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PDF para auxiliar estudantes do 1º semestre
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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Titular de Direito Romano da Faculdade de Direito Candido Mendes, Rio de Janeiro
INICIAÇÃO
AO
DIREITO ROMANO
A Religião nas Constituições do Próximo e Médio Oriente. (Publicado na revista Vozes de abril de 1959).
O Direito Social nas Constituições dos Países Árabes. (Publicado na revista Vozes de maio de 1959).
A Compra e Venda na Antiga Mesopotâmia. (Publicado na revista Vozes de julho de 1959).
O Direito Penal entre os Povos Antigos do Oriente Próximo. (Publicado na revista Vozes de setembro de 1959).
O Direito Penal entre os Hebreus. (Publicado na revista Vozes de julho de 1960).
A Greve do Direito Europeu Contemporâneo. (Publicado na revista Vozes de abril de 1960).
A Liberdade de Ensino e a Constituição da Guanabara. (Publicado na revista Vozes de agosto de 1961 ).
São Tomás de Aquino e o Direito Romano - in Estudos Jurídicos em Homenagem a Caio Mario da Silva Pereira Forense, 1984.
O Novo Código de Direito Canônico em sua Perspectiva Histórica, - Revista Forense, vol. 284.
Breve Introdução ao Existencialismo. (Publicado na revista Vozes de março de 1962).
Kierkegaard, Pensador Religioso. (Publicado na revista Vozes de maio de 1962 ).
Heidegger, o Filósofo em Busca do Sentido do Ser, (Publicado na revista Vozes de agosto de 1962).
Jaspers, o Filósofo da Transcendência 1ndefinívèl. (Publicado na revista Vozes de junho de 1962).
Sartre; o Filósofo do Ser e do Nada. (Publicado na revista Vozes de setembro de 1962).
Gabriel Marcel, o Filósofo do Problema e do Ministério. (Publicado na revista Vozes de outubro de 1962 ).
Conclusões sobre o Existencialismo. (Publicado na revista Vozes de dezembro de 1962).
Husserl, o Filósofo das Essências Puras. (Publicado na revista Vozes de outubro de 1964).
Farias Brito, o Apóstolo da Filosofia. (Publicado na revista Vozes de novembro de 1964).
Podemos definir o Direito Romano como o “conjunto de normas jurídicas que regeram o povo romano nas várias épocas de sua História, desde as origens de Roma até a morte de Justiniano, imperador do Oriente, em 565 da era cristã”^1.
Estudando a História da Educação em Roma, o historiador Marrou sublinha que, no campo do ensino jurídico, cessa o paralelismo entre as escolas gregas e latinas : “Abandonando aos gregos a filosofia e (ao menos por muito tempo) a medicina, os romanos criaram com suas escolas de direito um tipo de ensino superior original.” Esta originalidade provém evidentemente do objeto desse ensino: o direito romano que, como acentua, ainda, Marrou, representa “o aparecimento de uma forma nova de cultura, de um tipo de espírito que o mundo grego não havia de modo algum pressentido”^2.
É comum salientar-se que, enquanto a Grécia antiga notabilizou-se, entre outras características, pela vocação especulativa, cultora da idolatria da razão, que deu ao mundo ocidental a Filosofia, Roma, impregnada de um senso prático, criou um admirável ordenamento jurídico da sociedade, que reflete tão bem os traços marcantes do gênio romano: a gravitas (senso de responsabilidade), a pietas (expressão da obediência à autoridade tanto divina como humana) e a simplicitas (a qualidade do homem que vê claramente as coisas e as vê tais como são). Kaser atribui aos dotes do povo romano a magnitude e a importância do Direito Romano privado: “A magnitude do Direito Romano privado e sua importante missão histórica devem-se aos dotes do povo de Roma para o Direito, à sua constante atenção para com as realidades vitais e a um sentimento jurídico educado, depurado com o transcurso do tempo.^3 “ Compreende-se a magnitude dessa criação original ao gênio romano quando se considera que o Direito Romano chegou a ser, na palavra de Jhering, “como o cristianismo, um elemento de civilização moderna”^4.
As origens, a evolução e, finalmente, a reinterpretação e atualização do Direito Romano nas compilações justinianas no século VI P. C. abrangem um multissecular espaço de tempo em que os institutos jurídicos surgiram, desenvolveram-se e sofreram modificações, algumas tão profundas que os tornaram quase irreconhecíveis ou simplesmente extinguiram-nos. Compreende-se, assim, que o Direito Romano não ofereça em seu conjunto uma unidade monolítica. Como anota Margadant, frases como: “no Direito Romano encontramos a seguinte regra... “ sugerem falsamente uma unidade que não existe^5. A diversidade do Direito Romano encontra fácil explicação em numerosos fatores que, através do tempo, influíram direta ou
Inserido no importante quadro da História de Roma, o Direito Romano está sujeito através dos numerosos séculos a um longo desenvolvimento que se de um lado conserva uma perene continuidade a partir de suas origens, apresenta, de outro lado, uma ampla e intensa variedade caracterizada por justaposições e estratificações e que ,leva da extrema simplicidade primitiva à mais vasta complexidade”^9.
No estudo dessa longa e complexa evolução histórica do Direito Romano constitui um aspecto interessante a indagação sobre se teria havido e, em caso positivo, até onde se teriam feito sentir influências de outros sistemas jurídicos ou de outras manifestações culturais estranhas ao povo romano.
Não cabe evidentemente, dentro dos estreitos limites da presente obra, aprofundar um tema tão interessante e que já despertou entre romanistas os mais vivos debates. Pretendemos, apenas, abordar resumidamente três problemas:
As descobertas arqueológicas no Oriente Próximo revelaram a existência de rico material de conteúdo jurídico desde os códigos legislativos (entre os quais deve-se destacar o famoso Código de Hamurabi) até contratos redigidos em milhares de tabletes de argila 10. Compreende-se que a decifração e o estudo de toda essa vasta documentação de conteúdo jurídico (na qual deve ser incluída também a grande quantidade de papiros) tenha chamado a atenção não só dos historiadores, de um modo geral, mas dos especialistas em História do Direito e, de modo muito particular, dos romanistas. Ao lado do desenvolvimento do estudo do Direito Comparado surge entre alguns autores a tendência para explicar as origens e a evolução do Direito Romano por influências de outros sistemas jurídicos. Volterra sintetiza a história dos estudos sobre a influência dos Direitos Orientais no Direito Romano, na primeira parte de sua obra Diritto Romano e Diritti Orientali. Aliás a preocupação em comparar normas jurídicas romanas com normas orientais e de mostrar a falta de originalidade das primeiras em relação às segundas já aparece claramente na “ Mosaicarum et Romanarum legum collatio ” (Comparação das leis mosaicas e romanas), um longo fragmento conhecido através de três manuscritos (de Berlim, de Vercelli e de Viena), parte de uma compilação redigida provavelmente no século IV e que justapõe textos mosaicos extraídos de traduções latinas da Bíblia com textos de Gaio, Papiniano, Paulo, Ulpiano, Modestino e de constituições contidas principalmente nos Códigos Gregoriano e Hermogeniano.
Inútil lembrar ao leitor aqui todos os exageros a que o entusiasmo pelas legislações orientais levou os historiadores do Direito. Assim, por exemplo, Müller lançou em 1903 a hipótese de que a legislação de Hamurabi, a legislação mosaica e a lei das XII Tábuas
derivariam de uma fonte primitiva. Ainda o mesmo autor, com base no Livro Siro-Romano (tradução em árabe, armênio e siriaco de um manual de direito romano redigido em grego, no século V), que ele considerava como uma fusão de normas romanas e normas orientais, “procura demonstrar profundas relações entre ambos os direitos”^11.
Um estudo ainda que superficial do problema das relações entre os sistemas jurídicos orientais e o Direito Romano deve levar, desde logo, em consideração, que entre as origens da Civilização Romana de um lado e as Civilizações Orientais de outro lado encontra-se um hiato cronológico e cultural. Quando as legiões romanas conquistam a bacia do Mediterrâneo Oriental encontram-na helenizada, fato esse que levanta os seguintes problemas estudados mais adiante: Qual a influência da civilização grega na evolução do Direito Romano? Teria havido influências orientais através dos gregos? Quais as influências orientais no Direito Romano tardio?
Volterra sublinha que na comparação entre os institutos arcaicos romanos e os institutos das antiqüíssimas legislações orientais o direito quiritário aparece como absolutamente independente dessas legislações, apresentando uma completa autonomia originária^12.
Uma breve comparação entre o Direito contido na Lei das XII Tábuas (como nos foi transmitido pela tradição) e os sistemas jurídicos orientais revela-nos uma antítese fundamental. Com efeito, anota Volterra, o primeiro “é em substância um direito destinado, nas suas origens, a regular a vida pública e privada de uma cidade e que conservará por quase todo o período republicano este caráter fundamental”^13.
“O direito do Código de Hamurabi, o direito assírio, o direito egípcio, já a partir da V e da VI dinastias, são, ao contrário, direitos aptos a regular a complexa vida de impérios grandiosos, perfeitamente organizados, a assegurar a existência de sociedades ricas de indústrias e de comércios. Tais direitos respondem, pois, a exigências absolutamente diversas, têm atrás de si um longuíssimo e laborioso processo de evolução: regulam institutos comerciais e industriais que os romanos conhecerão somente em época tardia, a distância de muitos séculos; exercem-se e desenvolvem-se sobre territórios vastíssimos”^14.
A diferença entre o Direito Romano e os antigos Direitos Orientais acentua-se em um ainda que rápido confronto entre as estruturas dos principais institutos. Procedendo-se a tal confronto, anota Volterra, experimenta-se “uma verdadeira sensação de estupor” ao constatar-se que alguns autores tenham podido encontrar com tanta segurança analogias entre elementos tão díspares^15. Cabe aqui uma observação curiosa que explica, pelo menos em parte, os equívocos resultantes da comparação entre Direito Romano e Direitos Orientais: os orientalistas, ao traduzirem os documentos jurídicos de antigas civilizações orientais, foram levados a usar termos romanísticos correntes para designarem institutos que, na realidade, apresentavam muitas vezes com os institutos romanos apenas “uma aparente e confusa analogia”^16.
Os juristas e historiadores, iludidos assim por uma falsa terminologia, teriam concluído da aparente identidade de termos para a existência de uma identidade de estrutura.
De tudo o que se escreveu parece-nos lícito extrair a seguinte conclusão: “Como se pode constatar, mesmo um rápido confronto entre o direito quiritário e os antiqüíssimos direitos orientais é suficiente para persuadir-nos que nenhuma influência podem ter exercido estes sobre aquele e para fazer-nos concluir que na origem o Direito Romano - e sobretudo o privado - apresenta uma singular autonomia de princípios e de institutos”^17. Quanto à indagação sobre possível penetração de institutos e princípios de direitos orientais no antiqüíssimo Direito Romano através de influências gregas (uma vez que a civilização grega apresenta em suas origens vínculos diretos ou indiretos com as antigas civilizações do Oriente Próximo ), a resposta dependerá da constatação da influência helênica na época em tela. Focalizaremos mais adiante o problema^18.
Concluamos estas considerações sobre a influência dos Direitos Orientais no Direito Romano tardio com duas observações:
As influências gregas na evolução da Civilização Romana constituem tema por demais conhecido e estudado tanto nos grandes tratados de História de Roma como em simples compêndios escolares. Que essa influência se tenha feito sentir já em época bem remota é um indício seguro o fato inconteste de o alfabeto latino derivar de um alfabeto grego de tipo ocidental (talvez por intermédio dos etruscos^29 ).
A Expansão Romana através da Magna Grécia e a conquista do Oriente helenizado com a perda definitiva da independência grega ( 146 a.C.) vão ter como conseqüência a intensificação da influência helenística em Roma. Língua, Literatura, Religião, Educação, etc. sofrem o impacto helênico e Horácio (Ep. II, 1, 156) assinala a vitória do vencido sobre o vencedor: Graecia capta ferum victorem cepit et intuit artes agresti Latio (a Grécia vencida conquistou por sua vez seu selvagem vencedor e trouxe a Civilização ao inculto Lácio).
No presente item interessa-nos apenas indagar de modo sucinto sobre a influência da civilização grega no Direito Romano, quer através de legados do próprio Direito Grego ao Direito Romano, quer através da Filosofia Grega.
Preliminarmente convém dizer algumas palavras sobre o Direito Grego. Um rápido olhar sobre a História deste Direito revela-nos, desde logo, um pluralismo de sistemas jurídicos. A vida jurídica encontra-se particularizada em cada uma das numerosas cidades gregas, embora todas elas tenham um denominador comum a civilização grega que se expressa por uma relativa unidade lingüística^30. Dos direitos das antigas cidades gregas o que melhor conhecemos é o direito de Atenas. A época helenística, caracterizada sobretudo no Egito dos Ptolomeus por uma vida jurídica intensa revelada pelos papiros gregos, assinala uma nova etapa da evolução histórica do Direito Grego em que influências extra-helênicas se fazem sentir. Assim é que, no Egito, devemos falar de um direito greco-egípcio.
O estudo do Direito Grego antigo não encontrou por parte dos historiadores e juristas o mesmo interesse demonstrado pelo Direito Romano, o que se explica facilmente pelo fato de o primeiro aparecer como um direito meramente histórico sem as profundas repercussões que o segundo teve na elaboração da Civilização Ocidental. Acrescente-se a dificuldade que o estudo do Direito Grego apresenta em virtude da documentação esparsa que constitui sua fonte de cognição.
Cabe aqui uma observação curiosa. Algumas obras gerais que focalizaram o Direito Grego (como por exemplo a notável Histoire du droit privé de la République Athénienne , da autoria de Beauchet, 1897) revestem a tendência de expor a matéria de direito helênico dentro dos quadros tradicionais do Direito Romano. Este método de exposição pode sugerir uma semelhança entre um e outro. Na realidade um paralelo entre ambos mostra algumas acentuadas diferenças. Um fato chama logo a atenção quando se estuda a formação do Direito Grego: embora tenha existido na Grécia uma vida jurídica, não encontramos aí, anota Gernet, “como órgão de conservação e de elaboração do direito, qualquer coisa comparável aos prudentes romanos”^31. A Grécia não produziu juristas. Roma, ao contrário, faz do Direito o objeto de uma jurisprudência profissional^32. Outra, diferença fundamental : o costume , a regra não escrita enraizada em um passado mais ou menos distante, existe em diversos planos (familiar, religioso, econômico) mas não é considerado expressamente, teoricamente, como fonte do direito: “Há no grego uma disposição “intelectualista” que o inclina a não reconhecer outra norma além da norma escrita, que é como um decreto da inteligência a Lei^33 .”
É interessante observar que a atuação dos tribunais atenienses, que não são integrados por profissionais, obedece à preocupação de orientar-se pela justiça. O sentimento do justo domina o sistema legislativo. “É bem característico que os gregos falem constantemente do justo e não possuam um vocábulo especializado para o direito^34 .” Sublinhe-se que, em face do Direito Romano, o Direito Grego apresenta, em alguns aspectos essenciais, características originais. Assim, por exemplo, o desenvolvimento do Direito Comercial.
Quanto ao problema das influências gregas no Direito Romano, sublinhemos, desde logo, que enfrentamos um tema controvertido. Mayr, depois de afirmar a existência de numerosos paralelismos entre o Direito Grego e o Direito Romano, sublinha como verossímil a opinião dos que crêem “que em Roma houve, em diferentes épocas e sob diferentes formas, uma vasta recepção de instituições e concepções jurídicas helênicas”^35.
A notícia sobre a tão discutida missão à Grécia com a finalidade de estudar a legislação como preparo para a codificação das XII Tábuas, constituiria, segundo Mayr, “uma paráfrase com que se quer aludir às evidentes e profundas influências gregas que se encontram nas XII Tábuas”^36.
Arangio-Luiz nega essa influência grega: “Na organização da propriedade como no sistema das penas, nas formas do processo como naquelas dos negócios jurídicos, os decênviros operaram com idéias e institutos francamente romanos, cujas origens poderíamos, talvez, encontrar no mundo etrusco ou latino, se estes ambientes jurídicos nos fossem melhor conhecidos; e também as adaptações que tiveram maior caráter de novidade (como a extinção do pátrio poder em conseqüência da tríplice venda do filho, ou como a interrupção do usucapião do poder marital com a ausência da mulher, por três noites do lar comum) foram concebidos em conformidade com o gênio da raça, não substituindo as antigas por novas concepções jurídicas, mas deduzida sutilmente da própria estrutura dos institutos primordiais.”^37
Arangio-Luiz admite que algumas normas particulares gregas (como, por exemplo, as que condenam o luxo dos funerais e que parecem imitadas da legislação de Sólon) tenham sido adotadas por intermédio da Etrúria sem que os legisladores romanos tivessem conhecimento das origens mais distantes. Tais normas, entretanto, não seriam suficientes para caracterizar um sistema jurídico. Convenhamos que o direito vigente no ambiente de intensa vida urbana do mundo grego não tinha muito a oferecer ao mundo romano ainda num estágio de predominância da vida pastoril.^38
Na época das guerras púnicas a influência grega em Roma torna-se intensa. “É então somente que os romanos começam a imitar a literatura grega; pouco á pouco, seus talentos despertam ao contato com as obras-primas helênicas e chegam a produzir obras literárias mais
Werner Jaeger, em sua famosa Paidéia , considera a Filosofia como a criação mais maravilhosa do espírito grego^44.
O contato com o helenismo iria despertar nas classes elevadas de Roma o amor pela cultura literária e o interesse pelas idéias filosóficas. O gênio romano, entretanto, não possuía vocação para a especulação filosófica. O senso prático dos intelectuais romanos levaram-nos a um ecletismo filosófico, aceitando e selecionando, adaptando e vulgarizando os sistemas filosóficos helênicos. Os filósofos romanos raciocinaram em termos de filosofia grega. Lembremos, apenas para exemplificar, o eclético Cícero (+ 43 a.C ) e os estóicos Sêneca ( + 65 P.C. ) e Marco Aurélio (·+ 180 P.C. ) Cícero tem o grande mérito de difundir em alto nível a filosofia grega entre seus concidadãos, criando, em latim, uma verdadeira linguagem filosófica.
A par da influência das idéias filosóficas deve ser acentuado o papel da retórica grega na formação intelectual do romano. Compreende-se esse papel quando se considera com Marrou que a retórica “marca profundamente todas as manifestações do espírito helenístico” 45. E observe-se que, como a filosofia, estamos aqui em face de uma manifestação cultural estritamente grega. Os autores latinistas inclusive Cícero, estavam impregnados dos ensinamentos da retórica grega, procurando criar um vocabulário técnico latino que reproduz, não raro de modo servil, a nomenclatura grega.^46
A evolução do Direito Romano não poderia evidentemente fugir às influências da filosofia e da retórica helênicas. Enfatize-se, todavia, que essa influência nada subtrai ao mérito próprio dos criadores do Direito Romano e nem retira a estes o cunho da criação original que, já vimos, Marrou caracteriza como “uma forma nova de cultura”.
Monier acentua que “com os escritos de Cícero, são os princípios da filosofia estóica, de uma grande elevação moral, que exercem sua influência benfazeja sobre o direito”^47. Registre- se que Cícero, imbuído da mentalidade grega, preconiza fazer do direito civil uma “arte”, isto é, um corpo de doutrina estruturado.
Villey, depois de observar que a influência de uma doutrina filosófica sobre os juristas não deve ser imaginada como um decalque literal, pois eles “se inspiram livremente nas filosofias”, salienta que os juristas romanos recorreram simultaneamente a diversas escolas filosóficas: “O estoicismo , em que sobretudo foi instruído Cícero e ao qual aderiu um bom número de jurisconsultos clássicos, deixou sobre o direito romano uma marca bem visível; e o platonismo também não lhe foi sempre estranho. Mas a nossos olhos é da doutrina de Aristóteles que, no início do período clássico, recebeu seus princípios constitutivos e seu valor excepcional^48 .”
Passemos agora, somente a título de ilustração, a examinar brevemente alguns exemplos da influência da filosofia e da retórica grega no Direito Romano.
A fides (fé) era uma velha noção religiosa ligada à deusa Fides a quem o rei Numa havia consagrado um templo. Sob influência grega a fides secularizou-se, chegando a revestir um caráter puramente ético, como, por exemplo, em Cícero ( De Officiis I, 7) que a qualifica de “ fundamentum justitiae ”^54. No campo do jus , a fides , qualificada de bona fides , apresenta uma dupla acepção: objetiva e subjetiva. Na primeira, temos as ações de boa fé que possuem uma cláusula “ ex bona fide ”. Na segunda acepção, temos a bona fides quando um comprador de boa fé crê em determinadas qualidades da coisa adquirida^55. Finalmente os juristas identificam o fim do direito com a utilidade comum. É o bem comum, o bem geral, anota Villers; “a idéia é admitida tanto pelos jurisconsultos como pelos magistrados”^56. Os jurisconsultos do século III, por exemplo, dirão que o jus praetorium foi aceito por causa da utilidade pública ( propter utilitatem publicam ).
Kaser sublinha também a influência da filosofia grega no método dos juristas, colocando-a já no século II a. C.: “Pela metade do século II a.C. produz-se uma mudança fundamental no método dos juristas romanos que, impulsionados pela filosofia grega, dão à matéria jurídica um enfoque dialético^60 .” Kaser admite que os precedentes gregos da legislação