarelice inaudita de uma falsa contemporaneidade (O ury, 2010, p. 11). “Eu bem quero que alguém simpático se sente aí, na porta.” Eis praticamente tudo o que Jacky podia dizer, em um tom dos mais amáveis, desde sua chegada. Eu o encontrei há alguns anos numa institui- ção na qual eu era funcionário da direção. Ele acabava de chegar, depois de meses de vida em vagão. De trem em trem, de Leste a Oeste e do Norte ao Sul, ele ha- via varrido, em todos os sentidos, numa deambulação ferroviária, o território da França. Desde sua chegada, ele se colocara no que lhe fora designado como seu leito e não se mexera mais. A todas as solici- tações, invariavelmente, ele respondia: “Obrigado. Você é muito amável. Mas eu quero que alguém simpático se sente aí, na porta”. Certamente, após bem pouco tempo, os profissionais começaram a se inquietar. Que fazer? Uma outra paciente, Martine, leva a sério a única afirmação de Jacky, “[...] alguém simpático sentado aí, na porta”. Ela coloca uma cadeira junto à porta e se senta. Os residentes dessa instituição, de início, e depois Francis, o jardineiro, Nacera, uma cuidadora, e depois um educador, uma enfermeira, eu mesmo, sem nada dizer, pusemo-nos ali, exatamente, sentados nessa cadeira, no lugar indicado por Jacky. E depois aparece um quadro pendurado em um recanto do cômodo. Pessoas se inscrevem para que, de dia, à noite, alguém ‘simpático’ habite essa cadeira. Sem que isso seja premeditado, um novo arranjo se delineia: um caderno é posto no criado-mudo de Jacky. Nesse ca- derno estão reproduzidas as anotações fei- tas no quadro: o nome de alguém ao lado de um horário. Jacky segue atentamente as indicações do caderno, diz quem será o próximo ‘alguém simpático’; há uma lista de pessoas ‘simpáticas’, que se inscrevem no ritmo do tempo que passa e se colocam ali, no espaço da porta entreaberta, com uma presença discreta, silenciosa. Pessoas simpáticas, como uma tinta de caneta sim- pática: está ali, inscreve, não se impõe à vista. A única pessoa autorizada por Jacky a ir e vir nesse quarto, a discutir aos co- chichos com ele, é seu vizinho de quarto: Jean-Pierre. Em seguida, Jean-Marc, um enfermeiro, pode deixar a medicação no criado-mudo, ao lado do caderno. Depois, dois ou três cuidadores são autorizados a ajudá-lo numa ligeira higiene pessoal. Adrien, o chefe de cozinha, pode, a partir de então, ir pessoalmente lhe entregar a refeição. Jean-Pierre, seu vizinho, fala pouco, investe pouco nas relações com os outros. E ele vem a fazer algo que jamais fizera: entra em meu gabinete e me lança: “Você não entendeu nada do Jacky. Ele não pode sair da cama porque ele não está fora da cama”. Jean-Pierre me coloca a par de suas discussões cochichadas. O que Jean-Pierre havia compreendido é que seu colega de quarto não podia imaginar seu próprio corpo onde este não estava no mesmo instante. Esse sentimento que Winnicott denomina “sentimento contí- nuo de existir” estava impedido em Jacky. Uma pane radical. Acontece que, naquele momento, havíamos acabado de contratar uma nova funcionária. Logo no início de seu novo emprego, ela se colocará, conforme indi- cado no quadro e no caderno, sentada na cadeira. A indicação não formulada, não
Benoît le Bouteiller – Tradução: Bernardo Maranhão – Revisão técnica: Carlos de Brito e Mello potencialmente no mundo, ele não mais habita (Maldiney, 2007, p. 776).^10 O que se produz no caso de Jacky se dá certamente a partir disso que advém, dessa presença discreta e benevolente, na soleira, no espaço da porta entreaber- ta. Isso certamente nos leva a pensar no ‘aberto’ de Maldiney.^11 Projetar, fazer-se o operador do projeto, é dar lugar à possibilidade de alguma coisa como um mundo, ser nele o aí (Maldiney, 2007, p. 784). O que se passa para Jacky é o evento do encontro. Esse evento, esse campo novo dos possíveis tem uma estética iné- dita: ‘a estética do conluio’. Retomamos de bom grado essa bela expressão de Bernard Lafargue (2010, p. 249). O encontro em questão abriu uma perspectiva. Alguma coisa se solta da série dos objetos de uma total inanidade. Aqui, a noção de estética nos parece pertinente, pois não é uma questão de beleza, mas alguma coisa que permite que o olhar se vincule, se detenha, se focalize. Para Jacky, há o encontro e há os objetos: os cadernos, os recortes de imprensa, os números de telefone, elementos que ele, com a ajuda de seus ‘companheiros de pesquisa’, irá acumu- lar, classificar, ordenar. Ele modela esses objetos e os dispõe em relação uns com os outros, procura uma harmonia em sua organização. Formulemos aqui a hipótese de que isso assume para o sujeito a função de uma solução que evita o pior. Podemos afirmar com Lacan que, na neurose, o sujeito tem como recurso a fantasia, essa articulação entre o sujeito ( ) e o objeto ( a ), para velar o vazio abso- luto, radical, para poupar a si mesmo de uma relação com esse vazio. É também a fantasia o meio do neurótico para localizar o gozo. Na psicose, notadamente naquela declinada sob o modo da melancolia, o sujeito está desprovido da fantasia e, portanto, desprovido do recurso que esta constitui contra o vazio absoluto; despro- vido, também, da aparelhagem do gozo que ela possibilita. Jacky, provavelmente, com sua invenção em torno dos objetos evocados acima, encontra uma solução ‘sinthomática’ para manter de pé alguma coisa em torno desse furo.^12 Vejamos agora como Freud, com o texto Luto e melancolia, seria um recurso possível para a leitura de certos aspectos do mal-estar em nossa civilização contem- porânea. Os sintomas desse mal-estar são numerosos. Citemos, entre eles, o aumen- to significativo do número de suicídios^13 e os altos índices de toxicomania e de consumo de psicotrópicos.^14 Jacques Lacan evoca o discurso ca- pitalista no início dos anos 1970.^15 Isso se segue, como sabemos, às elaborações que lhe permitirão formalizar quatro mo- dalidades do discurso, a saber, o discurso universitário, o discurso da histérica, o discurso do mestre e o discurso psicana-
Luto e melancolia – variações com o texto de Freud lítico.^16 O ponto comum a esses quatro discursos é que neles figura a dimensão da perda. Cada um desses discursos é escrito com uma barreira, uma barreira ao gozo, entre o lugar da produção e o lugar da ver- dade. É sob essa condição que o discurso pode ser entendido como aquilo que faz laço social, como a matriz, em suma, que determina as modalidades do laço social. Ora, para escrever o quinto discurso, o discurso do capitalista, Lacan suprime essa barreira ao gozo. Encontramos nesse discurso um sujeito que está diretamente ‘ligado’, ‘conectado’ ao objeto. Por outro lado, nesse discurso, o lugar da verdade não é mais acessível. Podemos questionar em que medida isso emerge do discurso do capitalista, uma vez que ele impede estruturalmente o laço social. Contudo, por outra parte, apreen- demos também em que medida esse discur- so se funda no imperativo de consumo do objeto, acarretando a anulação do sujeito, implicando, em suma, a consumação do sujeito por meio do consumo de objetos. A organização social que se funda sobre esse discurso institui, portanto, a produção e o consumo de objeto como necessidade acessível pelo sujeito. A palavra de ordem é feroz (mesmo se deixa, aparentemente, o sujeito como soberano de suas escolhas, de suas decisões): não perder nenhuma oca- sião de ter acesso ao objeto supostamente faltante, a fim de prevenir a falta eventual, a provável insatisfação. Isso não se dá sem efeito para os sujeitos contemporâneos, pois “[...] do psiquismo, a insatisfação é o primeiro elemento constituinte” (laCan, 1968, p. 55). O capitalismo utiliza uma tecnologia, dispositivos para sustentar essa conexão permanente do sujeito ao objeto, em todos os campos possíveis do consumo, inclusive o da saúde, certamente. Que se tenha chegado a industrializar o desejo, enfim... não se pode fazer nada de melhor para que as pessoas estejam um pouco tranquilas, hein? […] e além disso, obteve-se o resultado (laCan, 1978, p. 78). Esse impossível de desejar é o que Freud designa como a posição subjetiva do sujeito melancólico em seu texto Luto e melancolia, pela colagem do objeto ao eu. Michel Foucault ([1978-1979] 2004) forja o conceito de biopolítica. Trata-se de uma estratégia política que visa à domina- ção e ao poder por meio do domínio do ser humano reduzido ao corpo. Mobilizando esse conceito, Agamben sustenta que [...] o desenvolvimento e o triunfo do capitalismo não teriam sido possíveis [...] sem o controle disciplinar realizado pelo novo biopoder que, por meio de uma série de tecnologias apropriadas, criou para si, por assim dizer, os corpos dóceis de que ele necessitava (agaMben, 1997, p. 11). Esse “triunfo do objeto”, que carac- teriza a melancolia (laCan, [1962-1963] 2004, p. 387), parece definir nossas sociedades ocidentais contemporâneas. Provavelmente, nós também podemos ver nisso um ponto de explicação de certas passagens ao ato de jihadistas suicidas e assassinos. O sociólogo Farhad Khos- rokhavar (2015) nota traços comuns a boa parte deles. [...] são quase todos jovens com passado de delinquência, tendo cometido atos de furto ou de tráfico; quase todos passaram por um período de encarceramento, quase todos eram desislamizados e se tornaram muçulmanos born again ou se converteram ao jihadismo sob a influên-
Luto e melancolia – variações com o texto de Freud
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