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psicologia organizacional e do trabalho, que considero ser a experiência ... refere à seleção, Fátima realizava apenas uma entrevista final com os ...
Tipologia: Notas de estudo
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Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia Social e Institucional. Orientadora: Profª. Drª. Maria da Graça Corrêa Jacques.
Na atual fase do capitalismo, o quadro de desemprego ensejou maior oferta de mão- de-obra, e os investimentos em tecnologia contribuíram para que essa mão-de-obra se tornasse cada vez mais descartável, com repercussões na atividade de selecionar pessoas para os postos de trabalho. Considerando a relação entre os processos de seleção de pessoal e de exclusão do mercado de trabalho, e a recorrência desta atividade no campo da psicologia organizacional e do trabalho, este estudo se propôs a identificar as experiências e vivências de psicólogas que realizam esta atividade no seu cotidiano de trabalho. Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com dez psicólogas, submetidas à análise de conteúdo, buscando uma compreensão à luz do referencial teórico norteador da pesquisa. Os resultados apontam para uma diversidade de modalidades de seleção de pessoal, com experiências e vivências também diferenciadas. Vivências positivas foram associadas ao ideário humanista de ajuda ao próximo. Embora a responsabilização do candidato pela sua exclusão no mercado seja um fato, também foram relatadas vivências de sofrimento que tendem a diminuir com os anos de experiência na atividade. Constatou-se, também, que, não obstante haja introdução de novos métodos e técnicas de seleção de pessoal, a atividade mantém como objetivo prever o grau de adaptação do indivíduo ao cargo e à organização, o que vai ao encontro de alguns princípios norteadores da psicologia desde a sua constituição como disciplina independente.
Palavras-chave : seleção de pessoal, experiências e vivências, psicologia organizacional e do trabalho.
APTIDÃO
Abre a porta. Entra o Senhor Pacheco.- Bom dia, Senhor Pacheco. Sente-se, por favor. Temos uma ótima notícia parao senhor.
Luis Fernando Veríssimo
No campo da psicologia organizacional e do trabalho, a seleção de pessoal é uma das atividades mais recorrentes. É, também, a que suscita maiores questionamentos, e o texto de Luis Fernando Veríssimo ilustra, de modo irônico, o espaço de poder que desfruta no cenário organizacional. Ademais, o poder de decisão atribuído aos encarregados de selecionar candidatos a empregos frente ao crescente acirramento na disputa pelos postos de trabalho suscita uma reconstrução de procedimentos e incita a uma reflexão sobre a contextualização desta prática no conjunto social.
Apesar de o processo da construção de uma dissertação ser produzido por muitas mãos e ser perpassado por muitos olhares (a orientação recebida, as trocas com os colegas, o próprio campo de investigação, citando apenas alguns exemplos), a singularidade como cada pesquisador vivencia este processo é moldada conforme sua implicação com o objeto de estudo. Assim, na intenção de apresentar o percurso que contribuiu para as formulações propostas nesta pesquisa, escrevo, diferentemente dos demais capítulos, o presente texto na primeira pessoa.
das informações obtidas com Fátima no mês de março de 2005, em um reencontro amistoso e repleto de emoção.
Caso Sentinela
Fátima ingressou na Companhia X como estagiária de psicologia organizacional no ano de 1979, quando se encontrava no sétimo semestre da graduação. Seu ingresso na empresa se deu através de processo seletivo. Realizou um ano de estágio obrigatório e foi convidada a permanecer estagiando por mais um ano, pois seu desempenho foi avaliado positivamente. Fátima aceitou este convite e realizou mais um ano de estágio na Companhia X, que então teve caráter extracurricular. No primeiro ano como estagiária, a atividade predominante era seleção de pessoal. Havia muitas indicações políticas de candidatos, pois, de acordo com Fátima, a empresa funcionava como “cabide de empregos”. Apesar das indicações, os candidatos eram submetidos a avaliações psicológicas, tornando o cotidiano de trabalho bastante repetitivo:
“(...) seleção que tu já tá até de saco cheio, porque vira uma mesmice, né,só muda o candidato (risos), porque o resto tudo é igual.” No segundo ano de estágio, outras atividades começaram a ser desenvolvidas, ampliando seu âmbito de atuação. Após a formatura, Fátima foi trabalhar realizando avaliações psicológicas de crianças em um consultório de neurologia. Ficou pouco tempo nessa atividade, pois na metade do ano seguinte recebeu a proposta para retornar à Companhia X, desta vez como psicóloga efetiva. Fátima aceitou e confessa ter ficado surpresa com o convite.
Em 1982, Fátima iniciou sua carreira como psicóloga na Companhia X. A empresa enquadrava-se na categoria de grande porte e, nesse período, possuía um gabinete de psicologia estruturado com seis psicólogas e vinte estagiários. Durante os sete anos seguintes, a empresa praticamente conservou seu quadro de pessoal, o que tornou a seleção uma atividade ocasional. Novos programas, como grupos de preparação para a aposentadoria e grupos de gestantes, foram sendo desenvolvidos pelo setor de psicologia e, neste percurso, três das seis psicólogas se desligaram por decisão pessoal, restando Fátima e mais duas colegas.
Na metade da década de 1990, a empresa abriu um grande número de vagas e houve um processo seletivo através de concurso público. Fátima admite que foi bastante expressivo o número de candidatos inscritos em relação ao número de postos oferecidos, revelando uma crescente disputa no mercado de trabalho:
“(...) a questão, que eu acho, é dificuldade de trabalho, de desemprego.Tanto que a exigência desse concurso era primeiro grau e, assim, destes primeiros trezentos que a gente avaliou, um tinha só primeiro grau, todos osoutros segundo grau completo e, muitos, na época, a gente não fez uma pesquisa, teria até os dados pra fazer, tá, pra ver os percentuais, masmuitos com curso superior em andamento ou completo.”
Uma das etapas seletivas deste concurso era o chamado exame psicotécnico, realizado por Fátima e suas duas colegas. Esta situação foi geradora de constrangimentos, pois diversos candidatos contestaram na justiça o resultado da avaliação, o que fez a direção da empresa abolir esta etapa e substituí-la pela avaliação do desempenho dos candidatos no período de estágio probatório.
Pouco tempo depois, ainda enquanto a Companhia X era estatal, foi implantado o primeiro Plano de Demissão Voluntária (PDV) na empresa, que contou com a adesão de aproximadamente trinta por cento do quadro de funcionários,
Fátima, nesse período, algumas áreas da empresa foram terceirizadas e outras desapareceram, como foi o caso da área da saúde, à qual pertencia.
Fátima refere ter experienciado situações de muito sofrimento e, com a intenção de se fortalecer para enfrentá-las, retornou ao tratamento psicoterápico. Ao contrário do que imaginara, não foi designada para oferecer apoio psicológico aos demitidos, mas exerceu atividades operacionais, orientando as pessoas desligadas nas questões burocráticas do processo. Questionamentos acerca de sua posição na organização eram constantes:
“Tive que lidar com esse paradoxo assim de... bom, eu tô aqui, eu podia táaí, meu grupo tá aqui... Que que eu fiz pra estar deste lado da mesa e não do outro, nesse momento?”
Com o final do último plano de demissão se aproximando, Fátima passou a ser responsável pelo Programa de Qualidade de Vida que então iniciava. Ao constatar que toda a sua área desaparecera, buscou saber junto ao dirigente se estavam com intenções de demiti-la, pois nesse caso, iria aderir ao PDV. Foi-lhe assegurado que seus serviços ainda seriam necessários, principalmente no momento em que a empresa começasse a admitir, pois já se previa a necessidade de profissionais com novas qualificações, que pudessem atender à demanda de modernização tecnológica, prevista no ramo de atividade da empresa em questão.
Suas atividades estavam restritas ao assessoramento dos processos de seleção de pessoal e à implantação do Programa de Qualidade de Vida. No que se refere à seleção, Fátima realizava apenas uma entrevista final com os candidatos encaminhados pelas consultorias de recursos humanos contratadas, pois estas realizavam o restante do processo. Refere que apenas dava um “vistaço” nos
candidatos e lhes apresentava a empresa. Aplicava um teste em formato de software quando necessário, pois era padrão da empresa. Considerava esta uma atividade “tranqüila”, referindo que “contratar era melhor do que demitir”. Já o Programa de Qualidade de Vida era percebido por Fátima como uma atividade paradoxal, pois este previa atividades de integração entre os funcionários, além do desenvolvimento de “hábitos saudáveis” como cafés da manhã na empresa, caminhadas, ginástica laboral, entre outras. No entanto, o clima que vigorava era de desgaste e de incertezas, uma vez que as demissões ainda estavam acontecendo, mesmo que em menor escala:
“E a gente até dizia, eles querem que a gente faça uma festa de Carnaval enós estamos trabalhando na UTI (...) Muita contradição, de ter que lidar com aquelas coisas de chegar em casa e dizer, meu Deus, isso é pra inglês ver!Isso de qualidade de vida, porque ela tá sacaneando com uma mão e tá agradando com outra.” Os últimos dois anos de Fátima como psicóloga da Companhia X foram repletos de tensão:
“Agora, as pessoas com quem a gente lidava, pra quem a gente tavaoferecendo o Programa de Qualidade de Vida, o tempo todo nos confrontavam com esta situação: escuta, mas o que que é que querem?Tão demitindo todo mundo e tão dando café da manhã!? E aí tu tinha que fazer de conta que tu não tinha ouvido nada (risos)... É a mesma empresaque faz isso... é a tua mãe que tem o seio bom, que tem o seio mau (risos).” Apesar dos questionamentos de Fátima, ela menciona que estava lutando para permanecer na empresa, tanto porque tinha um salário muito compensador, mas também porque se sentia capaz de realizar as atividades propostas. Todavia, sabendo da possibilidade de ser demitida a qualquer momento, mantinha sempre as contas organizadas, sem fazer dívidas, para que não fosse surpreendida. E finalmente chegou a sua vez:
“Eu acho que a empresa continua muito política, muito estatal em algunsaspectos, né, eu acho que estes foram alguns dos aspectos que eu tenha
A contratação de pessoal para um posto de trabalho em organizações públicas ou privadas se faz através de algum processo de seleção que implica a escolha, entre aqueles que se candidatam, dos que preenchem os requisitos desejáveis para o cargo. O ideal de compatibilização entre os homens e suas atividades já se encontra proposto por Platão, na República 5 , quando defende a seleção dos homens de acordo com suas habilidades como forma de melhor adaptá- los às tarefas e assim contribuir para o desenvolvimento social. Tal argumentação justifica o processo de seleção, mesmo quando um único candidato disputa um determinado posto de trabalho.
No cenário atual, o número de trabalhadores disponíveis, aliado à crescente competição no mundo do trabalho, torna a seleção de pessoal um importante produto de consumo no mercado. Uma ampla literatura com a promessa de aumentar as chances de colocação profissional através da elucidação dos mistérios que estão por trás da seleção pode ser facilmente encontrada nas prateleiras de
(^5) PLATÃO. A República. trad. C. A. Nunes, 3. ed. revisada, Belém: UFPA, 2000.
livrarias. Além disso, inúmeros especialistas realizam palestras e fornecem entrevistas nos meios de comunicação sobre dicas para um desempenho satisfatório nos processos seletivos, revelando estratégias de marketing pessoal e, também, o que consideram os mitos e as verdades da seleção de pessoal. Notadamente, esta temática está popularizada e sua legitimação não causa qualquer estranhamento.
No campo de atuação da psicologia, a seleção de pessoal para as atividades laborais é uma demanda constante desde a consolidação do sistema taylorista 6 de produção. O plano traçado por Taylor previa o emprego de trabalhadores com as aptidões necessárias para o exercício eficaz de tarefas que lhe eram atribuídas, buscando, através da fragmentação entre planejamento e execução, o controle do trabalho pela gerência. Segundo Taylor 7 (citado por Braverman, 1987, p. 99), “a seleção do homem não implica encontrar algum indivíduo extraordinário, mas, simplesmente, apanhar um entre os tipos comuns que são especialmente apropriados para esse tipo de trabalho”.
Heloani (2003) refere que as práticas de seleção, elaboradas como uma extensão da cientificidade do departamento de planejamento, constituíram-se, para Taylor, em uma de suas inovações mais significativas. A seleção científica do trabalhador teria tanta importância, pois, por trás das metáforas da capacidade e da opção do trabalhador aos novos métodos de gestão, ocultava-se a expectativa de sua adesão aos princípios da administração científica.
(^6) Aspectos sobre a organização do trabalho no sistema taylorista são abordados no capítulo que segue. Além disso, uma síntese teórica acerca dos princípios das teorias gerenciais formuladas porFrederic W. Taylor (1856-1915) e Henry Ford (1863-1947) pode ser encontrada em CATTANI, A.D. (Org).2002. Dicionário crítico sobre trabalho e tecnologia. 4. ed. Petrópolis: Vozes; Porto Alegre: Ufrgs, (^7) TAYLOR, F. W. Princípios de administração científica. 8. ed. São Paulo: Atlas, 1995.
psicólogas 8 que realizam a atividade de seleção de pessoal em suas práticas de trabalho. Os termos experiências e vivências foram emprestados da conceituação proposta por Tittoni (1994), embasada em concepções de Dejours (1999) 9 e de Thompson (1981) 10 acerca da expressão de formas de vivenciar as experiências concretas no mundo do trabalho. Os termos procuram expressar as maneiras como os trabalhadores vivenciam as experiências cotidianas de trabalho, considerando as especificidades que as constituem.
A vivência correspondente à dimensão subjetiva da experiência, estando os dois conceitos interrelacionados. O exemplo de Tittoni (1994) é ilustrativo desta articulação, quando experiências semelhantes são vivenciadas diferentemente por trabalhadores:
(...) condições que podem parecer a um técnico, em determinado aspectodo processo produtivo, como adversas – contaminação por produtos químicos, por exemplo – podem ser vivenciadas como uma possibilidade dedemonstração de vigor e coragem por parte de outros trabalhadores (p.33). Segundo a autora, Thompson (1981) centra sua análise em como o sujeito lida com sua experiência de inserção em determinado contexto cultural e a experiência abrange aspectos que pressionam e partilham o processo social e histórico. Nessa perspectiva, os valores, sentimentos e vontades estão presentes na compreensão do processo, da mesma forma que as necessidades ou os interesses peculiares estão relacionados aos grupos sociais.
Considerando-se que o local de trabalho é um espaço no qual processos organizativos são conduzidos visando alcançar determinados fins, este espaço se
(^8) A expressão no gênero feminino se deve ao fato de todas as participantes da presente pesquisa serem mulheres. (^9) DEJOURS, C. A banalização da injustiça social. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1999. (^10) THOMPSON, E. P. A miséria da teoria : ou um planetário de erros; uma crítica ao pensamento de Althusser. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.
molda pelas pessoas, papéis de trabalho, procedimentos técnicos, máquinas e equipamentos, valores, ideologia, cultura, regras, interesses, estruturas de poder e mecanismos de controle (SATO, 2003). Assim sendo, a vivência corresponde não só ao que as pessoas pensam ou conhecem, mas ao que faz sentido para elas diante deste contexto. Dejours (1999) compreende a vivência do trabalhador como a questão central para o entendimento da sua condição e das formas como se configuram as relações entre o sujeito e o trabalho. Para o autor, os trabalhadores vivenciam afetivamente as situações de trabalho:
Afetivamente, isto é, sob a forma de uma emoção ou de um sentimentoque não é apenas um conteúdo de pensamento, mas sobretudo um estado do corpo. A afetividade é o modo pelo qual o próprio corpo vivenciaseu contato com o mundo. A afetividade está na base da subjetividade. A subjetividadesubjetividade éé dada,da categoria acontece, do nãoinvisível. é uma O criação.sofrimento O essencialnão se vê.da Tampouco a dor. O prazer não é visível. Esses estados afetivos não sãomensuráveis. São vivenciados ‘de olhos fechados’. O fato de que a afetividade não possa jamais ser medida nem avaliada quantitativamente,de que ela pertença ao domínio das trevas, não justifica que se lhe negue a realidade, nem que se despreze os que dela ousam falar de modoobscurantista. Ninguém ignora o que sejam o sofrimento e o prazer, e todosexperiência interior. Tudo quanto se possa mostrar do sofrimento e do sabem que isso só se vivencia integralmente na intimidade da prazer não é senão sugerido. Negar ou desprezar a subjetividade e aafetividade é nada menos que negar ou desprezar no homem o que é sua humanidade, é negar a própria vida (p.29). A importância de compreender experiências e vivências é apontada por Porto (2005) como o grande desafio da ciência moderna: o de “enfrentar a complexidade e os mistérios do viver, fornecendo sentido às ações humanas” (p.834). Sato e Bernardo (2005) e Brito (2005) também se referem à importância a ser conferida aos saberes oriundos das experiências de trabalho, das vivências pessoais, singulares e compartilhadas.
Constatou-se uma escassa produção teórica nas bases de dados científicos (CAPES, PsycINFO, IndexPsi) sobre as experiências e vivências daqueles que exercem atividades de seleção de pessoal no âmbito da psicologia, apesar da