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Livro Ilustrado vs Livro com Ilustração: Diferenças e Características, Exercícios de Literatura

Este artigo teórico-metodológico explora as diferenças entre livro ilustrado e livro com ilustração no contexto da literatura infantil e juvenil, fornecendo definições e exemplos para cada categoria. Além disso, aborda a importância da ilustração na análise de livros e a relevância dos elementos gráficos e editoriais na fabricação do livro.

Tipologia: Exercícios

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Roxana_Br
Roxana_Br 🇧🇷

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LIVRO COM ILUSTRAÇÃO: UM EXERCÍCIO DO OLHAR
INTERDISCIPLINAR
Ano VII, V.16, jul-dez de 2012 - ISSN 1980-8879 | p. 06-18
Armando Gens (UERJ-UFRJ)
1
Resumo
O objetivo deste artigo é apresentar pressupostos metodológicos para orientar o trabalho
de leitura com histórias ilustradas, tendo por base a edição de
Conto de escola
, de
Machado de Assis, sob a chancela da editora Cosac Naify. Partindo de uma pesquisa de
base teórica (BENJAMIN; LINDEN; OLIVEIRA; NICOLAJEVA e SCOTT) para determinar
as diferenças existentes entre livro ilustrado e livro com ilustrações, realiza-se um exercício
de olhar imagens fora dos quadros do princípio de equivalência entre texto e texto.
Palavras-chave: livro infantil e juvenil; ilustração; leitura
Abstract
The aim of this article is to present methodological assumptions to guide the work of
reading with stories illustrated, based on the edition of
Conto de escola
, written by
Machado de Assis, under the seal of Cosac Naify. Focusing on a search of theoretical basis
(BENJAMIN; LINDEN; OLIVEIRA; NICOLAJEVA and SCOTT) to determine the
differences between picturebook and book with pictures, this article also designs the ways
of seeing pictures without the frames of equivalence between text and illustration.
Key-words: children & youth books; reading; pictures
1
Doutor em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo. Professor da Faculdade de Educação da Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Professor da Faculdade de Formação de Professores da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro. Tem como campo de estudo o ensino d e Literatura Brasileira, a formação de professores, o imaginário pedagógico,
e a poesia brasileira.
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LIVRO COM ILUSTRAÇÃO: UM EXERCÍCIO DO OLHAR

Armando Gens (UERJ-UFRJ)^1 Resumo O objetivo deste artigo é apresentar pressupostos metodológicos para orientar o trabalho de leitura com histórias ilustradas, tendo por base a edição de Conto de escola , de Machado de Assis, sob a chancela da editora Cosac Naify. Partindo de uma pesquisa de base teórica (BENJAMIN; LINDEN; OLIVEIRA; NICOLAJEVA e SCOTT) para determinar as diferenças existentes entre livro ilustrado e livro com ilustrações, realiza-se um exercício de olhar imagens fora dos quadros do princípio de equivalência entre texto e texto. Palavras-chave: livro infantil e juvenil; ilustração; leitura Abstract The aim of this article is to present methodological assumptions to guide the work of reading with stories illustrated, based on the edition of Conto de escola , written by Machado de Assis, under the seal of Cosac Naify. Focusing on a search of theoretical basis (BENJAMIN; LINDEN; OLIVEIRA; NICOLAJEVA and SCOTT) to determine the differences between picturebook and book with pictures, this article also designs the ways of seeing pictures without the frames of equivalence between text and illustration. Key-words: children & youth books; reading; pictures (^1) Doutor em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo. Professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor da Faculdade de Formação de Professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Tem como campo de estudo o ensino de Literatura Brasileira, a formação de professores, o imaginário pedagógico, e a poesia brasileira.

Armando Gens LIVRO ILUSTRADO OU LIVRO COM ILUSTRAÇÃO? Antes de estabelecer as diferenças existentes entre livro ilustrado e livro com ilustração, convém explicitar que o propósito deste artigo concentra-se em pressupostos voltados para as atividades de leitura realizadas em sala de aula, uma vez que confere destaque a dinâmicas através das quais se promove um contexto favorável para que alunas e alunos se exercitem em olhar o livro com ilustrações. É importante ainda esclarecer que este trabalho surgiu de indagações e lacunas reveladas durante as aulas de Didática de Língua Portuguesa e Literaturas I, quando se propôs a uma turma da Licenciatura em Letras um projeto de leitura baseado na obra Conto de escola , de Machado de Assis, com ilustrações de Nelson Cruz. Após os necessários enquadramentos, anuncia-se o contexto favorável para introduzir a primeira dúvida sobre o objeto de estudo. Ao colocar em análise a edição de Conto de escola , sob a chancela da editora Cosac Naify, surgiu a primeira interrogação: a obra poderia ser classificada como livro ilustrado? Embora, à primeira vista, a dúvida pareça muito óbvia, no entanto, quando se consultam os estudos de especialistas, não é essa a impressão que fica, pois, no âmbito do senso comum, prevalece, no Brasil, a classificação livro ilustrado para designar uma gama de obras que trazem ilustrações. De acordo com Nikolajeva e Scott (2011), os livros ilustrados, inicialmente, “combinam dois níveis de comunicação, o visual e o verbal” (p. 13). Contudo, quando as autoras se dedicam a propor uma tipologia para o objeto de investigação, é que as diferenças tomam corpo mediante a evidência de características que não são levadas em conta na classificação já consagrada pelo uso. Para as pesquisadoras, existem diferentes tipos de livros ilustrados assim por elas denominados: “livro demonstrativo refere-se a “dicionário pictórico (sem narrativa)”; “narrativa pictórica” aplica-se a obras “sem ou com pouquíssimas palavras”; “livro ilustrado” emprega-se para nomear obras em que “texto e imagem” sejam “igualmente importantes”; e, por fim, “livro com ilustração” para designar obras em que “o texto existe de modo independente” (p. 21). À medida que se avança na pesquisa, toma-se conhecimento do grau de complexidade que ronda a definição de livro ilustrado. Por exemplo, Linden (2011),

Armando Gens Através da pesquisa, fica muito claro que, ao se conceber o livro ilustrado “como uma forma específica de expressão”, não convém empregar na análise da ilustração os mesmos processos que comumente são aplicados ao texto verbal. Este é um ponto muito importante e que não tem recebido relevo em grande parte dos trabalhos em que se conjugam texto e ilustração, pois invariavelmente ou a ilustração receberá o mesmo tratamento dedicado ao texto, ou, em casos mais extremos, ela será negligenciada. Ao observar os trabalhos realizados com imagens em espaço escolar, nota-se que a ilustração tem recebido um tratamento semelhante ao aplicado à leitura do texto verbal, porque as abordagens ancoram-se no principio de equivalência entre imagem e texto. É importante sublinhar que a interpretação das ilustrações requer conhecimentos específicos e que só descrevê-las, segundo o princípio de equivalência entre texto e imagem, não dá conta da fruição do trabalho realizado pelos ilustradores. A esse respeito, Régis Debray, midiólogo francês, adverte que “Confundir regimes do ver e do dizer na noção generalizante de signo, sem distinguir entre os diferentes gêneros de signo, teria conduzido a um impasse”(p. 181), pois para ele a imagem não pode ser decomposta “em unidades discretas dependentes de um “sistema com dupla articulação (paradigma e sintagma)” (p.182). Ainda de acordo com o autor, ele afirma que uma imagem só pode ser “decriptada”, uma vez que só tal processo é que permite a exposição de “camadas de sentido sobrepostas, a propósito de um objeto sempre irresolúvel e ambíguo”(p.182). Para Régis Debray, “Codificar é socializar” (p.187), enquanto “decriptar” é entregar-se à contemplação da imagem e ao silêncio que ela traz, suscita e comporta. Da inobservância de tais diferenças decorre o anseio de ler imagens, impondo-lhes sintaxes, gramáticas, semânticas que não respeitam o silêncio e a ambiguidades que nelas habitam. Contudo, da observância às diferenças estabelecidas pelo midiológo, depreende-se que ele destaca dois pontos fundamentais para ver imagens: o primeiro, diz respeito à impossibilidade de separar uma imagem em partes distintas (como se faz na análise mórfica, por exemplo), por entender que ela é global e indivisível; enquanto o segundo, refere-se ao silêncio — ao momento da contemplação — que recria, naquele que a mira, um estado idêntico ao in-fans , o que ainda não fala. Os pontos em destaque revelam

Livro com Ilustração: Um Exercício do Olhar indiretamente os motivos que sustentam a generalização de que livros ilustrados destinam- se apenas ao público infantil, aos infantes. Contudo, Nikolajeva e Scott (2011) desconstroem essa visão estreita sobre os livros ilustrados, quando proclamam que muitos deles “são claramente destinados a crianças pequenas e adultos sofisticados, comunicando-se em diversos níveis com ambos os públicos”(p. 39). Retornando à contemplação e ao silêncio das imagens, é oportuno citar algumas considerações que Walter Benjamin (2002) tece sobre o livro ilustrado. Para o filósofo, a imagem captura aquele que a contempla. Por isso, “a própria criança penetra nas coisas durante o contemplar, como nuvem que se impregna do esplendor colorido desse mundo pictórico” (p. 69). E por não temer o silêncio, as crianças vão, como diz o pensador, habitar as imagens na dimensão dos sentidos, daí a importância das cores na ativação da fantasia, uma vez que O próprio corpo na dança, a mão no desenho, reproduz os elementos de sua percepção e os incorpora a si. Esta capacidade encontra porém os seus limites no mundo das cores: o corpo humano não é capaz de produzir cor. Ele não corresponde a ela em sentido criativo, mas sim receptivo: através do olho que reverbera em cores. (BENJAMIN, 2002, p.

Sobre o mesmo tópico abordado por Walter Benjamin, Rui de Oliveira (2008) também se pronuncia. Para o ilustrador brasileiro, o papel exercido pela luz e pela cor no trabalho de ilustrar livros é muito importante, pois cabe ao “esquema tonal” determinar “grande parte do olhar de um pequeno ou jovem leitor” (p.133) , assim como se deve ao mesmo esquema a elaboração da “atmosfera do ambiente e do momento representado”, pois “Por meio dele podemos expressar na ilustração o fantástico ou o fantasmagórico, o drama ou a alegria [...] de um texto que está sendo interpretado.” (p.136) Tendo em vista os resultados da pesquisa aqui apresentados, entende-se que a obra Conto de escola , na edição da Cosac Naify, não se enquadra na categoria de livro ilustrado. Segundo definições e características reunidas nesse artigo, Conto de escola (2006) atende mais às especificidades do livro com ilustração, na medida em que o texto é a via pela qual o leitor tem acesso à história. Outra característica que vem corroborar o alinhamento da obra aos livros com ilustração refere-se ao fato de que ela encerra uma

Livro com Ilustração: Um Exercício do Olhar em termos visuais. Assim, nos projetos de leitura, seria produtivo incluir o estudo de capas e ilustrações, contanto que tenham relevância para a ampliação, contradição, expansão e antecipação dos sentidos do texto literário. Já que a leitura exige exercícios dos sentidos (ver, ouvir, sentir), entende-se, então, que ela possa começar pelos elementos que a precedem, ou seja, pelos “elementos extratextuais” (ARAÚJO, 1986, p. 470), a saber: capa, sobrecapa, quarta capa, lombada, orelha, etc. Tais elementos apresentam-se como uma possível entrada de acesso à leitura de um livro; constatação que leva Jean-Pierre Goldenstein, em Entrées en littérature (1990), a dedicar-se, na seção intitulada “Lire les covertures”, aos modos de apreender a ver as capas como um exercício promotor de desenvolvimento da sensibilidade de leitoras e leitores. Quando Goldenstein argumenta que a leitura de livro começa pela capa que o reveste, é porque a compreende como embalagem de um produto da esfera do consumo e que comporta tripla tarefa: chamar a atenção, seduzir o consumidor e informar o leitor. Ao dar relevo e conferir importância à face externa do livro, Goldenstein deseja frisar que a capa funciona como fachada ou porta de acesso ao interior de uma obra. Em sendo assim, elementos como formato, grafismo, sobrecapa, cores, fontes, ilustração, diagramação de títulos refletem escolhas editoriais e retóricas que visam a influenciar o público, valorizar o produto e propor diálogos entre diferentes modalidades da arte, entre outras escolhas. Com base na proposta de Jean-Pierre Goldenstein, crianças e jovens podem ser provocados a examinar analiticamente a dimensão gráfica. E para a sustentação teórica necessária ao exame proposto, o mercado livreiro já dispõe de obras que aproximam, passo a passo, leitoras e leitores do processo de confecção de livros. Para conhecer a arquitetura e a origem do objeto, recomenda-se a leitura de O livro (2001). A obra traz um texto cheio de humor assinado por Alexandre Árbex Valadares com ilustrações para colorir de Felipe Süssekind. Nela, as crianças conhecem não só os diferentes formatos do livro através dos tempos, como também aprendem a nomear as respectivas partes de que se compõe o objeto.

Armando Gens Para leitores do sexto e sétimo anos do Ensino Fundamental, Uma história por trás das linhas: o processo de edição do livro infantil e juvenil (1997), de Sonia Junqueira, é uma obra bem adequada. O livro abarca desde a avaliação de originais até os procedimentos de estocagem, seguidos de um capítulo ilustrado sobre os elementos da estrutura física de um livro, de um exemplo de escala de cores para impressão em policromia, e de uma nota para reflexão sobre os efeitos causados pela reprodução de livros por meios mecânicos ou eletrônicos. Indica-se, também, a obra intitulada Como nascem os livros? (2000), de Angelina Bulcão e ilustrado por Maurício Veneza, na qual a história do livro e o trabalho desenvolvido na gráfica são apresentados através de uma moldura ficcional que se concentra na aventura de Leo e Laura em uma biblioteca. Diante do quadro até aqui esboçado, é quase um imperativo que os atuais projetos de leitura reconheçam a importância dos elementos gráficos e editoriais implicados na fabricação do livro e os incorporem ao ato de ler, não só porque o mercado vem investindo na dimensão icônica dos produtos destinados ao público infantil e juvenil, mas também porque leitores e leitoras, na qualidade de consumidores, necessitam de critérios para julgar o livro do ponto de vista mercadológico, a fim de que possam avaliar a qualidade das edições, dos projetos gráficos e das ilustrações em relação ao valor que terão de despender para aquisição do produto. Isto posto, cabe agora colocar em análise a obra Conto de escola (2006) que integra a coleção “Dedinho de Prosa” da editora Cosac Naify, da qual também fazem parte, por exemplo, os seguintes livros ilustrados: O homem que sabia javanês ; O presente dos magos. O LIVRO COM ILUSTRAÇÃO EM SALA DE AULA Como já ficou assentado no decorrer desse artigo, entre os muitos livros com ilustrações disponíveis no mercado, escolheu-se a edição de Conto de escola (2002) , de Machado de Assis, sob a chancela da editora Cosac Naify, para desenvolver um exercício de “ver o livro” por se considerar que a referida obra encarna um caso digno de estudo, uma vez que a capa, o projeto gráfico de Elaine Ramos e as ilustrações de Nelson Cruz ( também responsável pelo projeto gráfico) contribuem de modo decisivo para que um

Armando Gens manifestam-se ainda na disposição das carteiras em duas fileiras, porque cria uma área de circulação de ampliada visibilidade. Nada escapa ao olhar do mestre e do aluno cooperativo. A sala de aula, como está retratada por Nelson Cruz, configura-se como um espaço estreito, com pouquíssima luminosidade e com um pé-direito muito baixo, de forma a acirrar o conceito de confinamento admiravelmente dinamizado pelos tons de marrom em franco contraste com o azul do céu o qual serve de pano de fundo para as janelas abertas da sala de aula do professor Policarpo. Cumpre sublinhar que a diagramação aplicada ao título do conto –– Conto de escola –– cria a ilusão de que ele paira sobre a sala de aula, e propõe possibilidades de leitura ao estabelecer uma interferência na apreensão global do vocábulo “escola”, cujo efeito gráfico induz a ler: “Conto de (es)cola”. Tão logo abram o livro, os leitores irão deparar-se com uma sequência ilustrativa que articula pena de escrever, pincel e tambor em um trajeto instável, que caracteriza visualmente, através da linha, as alternâncias presentes no corpo textual do conto: a lição escolar ou o ritmo do tambor, espaços abertos ou fechados, liberdade ou confinamento, punição ou prazer. O conjunto visual comporta mobilidade e leveza assim como acirra o contraste entre formas imobilizadoras escolhidas para configurar a ordenação imposta pelo poder patriarcal e autoritário do qual mestre e pai são representantes. Em relação à representação das personagens de poder, o ilustrador tira partido de volumes e proporções, ora para enfatizar a força do adulto sobre as crianças, ora para recompor a óptica pela qual a criança vê o adulto. Tanto o pai (p.4) quanto professor (p.21; 23; 24), especialmente nas cenas de castigo, são retratados como seres monstruosos. Desse modo, a desproporção entre o volume corporal, a dimensão, por vezes, reduzida das cabeças, o contraste entre alto (professor / pai) e baixo (filho / aluno), os dentes pontudos, o dedo em riste, a mão espalmada, o peito inflado contribuem para compor uma imagem caricatural da imponência das personagens que detém o poder de punir e absolver em nome da força disciplinadora. Cabe esclarecer que as escolhas do

Livro com Ilustração: Um Exercício do Olhar ilustrador não podem ser encaradas apenas como complementares, já que, neste caso, encerram uma leitura crítica que desafia e zomba das figuras absolutas. No que diz respeito à sala de aula, a ilustração (p.12) a capta em plongée. Vê- la de cima para baixo promove um olhar que já não é o do professor. Será, portanto, de tal perspectiva que denuncia uma organização espacial marcada pela imobilidade e pela vigilância. A ilustração tira partido da regularidade e da simetria através de formas retangulares e quadradas, promovendo uma formulação visual que reforça o perfil autoritário da escola e, simultaneamente, expõe a função do professor Policarpo: guardião da ordem. A ilustração também investe no jogo entre luz e sombra para retratar a sala de aula como um ambiente triste e penumbroso, em contraponto à solarização exterior. Se para configurar visualmente o sombrio da sala de aula, Nelson Cruz lançou mão dos matizes de marrom, para a cidade reservou uma escala cromática mais luminosa que favorece o efeito de expansão. Ao contrário da sala de aula, as perspectivas aplicadas ao exterior são variadas: de cima, de baixo, de lado, de frente, de longe e de perto. A intenção de configurar o espaço exterior sem rigidez se reforça na representação do conjunto arquitetônico (p.8-9), através da oposição entre vertical e diagonal, em franco contraste com a regularidade aplicada à formulação visual da sala de aula (p.12). Enfatizam-se, então, em plano gráfico, as tensões entre liberdade vs opressão/ cidade vs escola enunciadas pela estrutura antitética sobre a qual se organiza o texto machadiano. Como se pode perceber, ilustrações e capa oferecem uma compreensão global do conto de Machado de Assis. Para a edição da Cosac Naify, Elaine Ramos e Nelson Cruz realizam formulações visuais que ultrapassam os limites da mera transposição. Do formato do livro ao conjunto ilustrativo, as soluções revelam um projeto que elabora séries de sentido que ampliam e expandem as da força disciplinar bem como as da liberdade de escolha, através de perspectivas, volumes, formas, direções, simetria, regularidade, distorções e contrastes; sem perder de vista a crítica às figuras despóticas, enfatiza-se o efeito caricatural na representação do pai e do mestre. Nesta obra, o regime do ver desloca o olhar para o jogo de perspectivas, de contraste entre esquemas de tons e de traços caricaturais, favorecendo ampliações, contradições e reinterpretações a respeito de autoridade, corrupção, ética, liberdade e punição. É ver para crer.

Livro com Ilustração: Um Exercício do Olhar VITTA, Maurizio. El sistema de las imágenes : estética de las representaciones cotidianas. Traducción de Manel Martí Viudes. Barcelona: Paidós, 2003. WOLF, Gita(texto) ; CHITRAKAR, Swarna (ilustração). Foto de macaco. Trad. de Bia Hatzel. Rio de Janeiro: Manati, 2010. Recebido: 30/06/ Aceito: 02/08/