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Guias e Dicas
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habeas corpus criminal nulidades, Notas de aula de Direito Penal

apreciação de uma decisão do superior tribunal de justiça

Tipologia: Notas de aula

2023

Compartilhado em 07/11/2023

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Superior Tribunal de Justiça
HABEAS CORPUS 725.534 - SP (2022/0051301-0)
RELATOR :MINISTRO RIBEIRO DANTAS
IMPETRANTE :JESSIKA ALVES ANTUNES FONTES
ADVOGADO :JESSIKA ALVES ANTUNES FONTES - GO059305
IMPETRADO :TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE : JOAO ROBERTO PEREIRA ALIBERTI (PRESO)
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
EMENTA
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. TRÁFICO
DE DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ART. 33, § 4º, DA
LEI N. 11.343/2006. DIRETRIZES FIRMADAS NO ERESP 1.887.511/SP.
USO APENAS SUPLETIVO DA QUANTIDADE E DA NATUREZA DA
DROGA NA TERCEIRA FASE. PROPOSTA DE REVISÃO DE
POSICIONAMENTO. MANUTENÇÃO DO ENTENDIMENTO
CONSOLIDADO ANOS PELAS CORTES SUPERIORES. ACOLHIDO
NO ARE 666.334/AM PELO STF. EXPRESSIVA QUANTIDADE DE
DROGA APREENDIDA. APLICAÇÃO DO REDUTOR EM 1/6. ORDEM
CONCEDIDA.
1. Esta Corte - HC 535.063/SP, Terceira Seção, Rel. Ministro Sebastião Reis
Junior, julgado em 10/6/2020 - e o Supremo Tribunal Federal - AgRg no HC
180.365, Primeira Turma, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 27/3/2020; AgR no
HC 147.210, Segunda Turma, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 30/10/2018 -,
pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do
recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da
impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato
judicial impugnado.
2. A Terceira Seção desta Corte, no julgamento do Eresp 1.887.511/SP, de
Relatoria do Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA (em 9/6/2021), fixou as
seguintes diretrizes para a aplicação do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006.
1 - a natureza e a quantidade das drogas apreendidas são fatores a serem
necessariamente considerados na fixação da pena-base, nos termos do
art. 42 da Lei n. 11.343/2006.
2 - sua utilização supletiva na terceira fase da dosimetria da pena, para
afastamento da diminuição de pena prevista no § do art. 33 da Lei n.
11.343/2016, somente pode ocorrer quando esse vetor conjugado com
outras circunstâncias do caso concreto que, unidas, caracterizem a
dedicação do agente à atividade criminosa ou a integração a
organização criminosa.
3 - podem ser utilizadas para modulação da causa de diminuição de pena
prevista no § do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 quaisquer circunstâncias
judiciais não preponderantes, previstas no art. 59 do Código Penal, desde
que não utilizadas na primeira etapa, para fixação da pena-base. (grifos no
original).
3. Embora tenha externado a minha opinião pessoal, inúmeras vezes, sobre a
impossibilidade de se aplicar a minorante especial da Lei de Drogas nos casos de
apreensões de gigantescas quantidades de drogas - p. ex. toneladas, 200 ou 300
kg - por ser deduzível que apenas uma pessoa envolvida habitualmente com a
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HABEAS CORPUS Nº 725.534 - SP (2022/0051301-0)

RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS

IMPETRANTE : JESSIKA ALVES ANTUNES FONTES

ADVOGADO : JESSIKA ALVES ANTUNES FONTES - GO

IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE : JOAO ROBERTO PEREIRA ALIBERTI (PRESO)

INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

EMENTA

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. TRÁFICO

DE DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ART. 33, § 4º, DA

LEI N. 11.343/2006. DIRETRIZES FIRMADAS NO ERESP 1.887.511/SP.

USO APENAS SUPLETIVO DA QUANTIDADE E DA NATUREZA DA

DROGA NA TERCEIRA FASE. PROPOSTA DE REVISÃO DE

POSICIONAMENTO. MANUTENÇÃO DO ENTENDIMENTO

CONSOLIDADO HÁ ANOS PELAS CORTES SUPERIORES. ACOLHIDO

NO ARE 666.334/AM PELO STF. EXPRESSIVA QUANTIDADE DE

DROGA APREENDIDA. APLICAÇÃO DO REDUTOR EM 1/6. ORDEM

CONCEDIDA.

1. Esta Corte - HC 535.063/SP, Terceira Seção, Rel. Ministro Sebastião Reis

Junior, julgado em 10/6/2020 - e o Supremo Tribunal Federal - AgRg no HC

180.365, Primeira Turma, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 27/3/2020; AgR no

HC 147.210, Segunda Turma, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 30/10/2018 -,

pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do

recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da

impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato

judicial impugnado.

2. A Terceira Seção desta Corte, no julgamento do Eresp 1.887.511/SP, de

Relatoria do Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA (em 9/6/2021), fixou as

seguintes diretrizes para a aplicação do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006.

1 - a natureza e a quantidade das drogas apreendidas são fatores a serem necessariamente considerados na fixação da pena-base , nos termos do art. 42 da Lei n. 11.343/2006. 2 - sua utilização supletiva na terceira fase da dosimetria da pena, para afastamento da diminuição de pena prevista no § 3º do art. 33 da Lei n. 11.343/2016, somente pode ocorrer quando esse vetor conjugado com outras circunstâncias do caso concreto que, unidas, caracterizem a dedicação do agente à atividade criminosa ou a integração a organização criminosa. 3 - podem ser utilizadas para modulação da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 quaisquer circunstâncias judiciais não preponderantes, previstas no art. 59 do Código Penal, desde que não utilizadas na primeira etapa, para fixação da pena-base. (grifos no original).

3. Embora tenha externado a minha opinião pessoal, inúmeras vezes, sobre a

impossibilidade de se aplicar a minorante especial da Lei de Drogas nos casos de

apreensões de gigantescas quantidades de drogas - p. ex. toneladas, 200 ou 300

kg - por ser deduzível que apenas uma pessoa envolvida habitualmente com a

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traficância teria acesso a esse montante de entorpecente, a questão não merece

discussão, uma vez que está superada, diante do posicionamento contrário do

Supremo Tribunal Federal. Precedentes.

4. Todavia, proponho a revisão das orientações estabelecidas nos itens 1 e 2 do

Eresp 1.887.511/SP, especificamente em relação à aferição supletiva da

quantidade e da natureza da droga na terceira fase da dosimetria.

5. No julgamento do ARE 666.334/AM, de Relatoria do Ministro Gilmar Mendes,

o Pleno do STF, em análise da matéria reconhecida como de repercussão geral,

reafirmou a jurisprudência de que "as circunstâncias da natureza e da quantidade

da droga apreendida devem ser levadas em consideração apenas em uma das

fases do cálculo da pena". O resultado do julgado foi assim proclamado:

Tese As circunstâncias da natureza e da quantidade da droga apreendida devem ser levadas em consideração apenas em uma das fases do cálculo da pena. Obs: Redação da tese aprovada nos termos do item 2 da Ata da 12ª Sessão Administrativa do STF, realizada em 09/12/2015. Tema 712 - Possibilidade, em caso de condenação pelo delito de tráfico de drogas, de valoração da quantidade e da natureza da droga apreendida, tanto para a fixação da pena-base quanto para a modulação da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006.

6. Portanto, diante da orientação consolidada há tempos pelas Cortes Superiores,

proponho mantermos o posicionamento anterior, conforme acolhido no ARE

666.334/AM, sobre a possibilidade de valoração da quantidade e da natureza da

droga apreendida, tanto para a fixação da pena-base quanto para a modulação da

causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, neste último

caso ainda que sejam os únicos elementos aferidos, desde que não tenham sido

considerados na primeira fase do cálculo da pena.

7. Precedentes recentes do STF no mesmo sentido: RHC 207256 AgR,

Relator(a): ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 18/12/2021; RHC

192.643 AgR, Relator: GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em

8. Hipótese em que o Juiz de origem afastou o redutor do tráfico privilegiado por

entender que a expressiva quantidade de droga apreendida (147 quilos de

maconha) não qualificaria o réu como pequeno e iniciante no comércio ilícito de

entorpecentes. Contudo, o STF tem posicionamento firme de que "A quantidade

de droga apreendida não é, por si só, fundamento idôneo para afastamento da

minorante do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006" (RHC 138117 AgR, Relatora:

ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 15/12/2020, publicado em 6/4/2021).

9. Assim, verificado o atendimento dos requisitos do art. 33, § 4º da Lei de

Drogas, reduzo a pena em 1/6, atento ao disposto no art. 42 da Lei n. 11.343.

(expressiva quantidade de droga apreendida - 147 quilos de maconha).

10. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, a fim de reduzir

a pena do ora agravante para 4 anos, 10 meses e 10 dias de reclusão, no regime

inicial semiaberto, mais o pagamento de 486 dias-multa.

ACÓRDÃO

Documento: 151920159 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJe: 01/06/2022 Página 2 de 3

HABEAS CORPUS Nº 725.534 - SP (2022/0051301-0)

RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS

IMPETRANTE : JESSIKA ALVES ANTUNES FONTES

ADVOGADO : JESSIKA ALVES ANTUNES FONTES - GO

IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE : JOAO ROBERTO PEREIRA ALIBERTI (PRESO)

INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO RIBEIRO DANTAS (Relator):

Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso próprio impetrado em favor de

JOÃO ROBERTO PEREIRA ALIBERTI , em que se aponta como autoridade coatora o

Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Consta dos autos que o paciente foi condenado como incurso no art. 33, caput ,

c/c o art. 40, V, ambos da Lei n. 11.343/2006, à pena de 5 anos e 10 meses de reclusão, em

regime inicial fechado, e pagamento de 583 dias-multa.

Em sede recursal, o Tribunal de origem negou provimento ao apelo da defesa.

Nesta Corte, o impetrante alega, em suma, ausência de motivação válida para o

afastamento da causa especial de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006.

Afirma que "o réu era um traficante eventual, pois era primário e possuidor de

bons antecedentes e não foi apreendido nenhum outro apetrecho destinado à traficância, a não

ser a substância entorpecente".

Requer o reconhecimento do tráfico privilegiado.

O Ministério Público Federal opinou pelo não conhecimento do writ (e-STJ, fls.

É o relatório.

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HABEAS CORPUS Nº 725.534 - SP (2022/0051301-0)

RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS

IMPETRANTE : JESSIKA ALVES ANTUNES FONTES

ADVOGADO : JESSIKA ALVES ANTUNES FONTES - GO

IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE : JOAO ROBERTO PEREIRA ALIBERTI (PRESO)

INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

EMENTA

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. TRÁFICO

DE DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ART. 33, § 4º, DA

LEI N. 11.343/2006. DIRETRIZES FIRMADAS NO ERESP 1.887.511/SP.

USO APENAS SUPLETIVO DA QUANTIDADE E DA NATUREZA DA

DROGA NA TERCEIRA FASE. PROPOSTA DE REVISÃO DE

POSICIONAMENTO. MANUTENÇÃO DO ENTENDIMENTO

CONSOLIDADO HÁ ANOS PELAS CORTES SUPERIORES. ACOLHIDO

NO ARE 666.334/AM PELO STF. EXPRESSIVA QUANTIDADE DE

DROGA APREENDIDA. APLICAÇÃO DO REDUTOR EM 1/6. ORDEM

CONCEDIDA.

1. Esta Corte - HC 535.063/SP, Terceira Seção, Rel. Ministro Sebastião Reis

Junior, julgado em 10/6/2020 - e o Supremo Tribunal Federal - AgRg no HC

180.365, Primeira Turma, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 27/3/2020; AgR no

HC 147.210, Segunda Turma, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 30/10/2018 -,

pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do

recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da

impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato

judicial impugnado.

2. A Terceira Seção desta Corte, no julgamento do Eresp 1.887.511/SP, de

Relatoria do Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA (em 9/6/2021), fixou as

seguintes diretrizes para a aplicação do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006.

1 - a natureza e a quantidade das drogas apreendidas são fatores a serem necessariamente considerados na fixação da pena-base , nos termos do art. 42 da Lei n. 11.343/2006. 2 - sua utilização supletiva na terceira fase da dosimetria da pena, para afastamento da diminuição de pena prevista no § 3º do art. 33 da Lei n. 11.343/2016, somente pode ocorrer quando esse vetor conjugado com outras circunstâncias do caso concreto que, unidas, caracterizem a dedicação do agente à atividade criminosa ou a integração a organização criminosa. 3 - podem ser utilizadas para modulação da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 quaisquer circunstâncias judiciais não preponderantes, previstas no art. 59 do Código Penal, desde que não utilizadas na primeira etapa, para fixação da pena-base. (grifos no original).

3. Embora tenha externado a minha opinião pessoal, inúmeras vezes, sobre a

impossibilidade de se aplicar a minorante especial da Lei de Drogas nos casos de

apreensões de gigantescas quantidades de drogas - p. ex. toneladas, 200 ou 300

kg - por ser deduzível que apenas uma pessoa envolvida habitualmente com a

traficância teria acesso a esse montante de entorpecente, a questão não merece

Documento: 147627308 - EMENTA, RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 2 de 8

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO RIBEIRO DANTAS (Relator):

Esta Corte - HC 535.063/SP, Terceira Seção, Rel. Ministro Sebastião Reis Junior,

julgado em 10/6/2020 - e o Supremo Tribunal Federal - AgRg no HC 180.365, Primeira Turma,

Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 27/3/2020; AgR no HC 147.210, Segunda Turma, Rel. Min.

Edson Fachin, julgado em 30/10/2018 -, pacificaram orientação no sentido de que não cabe

habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não

conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato

judicial impugnado.

Assim, passo à análise das razões da impetração, de forma a verificar a

ocorrência de flagrante ilegalidade a justificar a concessão do habeas corpus , de ofício.

Segundo se infere dos autos, o paciente foi condenado pelo delito de tráfico de

drogas à pena de 5 anos e 10 meses de reclusão, em regime fechado, porque, em 10/12/2013,

transportava 147 quilos de maconha (17 tijolos), em seu veículo, sem autorização legal ou

regulamentar (e-STJ, fls. 18-19).

O Juiz sentenciante negou o tráfico privilegiado nos seguintes termos:

Não haverá a redução presente na nova Lei n.11.342/06, em seu art. 33, par. 4°., não porque se presume ser o réu pertencente à organização criminosa e sim pela grande quantidade de droga apreendida, sendo tal beneficio impossível de se aplicar para quem transporta quase 150 (cento e cinquenta) quilos de "maconha".

A Corte de origem manteve afastado o redutor sob o entendimento de que o

transporte de expressiva quantidade de entorpecente e a falta de ocupação lícita indicaria ser o

paciente habitual na prática delitiva:

Por seu turno, as circunstâncias do caso não comungam com a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, par. 4', da Lei no 11.343/06. O réu usou um veículo (Honda/Civic) para transportar 15 tijolos de maconha (grande quantidade), de um Estado para o outro, sendo que receberia vantagem econômica para tanto, a indicar um acentuado envolvimento no comércio de drogas ou seja, a não ocasionalidade da conduta. Além disso, não demonstrou, a contento, o exercício de atividade lícita para seu sustento (fls. 38 - desempregado). Ou seja, um quadro a indicar que se trata de pessoa dedicada às atividades criminosas. [...] (e-STJ, fls. 47-48)

Todavia, antes de examinar propriamente o mérito deste habeas corpus ,

gostaria de convidar os Ministros da Quinta Turma para uma reflexão acerca do tema -

a aplicação da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006.

Preliminarmente, vale destacar que a Terceira Seção, em decisão de junho do ano

passado, no julgamento do Eresp 1.887.511/SP, de Relatoria do Ministro JOÃO OTÁVIO DE

NORONHA (julgado em 09/06/2021, DJe 01/07/2021), fixou as seguintes diretrizes sobre o

Documento: 147627308 - EMENTA, RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 4 de 8

assunto:

1 - a natureza e a quantidade das drogas apreendidas são fatores a serem necessariamente considerados na fixação da pena-base , nos termos do art. 42 da Lei n. 11.343/2006. 2 - sua utilização supletiva na terceira fase da dosimetria da pena, para afastamento da diminuição de pena prevista no § 3º do art. 33 da Lei n. 11.343/2016, somente pode ocorrer quando esse vetor conjugado com outras circunstâncias do caso concreto que, unidas, caracterizem a dedicação do agente à atividade criminosa ou a integração a organização criminosa. 3 - podem ser utilizadas para modulação da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 quaisquer circunstâncias judiciais não preponderantes, previstas no art. 59 do Código Penal, desde que não utilizadas na primeira etapa, para fixação da pena-base. (grifos no original).

Na verdade, busco um maior debate tão somente quanto às orientações

estabelecidas nos itens 1 e 2, ou seja, a aferição supletiva da quantidade e da natureza da

droga na terceira fase da dosimetria.

Embora tenha externado a minha opinião pessoal, inúmeras vezes, acerca da

impossibilidade de se aplicar a minorante especial da Lei de Drogas nos casos de apreensões de

gigantescas quantidades de drogas - p. ex. toneladas, 200 ou 300 kg... - por ser deduzível que

apenas uma pessoa envolvida habitualmente com a traficância teria acesso a esse montante de

entorpecente, reconheço que o assunto está superado, diante do posicionamento

contrário firmado pelo Supremo Tribunal Federal.

Observe-se:

"A quantidade de droga apreendida não é, por si só, fundamento idôneo para afastamento da minorante do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006". (RHC 138117 AgR, Relatora: ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 15/12/2020, public 06/04/2021).

E, da Segunda Turma:

"A quantidade de drogas, por si só, não pode proporcionar a presunção de que o paciente faria do tráfico seu meio de vida ou integraria uma organização criminosa" (HC 145362, Relatora: GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 04/02/2020, Public 20/03/2020).

Entretanto, situação diversa, é a do uso da quantidade e da natureza da droga na

terceira fase da dosimetria para modular a aplicação do redutor do art. 33, § 4º, da Lei n.

11.343/2006, amplamente aceita até então por esta Corte, e também pelo Supremo

Tribunal Federal.

No julgamento do ARE 666.334/AM, o Pleno do STF, em análise da matéria

reconhecida como de repercussão geral, reafirmou a jurisprudência de que "as circunstâncias da

natureza e da quantidade da droga apreendida devem ser levadas em consideração apenas em

uma das fases do cálculo da pena".

O resultado do julgado foi assim proclamado:

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ou de maior responsabilidade com organização criminosa, ou de dedicação ao crime, impõe-se o reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006. 5. Tendo em vista a aplicação da minorante do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas no patamar de 1/4 (um quarto), possível a fixação de regime prisional mais brando – semiaberto –, em atenção ao disposto no art. 33, § 2º, b, do Código Penal. 6. Agravo regimental conhecido e não provido. (HC 177.766 AgR, Relatora: ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 24/05/2021, Public 17/06/2021 - grifo nosso)

Ressalto, por oportuno, a decisão de 18/12/2021, na qual a Primeira Turma

do STF, embora tenha reiterado ser vedado o uso isolado da quantidade de droga para negar o

benefício especial da Lei de Drogas, fez incidir a aplicação da minorante no patamar de 1/

atenta "as circunstâncias concretas em que a Agravada, na condição de desempenhar papel

vulgarmente conhecido como mula, apesar de não integrar, de forma estável e permanente, a

organização criminosa, ‘têm plena e perfeita consciência de que estão a serviço de grupo dessa

natureza”, não merecendo, assim, uma redução maior’".

Confira a ementa:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS

CORPUS. CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. WRIT SUCEDÂNEO

REVISÃO CRIMINAL. PRESENTE SITUAÇÃO APTA A

EXCEPCIONAR ESSE ENTENDIMENTO. DOSIMETRIA DA PENA.

INCIDÊNCIA DA MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/2006.

QUANTIDADE DE DROGA. FUNDAMENTO ÚNICO PARA AFASTAR

O BENEFÍCIO LEGAL. INSUFICIÊNCIA. PATAMAR DE REDUÇÃO NA

FRAÇÃO MÍNIMA. POSSIBILIDADE. 1. Inadmissível o emprego do habeas corpus como sucedâneo de recurso ou revisão criminal, ressalvado, nesta última hipótese, serem os fatos incontroversos e presente situação excepcional de flagrante ilegalidade ou teratologia que autorize a concessão da ordem de ofício (HC 139.741/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe 12.4.2019, v.g.). 2. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a quantidade de droga apreendida não é, por si só, fundamento idôneo para afastamento da minorante do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006. Precedentes. 3. Considerada a primariedade, os bons antecedentes ostentados pela paciente, bem como ausentes fortes indícios de envolvimento com organização criminosa ou de dedicação ao crime, impõe-se o reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006. 4. Proporcional e razoável a fixação da minorante no patamar de 1/6 (um sexto), presentes as circunstâncias concretas reveladas nos autos. 5. Agravo regimental conhecido e não provido. (RHC 207256 AgR, Relator(a): ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 18/12/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-015 DIVULG 27-01-2022 PUBLIC 28-01-2022)

No mesmo sentido, as recentes decisões monocráticas do STF:

a) HC 210.906, Relatoria Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 29/12/2021: ordem parcialmente concedida para restabelecer a sentença que aplicou a minorante em 1/6 com fundamento na quantidade de droga

Documento: 147627308 - EMENTA, RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 7 de 8

apreendida – 8,8 quilos de maconha; b) HC 205.819, Relatoria Min. Cármen Lúcia, julgado em 27/8/2021: ordem concedida para reconhecer o bis in idem e determinar ao Tribunal de origem que quantidade de droga seja aferida na primeira ou na terceira fase

  • 900g de maconha; c) RHC 205.585, Relatoria Min. Gilmar Mendes, julgado em 16/9/2021: ordem concedida para aplicar a fração do redutor em 1/6 sopesando apenas a quantidade de droga – 2.843kg de maconha.

Outrossim, esta Corte de Justiça há mais de uma década vem orientando os

julgadores sobre a possibilidade de se considerar tais vetores na definição do índice de redução

(RHC 28.920/MS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 11/10/2011, DJe 19/10/2011; HC 159.108/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 11/10/2011, DJe 19/10/2011).

Portanto, diante da orientação consolidada há tempos pelas Cortes Superiores ,

não me parece adequado o acolhimento da proposta do uso apenas supletivo da quantidade e

da natureza da droga na terceira fase da dosimetria.

A adoção de tal posicionamento, resultará, em regra, na imposição de penas

diminutas - abaixo do patamar de 4 anos de reclusão, como decorrência da incidência da

minorante no grau máximo, ressalvados, obviamente, os casos de traficantes reincidentes ou

integrantes de grupos criminosos.

Em muitas condenações já julgadas definitivamente, haverá a redução drástica

das penas em crimes graves, a fim de se aplicar o novo posicionamento exposto no EResp

1.887.511/SP.

Como é a hipótese deste habeas corpus , em que tendo sido a quantidade de

droga o único vetor aferido para afastar o tráfico privilegiado, e sendo incabível sua utilização

isolada na terceira fase – como proposto o novo entendimento - o réu, condenado pela posse

de mais de 147 quilos de maconha - terá sua pena diminuída em 2/3, resultando definitiva em 1

ano e 8 meses de reclusão.

Sob tal contexto, proponho mantermos o entendimento anterior desta Corte,

acolhido em repercussão geral pelo STF, no julgamento do ARE 666.334/AM, sobre a

possibilidade de valoração da quantidade e da natureza da droga apreendida, tanto para

a fixação da pena-base quanto para a modulação da causa de diminuição prevista no art.

33, § 4º, da Lei 11.343/2006 -- neste último caso ainda que sejam os únicos elementos

aferidos -- , desde que não tenha sido considerada na primeira fase do cálculo da pena.

Em conclusão, e segundo as diretivas acima expostas, concedo em parte a ordem.

No caso, observa-se que a decisão impugnada está em confronto com o

entendimento do STF, porque concluiu pela habitualidade delitiva do agente considerando tão

somente a quantidade de droga encontrada (mais de 147 kilos de maconha). Assim, uma vez

constatado o atendimento dos requisitos do art. 33, § 4º da Lei de Drogas, reduzo a pena em 1/6,

atento ao disposto no art. 42 da Lei n. 11.343.2006 e condição de "mula" propriamente assumida

pelo agente, tornando-a definitiva em 4 anos, 10 meses e 10 dias de reclusão mais 486 dias-multa.

Ante o exposto, não conheço do habeas corpus. Contudo, concedo a ordem ,

de ofício, para fazer incidir a causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/

na fração de 1/6, redimensionando a pena do paciente para 4 anos, 10 meses e 10 dias de

reclusão, portanto no regime inicial semiaberto, mais pagamento de 486 dias-multa.

É o voto.

Documento: 147627308 - EMENTA, RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 8 de 8

Terceira Seção a respeito do precedente anterior é de suma importância, a fim de conferir maior

segurança jurídica.

Dito isto, estou de acordo com o voto trazido pelo Relator quanto à possibilidade

de consideração da quantidade de entorpecente na modulação da fração prevista no art. 33, §4.º,

da Lei n. 11.343/2006. No entanto, é preciso deixar claro que essa modulação não será legítima

na hipótese em que essa mesma quantidade de entorpecente já foi levada em consideração na

primeira etapa da dosimetria da pena, sob pena de bis in idem , na esteira do consolidado

entendimento do Supremo Tribunal Federal no âmbito do ARE 666.334/AM.

Nesse sentido, a fim de evitar dúvida quanto ao critério adotado pela Terceira

Seção, gostaria de sugerir ao eminente Relator que seja feito um pequeno acréscimo no item 6 da

sua ementa, nos seguintes termos: “[...] e desde que não tenham sido consideradas na

primeira fase do cálculo da pena”.

Isto é, a quantidade de entorpecente não poderá obstar, por si só a concessão do

benefício. Porém, uma vez reconhecido que o Acusado faz jus à referida causa de diminuição de

pena, a quantidade de drogas poderá amparar a modulação da fração escolhida pelo julgador

entre 1/6 e 2/3, desde que o montante de estupefaciente já não tenha sido considerado na

primeira fase do cálculo penal.

No mais, acompanho integralmente o eminente Relator quanto à solução dada ao

caso concreto.

Ante o exposto, não conheço do habeas corpus , porém, concedo a ordem de

ofício para fazer incidir a causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, na

fração de 1/3, redimensionando as penas e fixando o regime prisional semiaberto, nos termos do

voto do eminente Relator.

Documento: 153469252 - VOTO VOGAL - Site certificado Página 2 de 2

HABEAS CORPUS Nº 725534 - SP (2022/0051301-0)

RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS

IMPETRANTE : JESSIKA ALVES ANTUNES FONTES

ADVOGADO : JESSIKA ALVES ANTUNES FONTES - GO

IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE : JOAO ROBERTO PEREIRA ALIBERTI (PRESO)

INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA:

Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de JOÃO ROBERTO PEREIRA ALIBERTI,

contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Colhe-se dos autos que o paciente foi condenado, pela prática do art. 33, caput , c/c o art. 40,

V, da Lei n. 11.343/2006, às penas de 5 anos e 10 meses de reclusão em regime inicial fechado e de 583

dias-multa.

Interposta apelação pela defesa, o Tribunal a quo negou-lhe provimento.

Neste writ , a impetrante alega que o paciente preenche os requisitos legais para a incidência

da causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006, por ser primário, ter bons antecedentes e

por não ter sido apreendido nenhum apetrecho destinado ao tráfico.

Requer a concessão da ordem para que a pena seja redimensionada, com redução de 1/6 a

2/3, nos termos do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, com a consequente alteração do regime prisional.

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo não conhecimento da impetração (fls. 58-

60).

Incluído em mesa na sessão de 29/3/2022, a Quinta Turma afetou o julgamento do feito à

Terceira Seção.

Com a devida vênia ao eminente relator, Ministro Ribeiro Dantas, conquanto o notório

brilhantismo que lhe é peculiar, neste caso, ouso dissentir do voto aqui lançado, especialmente em relação

à proposta de alteração do entendimento firmado pela Terceira Seção no julgamento do REsp n.

1.887.511/SP.

Mendes, DJe de 19/2/2021), não sendo admissível, portanto, afastar um direito subjetivo por mera

inferência ou presunção.

A questão ora debatida é se, nos casos em que o acusado é primário, tem bons antecedentes,

não se dedica ao crime nem integra organização criminosa, pode o julgador aplicar fração de redução

menor (entre ⅔ a ⅙) quando a quantidade de drogas apreendida é significativamente grande.

Ou seja, pode o julgador modular a fração de redução com base na quantidade das drogas?

Pergunta-se ainda: Caso a quantidade e natureza da droga tenham sido utilizadas na primeira

fase da dosimetria, deve-se admitir, na terceira fase, sua utilização ara modular a fração de redução, ainda

que sejam os únicos elementos aferidos? Essa situação configurará ou não bis in idem?

Esse tema, aliás, foi objeto do julgamento do ARE n. 666.334/AM (com repercussão

geral) em 3/4/2014, quando o Supremo Tribunal Federal examinou a “possibilidade de se considerar a

quantidade e a qualidade da droga apreendida tanto na primeira fase de fixação da pena, como

circunstância judicial desfavorável, quanto na terceira, para modular a aplicação da causa especial de

diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006”.

Naquela assentada, o STF fixou a tese que "a natureza e a quantidade de entorpecentes" não

podem ser utilizadas em duas fases da dosimetria da pena, sob pena de incidência em inconstitucional bis

in idem (Tema n. 712).

Em harmonia com essa orientação jurisprudencial, a Terceira Seção do STJ, no julgamento

do REsp n. 1.887.511/SP, do qual fui relator, fixou o entendimento de que, nos crimes de tráfico, na

primeira etapa da dosimetria da pena, deve-se necessariamente considerar o elemento preponderante

"natureza e quantidade do entorpecente apreendido" para fixação da pena-base, dado o princípio da

especialidade.

Nessa linha de raciocínio, na ocasião, considerei que essa circunstância, por ser

preponderante, não deveria ser reservada para outras fases da dosimetria, para as quais o legislador não

tenha previsto, de forma específica, sua utilização.

Nesse ponto, registro que, em processos nos quais a natureza ou a quantidade de

entorpecentes encontrados em poder do réu sejam os únicos elementos negativos em seu desfavor, a

consideração desses vetores na primeira fase da dosimetria (e não na terceira) se traduz, normalmente,

como alternativa mais benéfica ao acusado.

No procedimento de fixação da pena, há duas tendências gerais: uma voltada à exasperação

das penas por meio de agravantes, majorantes e qualificadoras; outra, de mitigação por atenuantes,

minorantes e privilegiadoras. A primeira tendência que caminha em direção a penas mais duras, por

vezes, confronta-se com a exigência de humanização do sistema penal.

Considerando que o bem jurídico tutelado no crime de tráfico de drogas é a saúde pública,

por certo, a conduta de quem transporta grande quantidade de drogas é mais censurável e, em razão disso,

deve receber maior punição por revelar maior gravidade do injusto penal.

Em atenção ao maior dano, o legislador poderia ter previsto uma agravante ou majorante

para a conduta do tráfico de grande quantidade de drogas, porém não o fez.

Na verdade, apontou o maior desvalor da conduta expressamente no comando do art. 42 da

Lei n. 11.343/2006, determinando que essa circunstância seja valorada na primeira fase da dosimetria,

preponderantemente em relação às demais circunstâncias judiciais do art. 59 do CP.

A política de “guerra às drogas” adotada pelas instituições de segurança, por vezes, faz-me

lembrar aquela cena em que Alice, personagem de Lewis Carroll, encontra-se com a Rainha Vermelha,

que lhe ordena: “Vamos, Alice, corra! Corra mais! Mais rápido!”. Alice corre velozmente, porém, já

exausta, de repente, percebe que não saiu do lugar. A lógica paradoxal naquele estranho País das

Maravilhas , na verdade, era a de que, quanto mais se corre, menos se sai do lugar.

Quando se considera grande o volume de drogas apreendido, o julgador tende a impor penas

mais altas, mesmo que em retribuição a traficantes iniciantes ou de “primeira viagem”.

Assim, permite-se que indivíduos que ainda não estão totalmente enfronhados no mundo do

crime sofram os efeitos dessocializantes da privação de liberdade. No afã de prevenir a reiteração delitiva,

paradoxalmente, colocam-se esses indivíduos em contato com facções criminosas que irão, sim, integrá-lo

profunda e definitivamente ao mundo do crime. Nesses casos de tráfico privilegiado, o rigor judicial no

combate às drogas torna o efeito do “remédio” mais deletério que a própria “doença”.

O papel do Judiciário, na luta contra as drogas, é de garantidor dos direitos individuais, da

racionalidade e coerência do sistema penal. Por isso, reitero, deve ser mantida a limitação à criatividade

judicial contrária ao réu, tendo em vista a função primordial do direito penal que é limitar o poder

punitivo estatal.

Sem pretender ser demasiado redundante, insisto em que o tráfico privilegiado é instituto

criado para beneficiar aquele que ainda não se encontra mergulhado nessa atividade ilícita,

independentemente do tipo ou do volume de drogas apreendidas.

Cumpre-nos, pois, revigorar o entendimento da plena eficácia do art. 42 da Lei n.

11.343/2016, que exige a observância do indicado vetor na fixação da pena-base, já que o Superior

HABEAS CORPUS Nº 725.534 - SP (2022/0051301-0)

VOTO

O SENHOR MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ:

O caso diz respeito a habeas corpus afetado pela Quinta Turma

para a Terceira Seção, com a finalidade de se fazer uma reinterpretação do que

decidido, em sessão realizada no dia 9/6/2021, por ocasião do julgamento do

REsp n. 1.887.511/SP (Rel. Ministro João Otávio de Noronha , DJe

1º/7/2021), especificamente em relação aos itens 1 e 2 da proposta feita à

época, quais sejam:

1 - a natureza e a quantidade das drogas apreendidas são fatores a serem necessariamente considerados na fixação da pena-base, nos termos do art. 42 da Lei n. 11.343/2006;

2 - sua utilização supletiva na terceira fase da dosimetria da pena, para afastamento da diminuição de pena prevista no § 3º do art. 33 da Lei n. 11.343/2016, somente pode ocorrer quando esse vetor seja conjugado com outras circunstâncias do caso concreto que, unidas, caracterizem a dedicação do agente à atividade criminosa ou a integração a organização criminosa;

A questão que se coloca, basicamente, é a seguinte: caso a

natureza e/ou a quantidade de drogas apreendidas não haja sido considerada na

primeira fase da dosimetria, para fins de exasperação da pena-base, pode-se

admitir a sua utilização na terceira etapa, para modular a fração de diminuição

de pena relativa à minorante descrita no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006?

Parece-me que o tema em debate é o que hoje mais ocupa esta

Corte na Seção Criminal. Temos cerca de 30% do volume de trabalho

relacionado a tráfico de drogas, seja para questionar prisão cautelar, seja para

se insurgir contra regime inicial de cumprimento da reprimenda, seja para

discutir a própria individualização da pena, como no presente caso.

Em boa parte, essas dúvidas giram em torno da aplicabilidade ou

não da minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas, que, conforme

é cediço, se trata de uma causa especial de diminuição de pena, na qual se

Documento: 152316627 - VOTO - Site certificado Página 1 de 4

fixam os requisitos, quais sejam, além da primariedade e dos bons antecedentes

do acusado, que este não integre organização criminosa nem se dedique a

atividades delituosas.

Quando a lei assim o diz, cria uma possibilidade de diminuição

de pena (de 1/6 a 2/3), para um tipo penal que prevê pena em abstrato de 5 a

15 anos de reclusão. E a lei fala de primariedade e bons antecedentes. É

importante procurar o significado de cada palavra e parece-me que, quando a

lei se refere a bons antecedentes, a meu modo de sentir, é uma qualidade de

alguém cuja vida é inquestionável do ponto de vista de sua relação com a

jurisdição, alguém que não tenha nenhum tipo de processo, nem sequer em

andamento.

Se a natureza do instituto em análise é justamente tratar com

menor rigor o indivíduo que se envolve circunstancialmente com o tráfico

de drogas – e que, portanto, não possui maior envolvimento com o

narcotráfico ou habitualidade na prática delitiva –, não me parece razoável

punir aquele que ostenta diversas anotações penais em seu desfavor da mesma

forma que um traficante que não possui nenhum registro criminal contra si.

Pessoalmente, vejo algo diferente entre dizer que uma pessoa

tem maus antecedentes ou afirmar que ela possui bons antecedentes, porque,

se sempre exigirmos o critério de condenação definitiva, praticamente

estaremos igualando isso a uma reincidência, embora, é bem verdade, a

jurisprudência haja sido construída nesse sentido, de modo que não se pode

considerar maus antecedentes processos em andamento ou mesmo condenação

ainda sem a certificação do trânsito em julgado (em homenagem ao princípio

da presunção de não culpabilidade).

Não obstante isso, como se trata de uma causa de diminuição de

pena, parece-me que se deveria exigir que o agente fosse realmente primário e

que tivesse bons antecedentes, o que afastaria a incidência do benefício àqueles

que tenham processos já julgados, com sentença ainda sujeita a recurso. Essa,

no entanto, é uma discussão que não comporta no presente caso.

Contudo, apenas gostaria de tomar esse exemplo para dizer que

a jurisprudência que se tem construído – tanto no STF quanto nesta Corte –

acaba, na prática, esvaziando, sobremaneira , esse dispositivo legal, no que

diz respeito ao sentido que, a meu sentir, deveria dele se extrair.

É de rigor consignar que uma interpretação teleológica do art.

33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 à luz da política criminal de drogas instituída

Documento: 152316627 - VOTO - Site certificado Página 2 de 4