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Nos últimos quatro décadas, histórias em quadrinhos e música pop se aproximaram e estabeleceram interfaces e hibridações umas com as outras. Embora sejam meios de expressão absolutamente distintos, ambos são produtos culturalmente onipresentes na sociedade contemporânea. Nesta pesquisa, nos enfocamos na relação entre histórias em quadrinhos e música pop, e como essas interfaces se manifestam em obras de arte e música. A partir de textos e entrevistas, exploramos como os limites entre essas linguagens se confundem e perdem definição.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de estudo
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M á r c io M á r io d a P a ix ã o J ú n io r
Dissertação apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de mestre pelo curso de Pós - Graduação em Comunicação, Faculdade de Comunicação, Universidade de Brasília - UnB.
Orientadora: Prof.“ Dr” Selma Regina de Oliveira
Brasília 2005
M árcio M ário da Paixão Júnior
Aprovado por:
Prof.a Dra Selma Reeina Nunes de Oliveira (O rientadora - Faculdade de Comunicação - UnB)
Prof.a Dra Dione Oliveira M oura (Faculdade de Comunicação - UnB)
Prof. Dr. David Rodney Lionel Pennington (Faculdade de Comunicação ■UnB)
Prof. Ms. W agner Antônio Rizzo (Suplente - Faculdade de Comunicação - UnB)
Comics are a kind of media (gifted with a particular language) that essentially appeals to image in its construction and transmission of messages through graphic storytelling. Pop Music, although, has in sounds the transmition channel of its contents. Completely different, those languages bring in common the fact of being absolutely distinctive of the 20th century, as well as our current days. Mainly in the last four decades, Comics and Pop Music are searching not only to get closer, but also to set up a series of interchanges, interfaces and even hybridisation between them.The study of this process build the center of the dissertation that starts right now, named Comics and Pop Music: Interface Possibilities. By the experiences made in Counterculture, in Rock album covers, through interviews with Comic artists clearly interested in language hybridisation and specially by an empirical experience - from which are going to result both a Rock album and a graphic novel - we will seriously try to copreehend this subject.
Após a longa jornada percorrida, me é indispensável prestar aqui meus mais sinceros agradecimentos a todos aqueles que me auxiliaram e, principalmente, tomaram possível a realização desta tarefa. Em primeiríssimo lugar, gostaria de agradecer à minha orientadora, a Professora Doutora Selma Regina de Oliveira, pela paciência, apoio e fé no projeto aqui desenvolvido
comunicativos que envolvem, simultaneamente, texto, áudio e vídeo. No campo das artes, a poesia concreta e a videoarte, para ficarmos em apenas dois exemplos, seguem corroborando tal asserção. O conceito - há pouco inovador a agora trivial - do artista multimídia, também. Com as HQs e Música Pop não é diferente. Para além das tentativas de diálogo, experiências têm sido realizadas no intuito de que hibridações entre estas linguagens possam ocorrer. Tentar compreender as interfaces existentes entre as Histórias em Quadrinhos e a Música Pop, objetos de nossa pesquisa, é a pretensão central deste trabalho.
1.1.1 Uma breve História das Histórias em Quadrinhos Precisar o surgimento das Histórias em Quadrinhos - de modo exato e inequívoco - é tarefa impossível de se realizar. Existem várias e controversas versões acerca daquela que seria a primeira HQ da História. Todavia, ainda que pareça um produto típico do século XX, é possível remontarmos toda uma extensa trajetória desta linguagem ímpar. Para tal,sefaz necessária, inicialmente, uma definição apropriada às Histórias em Quadrinhos, mesmo considerando que o debate acerca da definição mais correta não seja alvo prioritário da pesquisa aqui proposta. No artigo Os quadrinhos e a comunicação de massa - contido na seminal obra teórica Shazam! - , Laonte Klawa e Haron Cohen analisam:
“Os quadrinhos, como o próprio nome indica, são um conjunto e uma seqüência. O que faz do bloco de imagens uma série é o fato de que cada quadro ganha sentido apenas depois de visto o anterior; a ação contínua estabelece a ligação entre as diferentes figuras. Existem cortes de tempo e espaço, mas estão ligados a uma rede de ações lógicas e coerentes.” (KLAWA e COHEN in MOYA, 1977: 110)
Para os quadrinhos mais convencionais, esta é uma definição plenamente válida. Ao nos defrontarmos com as HQs produzidas pelos Estúdios Disney, ou ainda com a esmagadora maioria dos gibis do gênero super-heróis, temos sua total comprovação. De um modo geral, o quadrinho produzido industrialmente (aquele no qual os autores encontram-
se submetidos a padrões pré-estabelecidos pelas megacorporações editoriais, sem maiores possibilidades de autonomia criativa, lidando quase sempre com personagens já conhecidos do grande público) obedece a esta “rede de ações lógicas e coerentes”. Em contrapartida, há toda uma gama de HQs em que isto não acontece. Invariavelmente, são as obras mais ousadas e experimentais, onde os autores possuem liberdade para expandir os limites da própria linguagem, normalmente por não estarem ligados a nenhum grande grupo editorial. Estar subordinado a esta dita “rede de ações lógicas e coerentes” não é, em nenhum momento, um requisito obrigatório aos trabalhos do italiano Guido Crepax, do americano Robert Crumb, ou do francês Moebius. Tomemos, outrossim, a definição proposta pelo teórico (e também quadrinista) Scott McCloud. Em sua obra Desvendando os quadrinhos 1, ele coloca as Histórias em Quadrinhos como “imagens pictóricas e outras justapostas em seqüência deliberada destinadas a transmitir informações e/ou a produzir uma resposta no espectador” (MCCLOUD, 1995: 9). Tal enunciado se enquadra em nossos propósitos, visto que ao retratar as HQs como “imagens pictóricas e outras justapostas” McCloud trata justamente do caráter - central na linguagem quadrinística - de intersecção entre desenhos (as imagens pictóricas) e palavra escrita (as “outras” imagens justapostas). Contudo, ao falar em “seqüência deliberada”, surge um problema. Se as Histórias em Quadrinhos constituem uma narrativa híbrida de imagens e palavras usualmente (mas não necessariamente) dispostas em quadros (no Brasil carinhosamente denominados “quadrinhos”), seria possível uma HQ de um único quadro, isto é, sem seqüência deliberada? Não de acordo com Scott McCloud. Para ele, as charges e cartuns, ainda que muito próximos dos quadrinhos, não podem ser classificados como tal. E sob esta perspectiva, determinados trabalhos de Goya, por exemplo, não poderiam também ser compreendidos como HQs, ainda que se valessem de recursos que mais tarde se notabilizariam entre os mais característicos dos quadrinhos (como o uso de personagens inseridos em situações que graficamente transmitam a idéia de movimento, ou dos balões como recurso visual de representação verbal).
1 D esvendando os Quadrinhos é tido com o um dos mais importantes e profundos estudos sobre a linguagem das Histórias em Quadrinhos. Curiosamente, o livro foi “escrito” em forma de HQ.
em quadros, as onomatopéias como representação gráfica dos sons e o uso de balões para a representação da fala e dos pensamentos dos personagens, bem como o de recordatórios para a expressão em o f f de um narrador onisciente. A inauguração dos quadrinhos modernos - esta linguagem que trabalha com a sinergia alcançada pelo uso simultâneo de imagens e textos - também é fonte de discussão. Os americanos clamam para si a paternidade da matéria com o seu Yellow Kid, criado por Richard F. Outcault e lançado no jornal The New York World (de Joseph Pulitzer) em 05 de maio de 1895. O ítalo-brasileiro Ângelo Agostini, entretanto, já trabalhava estes elementos há vários anos, nas Aventuras de Nhô Quim, conforme pode-se constatar no livro História das histórias em quadrinhos (MOYA, 1986: 19-21). Contudo, defendemos aqui a primazia do suíço Rudolph Tõpffer. Profundamente influenciado pela obra de Hogarth, em 1828 já lançava mão de recursos como o requadro2 e apresentava a primeira relação interdependente entre palavras e imagens na Europa. Sobre Tõpffer, Goethe escreveu que^1
“ele humilha o inventor mais fértil em combinações e podemos felicitar seu talento nato, alegre e sempre disposto” (GOETHE in MOYA, 1986: 13). E também que “se no futuro, ele tivesse escolhido um assunto menos frívolo e se limitasse um pouco, produziria coisas além de toda a concepção”. (GOETHE in MCCLOUD, 1995: 17) Todavia, ainda que as Histórias em Quadrinhos - tais como são hoje conhecidas e compreendidas - sejam fruto de elaborações realizadas no século XIX por artistas como Tõpffer, Angelo Agostini e Busch , foi somente no século passado que elas ocuparam um^ *****^ t^ é^ i lugar de destaque nas práticas culturais da sociedade. Meio de comunicação massivo4, dono de uma linguagem única, os quadrinhos se configuraram, ao longo do século XX, como um típico produto da indústria cultural5, atingindo com tremenda eficácia milhões e milhões de leitores ao redor do globo. Criada unicamente com o intuito de ser tecnicamente reproduzida (a apreciação de originais em museus e salões é um desvio de função, só há poucas décadas iniciada por alguns poucos entusiastas e logo transformada em operação mercadológica), a capacidade dos quadrinhos de atingir grandes parcelas da população parece estar em perfeita consonância com o apontamento benjaminiano: “A arte
2 Requadro é o nome técnico dado ao contorno (geralmente retangular) que delimita cada quadrinho. 3 O alemão W ilhelm Busch (1832-1908) foi um dos grandes precursores das HQs. Sua mais conhecida criação, Max urul M oritz (aqui, Juca e Chico) tiveram, no Brasil, tradução de Olavo Bilac. 4 Ver Kellner, 2001. 5 Ver Adomo/Horkheimer, 1985.
contemporânea será tanto mais eficaz quanto mais se orientar em função da reprodutibilidade e, portanto, quanto menos colocar em seu centro a obra original.” (BENJAMIN, 1996: 180) A definição mais apropriada sobre o que é uma História em Quadrinhos, bem como a investigação arqueológica acerca de suas origens, constituem, por si só, um complexo objeto de pesquisa, digno de um trabalho hercúleo. Todavia, não é este o caso. Se optamos por definir as HQs, tanto quanto por estabelecer, ainda que de modo ligeiro, sua cronologia básica, o fizemos buscando um instrumental hermenêutico para a análise mais criteriosa possível do efetivo objeto desta pesquisa, que é a relação entre as Histórias em Quadrinhos e uma outra típica produção da indústria cultural de nossos tempos, o Rock (ou Música Pop)6.
1.1.2 Uma breve História do Rock Parte do vocabulário geral das últimas cinco décadas, o Rock possui origem e linha evolutiva mais fáceis de precisar que as Histórias em Quadrinhos. O Rock nasce do grito e do lamento dos primeiros escravos africanos na América (MUGGIATI, 1983: 7-13). Ao passo em que vai sendo permeado pela cultura local - que no âmbito da música advinha da tradição européia - , este grito negro vai sofrendo mutações, até desembocar no blues. De fato, o blues é uma decorrência direta da hibridação ocorrida entre o grito do escravo africano e a harmonia musical européia. Seu elemento constituinte fundamental é a blue note, caracterizada pela terça bemolizada, que traduz sonoramente o espírito triste e melancólico presente nas canções de trabalho, nos gospels e spirituals Migrando para as grandes cidades americanas, os negros - geralmente confinados em guetos - continuaram entoando seus blues repletos de dor, lamento e indignação. A diferença é que, agora, o velho violão rural havia sido substituído pela guitarra elétrica. Nesta transformação, o blues assume uma roupagem urbana, passando a ser chamado de rhythm & blues.
6 Por razões que serão logo adiante esclarecidas, tomaremos nesta dissertação a Música Pop e o Rock com o sinônimos. 7 G ospels e spirituals são típicos cânticos religiosos negros, que têm com o característica com um geralmente obedecerem às estruturas de chamado-e-resposta.
do veio central de sua atividade. Tal e qual as Histórias em Quadrinhos, o rock’n ’roll tem com uma das razões prioritárias de sua eficácia como meio massivo o fato de se orientar em função de sua reprodutibilidade. Por outro lado, as ressignificações deste produto fonográfico (e mercantil, em última instância) por parte da audiência - tida como passiva e desprovida de qualquer autonomia - necessita de um instrumental mais adequado para análise, visto que a Teoria Crítica frankfurtiana (notadamente em Adorno) não é capaz de realizar tal tarefa, ainda que ofereça importantes conceitos e ferramentas de investigação. Para tal, serão de grande utilidade os Estudos Culturais ingleses. Do grito dos escravos africanos ao blues rural. Deste, ao rhythm & blues urbano e seus instrumentos eletrificados. Hibridizado ao country & western, o r&b finalmente dá à luz, na década de 50, o rock’n ’roll. Porém, há que se considerar que tal estilo musical possui um conjunto de características essenciais e um corpo de códigos bastante específicos e mesmo limitados. Poderíamos, à guisa de exemplo, classificar os trabalhos de Madonna, James Brown, Arrigo Bamabé e Nirvana como rock’n ’rolll Desde que surgiu como a primeira manifestação musical própria da juventude, o rock’n ’roll vem sofrendo dezenas (muito provavelmente centenas) de ramificações em gêneros e subgêneros. Uma vez que a pesquisa pretende se deter sobre as mais distintas destas ramificações, necessitamos de um conceito mais amplo que possa abarcá-las como um todo. Fiquemos então com as pertinentes considerações de Roberto Muggiati:
“(...) que é o Rock? Dentro dos limites deste estudo, é a música que nasceu nos primeiros anos da década de 1960 nos Estados Unidos (Dylan) e Inglaterra (Beatles), feita por jovens exclusivamente para jovens (...) Muitos o chamam ainda de rock and roll , pois o Rock atual não existiria sem aquela revolução sonora desencadeada nos anos 1950 (...)”(MUGGIATI, 1983: 7) “A palavra Rock engloba na verdade uma variedade de formas musicais, que vão desde o berro gutural e a batida primitiva do folclore até os sons eletrônicos mais depurados e abstratos.” (MUGGIATI, 1983: 8) “Mais recentemente, o Rock foi chamado também de Música Pop (...) Essa etiqueta não deixa de ser interessante, por seu caráter global e principalmente pelo paralelo que sugere com a pop art: ambas, arte pop (imagem) e Música Pop (som) penetram já no campo da metalinguagem (...) Nos Estados Unidos e na Inglaterra, porém, o termo pop já era usado anteriormente para designar a canção popular.” (MUGGIATI, 1983: 7-8)
Aplicando as definições do autor à música de Madonna, James Brown, Arrigo Bamabé e Nirvana, não a classificaríamos como rock’n'roll. Música Pop (ou simplesmente Rock) seria mais adequado a esta taxionomia, por ser um conceito capaz de abranger subgêneros aparentemente tão díspares quanto dance music, funk, música popular de vanguarda9 e grunge. Visto que todas as formas musicais a serem aqui estudadas pertencem à mesma matriz - cuja genealogia explicitamos anteriormente adotaremos então o conceito de Música Pop ou Rock (tomados como sinônimos), dentro dos parâmetros estabelecidos. Temos então os dois objetos sobre os quais a pesquisa em vigor irá investigar e problematizar. Dois objetos que, embora tenham suas origens situadas em épocas mais distantes, são absolutamente típicos (e fundamentais para que se possa compreender a cultura10) do século que há pouco se findou: Histórias em Quadrinhos e Música Pop. Não que isso signifique que a Música Pop e as HQs tenham ficado estanques no século XX. Pelo contrário, ambas manifestações culturais continuam vivas, transmutando-se e desenvolvendo-se em nossos dias. Mais que isso, elas continuam exercendo um interessante diálogo. E é este diálogo o cerne da pesquisa ora em curso.
1.2 DEFINIÇÃO DOS PROBLEMAS
Histórias em Quadrinhos e Música Pop. Uma vez definidas e traçadas suas linhas históricas evolutivas, o que se percebe é que, apesar de possuírem suportes completamente distintos (afinal trata-se, em um caso, de uma narrativa construída por imagens impressas, e no outro, de uma manifestação sonora), tais produtos culturais possuem um forte ponto de intersecção ao serem possíveis - ao menos da maneira como hoje os conhecemos - apenas com o advento de sua reprodutibilidade técnica. Mais que isso, Música Pop e quadrinhos são decisivos e sintomáticos na compreensão, tanto do século XX, quanto dos tempos atuais. Surgem então diversas questões, segundo as quais podemos - e devemos - problematizar. A primeira: sendo estas manifestações tão características de nossa época, é
9 A princípio, mostra-se contraditória a idéia de uma música ao mesmo tempo popular e de vanguarda. Porém, o gênero a que fazemos referência é aquele advindo do movimento conhecido como Vanguarda Paulistana, que ocorreu na virada dos anos 70 para os 80 - caracterizado por uma renovação da Música Popular Brasileira
- e que tinha em Arrigo Bamabé e Itamar Assumpção, dois de seus mais conhecidos representantes. 10 O conceito de cultura a ser utilizado durante toda a dissertação é aquele inicialmente elaborado por Raymond Williams e posteriormente desenvolvido pelos Estudos Culturais.
laços mais profundos e vigorosos. Daí a decisão de estabelecermos sobre as experiências contraculturais de interface entre Rock e HQs nosso principal recorte de estudo. A diluição e posterior fim do movimento contracultural no início dos anos 70, não pôs fim à intersecção entre a linguagem das HQs e da Música Pop. Surgido ao final daquela década, o punk rock foi extremamente profícuo em seu diálogo com as Histórias em Quadrinhos. Seus efeitos continuaram a reverberar nos decênios seguintes em uma infinidade de trabalhos. Atestam este fato, por exemplo, Love & Rockets, gibi dos irmãos Hemandez e os quadrinhos de Peter Bagge, cujas publicações se iniciaram na década de 80 e permanecem em circulação ainda hoje. Mas não pensemos que o encontro Rock e quadrinhos seja uma característica exclusiva dos comic booksu. A Europa também criou fortes vínculos entre tais meios, como na BD Rock francesa (uma variação do quadrinho marginal americano). Frank Margerin é um dos expoentes do gênero, assim como Alain Voss, brasileiro que se mudou para a França após realizar as psicodélicas capas dos últimos discos dos Mutantes ( Jardim elétrico e Mutantes e seus cometas no país dos baurets).1 5 Voss fez parte do corpo fundador da revolucionária revista Metal Hurlant, ao lado de quadrinistas de primeira grandeza como Moebius, Enki Bilal, Caza e Phillipe Druillet. Pouco depois, a revista teria a sua versão americana, a conhecida Heavy Metal. É fundamental ressaltar que ambas publicações não eram dedicadas unicamente às HQs, havendo nelas amplos cadernos sobre arte, vídeo, cinema e, logicamente, Música Pop. No Brasil, embora o obscuro período da ditadura militar tenha sufocado tentativas mais amplas e ousadas de um processo contracultural, tivemos nossa versão do movimento por meio do Tropicalismo. Com a abertura política gradual iniciada ao final dos anos 70, tanto músicos como quadrinistas obtiveram maior liberdade para estabelecer a conexão quadrinhos e Música Pop, até então incipiente e restrita a casos isolados. Angeli, Adão Iturrusgarai, o pernambucano Watson Portela e mesmo o urbanóide Daulista Luís Gustavo - ex-vocalista da extinta banda Pin Ups - são autores que sempre trabalharam os quadrinhos em estreito contato com o Rock.
14 Nome dado aos gibis norte-americanos. 15 D e fato, Jardim E létrico e M utantes e seus Com etas no P aís dos Baurets não são efetivamente os últimos discos do grupo, mas sim os últimos com o trio original, composto por Arnaldo Baptista, Sérgio Dias e Rita Lee.
Um outro problema, porém, se coloca. Haverá outro caminho de interface para além desta relação onde HQ e Música Pop buscam, uma na outra, inspiração, influências e confluências, geralmente através de citações? É comum, de certo modo, vermos HQs citando músicas e bandas, ou mesmo músicos tematizando quadrinhos (como Zé Ramalho utilizando o texto de uma HQ do Incrível Hulk em Força verde, ou ainda Jorge Ben cantando sobre Thor, o Deus do Trovão, personagem da Marvel Comics). Contudo, é possível que uma HQ seja realmente musical, através de um processo de sinestesia? Isto é, que da página impressa possa emergir para o leitor uma sensibilidade musical? E também o caso contrário: é possível que uma música se tome imagética a ponto de propiciar ao cérebro do ouvinte a formação de imagens esteticamente elaboradas a partir de notas musicais? Uma das experiências mais radicais na interlocução entre quadrinhos e música foi realizada no Brasil, em Tubarões voadores, parceria entre o músico da vanguarda paulistana Arrigo Bamabé e o quadrinista Luiz Gê. O resultado é uma obra dupla, onde a HQ possui o ritmo e a caótica cadência da música enquanto esta, por sua vez, encontra-se sincronizada com o tempo da HQ. Uma obra dupla? Provavelmente, já que tanto a HQ quanto a música podem ser experienciadas independentemente. Todavia, unindo-as, nasce desta relação um produto novo, diferente da soma de suas partes. Arte. Pop. E a Pop Art? Esta, sempre procurou na indústria cultural/cultura de massa o objeto a partir do qual raiaria o seu criar artístico. E poucas linguagens são tão pertinentes à indústria cultural quanto a Música Pop e as Histórias em Quadrinhos. Logo, não é de se estranhar que a própria Pop Art tenha buscado nelas uma fonte inspiradora para si mesma, conforme pode-se facilmente perceber na obra de Andy Warhol e Roy Lichtenstein. Entretanto, o caminho inverso também ocorreu. Com a explosão da Pop Art nos anos 60/70, tanto a Música Pop quanto as HQs foram até ela buscar influência, inspiração e diálogo.
Trata-se aqui de um jogo de palavras, uma pequena liberdade poética, na tentativa de transmitir o resultado ao mesmo tempo artístico e de estética p o p alcançado em Tubarões Voadores , bem com o introduzir a questão da Pop A rt no parágrafo seguinte.