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Este documento discute a possibilidade de efeitos das novas normas decorrentes do novo cpc durante o período de vacação legislativa. O autor argumenta que as normas jurídicas não são apenas textos, mas sentidos construídos a partir da interpretação, e o novo cpc será fonte de inúmeras normas jurídicas novas. As perguntas abordadas incluem se as novas normas jurídicas produzem apenas normas jurídicas novas, se textos normativos novos ainda não vigentes produzem algum impacto na argumentação jurídica e se há normas jurídicas novas que podem produzir efeitos mesmo no período da vacação. Para responder a essas perguntas, é necessário esboçar uma tipologia das normas jurídicas que podem surgir do novo cpc.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de aula
Compartilhado em 07/11/2022
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Livre-docente (USP), Pós-doutorado (Universidade de Lisboa), Doutor (PUC/SP) e Mestre (UFBA). Professor- associado de Direito Processual Civil da Universidade Federal da Bahia. Diretor Acadêmico da Faculdade Baiana de Direito. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual, do Instituto Ibero-americano de Direito Processual, da Associação Internacional de Direito Processual e da Associação Norte e Nordeste de Professores de Processo. Advogado e consultor jurídico. Palavras-chave. Novo Código de Processo Civil. Direito transitório. Vacatio legis. Eficácia das normas jurídicas Resumo: Este ensaio tem por objetivo defender a possibilidade de atribuição de efeitos às normas decorrentes do novo CPC, mesmo no período da vacatio legis. Keywords: New Code of Civil Procedure. Transitional Law. Legal Rules. Effectiveness of legal rules. Abstract: This paper defends the effectiveness of the rules of the new Code of Civil Procedure even within the period of its vacatio legis. Sumário: 1 - Generalidades; 2 – Proposta: 2.1 Normas jurídicas novas; 2.2 – Pseudonovidades normativas; 2.3 – Normas simbólicas; 3 – Arremate.
1. Generalidades. O novo CPC está em vias de ser aprovado. Projeta-se um ano como prazo de vacatio legis (art. 1.058)^2. É elementar a lição de que uma lei não produz efeitos no período da vacatio legis ; por não está em vigor, de seu texto não é possível extrair consequências normativas. O Código de Processo Civil é uma lei federal. O raciocínio deveria ser semelhante: somente após a vacatio de um ano, o CPC poderia surtir efeito. Mas talvez a edição de um texto normativo novo – sobretudo de um novo Código, com mais de três mil enunciados dispositivos (artigos, incisos, parágrafos, alíneas) – não seja algo totalmente anódino durante o período da vacatio. Para demonstrar essa hipótese, é preciso firmar uma premissa: texto normativo não se confunde com a norma jurídica. Lei não é norma jurídica; lei é fonte de norma jurídica. Riccardo Guastini acentua a diferença entre texto e norma. Norma é o resultado da interpretação; o texto, o seu objeto. Entende o autor como interpretação jurídica “a atribuição de sentido (ou significado) a um texto normativo.”^3 O discurso do intérprete seria construído na forma do enunciado “T significa S”, em que T equivale ao texto normativo e S equivale ao sentido que lhe é atribuído.^4 Seguindo essa linha, Humberto Ávila também afirma: “Normas não são textos nem o conjunto deles, mas os sentidos construídos a partir da interpretação (^1) Publicado na Revista de Processo, São Paulo, RT, 2014, n. 236. (^2) As referências levam em consideração a numeração da versão aprovada pela Câmara dos Deputados, em 25.03.2014. (^3) GUASTINI, Riccardo. Das fontes às normas. Edson Bini (trad.). São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 23-24. (^4) GUASTINI, Riccardo. Das fontes às normas , cit., p. 24.
sistemática de textos normativos.”^5 Na verdade, trata-se de uma reconstrução de sentido, do conteúdo semântico inicial inerente ao texto, já que “há traços de significado mínimos incorporados ao uso ordinário ou técnico da linguagem”^6. Ávila chama de “núcleos de sentido” os significados mínimos incorporados ao texto pelo uso linguístico e pela comunidade do discurso. A norma seria, assim, uma construção a partir de algo; logo, seria uma reconstrução.^7 A norma jurídica é o resultado da interpretação do texto (signo de linguagem) ou dos sinais (circunstâncias fáticas) dos quais ela é decorrente. Estes funcionam como ponto de partida da interpretação cujo sentido inicial a eles atribuído pode, inclusive, ser revisto no decorrer do processo do compreender. O novo CPC é texto normativo, de cuja interpretação inúmeras normas jurídicas decorrerão. Essas normas jurídicas somente poderão ser aplicadas após o período de vacância. Três perguntas vêm à mente, porém: a) será que os novos textos normativos do CPC- produzem apenas normas jurídicas novas?; b) textos normativos novos ainda não vigentes produzem algum impacto na argumentação jurídica? c) há normas jurídicas novas que podem produzir efeitos mesmo no período da vacatio? Para responder a essas perguntas, é preciso esboçar uma tipologia das normas jurídicas que podem surgir do novo CPC.
2. Proposta. Apenas como forma de facilitar a resposta às três perguntas formuladas, é possível classificar as normas jurídicas provenientes do novo CPC em três grandes grupos: a) normas jurídicas novas ; b) pseudonovidades normativas ; c) normas de caráter simbólico. A classificação não tem pretensão de exaustividade, mas serve, ao menos por ora, para dar início à discussão. .1 Normas jurídicas novas. O novo CPC será fonte de inúmeras normas jurídicas novas – não fosse assim, não haveria necessidade de novo CPC. As normas jurídicas novas somente poderão ser aplicadas após a vigência do Código. É o que acontece, por exemplo, com os novos requisitos da petição inicial (arts. 320, II e VII, CPC), que somente podem ser exigidos para demandas ajuizadas após a vigência do novo Código; a irrecorribilidade imediata de algumas interlocutórias (at. 1.022, §§1º e 2º) somente poderá ser considerada para as decisões proferidas após o início da vigência etc. Essas normas novas são absolutamente ineficazes no período de vacatio legis. Mas há normas jurídicas novas que reforçam tendências doutrinárias e jurisprudenciais que começaram a formar-se ainda sob a vigência do CPC-1973. É o que acontece, por exemplo, com a cláusula geral de negociação processual (art. 191, CPC), os pressupostos para a distribuição dinâmica do ônus da prova (art. 380, §1º, parte inicial) e a normatização da formação, aplicação e superação dos precedentes judiciais (arts. 520-522, CPC). Em todos esses casos, a doutrina e a jurisprudência já apontavam muitas das soluções que vieram a ser consagradas legislativamente – e esse apontamento visava à solução de problemas jurídicos surgidos na vigência do CPC-1973. A consagração legislativa dessas soluções é um dado nada desprezível e serve como importante reforço argumentativo. (^5) ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 10ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 30. (^6) ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos, cit., p. 32. (^7) ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos , cit., p. 33.
anos^12. Essa norma decorre do texto constitucional; o texto do novo CPC apenas ratifica o que já se entendia. Mesmo se o novo CPC silenciasse a respeito do tema, ainda assim o princípio do contraditório, de fundo constitucional, tornaria nula a decisão-surpresa. O trecho final do §1º do art. 380 determina que o juiz, ao redistribuir o ônus da prova, garanta à parte, a quem foi atribuído o ônus da prova, a oportunidade de se desincumbir dele. Esse trecho também concretiza o princípio do contraditório. Sucede que essa providência já é exigida atualmente, a despeito da ausência de texto normativo , exatamente como concretização do princípio do contraditório^13. Também aqui não há norma nova. A percepção de que o CPC traz algumas pseudonovidades é muito importante, ainda, por outro motivo. Há o risco de que, no período de vacatio , alguém considere que essas pseudonovidades sejam realmente novidades; assim, decida somente aplicá-las a partir da vigência do novo Código, o que funcionaria, em razão dessa interpretação canhestra, como fonte normativa do retrocesso. O perigo existe e é inadmissível que esse pensamento se concretize. Esses enunciados normativos novos reforçam, ratificam, confirmam, corroboram etc. a compreensão atual do direito processual civil brasileiro, construída antes da vigência do novo CPC. Podem, por isso, ser utilizados imediatamente como reforço de argumentação. .3 Normas simbólicas. (^12) OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. “Poderes do juiz e visão cooperativa do processo”. Revista de Direito Processual Civil. Curitiba: Gênesis, 2003, n. 27, p. 28-29; DIDIER Jr., Fredie. “Princípio do contraditório: aspectos práticos”. Revista de Direito Processual Civil. Curitiba: Gênesis, 2003, n. 29, p. 510; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. “Os elementos objetivos da demanda examinados à luz do contraditório”. Causa de pedir e pedido no processo civil (questões polêmicas). José Roberto dos Santos Bedaque e José Rogério Cruz e Tucci (coord.). São Paulo: RT, 2002, p. 39-42; GRECO, Leonardo. “O princípio do contraditório”. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo: Dialética, 2005, n. 24, p. 76-77; CABRAL, Antônio do Passo. Nulidades no processo moderno: contraditório, influência e validade prima facie dos atos processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p.103-171, 207-234 e 239-243; CABRAL, Antonio do. “ll principio del contraddittorio come diritto d'influenza e dovere di dibattito”. Rivista Di Diritto Processuale. Milano: CEDAM, 2005, v. 2, n. 2, p. 449-464; ZANETI JR., Hermes. A constitucionalização do processo. O modelo constitucional da justiça brasileira e as relações entre processo e constituição. 2ª ed. revista, ampliada, alterada. São Paulo: Atlas, 2014, p. 180; NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008, p. 224-231; MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil. São Paulo: RT, 2009; CUNHA, Leonardo Carneiro da. A atendibilidade dos fatos supervenientes no processo civil: uma análise comparativa entre o sistema português e o brasileiro. Coimbra: Almedina, 2012, p. 61; BARREIROS, Lorena Miranda. Fundamentos constitucionais do princípio da cooperação processual. Salvador: Editora Jus Podivm, 2013, p. 198-199; CAVANI, Renzo. “Contra as ‘nulidades-surpresa’: o direito fundamental ao contraditório diante da nulidade processual”. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2013, n. 218, p. 65-80; MALLET, Estevão. “Notas sobre o problema da chamada ‘decisão-surpresa’”. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2014, n. 233, p. 43-63. (^13) STJ, 2ª S., EREsp n. 422.778/SP, rel. Ministro João Otávio de Noronha, rel. p/ Acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, j. em 29.02.2012, publicado no DJe de 21.06.2012. No mesmo sentido, enunciado 91 da súmula da jurisprudência predominante do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro: “A inversão do ônus da prova, prevista na legislação consumerista, não pode ser determinada na sentença”. Na doutrina, no mesmo sentido, há muitos anos, GIDI, Antônio. “Aspectos da Inversão do Ônus da prova no Código do Consumidor”. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 13, p. 38; MARINONI, Luiz Guilherme. Formação da Convicção e Inversão do Ônus da Prova segundo as peculiaridades do caso concreto. Disponível em: <http:// www.marinoni.adv.br/principal/pub/anexos/2007061901315330.pdf>. Acesso em: 13 dez 2007, p. 06, 07, 13 e 14; CAMBI, Eduardo. A Prova Civil. Admissibilidade e Relevância. São Paulo: RT, 2006, p. 418 segs.; CARPES, Artur Thompsen. “Apontamentos sobre a inversão do ônus da prova e a garantia do contraditório”. In: Prova Judiciária. Estudos sobre o novo Direito Probatório. Danilo Knijnik (Coord.). Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 40 segs.; MIRANDA NETTO, Fernando Gama de. Ônus da Prova: No Direito Processual Público. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009, p. 217-218; MENDES Jr., Manoel de Souza. “O momento para a inversão do ônus da prova com fundamento no Código de Defesa do Consumidor”. Revista de processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 114, 2004, p. 89; DIDIER Jr., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil. 9ª ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2014, v. 2, p. 83-86.
O novo CPC traz alguns enunciados que podem ser considerados como manifestação de legislação simbólica. No Brasil, o conceito de legislação simbólica foi desenvolvido por Marcelo Neves. Para ele, considera-se legislação simbólica a “produção de textos cuja referência manifesta à realidade é normativo-jurídica, mas que serve, primária e hipertroficamente, a finalidades políticas de caráter não especificamente normativo-jurídico”^14. Na legislação simbólica, o sentido político prepondera sobre o sentido normativo-jurídico do texto legislado. Um mesmo texto normativo pode ser lido em uma dimensão simbólica e em uma dimensão normativo-jurídica. Umas das espécies mais comuns de legislação simbólica é a legislação-álibi, que é aquela por meio da qual o legislador “procura descarregar-se de pressões políticas ou apresentar o Estado como sensível às exigências e expectativas dos cidadãos” 15. A legislação- álibi serve para, dentre outras coisas, amortecer as reivindicações dos cidadãos, permitindo o surgimento de um clima de que “agora, vai!”. 16 Dois exemplos – alguns outros poderiam ser citados. O art. 3º, §2º: “O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos”. Trata-se de enunciado que consagra, legislativamente, uma política pública: a solução consensual dos conflitos passa a ser uma meta a ser realizada. O dispositivo ratifica a Resolução n. 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, que já havia determinado a implantação dessa política pública. Agora, há a consagração legal dessa opção, que está em consonância com movimento mundial de estímulo à solução negociada, considerada o mais efetivo entre todos os métodos de resolução de conflitos. O art. 1.083 é outro exemplo: “O Conselho Nacional de Justiça promoverá, periodicamente, pesquisas estatísticas para avaliação da efetividade das normas previstas neste Código”. Esse dispositivo veio atender a velho reclamo da ciência jurídica brasileira^17 e da sociedade civil^18 : a existência de uma base confiável e permanente de dados estatísticos para a aferição da qualidade da nossa legislação processual civil. Além disso, o artigo é uma forma de exposição simbólica do Conselho Nacional de Justiça^19 , instituição que se apresenta como responsável pelo bom funcionamento do Poder Judiciário brasileiro e que deve ser merecedora da confiança pública dos cidadãos. O sentido político desse enunciado prepondera claramente sobre o seu sentido normativo, que, embora rarefeito, existe^20. Essa legislação simbólica é ineficaz no período da vacatio? O Estado esperará o CPC entrar em vigor para continuar implantando a política pública de busca pela solução consensual dos conflitos? O Conselho Nacional de Justiça (^14) NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. 3ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2011, p. 30. (^15) NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. 3ª ed., cit., p. 37. (^16) “(...) é evidente que a legislação-álibi pode induzir ‘um sentimento de bem-estar’, com isso levar à ‘resolução de tensão’ e, portanto, servir à ‘lealdade das massas’”. (NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. 3ª ed., cit., p. 40). (^17) MOREIRA, José Carlos Barbosa. “O futuro da justiça: alguns mitos”. Temas de Direito Processual (Oitava Série). São Paulo: Saraiva, 2004, p. 10-12; “As reformas do Código de Processo Civil: condições de uma avaliação objetiva”. Temas de Direito Processual (Sexta Série). São Paulo: Saraiva, 1997, p. 93; ARAGÃO, Egas Dirceu Moniz de. “Estatística judiciária”. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2003, n. 110, p. 9. (^18) Que já se organiza nessa direção, como se vê dos notáveis exemplos do CEBEPEJ – Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais e da Fundação Getúlio Vargas, com trabalhos importantíssimos de mineração e organização de dados sobre o funcionamento do Judiciário e dos processos. (^19) A exposição simbólica de instituições é uma das utilidades da legislação-álibi (NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. 3ª ed., cit., p. 38). (^20) É possível cogitar uma ação civil pública para impor ao CNJ a realização das referidas pesquisas.