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A Etimologia e a Semântica das Palavras: Origem e Significado, Notas de aula de Latim

Uma introdução à etimologia e semântica de palavras, duas disciplinas importantes da linguística moderna. A etimologia se preocupa com a origem das palavras, enquanto a semântica estuda seu significado. O texto aborda a história da etimologia, as ciências da linguagem relacionadas, as intimidades entre origem e significado, a etimologia popular e a importância de considerar o contexto de comunicação. O documento também discute a importância de evitar interpretar palavras apenas por meio de etimologia popular e a necessidade de cautela e prudência na utilização da etimologia.

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Lula_85
Lula_85 🇧🇷

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FACULDADE ANCHIETA
CURSO DE LETRAS
CARLOS ALMEIDA DE JESUS
ETIMOLOGIA – ESPECULAÇÃO E MAU USO
SÃO BERNARDO DO CAMPO
2008
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FACULDADE ANCHIETA

CURSO DE LETRAS

CARLOS ALMEIDA DE JESUS

ETIMOLOGIA – ESPECULAÇÃO E MAU USO

SÃO BERNARDO DO CAMPO

CARLOS ALMEIDA DE JESUS

ETIMOLOGIA – ESPECULAÇÃO E MAU USO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Letras da Faculdade Anchieta, de São Bernardo do Campo, como requisito parcial para obtenção do grau de Licenciado em Letras: Português - Inglês e respectivas literaturas. Orientador: Prof. Ms. Homero Nogueira

SÃO BERNARDO DO CAMPO

RESUMO

Dentre as ciências da linguagem determinadas a estudar as palavras, duas adquiriram importante papel no que se refere à Lingüística moderna: a Etimologia – preocupada com a origem, e a Semântica – empenhada no estudo do significado. A primeira trata-se de uma disciplina praticada desde a Antigüidade. Naquele tempo, pouco se sabia sobre a história das palavras, então essa prática consistia em especular suas origens, tentando explicá-las a partir de suposições e analogias. Outros aspectos sobre a palavra ainda eram desconhecidos, como sua definição e a proximidade existente entre sua origem e significado. Esses estudos passaram a ser amplamente desenvolvidos a partir do final do século XIX. No entanto, verifica-se ainda hoje, o fenômeno da especulação, o qual ocorre, basicamente, de duas maneiras: por meio da massa de praticantes de uma língua que a modificam através dos tempos, e pelos oportunistas que se aproveitam do grande interesse popular sobre o assunto para impor suas descobertas fantásticas como regimento do uso “correto” das palavras.

Palavras-chave: Especulação. Palavra. Origem. Significado. Etimologia.

ABSTRACT

Among the sciences of the language determined to study the words, two acquired important function in what it refers to the modern Linguistics: the Etymology – concerned with the origin, and the Semantics – determined in the study of the meaning. The first consists of a discipline practiced from the Antiquity. At that time, little it was known about the history of the words, then that practice consisted of speculating their origins, trying to explain them, starting from suppositions and analogies. Other aspects on the words were not elucidated yet, as their definition and the existent proximity between their origin and meaning. Those studies became highly developed starting from the end of the century XIX. However, it is still verified today the phenomenon of the speculation, which happens, basically, in two ways: through the apprentices of a language community who modify it through the times, and because of opportunists that take advantage of the great popular interest on the subject to impose your fantastic discoveries as regiment for the “correct” use of the words.

Key words: Speculation. Word. Origin. Meaning. Etymology.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...........................................................................................................

1 ETIMOLOGIA – ESPECULAÇÃO E MAU USO .....................................................

1.1 O Objeto: As Palavras ...................................................................................... 1.1.1 Definição de Palavra ..........................................................................................

1.2 As Ciências da Linguagem e as Palavras ....................................................... 1.2.1 Intimidade Entre Origem e Significado das Palavras ..................................

1.3 Especulação Etimológica ................................................................................ 1.3.1 Etimologia Popular ............................................................................................ 1.3.2 Etimologistas de Todo Tipo ..............................................................................

1.4 Limitação Etimológica ......................................................................................

2 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................

REFERÊNCIAS .........................................................................................................

INTRODUÇÃO

À área de estudos que se preocupou com o passado das palavras deu-se o nome de Etimologia (do grego << verdade >>), uma disciplina que há muito tempo investiga a origem das palavras. Ela mostra, tipicamente, que há continuidade entre a forma e o sentido que as palavras têm hoje, e a forma e o sentido que apresentavam em fases mais antigas da língua (ILARI, 2006). Essa análise etimológica das palavras é uma espécie de arqueologia dos significados, que vai esbarrar fatalmente numa limitação intrínseca do próprio material lingüístico, limitação que deverá ser levada em conta por todos que recorrem a esse tipo de análise. O tema tem interessado desde as ciências psíquicas até aqueles que não possuem conhecimento específico na área, pois a história das palavras está longe de ser insípida e desinteressante ao mais comum dos mortais. É com vivo entusiasmo e prazer que o homem acompanha as incursões nessa área, desmontando as palavras a fim de saber o segredo profundo do seu significado (BECHARA, s/d apud LUFT,1996). Na maioria das línguas importantes do Ocidente, essa busca pela origem das palavras vai levar ao latim, e este, ao grego.

Há, pelo menos, cem anos, os estudos sobre a linguagem humana têm se intensificado. Descobriram-se muitas coisas que, até então, não eram consideradas ou refletidas pelo homem. Não sabíamos, por exemplo, que ao estudar a linguagem humana, poderíamos adquirir um conhecimento mais profundo sobre o próprio homem. Surgiram, então, diversos segmentos de pesquisa, que deram origem às ciências da linguagem que conhecemos hoje: a Morfologia, a Sintaxe, a Fonética, a Semântica, entre outras.

A idéia que desencadeou esta pesquisa veio do estudo introdutório dessas ciências durante nosso curso de graduação, sobretudo as aulas de Latim e de Lingüística. Foi a partir disso, que nasceu o desejo de abordar esta disciplina milenar - a Etimologia, traçando um paralelo com os estudos lingüísticos subseqüentes a ela, os quais avançam ininterruptamente, para tentar descobrir os seus limites e suas aplicabilidades, haja visto, na atualidade, a banalização da Etimologia e o freqüente mau uso que se tem feito dela. E por isso, verificar as causas e os efeitos da

Entendemos que será necessário permear esta pesquisa não somente com o que propõe as ciências da linguagem que dão ênfase à palavra, mas também dar exemplos verdadeiros e atuais que comprovem a situação de caos etimológico enfrentado pelos usuários de língua portuguesa e o oportunismo daqueles que se atrevem a encontrar etimologias e razões para o emprego “correto” das palavras. Contudo, não nos prenderemos à descrição teórica dessas ciências. Buscaremos fundamentar nossos argumentos, em contraponto ao mau uso da Etimologia tradicional, nas teorias e nos estudos desenvolvidos nos últimos cento e quarenta anos, estamos falando dos estudiosos da língua e da linguagem desde Saussure e Bakhtin a Luft, Koch, Bagno e outros lingüistas. E, para a análise e refutação dos vocábulos, nos quais mostraremos a propagação de etimologias errôneas, serão utilizadas três excelentes fontes de conhecimento etimológico como base fundamental, são elas: Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa (CUNHA, 1982), Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (HOUAISS, 2001) e O Romance das Palavras (LUFT, 1996).

1 ETIMOLOGIA – ESPECULAÇÃO E MAU USO

Em primeiro lugar, é preciso salientar que a acepção tomada para especulação, neste trabalho, é a de conjectura maldosa ou não baseada em fatos concretos, que além de ser a mais aceita atualmente, encontra-se registrada no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001). Definido o termo, fica, desde já, mais clara, a abordagem que foi proposta na Introdução acima, podendo, então, dar-se início à explanação do objeto.

1.1 O Objeto: As Palavras

Os Antigos se preocupavam com as palavras no sentido de sua origem e de sua significação. As coisas que mais os intrigavam eram: as mudanças de significado e o comportamento das palavras na fala. Contudo, até ali, as considerações daqueles que se interessavam por esse assunto, tratavam apenas de conhecimento empírico, especulação.

O interesse pelas palavras tornou-se vivo e universal, ao ponto de ser um tema, por diversas vezes e por diferentes autores, poetizado no decorrer da história. Para Wordsworth:

Visionary power Attends the motion of the viewless winds, Embodied in the mystery of words.^1 (WORDSWORTH, 1850 (The Prelude. Livro V apud ULLMANN, 1962).

(^1) O poder visionário está atento aos movimentos dos ventos invisíveis, encarnados no mistério das palavras. (N.T.)

defini-la em função de cada língua. Por isso questiona-se se as expressões give up e to go out do inglês podem representar, respectivamente duas e três palavras ou, cada uma das expressões, equivalentes a apenas uma palavra. É necessário que para cada língua encontre-se uma definição apropriada (MARTINET, s/d apud BLECUA, 1979).

1.2 As Ciências da Linguagem e as Palavras

Segundo Stephen Ullmann (1962), há dois ramos importantes da Lingüística que tratam diretamente das palavras: um é a Etimologia, que estuda a origem das palavras – um dos ramos mais antigos da Lingüística - e o outro é a Semântica que estuda o significado das palavras. Esta última, pode-se dizer, é uma ciência recente, porém isto não depreende que os Antigos fossem indiferentes aos problemas do significado. Por outro lado, a Etimologia é uma disciplina de há muito enraizada, já adquirira especial importância na antiga filosofia grega. No Século I, foi considerada como uma das três principais divisões dos estudos lingüísticos, ao lado da Morfologia e da Sintaxe. Naquele tempo havia duas escolas de pensamento que se divergiam: os naturalistas, que acreditavam na existência de uma relação intrínseca entre o som e o sentido das palavras, e os convencionalistas que sustentavam ser essa relação tão somente arbitrária. Muito tempo depois, com a abertura dos estudos lingüísticos, impulsionados por Ferdinand Saussure, veio comprovar-se que não existe relação direta entre a palavra e o objeto ao qual ela nomeia.

A relação é estritamente arbitrária. Não há qualquer relação natural entre os sons que servem para expressar esta ou aquela noção, este ou aquele objeto, em qualquer língua, com a significação dessa mesma noção ou objeto. E é essa arbitrariedade que faz a linguagem humana tão original (MARTINET, s/d apud BLECUA, 1979). Em face dessa descoberta, aproximam-se as noções de origem e significado das palavras.

1.2.1 Intimidade entre Origem e Significado das Palavras

Até o início do Século XIX a contribuição dos estudos etimológicos manteve uma posição chave no estudo da linguagem. Mas, o avanço das pesquisas em relação à significação das palavras fez surgir uma outra divisão de estudos dentro da Lingüística, a qual recebeu o nome de Semântica, com a finalidade principal de analisar o sentido que as palavras recebem em toda e qualquer situação de uso.

A busca da raiz de uma palavra ou de um grupo de palavras já não é mais hoje a tarefa única da Etimologia. Ela deve mostrar-nos o percurso das transformações léxico-semânticas às quais a palavra atravessou; e não deve considerar as palavras isoladamente, mas como elementos constitutivos de grupos mais amplos (ULLMANN, 1962).

Assim, nos últimos anos, a relação entre Etimologia e Semântica tem-se tornado cada vez mais próxima e bem-sucedida, e não há como abordar Etimologia sem incorrer ou resvalar na semântica das palavras ou, dito de outro forma, a análise do sentido de uma palavra, não raro, requererá a busca por algum traço etimológico seu, seja para referência, comparação ou mesmo para mostrar o distanciamento entre o sentido original e o sentido atribuído a ela dentro de um outro contexto. Por isso, é possível afirmar que a Etimologia complementa e integra as ciências da linguagem mais recentes como: a Lexicologia, a Filologia, a Semântica, a Semiologia, a Semiótica, a Lingüística Textual etc. que se ocupam dos processos de significação, haja visto que os significados das palavras são dados dentro de um contexto de comunicação, levando em consideração a função do ato comunicativo e os efeitos de sentido provocados. Porém, é a utilização inadequada da Etimologia que a faz parecer oposta a essas ciências.

De acordo com Ullmann (1962), a princípio, a Semântica foi considerada como um estudo histórico, e nada mais. Seus estudiosos prendiam-se apenas ao estudo das mudanças de significado e das suas causas e pretendiam classificá-las a partir de princípios lógicos, psicológicos e outros, a fim de estabelecer, possivelmente, regras gerais. No entanto, a partir do Século XX, essa ciência vem caminhando a passos largos, o centro de interesses passou de princípios gerais ao estudo de línguas

aproximações equivocadas. Assim, pequinês vira pequenês – ignora-se o que seja o radical pequin- (< Pequim) e apoia-se no tamanho do animal. Outro caso (só para mostrar que Etimologia Popular não é particularidade da língua portuguesa) é o da ligação que se faz do termo do inglês ear - orelha, com seu homônimo ear – espiga dos cereais. São oriundas de raízes completamente diferentes: o primeiro relaciona- se com o latim auris ; o segundo com o latim acus , aceris , mas a Etimologia Popular atribuiu um elo semântico injustificado entre ambos: de que ear dos cereais seria uma metáfora baseada na semelhança entre o posicionamento da espiga à sua respectiva planta e o posicionamento da orelha em relação ao corpo.

É importante ressaltar que as palavras estrangeiras são aquelas que freqüentemente estarão vulneráveis à Etimologia Popular, por não terem raízes no idioma que as recebe e por perderem facilmente a motivação.

Para a maioria das pessoas, o fator determinante, na busca por origens e significados das palavras, é a curiosidade. Além disso, é possível que intuitivamente, as pessoas usem esse “saber” etimológico, como um artifício de persuasão, a fim de trazer autoridade argumentativa ao seu discurso. É como se houvesse uma espécie de pequeno etimologista dentro de cada indivíduo (MORENO, 2006). Já para aqueles que possuem algum conhecimento sobre a formação do léxico da língua portuguesa, há outros fatores a considerar como: as contribuições e os empréstimos lingüísticos de outras línguas, incorporados ao idioma em diferentes épocas. Esses indivíduos apropriam-se dos sufixos e prefixos (partículas de alto índice polissêmico) geralmente provenientes do grego e latim, para presumir e induzir significados sobre as palavras. Para exemplificar, eis alguns desses elementos constitutivos:

Do grego: a (antes de consoante) an (antes de vogal)

negação, privação anarquia, anômalo, ateu, acéfalo, afônico caco mau cacofonia, cacófato di dois dipétalo, dissílabo necro morto necromancia, necrotério auto de si mesmo automorfismo, autógrafo -nomo que regula autônomo, metrônomo -doxo que opina ortodoxo, paradoxo

-agogo que conduz demagogo, pedagogo -sofia sabedoria filosofia, teosofia

Do latim: omni, oni todo onipresente, onipotente lumen luz luminescência fide fé fidedigno, fidelidade -cida que mata inseticida, vermicida -cola que habita arborícola, silvícola -fero que contém aurífero, mamífero -fico que faz, que produz frigorífico, maléfico Fonte: PIMENTEL, Carlos. Português Descomplicado. São Paulo: Saraiva, 2004.

De modo geral, essa associação é benéfica, ajuda a identificar possíveis significados das palavras, afinal alguns dos processos comuns de formação de palavras na Língua Portuguesa utilizam-se desses elementos, tais como os formados por derivação ou por hibridismo. O que não deve acontecer é esse tipo de interpretação tornar-se regra para a assimilação do sentido das palavras usadas nos mais diversos tipos de enunciados inseridos em diferentes contextos enunciativos. Por exemplo, ensina-se por aí que o termo aluno seria composto pelo prefixo grego a (privação de) e luno derivação de lume do latim (referente a luz). Então, aluno , etimologicamente falando, designaria o indivíduo desprovido de luz, e os mais tórridos vão dizer: trata-se daquele que precisa ser iluminado pelo conhecimento. É possível encontrar professores, em primeiro dia de aula, argumentando dessa forma, a fim de impactar seus interlocutores. Mas a verdade é outra: aluno = alumnus (do latim) criança de peito, lactente.

Um caso semelhante acontece com o vocábulo pedófilo – atribuído àquele indivíduo adulto; inescrupuloso, vil e perverso que é capaz de abusar sexualmente de crianças. Há quem diga que o ideal seria o termo pedômano , já que o elemento mania (do Grego) deu origem a adjetivos, como: cleptomaníaco, ninfomaníaca, megalomaníaco – sempre designando uma conduta criticável, depreciativa. Ao passo que filia (também do Grego) sempre compôs vocábulos “do bem”: bibliófilo,

socioculturais: são médicos, advogados, jornalistas, apresentadores de televisão, farmacêuticos, colunistas de revistas teen, professores , palestrantes e muitos outros. Esses que são, de alguma forma, influentes e formadores de opinião estufam o peito para falar de origem e significado das palavras e, não raro, querem limitar o seu uso, levando-se em consideração exclusivamente o aspecto etimológico.

Entretanto, prender-se ao significado original de uma palavra para tentar definir as coisas que elas representam é um equívoco condenado pela Lingüística e pela própria vida, as palavras não podem ser compreendidas apenas pelo seu sentido primitivo. Muitas delas, inclusive, desligam-se do sentido literal que tinham quando do seu nascimento. Os vocábulos transformam-se, alargam ou estreitam seu significado e, ainda podem ter o sentido estendido, se utilizados de uma forma alegórica, metafórica. Essa polissemia existente na língua mostra que não há nada de definitivo acerca das mudanças de significado. Uma palavra pode adquirir um sentido novo sem perder o seu significado original. Por outro lado, ela pode distanciar-se tão longinquamente do que representava, que não mais será lembrada ou utilizada no seu sentido original (MORENO, 2007).

Tomando-se o vocábulo batismo como exemplo, algum purista da língua dirá que o termo só poderá ser empregado quando se tratar de mergulho nas águas de um rio, visto que a Etimologia mostra a ligação de um termo ao outro: do grego – baptizein e do latim – baptizare , alusivo à imersão completa que se fazia em sacramento aos convertidos da Igreja Primitiva. Excetuando-se a questão religiosa da obrigatoriedade de ser o batismo uma imersão – sabe-se que há divergência entre denominações religiosas quanto à aplicação e ao procedimento desse ritual eclesiástico – o termo, no português, ganhou também a acepção de iniciação, o que permite por exemplo falar-se em “batismo de fogo de um combatente”, e a acepção de atribuir um nome, por isso é usado sem estranhamento “batizei meu cãozinho de Totó”. Além disso, a língua portuguesa, com ironia, passou a utilizar o verbo batizar para denominar a prática desonesta de adulterar líquidos, adicionando a eles quantidades favoráveis de água, daí aceitarem-se as locuções: uísque batizado, gasolina batizada, leite batizado etc. Como foi visto, por extensão de significado, não apareceu, em todas as acepções que o vocábulo batismo adquiriu, a noção de imersão – tão inerente ao sentido original.

Não é difícil encontrar um desses astuciosos da língua dizendo, por exemplo, que não se deve falar em caligrafia ilegível , argumentando que caligrafia, de acordo com a Etimologia, é a escrita bem feita, com letras regulares, perfeitamente legível e, que portanto, quem escreve ilegivelmente não possui caligrafia. Mas, apesar do seu bom raciocínio lógico – cabe aqui dizer que uma língua natural como a língua portuguesa não se enquadra nos parâmetros da lógica – o termo passou a significar também a simples feitura de letra. Dessa forma obtêm-se enunciados como: “Precisamos melhorar nossa caligrafia”, “Você tem uma péssima caligrafia” e “A caligrafia de médico é ilegível” sem que isso incorra em contradição ou desentendimento por parte do interlocutor. Assim também, ao usar a expressão “bonita caligrafia”, não se pode dizer que se trata de um caso de pleonasmo – justamente porque o tempo já dissipou o significado etimológico do termo.

A tendência em ampliar a abrangência significativa de um vocábulo é própria de qualquer idioma. É por isso que se diz que os dicionários engrossam mais pela atribuição de significados a palavras já existentes do que pelo surgimento de novas palavras. Elas não significam hoje, necessariamente, o que significavam em outros tempos; a princípio, corneta – derivado de corno , era um instrumento de sopro feito a partir de um chifre (similar a um berrante), e jornada irmã de jornal , era o trajeto percorrido em um só dia. Hoje a corneta é de metal e fala-se em “jornadas nas estrelas”, que podem durar vários anos-luz.

Especula-se, também, que o termo cecê – usado para designar o mau cheiro das axilas – teria uma origem indígena, assim como: inhaca e chulé , ou teria sido formado como aquelas palavras que se usam em família, típica da linguagem usada para interagir com crianças – caracterizada pela repetição de sílabas: popô, xixi, tetê, naná e outras. No entanto, trata-se de uma espécie de um empréstimo lingüístico. Havia nos Estados Unidos uma marca de sabonete, campeã de vendas por lá, chamada Life-buoy, a qual, em seu slogan, se dizia insuperável na capacidade de eliminar o mau cheiro do corpo, o B.O. (sigla para body odor ). Com a fama, o produto foi lançado no Brasil e os produtores mantiveram a mesma estratégia de publicidade, traduzindo, então B.O. (body odor) para C.C. (cheiro do corpo). A sigla ganhou popularidade e não demorou muito para entrar no léxico da língua portuguesa – cecê está devidamente dicionarizada, com essa mesma grafia.