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fundação getulio vargas escola de direito de são paulo, Notas de estudo de Direito

Parceria imobiliária em loteamentos urbanos / Pablo Meira Queiroz. ... jurídica do contrato de parceria imobiliária, nega-lhe a capacidade ...

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Amazonas
Amazonas 🇧🇷

4.4

(80)

224 documentos

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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
ESCOLA DE DIREITO DE SÃO PAULO
PABLO MEIRA QUEIROZ
PARCERIA IMOBILIÁRIA EM LOTEAMENTOS URBANOS
SÃO PAULO
2016
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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

ESCOLA DE DIREITO DE SÃO PAULO

PABLO MEIRA QUEIROZ

PARCERIA IMOBILIÁRIA EM LOTEAMENTOS URBANOS

SÃO PAULO

PABLO MEIRA QUEIROZ

PARCERIA IMOBILIÁRIA EM LOTEAMENTOS URBANOS

Dissertação apresentada à Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, como requisito para obtenção do título de Mestre em Direito. Orientador: Prof. Mario Engler Pinto Junior

SÃO PAULO

PABLO MEIRA QUEIROZ

PARCERIA IMOBILIÁRIA EM LOTEAMENTOS URBANOS

Dissertação apresentada à Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, como requisito para obtenção do título de Mestre. Linha de Pesquisa: Direito dos Negócios

Data de Aprovação: 04/11/

Banca Examinadora:

Prof. Dr. Mário Engler Pinto Jr. (Orientador)

Prof. Dr. André Rodrigues Corrêa

Prof. Dr. Pedro Ricardo e Serpa

Prof. Marcelo Terra

RESUMO

As parcerias imobiliárias constituem modelo negocial desenvolvido pelo mercado imobiliário, mais especificamente, o de loteamentos, por meio do qual proprietários de terrenos se associam a desenvolvedores imobiliários para a implementação desses empreendimentos. Apesar de largamente difundidas enquanto modelo negocial, as parcerias imobiliárias não foram, até hoje, objeto de tratamento legislativo. Este trabalho discutirá as principais características da modelagem negocial, especialmente a alocação de riscos e responsabilidades, os efeitos das decisões de autoridades fiscais sobre o tratamento das partes nesses contratos e as estruturas alternativas empregadas pelo mercado. Ao final, tentará apontar os motivos pelos quais a parceria imobiliária subsiste no mercado de loteamentos e sugerir aprimoramentos ao modelo.

Palavras-chave : Loteamento. Parceria imobiliária. Estruturas alternativas.

SUMÁRIO

    1. INTRODUÇÃO
    1. METODOLOGIA
    1. A PARCERIA IMOBILIÁRIA
    • 3.1. Campo de aplicação
    • 3.2. Características gerais
      • 3.2.1. Estrutura contratual: a prática negocial
      • 3.2.2. Regime jurídico
      • 3.2.3. O problema da alocação de riscos
      • 3.2.4. Tributação
    • 3.3. Vantagens e desafios operacionais
    1. ESTRUTURAS ALTERNATIVAS
    • 4.1. Joint Venture personificada: a sociedade de propósito específico (SPE)
    • 4.2. Joint Ventures despersonificadas
      • 4.2.1. Sociedade em conta de participação (SCP)
      • 4.2.2. Consórcio
    1. O FUTURO DA PARCERIA IMOBILIÁRIA
    • 5.1. Avaliação crítica em face das estruturas alternativas
    • 5.2. Alterações ao marco legal
      • 5.2.1. Alteração pontual
      • 5.2.2. Alteração abrangente
    1. CONCLUSÃO
  • REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1. INTRODUÇÃO

Os loteamentos urbanos são a fronteira mais promissora do mercado imobiliário brasileiro no médio e no longo prazo. Com os gargalos existentes nas maiores cidades do País, o crescimento para o interior é natural, até inevitável. Some-se a isso a possibilidade de viver em bairros planejados de acordo com as melhores práticas urbanísticas atuais, como calçadas largas e fiação subterrânea, ou mesmo a sensação de segurança proporcionada por comunidades, em muitos casos, fechadas. Apesar de promissor, trata-se de mercado ainda não consolidado, com muitos agentes econômicos locais e poucos nacionais. As barreiras de entrada são poucas e o segmento vem atraindo, nos últimos anos, a atenção de investidores institucionais^1 e grupos de outros setores econômicos, especialmente do agronegócio, beneficiados pela aproximação (às vezes absorção) de parte de suas propriedades rurais com os centros urbanos.^2 Esse segmento do mercado imobiliário sofre, como tantos outros no País, com a escassez de fontes de financiamento, tanto por não ser atendido pelas linhas incentivadas de financiamento à habitação, quanto pela dificuldade na formatação de instrumentos de mercado de capitais compatíveis com as peculiaridades dos loteamentos, a despeito de se notar um crescimento nas emissões de certificados de recebíveis imobiliários (CRI) lastreados nas carteiras de venda de loteadoras. Se ainda é possível apontar uma certa falta de sofisticação no mercado imobiliário como um todo, mesmo com a acentuada evolução vivida nos últimos anos – especialmente a partir de 2006, quando o País passou a vivenciar a abertura de capital de diversas empresas do setor e a entrada maciça de investidores institucionais – , o segmento de loteamentos é expoente dessa carência de modelos negociais complexos e coadunados com a evolução do mercado e das estruturas de governança e compliance , bem como dos órgãos reguladores e das autoridades fiscais, com capacidade fiscalizatória cada vez maior. É nesse contexto que nasceu e se consolidou uma modelagem negocial – arrisca-se dizer

  • exclusiva do mercado de loteamentos: a parceria imobiliária. Por meio dessa estrutura, o proprietário de um imóvel associa-se a uma empresa com expertise em desenvolvimento de

(^1) Os fundos HSI e Carlyle foram pioneiros, investindo, respectivamente, em duas tradicionais empresas paulistas, a CIPASA Urbanismo (2010) e a Scopel (investimento inicial em 2006 e aquisição da totalidade da empresa em 2013), seguidos, mais recentemente, pelo Pátria, que adquiriu o controle da Alphaville Urbanismo em 2013. 2 Sobre a entrada de empresas do agronegócio no segmento de loteamentos, é ilustrativa a notícia publicada pelo Valor Econômico em 27/10/2014, sobre a criação de um braço de desenvolvimento imobiliário pela Usina São Martinho (Disponível em: <http://www.valor.com.br/agro/3751662/grupo-sucroalcooleiro-sao-martinho-anuncia- parceria-imobiliaria-em-sp>. Acesso em: 12 set. 2016.).

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vantagens e desafios das parcerias imobiliárias (Capítulo 3). Em seguida, serão abordados alguns modelos empregados pelo mercado em substituição à parceria: o consórcio, a sociedade em conta de participação e a joint venture personificada em sociedade de propósito específico (SPE), a partir de uma análise comparativa dessas figuras contratuais (Capítulo 4). O Capítulo 5 partirá da problematização apresentada nos capítulos anteriores e discutirá possíveis mudanças no marco legal, para que, ao final do trabalho, possamos apontar os motivos pelos quais a parceria imobiliária subsiste no mercado de loteamentos e discutir possíveis aprimoramentos ao modelo negocial.

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2. METODOLOGIA

Este trabalho é fruto de pesquisa jurídica profissional aplicada, cujo objeto é um arranjo contratual – a parceria imobiliária para desenvolvimento de loteamentos urbanos – aqui tratado em seus aspectos conceituais e estratégicos. A pesquisa toma por base a observação da realidade feita pelo autor como participante do mercado imobiliário e busca sistematizar um conhecimento prático difundido entre os participantes desse mercado, porém – e até pela falta de sistematização – de difícil acesso àqueles estranhos a esse universo. Além de sistematizar conhecimento existente, tornando-o mais acessível como consequência, o trabalho busca o aprimoramento e qualificação do conhecimento e das práticas sobre a parceria imobiliária. O nítido caráter empírico da pesquisa tem viés qualitativo e não quantitativo, muito por conta da inexistência de uma base de dados organizada e da confidencialidade de que se revestem, via de regra, os arranjos contratuais examinados. É a experiência profissional do advogado-pesquisador que permite os juízos de fato ao longo deste trabalho. Sobre essa experiência profissional, o autor é advogado e atua com negócios imobiliários desde o ano 2000, tendo iniciado ainda como estagiário. Em sua trajetória, passou por escritórios com perfis de clientes distintos, o que lhe permitiu interagir com os diferentes agentes do mercado, tendo representado, no campo dos loteamentos urbanos, terrenistas^1 , desenvolvedores imobiliários, investidores e estruturadores de produtos de financiamento à produção e à aquisição dos bens. Essa diversidade de interesses envolvidos na atuação profissional do autor em relação ao tema da pesquisa contribui para a neutralidade e imparcialidade do trabalho. A trajetória profissional do autor e a interação com os diferentes agentes do mercado ao longo dos anos permitiu o desenvolvimento do trabalho sem que este dependesse sobremaneira de certas fontes de pesquisa caras ao direito para a consecução dos objetivos assumidos, como a realização de entrevistas ou de uma revisão mais abrangente das fontes formais de pesquisa jurídica (doutrina e jurisprudência). Não há nessas fontes formais obra ou decisão paradigmática para o tema ora tratado, exceto, talvez e em certa medida, pelas decisões das autoridades fiscais citadas na introdução.

(^1) Terrenista é um neologismo empregado largamente pelo mercado imobiliário para designar aquele que, no desenvolvimento de um projeto, contribui com o terreno, isto é, com a propriedade imobiliária sobre a qual será desenvolvido o empreendimento, sem prejuízo de poder também assumir outras contribuições para a consecução do projeto.

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3. A PARCERIA IMOBILIÁRIA

As parcerias, de forma geral, pressupõem a existência de três elementos caracterizadores comuns, de combinação necessária para sua caracterização, a saber: a associação de agentes (pluralidade subjetiva), que comungam esforços para uma finalidade comum , dividindo os riscos e o produto (ganhos ou perdas) da atividade. Esses três elementos caracterizadores da parceria aproximam-na da ideia de empresa, de que se distingue, considerando que a atividade que é objeto da parceria pode ser puramente intelectual, como as parcerias musicais, enquanto a empresa desenvolve atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços. Embora a ideia de parceria seja bastante difundida e recorrente no mundo dos negócios e nas atividades cotidianas da vida em sociedade, o vocabulário jurídico nacional privilegia expressões de conteúdo e alcance equivalentes ou similares, como “companhia”, “sociedade”, “empresa”, “consórcio”, “associação” e até a importada “ joint venture ”, além de outras derivadas dessas, como a expressão “contratos associativos”, utilizada na legislação de defesa da concorrência (Lei n. 12.529/2011). Basta notar que a palavra “parceria” não ocorre uma única vez no Código Civil brasileiro. Nesse sentido, não há na legislação federal brasileira tratamento das parcerias enquanto gênero ou, em outras palavras, enquanto modalidade associativa que pode ser utilizada nos mais diversos tipos de empreitadas – econômicas e intelectuais. Contudo, algumas espécies do gênero parceria mereceram atenção especial no ordenamento jurídico brasileiro, dentre as quais se destaca, até pela proximidade com o objeto deste trabalho, a parceria rural, regulada no Estatuto da Terra (Lei n. 4.504/1964). A parceria rural está inserida, ao lado do arrendamento rural, entre os contratos que garantem uso ou posse temporária da terra. É modalidade de contrato agrário por força da qual o proprietário de imóvel rural cede temporariamente a posse da área, com ou sem benfeitorias e outros bens passíveis de utilização na produção, a um produtor, dividindo com ele os riscos intrínsecos à atividade, que pode ser de exploração agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativa vegetal ou mista, e recebendo, em contrapartida, uma parcela da produção.^1 Diferencia-se a parceria rural do arrendamento justamente pelo escopo mais abrangente daquela, envolvendo atividades comuns e partilha de riscos, enquanto a cessão do uso ou posse, no arrendamento, não está associada a uma comunhão de esforços entre proprietário da terra e

(^1) Cf. artigo 96, § 1º, do Estatuto da Terra.

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arrendatário, que deve arcar com a contraprestação pactuada no contrato independentemente do êxito da atividade agrícola. Em comum, ambos os contratos têm seu conteúdo fortemente dirigido e delimitado pelo Estatuto da Terra, que regula prazos e, no caso da parceria, até mesmo o percentual máximo da produção que pode ser atribuído ao proprietário da terra em razão da sua contribuição e do tipo de atividade desenvolvido. Vê-se que estão presentes na parceria rural os três elementos caracterizadores da parceria indicados anteriormente, quais sejam: (a) a pluralidade subjetiva, entre o proprietário da terra e o produtor rural; (b) a finalidade comum, que é a exploração de atividade agrária; e (c) a partilha dos riscos – mercadológicos e naturais – e do produto da atividade agrária. A parceria imobiliária apresenta, em seus elementos qualificadores, estrutura muito semelhante à parceria rural. Lá como cá, há um proprietário de imóvel, não produtor, que se associa a terceiro para proceder à exploração econômica comum do seu ativo, com partilha de riscos e produto da atividade. Porém, não se confundem, seja pelo campo de aplicação (loteamento vs. atividades agrícolas), pela qualificação jurídica (atipicidade vs. tipicidade jurídica) ou pelo grau de flexibilidade (conteúdo livre vs. conteúdo essencial definido em lei). Cada um desses diferenciadores será melhor abordado a seguir. Também é possível encontrar figura similar à parceria imobiliária na partnership norte- americana. O Revised Uniform Partnership Act de 1997 (RUPA) define partnership como a “associação de duas ou mais pessoas para desenvolver, como donos, negócio voltado ao lucro” (EUA, 1997, tradução nossa).^2 Há, nessa definição, os três elementos da parceria mencionados acima, além de um novo, que é o controle compartilhado ( co-ownership ) do negócio. Porém, esse controle compartilhado não implica, necessariamente, a participação de todos os sócios na administração ordinária do negócio, admitindo-se a presença de sócios investidores que tenham posição passiva em relação ao negócio.^3 Embora a seção 201 da RUPA reconheça a partnership como uma entidade distinta dos seus sócios, boa parte da legislação norte-americana tende a não atribuir personalidade jurídica à partnership , a exemplo do que ocorre com a parceria imobiliária.^4 O campo de aplicação das partnerships é bastante amplo e envolve os mais diversos ramos de negócios (e desde que haja um negócio, e não apenas uma situação de condomínio ou

(^2) RUPA, in verbis : “Section 101 (6): ‘Partnership’ means an association of two or more persons to carry on as co- owners a business for profit formed under Section 202, predecessor law, or comparable law of another jurisdiction”. 3 4 Nesse sentido, Coffee Jr. et al.^ (2010,^ p.^63 e^ 64). RUPA: “Section 201 (a): A partnership is an entity distinct from its partners”. Em contraste, Coffee Jr. et al. (2010, p. 69) sustentam que “[…] the law of partnership exhibits much less tendency to treat partnerships as entities separate and distinct from their owners than does corporate law”.

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conhecimento das normas e – é preciso admitir – bom trânsito nos órgãos de aprovação de projetos. Tanto o loteamento, quanto o desmembramento implicam o parcelamento do solo, daí resultando a criação de novos lotes (enquanto partes de um todo que se subdivide). A principal diferença conceitual entre um e outro é o aproveitamento ou não de sistema viário existente, que ocorre no desmembramento, mas não no loteamento. Por não se aproveitar de sistema viário já existente, os loteamentos costumam demandar, para sua viabilidade, extensas porções de terra, envolvendo escalas maiores que a de um simples desmembramento. Em breves linhas, no âmbito da Lei de Loteamento, o loteamento pode ser definido como a subdivisão de um imóvel (urbano ou em área definida como destinada à expansão urbana, em diversos lotes), com a construção de novas vias de circulação e/ou a ampliação do sistema viário existente, bem como com a implantação de infraestrutura básica de abastecimento e coleta de água e esgoto, iluminação pública, ligação dos lotes com a rede das concessionárias desses serviços públicos e equipamentos comunitários (áreas verdes, áreas de lazer etc.), com a subsequente incorporação do empreendimento assim desenvolvido à paisagem urbana. Entretanto, para os fins deste trabalho e delimitação do campo de aplicação das parcerias imobiliárias, mais do que o conceito de loteamento, importa entender os processos e os papéis dos agentes envolvidos na execução desse tipo de empreendimento. O responsável legal pela implantação de um loteamento é chamado de loteador. Ao contrário do que ocorre nas incorporações imobiliárias – em que a Lei n. 4.591/1964 (Lei de Incorporações) permite que sejam responsáveis pelo empreendimento o proprietário, o titular de direito real de aquisição do imóvel, construtor ou corretor de imóveis – , a Lei de Loteamento atribui privativamente ao proprietário do imóvel a legitimidade para promover loteamento.^7 Isso gera um problema de alocação de riscos, já que o proprietário não é, necessariamente, a pessoa com maior capacitação para o desenvolvimento do empreendimento e assunção das responsabilidades dele decorrentes, tema que será melhor explorado em tópico específico deste trabalho. A exemplo do que ocorre nas incorporações imobiliárias, é vedada a comercialização de lotes antes de registrado o loteamento na competente circunscrição imobiliária, e a inobservância deste mandamento pode sujeitar o loteador a sanções administrativas, civis e criminais. O registro do loteamento, por sua vez, pressupõe a prévia aprovação do

(^7) Exceto na hipótese do artigo 18, § 4º, da Lei de Loteamento, pela qual União, Estados, Distrito Federal, Municípios ou suas entidades delegadas, poderão implantar projetos de parcelamento destinados à habitação de população de baixa renda antes de concluído o respectivo processo de desapropriação da área.

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empreendimento pelo Poder Público e, nesse ponto, costumam surgir dois problemas recorrentes para a aprovação de obras no Brasil, especialmente quando envolvem infraestrutura (ainda que em pequena escala): a burocracia e a imprevisibilidade. O processo de aprovação de um projeto de loteamento envolve diversas etapas e, como visto antes, pode também envolver diversas esferas da Administração Pública, conforme dimensões e caraterísticas peculiares do projeto e/ou do imóvel que será subdividido. O primeiro passo^8 é a obtenção, pelo loteador, de uma certidão emitida pela prefeitura local (ou o Distrito Federal, se for o caso), contendo as diretrizes “para o uso do solo, traçado dos lotes, do sistema viário, dos espaços livres e das áreas reservadas para equipamento urbano e comunitário”.^9 É com base nessas diretrizes que o loteador elaborará o projeto de loteamento, que será, então, submetido à aprovação do Poder Público. Com maior recorrência na fase de aprovação do que na de diretrizes, pode haver a necessidade de manifestação de órgãos estaduais, principalmente quando o projeto envolver área muito extensa, criação de um número significativo de lotes, áreas de especial interesse de preservação, ou quando estiver situado em área que compreenda mais de um município ou grande região metropolitana. Mesmo dentro de cada esfera federativa (estado e município), por vezes é necessário obter o consentimento de diversos órgãos e secretarias, em procedimento pouco integrado, o que pode retardar bastante a aprovação. Se não bastasse o complexo roteiro para elaboração e aprovação do projeto, há outras questões comumente enfrentadas para que se viabilize o registro de um loteamento; dentre as mais recorrentes: necessidade de promover retificações de registro, fusões e desdobros de imóveis, providências para regularização dominial (imóveis objeto de inventário não concluído ou envolvidos em litígio, por exemplo), procedimento para conversão de imóveis rurais em urbanos^10 etc. Todo esse emaranhado de providências de aprovação e regularização imobiliária faz com que existam casos de projetos de loteamento cuja aprovação se estende por cerca de cinco anos. Uma vez aprovado o projeto de loteamento, deve o loteador promover o seu registro na circunscrição imobiliária competente, apresentando, entre outros documentos, um memorial

(^8) Ressalvados os casos de dispensa da fase de diretrizes, previstos no artigo 8º da Lei de Loteamento para “[m]unicípios com menos de cinqüenta mil habitantes e aqueles cujo plano diretor contiver diretrizes de urbanização para a zona em que se situe o 9 parcelamento”. 10 Cf. artigo 6º da Lei de Loteamento. Por envolverem grandes extensões de terra, muitos loteamentos são planejados sobre imóveis rurais, que, para a viabilização do projeto, devem ser convertidos em imóveis urbanos, o que pode implicar a necessidade de alteração da regulamentação municipal de uso e ocupação do solo para que passe a incluir dito imóvel em perímetro urbano ou de expansão urbana.

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complexo. Some-se a isso o descasamento entre as despesas do projeto e o seu fluxo de receitas, agravado pela de escassez de crédito e de linhas de financiamento específicas e adequadas às peculiaridades do setor.

3.2. Características gerais

Traçado o panorama geral do campo de aplicação das parcerias imobiliárias, com as principais fases do projeto e funções dos envolvidos, torna-se mais clara a apresentação e discussão das características gerais dos contratos de parceria imobiliária. Como mencionado na Introdução, o proprietário de um imóvel associa-se a uma empresa com expertise em desenvolvimento de projetos urbanísticos e construção, para a implantação de empreendimento imobiliário composto de lotes individuais de terreno, contribuindo o primeiro com o imóvel de que é titular e a segunda, com a concepção do projeto sob o ponto de vista urbanístico e mercadológico, com as aprovações do Poder Público e a execução das obras de infraestrutura. Trata-se, portanto, de contrato que promove uma comunhão de esforços e de ativos tangíveis (e.g. terreno e obras) e intangíveis (e.g. projeto urbanístico e estratégia de vendas). A finalidade da parceria imobiliária, no modelo que é objeto deste estudo, é bastante restrita, consistindo na implantação de loteamento urbano, regido pela Lei n. 6.766/1979. Cada contrato envolve um único projeto, embora cada projeto, no sentido aqui empregado, possa abranger mais de um imóvel ou mais de um loteamento. Isso porque é possível que, na formação do contrato, o terrenista possua imóveis contíguos, os quais deverão ser unificados para viabilizar o desenvolvimento do projeto. Da mesma forma, é possível que, por conveniência urbanística ou mercadológica, o desenvolvedor imobiliário opte por implantar o empreendimento em fases distintas, o que pode implicar o desmembramento de uma área em tantas quantas forem as fases de implantação. Nesse caso, cada fase de implantação configurará, tecnicamente, um loteamento distinto. Admitir que um mesmo contrato possa envolver múltiplos imóveis ou loteamentos não implica dizer que a parceria imobiliária pode ter finalidade ou objeto indeterminado. Na verdade, a existência de uma finalidade determinada ou determinável^11 parece ser da essência

(^11) Admite-se, aqui, que a parceria imobiliário tenha objeto determinável nos casos em que o contrato apresente definições abertas acerca da extensão de um determinado imóvel que será destinada ao loteamento, do número de glebas em que será desmembrado para permitir o desenvolvimento de mais de um empreendimento, ou mesmo de características essenciais do loteamento, como número exato de lotes, área e destinação de cada um deles, o que é

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do modelo negocial. As partes – terrenista e desenvolvedor imobiliário – associam-se para a consecução de um projeto específico de loteamento. Ainda que esse projeto envolva, na origem, mais de um imóvel, ou venha a ser implantado como loteamentos distintos e sucessivos, há uma unidade negocial subjacente que não permite a dissociação de todas as áreas ou etapas do projeto das condições acordadas para a parceria. Não nos parece, assim, ser possível falar em parceria imobiliária para a aquisição e desenvolvimento de projetos indeterminados. Nesse caso, o acordo entre as partes caracterizará uma modalidade de joint venture de objeto aberto, mas não uma parceria imobiliária na modelagem aqui abordada, nem mesmo na forma de contrato preliminar. A duração da associação é diretamente determinada pela sua finalidade, devendo, em regra, viger o contrato até que sejam (a) concluídas e aprovadas pelo Poder Público todas as obras de infraestrutura previstas, (b) alienados todos os lotes que compõem o loteamento e (c) recebidos todos os valores devidos em decorrência da alienação dos lotes. É possível, contudo, que as partes prevejam contratualmente momento anterior para a extinção da parceria imobiliária, ou mesmo condições resolutivas. Se a extinção, por advento do termo ou implementação de condição resolutiva, ocorrer após o registro do loteamento na circunscrição imobiliária competente, a solução mais usual e adequada é a partilha dos lotes entre o terrenista e o desenvolvedor imobiliário, para que cada um deles realize a comercialização de seus ativos. Para que isso ocorra, algumas obrigações do contrato de parceria extinto devem ser preservadas, notadamente a obrigação do terrenista de destinar o imóvel à implantação do projeto, permanecendo, na qualidade de loteador, como responsável legal, e a obrigação do desenvolvedor imobiliário de realizar as obras de infraestrutura previstas no projeto e obter sua final aprovação perante o Poder Público. Quando há a extinção do contrato anteriormente ao registro do loteamento, é possível discutir se se teria aperfeiçoado ou não a parceria imobiliária, dada a sua finalidade específica e o fato de que o loteamento não terá existido. Essa discussão pode ser importante para o reconhecimento individual das despesas incorridas por cada parte até então, embora seja relativamente mitigada pelo fato de que não terão as partes auferido renda nesse caso. Em qualquer cenário, caberá ao contrato regular eventuais obrigações de reembolso ou indenização, conforme a parte ou o evento que tenha causado a resolução. Outro elemento importante da parceria imobiliária é a inexistência de personalidade jurídica ou de qualquer forma de afetação patrimonial entre os participantes. Na parceria

corriqueiro. Porém, esse estado de indeterminação deve ser temporário no âmbito da parceria, que deverá conter os procedimentos para a especificação (determinação) do seu objeto.