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Guias e Dicas
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Influências Culinárias e Diversidade Cultural da Identidade ..., Manuais, Projetos, Pesquisas de Cultura

da Identidade Brasileira: ... língua e por sua cultura alimentar. Um conjunto de ... e “uma cozinha faz parte de um sistema alimentar – ou seja,.

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Marcela_Ba
Marcela_Ba 🇧🇷

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Capítulo 14
Influências Culinárias e Diversidade Cultural
da Identidade Brasileira:
Imigração, Regionalização e suas Comidas
Ja q u e l i n e Gi r n o s so n a t i
me s t r e e m ed u c a ç ã o fís i c a – unicamP
ro b e r t o vi l a r t a
Pr o f e s s o r ti t u l a r e m qu a l i d a d e d e vi d a ,
sa ú d e co l e t i va e at i v i d a d e fí s i c a
fa c u l d a d e d e ed u c a ç ã o fís i c a – unicamP
cl e l i a n i d e ca s s i a d a si l v a
es P e c i a l i s t a e m nu t r i ç ã o , sa ú d e e qa u l i d a d e d e vi d a – unicamP
A
identidade de um povo se dá, principalmente, por sua
língua e por sua cultura alimentar. Um conjunto de
práticas alimentares determinadas ao longo do tem-
po por uma sociedade passa a identificá-la e muitas vezes,
quando enraíza, se torna patrimônio cultural. O ato da ali-
mentação, mais do que biológico, envolve as formas e tecno-
logias de cultivo, manejo e a coleta do alimento, a escolha,
seu armazenamento e formas de preparo e de apresentação,
constituindo um processo social e cultural.
As questões simbólicas relacionadas com o alimento e as
comidas são tratadas do ponto de vista antropológico por Da-
Matta (1986, 1987) onde a “comida não é apenas uma subs-
tância alimentar mas é também um modo, um estilo e um
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Capítulo 14

Influências Culinárias e Diversidade Cultural

da Identidade Brasileira:

Imigração, Regionalização e suas Comidas

Jaqueline Girnos sonati mestre em educação física – unicamP

roberto vilarta Professor titular em qualidade de vida, saúde coletiva e atividade física faculdade de educação física – unicamP

cleliani de cassia da silva esPecialista em nutrição, saúde e qaulidade de vida – unicamP

A

identidade de um povo se dá, principalmente, por sua língua e por sua cultura alimentar. Um conjunto de práticas alimentares determinadas ao longo do tem- po por uma sociedade passa a identificá-la e muitas vezes, quando enraíza, se torna patrimônio cultural. O ato da ali- mentação, mais do que biológico, envolve as formas e tecno- logias de cultivo, manejo e a coleta do alimento, a escolha, seu armazenamento e formas de preparo e de apresentação, constituindo um processo social e cultural.

As questões simbólicas relacionadas com o alimento e as comidas são tratadas do ponto de vista antropológico por Da- Matta (1986, 1987) onde a “comida não é apenas uma subs- tância alimentar mas é também um modo, um estilo e um

jeito de alimentar-se. E o jeito de comer define não só aquilo que é ingerido, como também aquele que o ingere”. Maciel (2004), a partir dessa diferenciação, esclarece a estruturação conceitual das chamadas “ cozinhas como formas culturalmen- te estabelecidas, codificadas e reconhecidas de alimentar-se” e “uma cozinha faz parte de um sistema alimentar – ou seja, de um conjunto de elementos, produtos, técnicas, hábitos e comportamentos relativos à alimentação –, o qual inclui a culinária , que refere-se às maneiras de fazer o alimento trans- formando-o em comida”.

Nos últimos anos tem sido difundida, tanto pela mídia como também pelos profissionais da área da saúde, a ideia da trans- posição de modelos de dieta tradicionais como referência para prescrições nutricionais direcionadas à promoção da saúde e prevenção de doenças crônicas não transmissíveis. Garcia (2001) confronta esse conceito, em um elegante artigo de revisão sobre a dieta mediterrânea. Segundo a autora, há que se ter o cuidado ao preconizar modelos de dieta importados de culturas e estilos de vida diferenciados visto que tais abordagens contemplam “a s características alimentares e nutricionais de uma população, incluindo peculiaridades de sua estrutura culinária, de modo a permitir identi- ficar tais características como parte da cultura de um povo ou nação”. Segundo Garcia (2001)

“quando a alimentação é incluída no estilo de vida, um outro campo de análise é aberto, dizendo respeito às disposições re- lacionadas às práticas alimentares e sua contextualização no comportamento alimentar. Qualquer mudança na dieta impli- ca profundas alterações nas práticas alimentares o que, por sua vez demanda um redimensionamento da rotina doméstica, das práticas sociais, do ritmo de vida, enfim, representa uma reorga- nização e realocação da alimentação no modus vivendi, que só é possível se for afetada também às condições de vida.”

Considerando a importância desses aspectos, a título de exemplos e estímulo à discussão, apresentamos algumas aproximações entre os aspectos ambientais, socioeconômicos e culturais de determinadas comidas.

A cozinha japonesa valoriza a decoração. A beleza da comida faz com que aumente a vontade de comer e que o alimento seja apreciado antes de ser comido, isso obriga as pessoas comerem mais lentamente. Essa cozinha se dedica ao capricho e imaginação à apresentação das refeições, assim como são as cozinhas francesa e chinesa. Entretanto, há uma diferença entre as três cozinhas citadas, sendo que a francesa e a chinesa buscam desenvolver a mistura de ingredientes de forma harmoniosa na elaboração de seus pratos, enquanto que a japonesa procura preservar as propriedades nutricio- nais de cada componente (FRANCO, 2001). Para isso ela se baseia em 3 conceitos básicos:

  • cinco cores – preto (algas), branco (arroz/tofu), ver- melho-laranja (cenoura), amarelo (milho) e verde (espinafre).
  • cinco cozeduras – vapor, grelhamento, fritura, crus e o cozimento pelo vinagre.
  • cinco sabores – doce, salgado, o de especiarias, azedo e amargo.

Esses conceitos são respeitados e acabam identificando a culinária japonesa (MOTTA, 2006). A ritualização é o ponto marcante das cozinhas orientais: para tudo há uma razão de estar na mesa naquele momento, e cada prato exige proce- dimentos especiais para sua elaboração. Como exemplo, vale citar a cerimônia do chá (chanoyu), que envolve vestes, lou- ças, utensílios e procedimentos especiais e particularmente lentos, levando a um ritual de calma e paciência.

Dentre todas as cozinhas, o mundo elegeu a francesa como norteadora da gastronomia. A culinária francesa há muitos anos é considerada a melhor cozinha (MACIEL, 2001). É um referencial para a ciência da culinária, uma identidade cons- truída dentro e fora de suas fronteiras, mas vale a pena lem- brar que nesse caso não é somente pelo sabor especial que a cozinha francesa dá a seus pratos, mas sim ao conjunto de atitudes que envolvem a culinária francesa.

A idéia de que o prato francês é pequeno na quantidade, fica desmistificado quando somados a uma entrada com pa-

tês, pães, uma variedade de vegetais e uma tábua de queijos como sobremesa. Além disso, é uma cozinha que dedica tem- po para o preparo e tempo para fazer a refeição, ou seja, a pessoa tem que, necessariamente, sentar-se à mesa e dedicar- se à comida.

Já a diversidade da cultura alimentar do Oriente Médio é influenciada pela identidade religiosa de seu povo. Pode- mos notar nitidamente a influência da religião na cultura ali- mentar do povo do Oriente Médio ao analisar a alimentação dos judeus e dos muçulmanos. A cultura alimentar judaica é influenciada pelas leis da Cashrut , que derivam de precei- tos bíblicos e tem como objetivo trazer para a alma e o cor- po judaico muita santidade e não apenas visando os aspec- tos sanitários e de higiene. As leis da Cashrut são normas de alimentação que envolvem seleção da matéria-prima, abate de animais, higienização, cuidados na manipulação, prepa- ro e consumo de alimentos e uso de determinados utensílios (Associação Israelita de Beneficência Beit Chabad do Brasil, 2001; ENDE, 2006).

De acordo com as leis da alimentação judaica ( Cashrut ), todo alimento apropriado para consumo é considerado casher. O termo casher é usado para designar as comidas devidamen- te preparadas para o consumo dos judeus, e também objetos e pessoas. O alimento casher é produzido ou preparado de acordo com as especificações da Cashrut (TOPEL, 2003).

A Cashrut especifica o tipo de carne que pode ou não ser consumida. As carnes para o consumo dos judeus devem ser de animais casher , ou seja, que ruminam e possuem cascos fendidos, como por exemplo, vaca, carneiro, cabra e bode, etc., porém animais que só ruminam e não têm o casco fen- dido (coelho, etc.), ou que só tem o casco fendido e não ru- minam (porco, etc.) não podem ser consumidos, pois não são casher. As aves consideradas casher são as espécies domésticas, como pomba, frango, patos, ganso e peru. Porém, é impor- tante ressaltar que para serem considerados casher , além dos requisitos citados acima, tanto o animal quanto a ave devem ser abatidos e examinados de acordo com as normas alimen- tares da Torá e o processamento deve ser realizado com uten- sílios casher. Frangos e carnes pré-embalados devem apresen-

nha brasileira é o resultado das influências portuguesa, negra e indígena, mas devemos considerar que o país possui uma dimensão continental não somente do aspecto geográfico, mas principalmente na sua diversidade cultural implantada pelos imigrantes que aqui se instalaram (italianos, alemães, japoneses, espanhóis, árabes, suíços e outros).

“Melting pot”, essa expressão em inglês, retrata bem o que é a cultura brasileira, uma “mistura” de raças, crenças, costu- mes e hábitos alimentares diferentes. Não adianta querer que um paulista coma mandioca cozida no café da manhã com manteiga e sal, como faz o nordestino, se ele está acostumado com o pingado, pão e manteiga. Situação semelhante é exigir que o mineiro deixe de comer seu pão de queijo quentinho logo que acorda e substituí-lo por torradas com geléia, como fazem os gaúchos.

Cada região desenvolveu uma cultura alimentar peculiar e característica, mas dois alimentos são a “cara” do Brasil: o arroz e o feijão. São alimentos consumidos em todo o ter- ritório, mas o que varia é a espécie dos grãos e o modo de preparo. Atualmente, com a mudança do estilo de vida e a necessidade de refeições rápidas em grande parte das regi- ões metropolitanas brasileiras, se alimentar passou a ser mais um item a ser realizado na agenda, sendo o arroz com feijão facilmente substituído por um cachorro quente, um pastel, uma coxinha, enfim uma ”comida de rua”. Comida de rua ou mundialmente conhecido como “street food” são termos destinados a comidas prontas vendidas nas ruas, estando também incluídas nessa denominação as frutas frescas (LA- THAM, 1997; WHO, 1996). Pastéis, coxinhas, esfihas, milho verde cozido, cocada, cachorro quente, caldo de cana, sucos, sorvetes, doces, bolos, pipoca, churrasco grego, amendoim, queijo quente, enroladinho, tapioca, acarajé, churros, crepes, e outros tantos são encontrados diariamente nas ruas das me- trópoles de nosso país. O desemprego faz com que haja um aumento na venda de comida de rua, pois é um trabalho in- formal que muitas pessoas encaram como uma oportunidade real de trabalho para o sustento de suas famílias, relatado por Germano et al. (2000), e real ainda nos dias de hoje.

As comidas regionais do Brasil possuem uma diversidade nos sabores, influenciadas por fatores ambientais (solo, cli- ma, disposição geográfica, fauna) e pelo tipo de colonização (M.S., 2004). Seguem exemplos da regionalização:

  • Região Norte: A mandioca é o alimento típico dessa região, herdada da cultura dos índios nativos. A man- dioca nessa região é servida cozida ou como farinha. Ainda se usa seu suco para o preparo do tucupi junto com alfavaca e chicória, prato típico da região. Por ser uma região de grandes rios, o peixe também é muito apreciado e entre os mais consumidos estão o tamba- qui, traíra, piranha, pescada, sardinha de rio, tucuna- ré, pacu e pirarucu. Esse último é também chamado na região pelo nome de bacalhau da Amazônia. Ou- tros pratos típicos: Tacacá (caldo do tucupi com folhas de jambú); Maniçoba (carne de sol, cabeça de porco, mocotó, toucinho, sal, alho, louro, hortelã-pimenta e folhas de mandioca tratada); Açaí com tapioca; Car- nes assadas de jacaré e tartarugas. Além de alimentos secos como o camarão, as frutas silvestres (açaí, muri- ci, graviola, cupuaçu, mangaba, pupunha), castanha do pará, guaraná, manga e abacate.
  • Região Nordeste: além da influência portuguesa, indí- gena e negra, recebeu contribuições de holandeses, in- gleses e franceses. Podemos dizer que a parte do litoral nordestino que vai do Piauí até o sul da Bahia utilizam como alimentos básicos a farinha de mandioca, o fei- jão, a carne de sol (influência indígena), a rapadura, o milho, peixes e frutos do mar. Já para a população do sertão temos a carne bovina, caprina, o leite e a mantei- ga, o feijão, a batata doce, mandioca, alguns legumes e frutas nativas. Pratos típicos: Angu e cuscuz (que podem variar o modo de preparo dependendo do local); abóbo- ra com leite; queijo com rapadura; batata doce com café, doce de leite com banana, polenta com leite; galinha de cabidela (influência portuguesa); acarajé, vatapá, abará, caruru (influência africana).
  • Região Sul: foi a que mais recebeu influência dos imi- grantes europeus (italianos, alemães, poloneses, ucra- nianos), atraídos pelo clima e ser uma região agrícola. Exemplos típicos são observados a partir da influência culinária dos poloneses com o repolho à moda, pão de leite e sopas; italianos com as uvas, vinho, pães, queijos, salames, massas em geral e sorvetes; alemães com a batata, centeio, carnes defumadas, cerveja, lin- güiça e laticínios, hábito do café colonial, cuca, tor- ta de maça, bolo de frutas. Em Santa Catarina existe ainda o hábito de consumir peixes, entre eles a tainha e os frutos do mar, e no Rio Grande o consumo de arroz com charque (arroz de carreteiro) e o famoso churrasco gaúcho.

Referências

ASSOCIAÇÃO ISRAELITA DE BENEFICÊNCIA BEIT CHABAD DO BRASIL, 2001. Disponível em: http://www.chabad.org.br. Acesso em: 19 de jan. 2009.

DaMATTA, Roberto.Sobre o simbolismo da comida no Brasil. Correio da Unesco, ano 15, n. 7, julho. 1987

_____. 1986. O que faz o Brasil, Brasil?. Rio de Janeiro, Rocco.

ENDE, S. Cashrut e Shabat na cozinha judaica: leis e costumes. 3ª ed. Editora Chabad. 2006. Disponível em: <www.chabad.org.br/ mitsvot/cashrut/livro_cashrut/Cashrut_Shabat.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2009. FRANCO, A. De caçador a gourmet: uma história da gastronomia. São Paulo: Senac, 2001.

GARCIA, R.W.D. Dieta Mediterrânea: inconsistências ao se preco- nizar modelos de dieta. Cadernos de Debate , Campinas, Vol. VIII, 28-36, 2001

GERMANO, M.I.S. et al. Comida de rua: Prós e contras. Higiene Ali- mentar. São Paulo, v. 14, n. 77, p. 27-33, out. 2000.

LATHAM, M.C. Street Foods. In: FAO. Food And Nutrition Series : Human Nutrition In The Developing World, 29. FAO, Rome,

  1. Disponível em:

www.fao.org/docrep/w0073e/w0073e07.htm.

MACIEL, M.E. Cultura e alimentação ou o que têm a ver os maca- quinhos de Koshima com Brillat-Savarin?. Horizontes Antropoló- gicos.- Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, v.7, n. 16, p. 145-156, dez. 2001.

MACIEL, M.E.. Uma cozinha à brasileira. Estudos Históricos , Rio de Janeiro, 33: 1-16, 2004

M. S. Ministério da Saúde. Cultura Alimentar. Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília – Área Técnica de Alimen- tação e Nutrição do Departamento de Atenção Básica da Secre- taria de Política de Saúde do Ministério da Saúde. 2004. Dispo- nível em:

http://nutricao.saude.gov.br/documentos/alimentacao_cultura.pdf Acesso: 15/02/

MOTTA, A.C.S.; SILVESTRE, D.M.S.; BROTHERHOOD, R.M. Gas- tronomia e culinária japonesa: das tradições às proposições atu- ais (inclusivas). Revista de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas – Cesumar, Maringá, v.11, n. 1, p. 41-57, jan./jun. 2006.

REINHARDT, J.C. Dize-me o que comes e te direi quem és: alemães, comida e identidade. 2007. 204f. Dissertação (Doutorado em História) – Faculdade de Ciências, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2007. Disponível em: http://dspace.c3sl.ufpr. br:8080/dspace/handle/1884/ TOPEL, M. F. As leis dietéticas judaicas: um prato cheio para a an- tropologia. Horizontes Antropológicos , Porto Alegre, ano 9, n. 19, p. 203-222, julh. 2003.

WHO. Division of Food and Nutrition. Food Safety Unit. Essential Sa- fety Requirements for Street-Vended Foods. (Revised Edition). 1996. Disponível em: http://www.who.int/fsf/96-7.pdf