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Um estudo sobre o conceito de ethos e pathos na retórica jornalística do piauí, explorando as especificidades de seus principais gêneros discursivos e peculiaridades regionais. O texto destaca a importância de marcadores argumentativos que reforçam a verdade e analisa a influência reciproca entre ethos e pathos na construção de discursos. O documento também discute a relação entre a posição institucional do locutor e a interação social, e a importância da observação empírica da prática das trocas sociais na construção de imagem de si no discurso.
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Tipologia: Notas de aula
Compartilhado em 07/11/2022
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João Benvindo de Moura (UFPI) INTRODUÇÃO O “ethos” e o “pathos”, assim como o “logos” fazem parte da trilogia aristotélica dos meios de prova. De acordo com o Dicionário de Análise do Discurso assinado por Charaudeau e Maingueneau (2004), o ethos é um termo emprestado da retórica antiga e designa a imagem de si que o locutor constrói em seu discurso para exercer uma influência sobre seu alocutário. Essa noção foi retomada em ciências da linguagem e, principalmente, em análise do discurso no que se refere às modalidades verbais da apresentação de si na interação verbal. Aristóteles atribui ao ethos dois sentidos privilegiados: designar as virtudes morais que garantem credibilidade ao orador, tais quais a prudência, a virtude e a benevolência e comportar uma dimensão social, na medida em que o orador convence ao se exprimir de modo apropriado a seu caráter e a seu tipo social. Nos dois casos trata-se da imagem de si que o orador produz em seu discurso, e não de sua pessoa real. Enquanto o ethos encontra-se diretamente ligado à pessoa do orador, o pathos refere-se ao auditório. A palavra pathos é assumida atualmente no sentido de transbordamento emocional, geralmente sem sinceridade, acepção que não afeta seu derivado “patético”. Em retórica, o termo remete aos argumentos ou provas destinados a produzir a persuasão. A retórica repousa sobre uma teoria do espírito humano; enquanto os argumentos lógicos que agem sobre a representação podem fundar a persuasão ou a convicção, o pathos implica a vontade (no limite contra as representações) e é nisso que ele é essencial. Os meios fundamentais que permitem produzir a emoção no interlocutor ou no auditório através da ação discursiva são: mostrar-se emocionado; mostrar objetos e descrever coisas emocionantes. No presente trabalho, partimos das concepções de ethos e pathos presentes na Retórica aristotélica e exploramos tais noções em trabalhos de autores contemporâneos, como Maingueneau (2005) Amossy (2005) e Charaudeau (2007). Por meio de tal estudo, destacamos a relação entre ethos e pathos na construção de discursos jornalísticos veiculados pela imprensa escrita do Piauí, considerando as especificidades de seus principais gêneros discursivos e peculiaridades regionais, constituídos mútua e polemicamente em torno de alguns acontecimentos políticos. Observamos as principais construções discursivas que visam a persuadir ou convencer os leitores acerca da verdade que os jornalistas desejam passar. Tais construções consistem em fortes marcadores argumentativos que interligam as várias idéias e possibilitam o alcance do objetivo inicial: a persuasão ou o convencimento. Utilizamos como corpus , editoriais veiculados pelo Jornal Meio Norte, noticiário de circulação em todo o Estado do Piauí, durante o ano de 2008. A escolha desse veículo se deu por conta de sua maior abrangência, tiragem, qualidade gráfica e facilidade de acesso ao acervo que se encontra disponibilizado on-line. Através desse discurso escrito, sublinhamos e analisamos o importante papel dos marcadores argumentativos que reforçam a verdade, isto é, a idéia sobre a qual o orador deseja que seu auditório reflita e acolha. Observamos ainda a influência recíproca que as noções de ethos e pathos exercem uma sobre a outra, com o objetivo de, depreendendo as relações entre elas, verificar os efeitos de sentido construídos na interação entre enunciador e co-enunciador, e os regimes de negociação dos posicionamentos discursivos aí manifestados.
1. CONSIDERAÇÕES SOBRE A NOÇÃO DE ETHOS E PATHOS A característica essencial do ethos são os traços de caráter que o orador deve mostrar ao auditório (pouco importa sua sinceridade) para causar boa impressão: são os ares que assume ao se apresentar. O orador enuncia uma informação, e ao mesmo tempo diz: eu sou isto, eu não sou aquilo. Desse modo, a eficácia do ethos se deve ao fato de que ele envolve de alguma forma a enunciação, sem estar explícito no enunciado:
Não se trata das afirmações elogiosas que o orador pode fazer sobre sua própria pessoa no conteúdo de seu discurso, afirmações que, contrariamente, podem chocar o ouvinte, mas da aparência que lhe conferem o ritmo, a entonação, calorosa ou severa, a escolha das palavras, dos argumentos... [...] É na qualidade de fonte da enunciação que ele se vê revestido de determinadas características que, por ação reflexa, tornam essa enunciação aceitável ou não. (DUCROT, 1987, p. 207). Ao contrário do que se possa imaginar, essa noção de ethos não diz respeito apenas, como na retórica antiga, à eloqüência judiciária ou aos enunciados orais: é válida para qualquer discurso, inclusive para o escrito, ao qual nos dedicamos neste trabalho. Com efeito, o texto escrito possui, mesmo quando o denega, um tom que dá autoridade ao que é dito. Esse tom permite ao leitor construir uma representação do corpo do enunciador (e não, evidentemente, do corpo do autor efetivo). A leitura faz, então, emergir uma instância subjetiva que desempenha o papel de fiador do que é dito. Maingueneau (2005) avança em seu desdobramento teórico a respeito do ethos : O texto não é para ser contemplado, ele é enunciação voltada para um co-enunciador que é necessário mobilizar para fazê-lo aderir 'fisicamente' a um certo universo de sentido. O poder da persuasão de um discurso decorre em boa medida do fato de que leva o leitor a identificar-se com a movimentação de um corpo investido de valores historicamente especificados. (MAINGUENEAU, 2005 , p.73). O autor chama a atenção para o fato de que qualquer discurso escrito possui uma vocalidade específica que se manifesta por meio de um tom : este tom indica quem o disse, permitindo relacioná-lo a uma fonte discursiva e determinar o "corpo do enunciador" – e não do autor efetivo: "a leitura faz emergir uma origem enunciativa, uma instância subjetiva encarnada que exerce o papel de fiador" (MAINGUENEAU, 2005, p.72). Com base em indícios textuais, o leitor constrói a figura do fiador que se investe de um caráter e de uma corporalidade. Estes, por sua vez, apóiam-se em estereótipos sociais, ou seja, em representações sociais valorizadas ou desvalorizadas. Neste caso, o ethos não pré-existe à enunciação, uma vez que é por seu próprio enunciado que o fiador deve legitimar sua maneira de dizer. Diferentemente do que acontece na abordagem clássica, aqui o enunciador não é um ponto de origem estável, que se expressaria desta ou daquela maneira. É nesse sentido que Maingueneau afasta-se da concepção de ethos como procedimento ou como estratégia , na medida em que, para ele, os conteúdos não pré-existem à cena de enunciação que eles assumem: o fiador legitima sua maneira de dizer por seu próprio enunciado e a cena de enunciação é, simultânea e paradoxalmente, aquela de onde o discurso vem e aquela que ele engendra: "São os conteúdos desenvolvidos pelo discurso que permitem especificar e validar a própria cena e o próprio ethos, pelos quais esses conteúdos surgem" (MAINGUENEAU, 2005, p. 77 - 78). Para Amossy (2005) não se pode separar o ethos discursivo da posição institucional do locutor, nem dissociar totalmente a interlocução da interação social como troca simbólica (no sentido de Bourdieu). A passagem do sujeito falante como ser falante ou “ser do mundo” para o locutor como pura instância de discurso se efetua por uma série de mediações. “A imagem de si construída no discurso é constitutiva da interação verbal e determina, em grande parte, a capacidade de o locutor agir sobre seus alocutários.” (AMOSSY, 2005, p. 137). Conforme afirmamos na introdução, o pathos se refere às emoções que, por sua vez, se originam de uma racionalidade subjetiva porque, de acordo com a fenomenologa, emanam de um sujeito do qual se supõe ser fundado de intencionalidade. De acordo com Charaudeau (2007), são orientadas em direção a um objeto imaginado já que este objeto é extirpado da realidade para se tornar um real significante. A relação entre esse sujeito e esse objeto se faz pela mediação de representações. É pelo fato das emoções se manifestarem em um sujeito em função de alguma coisa que esse sujeito se faz representar enquanto tal. Digamos que seja por isso que essas emoções podem ser ditas representacionais. A piedade ou o ódio que se manifesta em um sujeito não é o simples resultado de uma pulsão, nem se mede somente como uma sensação de excitação, como um aumento de adrenalina. A emoção pode ser percebida na representação de um objeto em direção ao qual o sujeito se dirige ou busca combater. E como estes conhecimentos são relativos ao sujeito, às informações que ele recebeu, às experiências que ele teve e aos valores que lhe são atribuídos, pode-se dizer que as emoções, ou os sentimentos, estão ligados às crenças.
estar subentendido, a conclusão implícita. O tema, por sua vez, pode estar identificado no título e a conclusão pode exigir inferência por parte do leitor. As características estruturais dos editoriais, por sua vez, são as seguintes: · Vocabulário objetivo e preciso; · Frases curtas e sem muita complexidade, sem, no entanto, implicar uma leitura simplificada, pois os articuladores discursivos garantem o rigor lógico da argumentação e o encadeamento das idéias. Em alguns casos, um parágrafo inteiro pode coincidir com um simples período composto de duas orações; · Verbos no presente do indicativo; · Uso de adjetivos e advérbios modais. No grupo de gêneros que argumentam, como os editoriais, não é tanto a estrutura superficial, o modo como as orações são encadeadas, que conta para o sucesso do gênero em termos de persuasão, mas sim as estratégias discursivas usadas pelo editorialista para convencer o leitor. Entre estas estratégias estariam as que apelam para a razão e as que apelam para a sensibilidade. Razão Sensibilidade · Predomínio da objetividade · Fonte de autoridade (recorrência a uma personalidade famosa, a uma opinião de especialista, a dados estatísticos, a testemunhos confiáveis). · Ênfase na subjetividade · Apelo ao emocional por meio de ironias, insinuações, conseqüências indesejadas, promessas, etc.)
2. PRIMÓRDIOS DA IMPRENSA EM TERRITÓRIO NACIONAL 2.1. Origem da imprensa no Brasil A imprensa chega ao Brasil junto com a Corte Portuguesa, em 1808. O primeiro empreendimento nesse sentido se deu com a montagem de uma pequena tipografia, comprada para a metrópole e que não chega a ser montada em Portugal. Num dos 14 navios, o Medusa, embarca o material tipográfico citado, comprado para a Secretaria de Estrangeiros, por D. João Antônio Araújo, Conde da Barca. Por decisão do Príncipe Regente, o Ato Real de 31 de maio de 1808 autoriza a montagem e implantação da primeira tipografia, com o fim de imprimir, exclusivamente, a legislação e papéis diplomáticos emanados do governo. “Fato verídico, portanto, que os primeiros impressos começam a circular por iniciativa oficial, o que é por demais particular e significativo, além de totalmente adverso ao contexto vivenciado pelos países europeus.” (Rêgo, 2001, p. 43). O primeiro fruto da tipografia imperial é a Gazeta do Rio de Janeiro, cujo primeiro exemplar foi publicado no dia 10 de janeiro de 1808. Impresso em papel de pouca qualidade, contém inicialmente quatro páginas. No entanto, o primeiro jornal brasileiro, além de não ser a Gazeta do Rio de Janeiro, não é sequer editado em território nacional, mas sim, em Londres. O Correio Braziliense, de Hipólito da Costa, circula a partir de junho de 1808 e, apesar de seu caráter político, tem livre circulação em terras brasileiras e portuguesas. Durante o processo de emancipação política, os apelos dos liberais passam a ser mais freqüentes nos periódicos, principalmente depois de oficializada a liberdade de imprensa, que, em 12 de julho de 1821, é fixada constitucionalmente pelos liberais portugueses, com repercussão no Brasil, em agosto do mesmo ano, quando por aviso, D. Pedro resolve garanti-la oficialmente. Tal fato impulsiona a produção jornalística, com a proliferação de folhetos e periódicos, que influenciam nos rumos das políticas internas e concorrem para a independência. Contudo, a virulência dos jornais e panfletos faz com que D. Pedro I, nos primeiros dias de seu reinado, publique uma portaria limitando a atuação da imprensa, em que é visível o seu descontentamento com as críticas mordazes ao seu reinado. Junto com o jornalismo panfletário, nasce o Pasquim, incentivado pelo cerceamento à liberdade de imprensa. O governo de D. Pedro I representa um dos períodos da história
da imprensa brasileira em que o Pasquim mais se destaca. A linguagem agressiva, mas, ao mesmo tempo irreverente, figura como a marca identificadora dos jornalistas que aderem a esta prática. Durante o Segundo Reinado, o Império toma novos rumos ditados pelas mudanças na conjuntura política do país. A imprensa das décadas de 1840 e 1850 participa da vida pública do país, dialogando e informando diretamente ao público e às instituições legitimadas, cumprindo o papel de mediadora social e rompendo com o discurso panfletário. Os impressos trazem crônicas, resenhas, romances seriados e folhetins. Estes últimos, lançados pelo Jornal do Commércio, tornam-se um grande sucesso, logo copiado pelos concorrentes Correio Mercantil e Diário do Rio de Janeiro, marcando, definitivamente, o traço literário da imprensa no Segundo Império. Todavia, ao final da década de 1850, surgem, mais uma vez, problemas de cunho político que se agravam até a queda do Império. Com o lançamento do jornal A República, em 1870, a dissidência do Partido Liberal divulga, oficialmente, a existência do Partido Republicano. Após este fato, vários jornais republicanos surgem por todo o território nacional, conforme relaciona Sodré: ... de 1870 a 1872, surgiram no país mais de vinte jornais republicanos, sem falar em folhas do tipo da Opinião Liberal, que passara à direção de Lafaiete Rodrigues Pereira e Limpo de Abreu: O Argos, no Amazonas, O Futuro, no Pará; O Amigo do Povo, no Piauí (grifo nosso); O Voluntário da Pátria, na Paraíba; A República Federativa, O Seis de Março e O Americano, em Pernambuco; A República, em Alagoas; O Horizonte, na Bahia; O Correio Paulistano, a Gazeta de Campinas, em que colaborava Campos Sales, O Paulista, O Comércio de Santos, O Ipanema e O Sorocabano, em São Paulo; O Jequitinhonha e o Farol, em Minas; O Antonina, no Paraná; Democracia e O Tempo, no Rio Grande do Sul... (SODRÉ, 1983, p. 212). 2.2. Origem da imprensa no Piauí A instituição do governo regencial no Brasil se prolonga até a proclamação da maioridade de D. Pedro II, no dia 23 de julho de 1840. Isto se deu por conta da impossibilidade de continuação imediata do Império, em face da menoridade do primogênito. A província do Piauí atravessa dias de prosperidade no início da Regência, com a criação das vilas do Poti, São Gonçalo de Amarante, Piracuruca e Jaicós. Sousa Martins continua no poder, sendo confirmado como presidente da Província, em junho de 1831. Pouco tempo depois, surge o primeiro jornal do Piauí, com a denominação O Piauiense, a 15 de agosto de 1832, como afirma Costa, 1974, em cujo livro encontra-se uma transcrição da Aurora Fluminense, jornal de Evaristo da Veiga, número 689, 17 de outubro de 1832, onde se lê, Nas províncias do Norte do Brasil vai tendo rápidos progressos a imprensa periódica. Algumas que ainda não conheciam praticamente este meio de espalhar por entre o povo as doutrinas políticas, esta grande alavanca da civilização progressista, vão tendo suas imprensas e jornais. Mencionaremos particularmente o Recopilador Sergipano, em Sergipe, e, no Piauí, O Piauiense... (COSTA, 1974, p. 388). Durante a década de 1830, surgem outros impressos, tais como O Correio da Assembléia Legislativa e, em 1839, O Telégrafo, de caráter oficial e político, com o objetivo primeiro de manter a opinião pública a favor do governo e do Visconde da Parnaíba no episódio da Balaiada. Configura-se, portanto, como o primeiro jornal noticioso, embora semi-oficial. O primeiro jornal piauiense de cunho político e doutrinário, O Liberal Piauiense, só surge após a queda do Visconde da Parnaíba. Seu redator, Lívio Lopes Castello Branco atua ainda como redator em Aucapura e O Argos Piauiense, ambos em Oeiras. Com a transferência da capital para a chapada do Corisco, Lívio Lopes vem residir em Teresina, onde trabalha nos jornais Patuléia e O Conciliador Piauiense. Tibério César de Burlamaqui, chefe do Partido Liberal, lança, em 1849, o jornal Echo Liberal. Este periódico serve de canal de comunicação aos oeirenses contrários à saída da sede administrativa daquele município.
2008 ). Em outras, nota-se a presença de uma única fonte durante todo o texto, como se ele fosse construído em cima de apenas um discurso ou coletiva do entrevistado (“Projeto de Piscicultura é sucesso no município”, de 2 de abril de 200 8 , que gira em torno do deputado federal Osmar Júnior). Para efeito de análise, propriamente dita, escolhemos três editoriais publicados respectivamente em 12 de março, 22 de setembro e 9 de dezembro de 2008.
5. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS O editorial de 12 de março de 2008, publicado na página 2, tem como título: “A delinqüência do MST” e refere-se às constantes ações da entidade na luta pela reforma agrária e contra os produtos transgênicos. No primeiro enunciado do texto, pode-se perceber através da seleção lexical o uso do termo “invasão” ao invés de “ocupação”, termo geralmente utilizado pelos integrantes do MST. Tal escolha reflete nitidamente os pontos de vista sobre os quais cada uma das partes constrói a sua argumentação. O editorial denuncia ainda que o MST age com violência insana e não sofre nenhuma repressão por parte da polícia, sendo ainda abastecido for financiamentos governamentais o que estaria caracterizando uma ação terrorista institucional. Afirma que a produção de alimentos nos assentamentos é ínfima e que o movimento se posiciona na contramão da história ao se dizer contrário às pesquisas sobre melhoramento genético. Por fim, acusa o movimento de estar produzindo atentados contra a democracia e a ordem estabelecida com a conivência do estado. Este é o tipo de fenômeno que, como desdobramento da retórica tradicional, podemos chamar de ethos: por meio da enunciação revela-se a personalidade do enunciador. Para caracterizar o MST o enunciador utiliza os seguintes adjetivos: violento, insano, destruidor, antidemocrático, ilegítimo, ilegal, carcomido, fracassado, improdutivo e delinqüente. Por conseguinte, considera-se o oposto de tudo isso. O enunciador assume claramente os ethé de saber, competência, experiência em matéria de política agrícola e econômica, habilidade, seriedade, virtude, defensor da ordem, da legalidade e do progresso. Enquanto outros veículos de comunicação publicaram a razão da posição contrária do MST à produção de alimentos transgênicos, tendo em vista a ausência de estudos que garantam a segurança da saúde humana, da biodiversidade e do meio ambiente, o editorial afirma apenas que o Movimento é contrário à pesquisa sobre o melhoramento genético de plantas e, portanto, contra os avanços tecnológicos.
O que é mostrado neste editorial, sem nenhum comentário, provoca também uma forma de pathos, despida de qualquer marca de afetividade – e isso justamente na medida em que os fatos relatados infringem, de modo ostensivo, todas as normas e valores reconhecidos tanto pelo leitor implícito, quanto pelo locutor. Ao fazer uma descrição seca e factual da atuação do MST, o editorialista, por sua vez, não deseja se identificar com os latifundiários. A compreensão disso faz apelo a um sentimento moral, que se liga a um julgamento de valores, no caso, a indignação. É preciso enfatizar a singularidade desse pathos tomado no sentido aristotélico do termo como sendo a capacidade de mobilizar os sentimentos do auditório em favor de uma tese. Trata-se de um pathos em estado bruto, na medida em que o discurso que provoca a indignação é desprovido de marcas de afetividade. Quanto menos a emoção se inscrever verbalmente, tanto mais forte ela se tornará aos olhos do leitor. Assim, no editorial acima, as marcas de afetividade são tão discretas quanto possível. O segundo editorial escolhido foi publicado em 22 de setembro de 2008 e tem como título “Eficiência policial”. Nele, o enunciador faz uma série de reflexões acerca do papel e da importância do aparato policial, bem como de seu alijamento do rol das políticas públicas em detrimento de outras demandas como saúde e educação. Defende a existência de uma polícia técnica cuja tarefa seja a de trabalhar para que crimes possam ser evitados e esclarecidos. Percebe-se um claro desejo de projeção do ethos da competência, aquele que exige de seu possuidor, ao mesmo tempo, saber e habilidade: o enunciador deve revelar conhecimento profundo do domínio particular sobre o qual constrói o seu discurso, mas deve igualmente provar que tem os meios, o poder e a experiência necessários para realizar completamente seus objetivos, obtendo resultados positivos. Pretende-se qualificar o veículo de comunicação como detentor de um saber social e político capaz de formar a opinião dos leitores e garantir a adesão dos mesmos. Ao dissertar sobre a problemática da eficiência policial o enunciador lança mão de argumentos que visam a suscitar a emoção dos leitores em diversos trechos. O primeiro deles relata situações extremas, como de civis mortos em confrontos de bandidos com a polícia ou de prisões arbitrárias, sem fundamento legal ou tecnicamente imperfeitas. Tenta construir, portanto, um estado de comoção no imaginário social com vistas a uma adesão das principais forças da sociedade no intuito de expandir a atividade de comunicação. Num segundo momento, o discurso lista as agruras porque passam os policiais em serviço, como falta de apoio médico-psicológico e salários incompatíveis com o risco a que se submetem. A argumentação termina por afirmar que a principal tarefa da polícia não é a de
A construção do ethos do jornal se dá a partir de representações sociais. O sujeito falante não tem outra realidade além da permitida pelas representações que circulam em dado grupo social e que são configuradas como “imaginários sociodiscursivos”. As representações de si são evocadas a partir de uma ação reflexiva onde a negação do outro é a afirmação do eu enunciativo. O enunciador afirma ser o que o outro não é. A evocação de estratégias argumentativas visa a legitimar as idéias defendidas e buscar a adesão dos leitores e anunciantes. Nos discursos analisados, a emoção funciona como uma representação social, originando-se numa “racionalidade subjetiva” (Maingueneau, 2007). Tal possibilidade faz do enunciador um porta- voz da sociedade, capaz de operacionalizar uma rede discursiva que favoreça o surgimento de adesões e comportamentos positivos frente ao conjunto de idéias formulado. O efeito pathêmico pode ser observado a partir da reação emocional da massa face a uma crise, ou situação social calamitosa cuja veiculação na imprensa culmina com a publicação de editoriais compondo, assim, a dramaturgia discursiva. REFERÊNCIAS AMOSSY, Ruth. O Ethos na Intersecção das Disciplinas: Retórica, Pragmática, Sociologia dos Campos. In: Amossy, Ruth (Org.). Imagens de si no Discurso: a Construção do Ethos. São Paulo: Contexto, 2005 CHARAUDEAU, Pathos e discurso político. In: Machado, Ida Lúcia et alli (Orgs.). As emoções no discurso. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. ______. Discurso das mídias. São Paulo: Contexto, 2007. COSTA, F. A. Pereira. Cronologia histórica do estado do Piauí. Teresina: Artenova, 1974. DUCROT, Oswald. O dizer e o dito. Campinas, São Paulo: Pontes, 1987. JORNAL MEIO NORTE. Disponível em: http://www.jornalmn.com.br/ Acesso em: 25.02. MAINGUENEAU, Dominique. Análise de Textos de Comunicação. São Paulo: Cortez, 2004 ______. Ethos, Cenografia, Incorporação_._ In: Ruth Amossy (Org.). Imagens de si no Discurso: a Construção do Ethos. São Paulo: Contexto, 2005. RÊGO, Ana Regina. Imprensa Piauiense : Atuação política no século XIX. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 2001. SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1983.