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Guias e Dicas
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Cidade como Personagem em Medianeras: Análise Filmográfica e Reality Real., Notas de aula de Lógica

Este texto discute a construção visual da cidade em medianeras, onde as vozes dos personagens continuam a fazer parte da história, enquanto as imagens refletem suas emoções e encarnam as relações urbanas. O autor defende a ideia de que a imagem cinematográfica de um determinado espaço geográfico está relacionada com sua contrapartida na realidade concreta, formando o imaginário coletivo e cultural. Além disso, o texto aborda a importância da análise de cenas e do departamento de fotografia na compreensão do filme.

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Romar_88
Romar_88 🇧🇷

4.6

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VANESSA PAULA TRIGUEIRO MOURA
ESPAÇOS URBANOS E RELAÇÕES CONTEMPORÂNEAS NO FILME
MEDIANERAS
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Programa de Pós-Graduação em Estudos da Mídia
Natal, 2016
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VANESSA PAULA TRIGUEIRO MOURA

ESPAÇOS URBANOS E RELAÇÕES CONTEMPORÂNEAS NO FILME

MEDIANERAS

Universidade Federal do Rio Grande do Norte Programa de Pós-Graduação em Estudos da Mídia Natal, 2016

Vanessa Paula Trigueiro Moura

ESPAÇOS URBANOS E RELAÇÕES CONTEMPORÂNEAS NO FILME

MEDIANERAS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Estudos da Mídia, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para a obtenção do grau de Mestre em Estudos da Mídia. Linha de Pesquisa: Estudos da Mídia e Produção de Sentido Orientadora: Profa. Dra. Josimey Costa da Silva

Natal, 2016

Vanessa Paula Trigueiro Moura

ESPAÇOS URBANOS E RELAÇÕES CONTEMPORÂNEAS NO FILME

MEDIANERAS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Estudos da Mídia, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para a obtenção do grau de Mestre em Estudos da Mídia. Linha de Pesquisa: Estudos da Mídia e Produção de Sentido Orientadora: Profa. Dra. Josimey Costa da Silva

Apresentada em: ____/____/____

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________ Prof. Dra. Josimey Costa da Silva Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Orientadora

_______________________________________________ Prof. Dra. Angela Freire Prysthon Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Examinadora Titular

_______________________________________________ Prof. Dra. Maria Helena Braga e Vaz da Costa Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Examinadora Titular

_______________________________________________ Prof. Dr. Allyson Carvalho Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Examinador Suplente

“Eu não poderia apreender nenhuma coisa como existente se primeiramente eu não me experimentasse existente no ato de apreendê-la”

Merleau-Ponty

RESUMO

A presente pesquisa estabelece uma investigação iniciada na obra audiovisual argentina intitulada Medianeras. Esse corpus empírico torna-se o lugar de representação que nos permite refletir sobre o imaginário da vida urbana, possibilitando, por meio da análise e interpretação fílmica, uma leitura não só da linguagem e técnicas cinematográficas, mas uma leitura dos fenômenos sociais contemporâneos que envolvem a cidade e suas relações. Ou seja, questões da sociabilidade contemporânea são retratadas a partir da narrativa fílmica, que reflete a lógica do cotidiano midiatizado na organização e fluxo das grandes cidades. Para tanto, o trabalho apresenta as etapas de uma produção cinematográfica, objetivando a compreensão do processo de produção audiovisual, admitindo que a intencionalidade aplicada por meio dos recursos da linguagem, também é construída por meio de imaginários, a partir da experiência urbana dos diretores. Além disso, após um processo de contextualização da produção de Medianeras e do desenvolvimento da análise fílmica, propomos uma reflexão por meio de chaves de leitura, que atuam no campo do imaginário do público, e nesse caso, também da pesquisadora. Identifica-se, portanto, um processo de cointencionalidade por meio de uma discussão que extrapola os limites da narrativa e busca a compreensão de aspectos que constituem a complexidade da organização da sociedade contemporânea, urbana e midiatizada.

PALAVRAS-CHAVE : Cinema; Imaginário; Cidade; Cotidiano midiatizado.

ABSTRACT

This research establishes an investigation initiated in an argentinian audiovisual work entitled Medianeras. This empirical corpus becomes the place of representation that allows us to reflect about the imagery of urban life, making it possible, through the filmic analysis and interpretation, a reading not only of a film language and techniques, but a reading of contemporary social phenomena involving the city and its relations. In other words, issues of contemporary sociability are portrayed from the filmic narrative that reflects the logic of mediatized everyday in the organization and flow of large cities. Therefore, this work presents the stages of a film production, aiming the understanding of the audiovisual production process, assuming that the intentionality applied by means of language resources, is also built through imaginary, from the urban experience of the directors. Moreover, after a contextualization process of the production of Medianeras and development of film analysis, we propose a reflection through reading keys, which acts in the public imaginary field, and in this case, also in the researcher. It identifies therefore a co intentionality process by means of a discussion that goes beyond the narrative limits and seeks the understanding of aspects that constitute the complexity of the organization of contemporary society, urban and mediated.

KEYWORDS: Cinema; Imaginary; City; Mediatized everyday.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - A construção visual das personagens a partir da revelação dos aspectos da vida privada...................................................................................................................... 36 Figura 2 - A construção visual da cidade como personagem em Medianeras. ........................ 37 Figura 3 - Elementos usados pela cenografia revelam o gosto de Martín por Star Wars. ....... 38 Figura 4 - Objetos cênicos que compõem o cenário do apartamento de Mariana. ................... 38 Figura 5 - Gráfico da faixa etária da população da Província de Buenos Aires disponibilizado pelo INDEC. ................................................................................... 55 Figura 6 - Comparativos entre os longas argentinos e brasileiros estreados entre os anos de 2007 e 2013. ............................................................................................................. 60 Figura 7 - Comparativos entre os longas argentinos e brasileiros estreados entre os anos de 2007 e 2013. ............................................................................................................. 61 Figura 8 - Diferenças arquitetônicas apresentadas durante o primeiro monólogo em off de Martín. ...................................................................................................................... 65 Figura 9 - A luminosidade das telas compõe parte da iluminação cênica do apartamento de Martín. ...................................................................................................................... 67 Figura 10 - Captação de imagem em ângulo zenital apresenta os objetos que Martín carrega em sua mochila. ..................................................................................................... 68 Figura 11 - Os objetos cênicos distribuídos pelo apartamento de Mariana revelam seu ofício e sua rotina................................................................................................... 69 Figura 12 - As personagens transitam pelos mesmos espaços, mas o encontro não acontece. 70 Figura 13 - A rotina de Martín está ligada diretamente ao computador e ao ambiente virtual. .................................................................................................................... 70 Figura 14 - Mariana apresenta uma forte ligação com os seus manequins e os insere em seu dia-a-dia. ................................................................................................................ 71 Figura 15 - A vitrine é apresentada como espaço que reflete a personalidade e os gostos de Mariana. ................................................................................................................. 72 Figura 16 - A vitrine de Mariana desperta interesse em Martín. .............................................. 73 Figura 17 - Primeira cena em que Wally aparece como elemento narrativo. ........................... 74 Figura 18 - A relação das personagens com a fotografia é retratada em alguns momentos do enredo. .............................................................................................................. 75 Figura 19 - Mariana apaga o seu passado e em seu lugar insere uma representação do que pode vir a ser o seu futuro...................................................................................... 75 Figura 20 - A inserção do manequim com as roupas do Wally representam o momento de vida de Mariana. .................................................................................................... 76 Figura 21 - Opções de cortes e detalhes da montagem ditam o ritmo da narrativa. ................. 77 Figura 22 - O grande plano geral reflete o distanciamento das personagens na cena. ............. 78 Figura 23 - A cena monocromática ressalta a angústia da personagem diante do elevador..... 78 Figura 24 - A imponência do Edifício Kavanagh diante da Basílica do Santíssimo Sacramento. ........................................................................................................... 81 Figura 25 - Fotografias antigas e elementos de pós-produção ilustram a história contada por Mariana. ........................................................................................................... 81 Figura 26 - A pouca incidência de luz e a coloração em tom azulado permanecem presentes na narrativa. ........................................................................................................... 82 Figura 27 - Nascimento das plantas no concreto apresentadas durante o monólogo em off de Martín. ............................................................................................................... 82 Figura 28 - O uso de formas geométricas nos enquadramentos das cenas é uma constante em Medianeras. ..................................................................................................... 84

Figura 29 - As cenas em que as vitrines são apresentadas são captadas, em sua maioria, em um ângulo frontal e plano geral de captação, mantendo a imagem aberta. ........... 84 Figura 30 - Mariana ao perceber o seu reflexo no espelho da vitrine. ..................................... 85 Figura 31 - Imagens das medianeras apresentadas durante o monólogo em off de Mariana. .. 86 Figura 32 - Iluminação dos apartamentos e vestimentas das personagens antes de eles quebrarem as medianeras. ...................................................................................... 87 Figura 33 - Iluminação dos apartamentos e vestimentas das personagens logo após a quebra das medianeras. ......................................................................................... 87 Figura 34 - As medianeras dos prédios de Martín e Mariana. .................................................. 88 Figura 35 - Momento em que Martín e Mariana iniciam uma conversa no chat online. ......... 89 Figura 36 - Mariana encontra Martín, o “seu Wally ” na cidade, e vai ao encontro dele na rua. ......................................................................................................................... 91

APRESENTAÇÃO

Ao se falar em espaços urbanos e relações contemporâneas, fala-se também de um cenário dinâmico, de não permanências, de fluxos, de movimentos. Essa pesquisa reflete sobre esse cenário juntamente ao entrelaçado de símbolos que constitui também a linguagem cinematográfica. Dessa forma, transitar pelo universo da linguagem é não somente compreender as condições técnicas de uma produção audiovisual, mas também compreender o cotidiano, os imaginários e a produção de sentido, que servem de substrato para a complexificação da narrativa fílmica. A produção cinematográfica analisada na presente dissertação é Medianeras , obra argentina roteirizada e dirigida por Gustavo Taretto. O filme em questão traz esse panorama dos espaços urbanos e das relações contemporâneas não só para a superfície do texto fílmico, como também projeta a possibilidade de uma discussão acerca de um cotidiano urbano e midiatizado. O filme conta a história de Martín (Javier Drolas) e Mariana (Pilar López de Ayala), dois jovens que vivem no mesmo quarteirão em Buenos Aires. Apesar de se cruzarem pelas ruas, de caminharem pelas mesmas calçadas e frequentarem os mesmos lugares, as personagens não se percebem e não vivenciam a experiência de um encontro durante quase toda a trama. Isso porque a narrativa assume a perspectiva de que “nas sociedades contemporâneas, onde muito se vê e pouco se olha, o devaneio como método de olhar convive com a alucinação do próprio real” (ROCHA, 2008, p. 92). Uma das vertentes que possibilita a discussão teórica a partir de Medianeras é a forma como a equipe de produção construiu o discurso fílmico, tanto o verbal quanto o visual. A opção foi utilizar a voz dos protagonistas off^1 e apresentar takes que representam a Buenos Aires cinemática, mas que, ao mesmo tempo, funcionam como metáfora dos indivíduos de uma sociedade urbana e midiatizada. Midiatização essa caracterizada por uma espécie de tecnomediação, uma espécie de uma nova forma de presença do sujeito no mundo (SODRÉ, 2006), que envolve mediações socialmente realizadas. Cada momento em que o discurso de Martín e de Mariana entra por meio do recurso do off , nos aproximamos da personalidade, dos (^1) Chama-se de off na linguagem cinematográfica uma ação ou um discurso que se desenrola fora do campo, mas que pode ser percebida seja pelo som, seja pelos seus efeitos visíveis causados nos elementos em campo. Disponível em: <http://www.mnemocine.com.br/index.php/cinema-categoria/28-tecnica/141- glossarioaudiovisual>. Acesso: 08 dez. 15. No caso de Medianeras , em algumas cenas os protagonistas não aparecem na composição do quadro fílmico, mas as suas vozes continuam fazendo parte da história, relatando fatos passados, medos e angústias, ou ainda refletindo sobre a cidade e nova realidade das relações no cotidiano midiatizado.

medos, dos desejos e angústias das personagens, mas também nos aproximamos da forma como elas encaram as relações que se dão no espaço urbano e como encaram a própria cidade. Calvino (1990), ao trabalhar as variadas vertentes de suas cidades invisíveis, nos apresenta uma ligação da cidade com a memória, símbolos, desejos, trocas e nos faz perceber que “cada pessoa tem em mente uma cidade feita exclusivamente de diferenças, uma cidade sem figuras e sem forma, preenchida pelas cidades particulares” (CALVINO, 1990, p. 34). Por mais que façamos projeções individuais e interiores, ao nos depararmos com o contexto midiático, as imagens que nos são impostas, em um processo de produção e recepção de mensagens, constituem uma série de transformações em nossa condição cultural e, consequentemente, atuam no processo de construção de um imaginário. Essa ambiência midiática hoje se trata de um consumo exponencial de imagens que, a partir da ativação dos sentidos, gera um processo de imaginação e de construção de imaginários, compreendendo esse último como uma categoria cognitiva. Segundo, Silva (2011), os imaginários apontam “para a experiência humana de construir percepções a partir de onde somos sociais” (SILVA, 2011, p. XI). Ora, a imagem compõe o imaginário e o imaginário, por sua vez, “absorve imagens e sofre construções impostas pela vida em sociedade, mas é também a condição da abertura, do escape. É fundamental que sua produção e produtividade sejam integradas à realidade social humana” (SILVA, 2012, p. 08). Com base nisso, compreendemos que a análise fílmica é dotada de um imaginário social – individual, mas também coletivo - que, por sua vez, identifica uma narrativa construída a partir de outro imaginário urbano, o do diretor Gustavo Taretto. “Os diversos complexos de magia, de afetividade, de razão, de real que compõem a estrutura molecular dos filmes nos conduzem aos complexos sociais contemporâneos e aos seus componentes” (MORIN, 1997, p. 240). De acordo com essa premissa, busca-se compreender o universo fílmico em análise como um fenômeno social, cultural e que nos remete à representação da época atual. Ou seja, aprofundar-se na narrativa de Medianeras nos possibilita fazer mais que uma análise cinematográfica; a obra argentina, agindo como lugar de representação do real, nos permite enxergar uma discussão que permeia as relações entre cidade, cotidiano midiatizado e relações sociais. Trata-se de compreender o filme como uma moldura, em que a construção da linguagem discursiva verbal e visual consiste em um espaço de representação que, no caso de Medianeras , propicia uma reflexão a respeito das cidades, bem como a respeito das relações interpessoais que acontecem no cenário urbano.

devem ser somadas às demais dimensões que cercam as atividades humanas, fazendo reforçar a ideia de que o sentido e a cultura fazem parte de uma totalidade complexa. "Não estando mais num universo meramente físico, o homem vive em um universo simbólico. A linguagem, o mito, a arte e a religião são partes desse universo. São os variados fios que tecem a rede simbólica, o emaranhado da experiência humana" (CASSIRER, 1994, p. 48). Pensando sobre essa perspectiva, estabelecemos o cinema, as cidades e o próprio filme Medianeras , objeto deste estudo, como elementos dotados de um adensamento simbólico. As relações entre os símbolos, ícones e demais sistemas de signos nos permitem pensar que o sentido seria antes uma fusão entre dimensões diversas, pautadas, sobretudo, pela dimensão cultural. Ou seja, esse adensamento simbólico presente nas esferas aqui discutidas extrapolam o pensamento de que a produção de sentido se encontra ligada apenas a uma dimensão técnica, da ordem da produção midiática. Diante disso, nos aproximamos do objeto de estudo do presente trabalho e passamos a refletir sobre o simbólico e a produção de sentido em Medianeras. A obra argentina nos permite lançar um olhar tanto sobre o viés da profusão de sentidos nas relações interpessoais nas grandes cidades quanto na construção da linguagem cinematográfica. Medianeras nos permite pensar nas faces do urbano como representações das relações sociais, do individualismo e do afeto no cotidiano contemporâneo por meio da linguagem cinematográfica, nos inserindo numa realidade transdisciplinar, em que os processos culturais, comunicacionais e sociais encontram-se interligados de maneira quase indissociável. Silva (2011), ao tratar dos imaginários urbanos também se remete às formações simbólicas, buscando antes compreender o simbólico para, só então, exercitar a sua apreciação. Nesse sentido, a visão de Silva (2011) aproxima-se também do que já apontamos dos estudos de Cassirer (1994) e, além disso, nos remete a Durand (1993), que discorre sobre as duas maneiras de representar o mundo, sendo "uma direta, na qual a própria coisa parece apresentar-se ante o espírito, como na percepção ou na simples sensação. Outra indireta, quando por uma ou outra razão a coisa não pode apresentar-se em 'carne e osso' à sensibilidade" (DURAND , 1993, p. 7). Trata-se de um fenômeno que transcende a coisa, que transcende a língua.

Quando alguém aprende uma língua, aprende as palavras, sua gramática, isso no tocante à linguagem, é igual para todos os que aprendem um determinado sistema linguístico. Porém, o simbolismo próprio de alguém através da religião, dos mitos, da arte ou de outros motivos psicológicos, como, no nosso caso, a percepção de uma cidade dentro de suas encruzilhadas de sentido social, traduz-se para a nova língua que estuda ou

fala: transpassa a linguagem e localiza-se acima dos valores referenciais das palavras (SILVA, 2011, p. 44). Continuando nossa discussão a partir da compreensão das formações simbólicas e do seu valor diante da percepção das cidades por meio do seu imaginário, passamos também a uma reflexão sobre as relações humanas, sociais nas cidades. Entende-se, nesse cenário do urbano, que o cidadão "é lançado a um papel de produtor, precisa co-criar, cooperar na criação da mensagem" (FERRARA, 1988, p. 31). As linguagens diversas presentes na esfera do espaço urbano, em conjunto com a comunicação urbana e com as relações que acontecem na cidade, são incorporadas ao sentido que damos a um determinado bairro, rua ou espaço qualquer. A leitura espaço-temporal do cotidiano e da interação social é inerente ao processo subjetivo de ressignificação tanto da cidade quanto das relações. "As cidades são também as muitas diferentes visões de quem a olha e vê as versões que se apresentam dentro dos seus limites urbanos. Uma visão da cidade é um discurso ao mesmo tempo individual e do todo" (SILVA; ROCHA, 2006, p. 07). Nessa perspectiva, enxergamos Buenos Aires, inicialmente pelo olhar de Gustavo Taretto. A representação posta em Medianeras corresponde a um híbrido de imagens que mesclam memórias e vivências do próprio diretor. E essa apropriação nos permite construir um imaginário a respeito da cidade de Buenos Aires, para o que nos servem de apoio os estudos de Costa (2013):

Pretende-se aqui defender a ideia de uma correlação estreita entre a imagem fílmica de um determinado espaço geográfico e sua contrapartida na realidade concreta não pela via do entendimento da imagem fílmica como uma representação direta do real, mas pela via do entendimento da imagem e do espaço narrativo como elementos constituintes da própria formação, experiência e percepção do espaço geográfico real - e ainda como responsável pela construção do imaginário coletivo e cultural que substanciam e subjetivam sua existência e sua experiência (COSTA, 2013, p. 252). Aproximando-nos ainda da discussão da produção de sentido por meio da linguagem cinematográfica, compreende-se então que um filme é dotado de símbolos que permitem que o processo de análise tenha sentidos múltiplos. "A linguagem, por sua própria natureza e essência, é metafórica" (CASSIRER, 1994, p. 181). Aplicando essa definição de linguagem ao universo da linguagem cinematográfica, tratamos, portanto, de uma amplificação dos sentidos da narrativa audiovisual, que vai sendo posta de acordo com o uso de técnicas e a inserção de elementos cênicos no interior das obras.

Continuando na busca por teses e dissertações que versem sobre o filme Medianeras , dessa vez em uma pesquisa virtual livre a partir de ferramentas de busca da Google , conseguimos encontrar outras três pesquisas que contém em seu texto o nome do filme argentino em questão. No entanto, nenhuma delas realiza uma análise de Medianeras ou aprofunda alguma discussão sobre o filme. No primeiro, uma dissertação 4 na área de Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, a pesquisadora cita a obra audiovisual em suas considerações finais, usando o filme para refletir sobre as relações pessoais contemporâneas. O segundo trabalho encontrado foi também uma tese^5 , também na área de Educação, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. A pesquisadora aborda o filme Medianeras em sua introdução, ao tratar de uma discussão trazida pelo autor Manuel Castells sobre a cultura da virtualidade e sobre as relações terem como plataforma os ambientes multimídia. Por fim, o último trabalho encontrado, é uma tese^6 na área de Letras defendida na Universidade Federal da Paraíba, cita Medianeras em sua introdução como exemplo de obra audiovisual. A pesquisa aborda o que o autor João Carlos Sampaio apresenta como comunicabilidade da vida moderna, passando pela compreensão dos novos rearranjos das reações interpessoais. Esse levantamento realizado demonstra ou a carência de trabalhos acadêmicos que envolvam a análise do cinema contemporâneo argentino ou ainda a carência na organização do sistema de busca ou na atualização dos bancos de dados de dissertações e teses no Brasil. De toda forma, os autores já citados no início dessa apresentação seguem como referência nos estudos que discutem a relação entre cidade e cinema, bem como os que discutem a linguagem, o cinema e a narrativa cinematográfica. A presente dissertação discute todas as relações propostas – seja a relação interpessoal ou a relação entre homem e cidade ou até mesmo entre os próprios elementos estacionários que constituem o espaço urbano – no âmbito do imaginário, do conhecimento. A comunicação é aqui compreendida como elemento que permite a relação social e é também o que permite o estabelecimento de um plano imaginário, de um plano de representação

(^4) Dissertação completa disponível em: <http://www.sapientia.pucsp.br/tde_arquivos/23/TDE-2012-05- 30T11:51:32Z-12312/Publico/Iracema%20Cerdan%20Galves.pdf 5 >. Acessado em: 23 jan. 2016. Tese completa disponível em: http://www.educacao.ufrj.br/ppge/teses2015/tjanainapires.pdf. Acessado em: 23 jan. 2016. 6 Tese completa disponível em: <http://www.cchla.ufpb.br/ppgl/wp-content/uploads/2015/04/TESE- Edv%C3%A2nea-Maria-da-Silva-Defesa-23-04-2015.pdf>. Acessado em: 23 jan. 2016.

comum, que tanto constrói a representação fílmica como alimenta a própria cidade e suas relações. Além disso, pensando o contexto de fluxos midiáticos não só ligado às cidades e às relações, mas o aproximando também do cinema e da sua reconfiguração pelos novos meios, Stam (2003) nos propõe pensar no campo da cultura visual, a compreendendo enquanto “um diversificado campo de interesse envolvendo a centralidade da visão e do visual na produção de sentidos e na estruturação das relações de poder” (STAM, 2003, p. 345). Isso porque as novas tecnologias presentes no universo do audiovisual produzem, além de um novo cinema, um novo espectador. A dimensão midiática altera, portanto, o processo de construção do imaginário já que altera o fluxo da construção narrativa, a relação emissor e receptor e também a própria linguagem. Todo filme, por se tratar de um processo de produção coletiva que envolve o universo da linguagem e do imaginário, é um produto social e possui um sentido constituído também socialmente – inicialmente na etapa de produção e, em seguida, na etapa de recepção. Por isso o seu processo de análise deve levar em conta essa complexidade inerente à sua produção. A partir desse entendimento, Viana (2012) defende que o processo de análise de um filme necessita de uma percepção mais ampla possível, abrangendo além do contexto histórico e cultural da produção do filme, as relações entre a própria equipe de produção cinematográfica. Ao partirmos para esse plano de análise e da representação fílmica em si, seguimos o pressuposto de Vanoye e Goiliot-Lété (2002), adotando a ideia de que "analisar um filme não é mais vê-lo, é revê-lo e, mais ainda analisá-lo tecnicamente. Trata-se de uma outra atitude com relação ao objeto-filme" (VANOYE; GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p. 12). Isso porque “é preciso não apenas expor as cenas do filme, mas problematiza-las e revelar seus significados” (VIANA, 2012, p. 89). Diante dessa perspectiva, podemos identificar duas etapas que se alternam na atividade analítica de um filme, sendo elas a desconstrução e a reconstrução, ou seja, a descrição e a interpretação.

Analisar um filme ou um fragmento é, antes de mais nada, no sentido científico do termo, assim como se analisa, por exemplo, a composição química da água, decompô-lo em seus elementos constitutivos. [...] Uma segunda fase consiste, em seguida, em estabelecer elos entre esses elementos isolados, em compreender como eles se associam e se tornam cúmplices para fazer surgir um todo significante (VANOYE; GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p. 15). Mesmo diante dessa indicação dos autores, não tratamos aqui do processo de análise como um método reducionista. Compreendemos que uma análise fílmica envolve muito da