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Dualismo platônico e a visão adventista, Notas de estudo de Teologia

O presente artigo lida com a posição da Igreja Adventista quanto à possessão demoníaca e seu contraste com o dualismo platônico. Através da pesquisa bibliográfica, este trabalho propôs distinguir as duas posições conflitantes sobre a natureza do homem, a saber, o dualismo e o holismo, demonstrando como a possessão é entendida em cada uma dessas vertentes. Com esse estudo foi possível traçar as bases para uma compreensão correta e concreta do ensino bíblico de integralidade do ser humano e pontua

Tipologia: Notas de estudo

2014

Compartilhado em 27/05/2014

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eliabe-neves-8 🇧🇷

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A VISÃO ADVENTISTA SOBRE POSSESSÃO DEMONÍACA E SEU CONTRASTE
COM O DUALISMO PLATÔNICO1
André Uziel da Cunha 2
Laézio Mariano de Oliveira3
Graciliano Martins dos Santos Filho4
Vânia Hirle Almeida 5
RESUMO
O presente artigo lida com a posição da Igreja Adventista quanto à possessão
demoníaca e seu contraste com o dualismo platônico. Através da pesquisa bibliográfica, este
trabalho propôs distinguir as duas posições conflitantes sobre a natureza do homem, a saber, o
dualismo e o holismo, demonstrando como a possessão é entendida em cada uma dessas
vertentes. Com esse estudo foi possível traçar as bases para uma compreensão correta e
concreta do ensino bíblico de integralidade do ser humano e pontuar de maneira contundente
a forma sobre como se processa e ocorre a possessão demoníaca. Esta compreensão se
mostrou radicalmente oposta à concepção dualística tanto em suas bases argumentativas
quanto em seus resultados lógicos. Verificou-se com esse trabalho que a visão dualista foi
introduzida na comunidade cristã desde os seus primórdios. Sendo venerada por muitos e
rejeitada por alguns, ela influenciou e deturpou a compreensão bíblica de vários temas, entre
os quais a possessão demoníaca. Conclui-se através deste estudo que, não sendo possível
nutrir uma ideia de introdução corpórea e permanecer coerente com o holismo bíblico, a
Igreja Adventista do Sétimo Dia, que se utiliza do método de sola scriptura, defende a
possessão demoníaca ocorrida através do controle da mente, negando, portanto, que aja uma
introdução corpórea.
Palavras-chave: Possessão Demoníaca. Dualismo Platônico. Holismo. Mente. Corpo.
Posição da Igreja.
ABSTRACT
This paper deals with the position of the Adventist Church regarding demon
possession and its contrast with the Platonic dualism. Through literature research this study
proposed to distinguish the two conflicting positions about the nature of man, namely dualism
and holism, demonstrating how possession is understood in each of these aspects. Through
this study was possible to outline the foundation for a proper understanding of biblical
teaching and practical of integrality human and punctuate in a schocking way how to
processes and occurs as demonic possession. This understanding proved radically opposed to
the dualistic conception, both in their bases regarding argumentative in their logical results.
1 Artigo apresentado ao Seminário Adventista Latino-Americano de Teologia como requisito obrigatório parcial
para a obtenção do título de Bacharel em Teologia.
2 Bacharelando em Teologia pelo Seminário Adventista Latino-Americano de Teologia.
3 Bacharelando em Teologia pelo Seminário Adventista Latino-Americano de Teologia.
4 Mestre em Psicologia pela Universidade Salgado de Oliveira. Graduado em Formação de Psicólogo pela
Universidade Estácio de Sá. Professor do SALT. Orientador específico.
5 Doutora em Educação e Sociedade pela Universidade de Barcelona - Professora do SALT e FADBA.
Orientadora metodológica.
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A VISÃO ADVENTISTA SOBRE POSSESSÃO DEMONÍACA E SEU CONTRASTE

COM O DUALISMO PLATÔNICO^1

André Uziel da Cunha 2 Laézio Mariano de Oliveira^3 Graciliano Martins dos Santos Filho^4 Vânia Hirle Almeida 5

RESUMO

O presente artigo lida com a posição da Igreja Adventista quanto à possessão demoníaca e seu contraste com o dualismo platônico. Através da pesquisa bibliográfica, este trabalho propôs distinguir as duas posições conflitantes sobre a natureza do homem, a saber, o dualismo e o holismo, demonstrando como a possessão é entendida em cada uma dessas vertentes. Com esse estudo foi possível traçar as bases para uma compreensão correta e concreta do ensino bíblico de integralidade do ser humano e pontuar de maneira contundente a forma sobre como se processa e ocorre a possessão demoníaca. Esta compreensão se mostrou radicalmente oposta à concepção dualística tanto em suas bases argumentativas quanto em seus resultados lógicos. Verificou-se com esse trabalho que a visão dualista foi introduzida na comunidade cristã desde os seus primórdios. Sendo venerada por muitos e rejeitada por alguns, ela influenciou e deturpou a compreensão bíblica de vários temas, entre os quais a possessão demoníaca. Conclui-se através deste estudo que, não sendo possível nutrir uma ideia de introdução corpórea e permanecer coerente com o holismo bíblico, a Igreja Adventista do Sétimo Dia, que se utiliza do método de sola scriptura, defende a possessão demoníaca ocorrida através do controle da mente, negando, portanto, que aja uma introdução corpórea.

Palavras-chave: Possessão Demoníaca. Dualismo Platônico. Holismo. Mente. Corpo. Posição da Igreja.

ABSTRACT

This paper deals with the position of the Adventist Church regarding demon possession and its contrast with the Platonic dualism. Through literature research this study proposed to distinguish the two conflicting positions about the nature of man, namely dualism and holism, demonstrating how possession is understood in each of these aspects. Through this study was possible to outline the foundation for a proper understanding of biblical teaching and practical of integrality human and punctuate in a schocking way how to processes and occurs as demonic possession. This understanding proved radically opposed to the dualistic conception, both in their bases regarding argumentative in their logical results. (^1) Artigo apresentado ao Seminário Adventista Latino-Americano de Teologia como requisito obrigatório parcial para a obtenção do título de Bacharel em Teologia. 2 3 Bacharelando em Teologia pelo Seminário Adventista Latino-Americano de Teologia. 4 Bacharelando em Teologia pelo Seminário Adventista Latino-Americano de Teologia. Mestre em Psicologia pela Universidade Salgado de Oliveira. Graduado em Formação de Psicólogo pela Universidade Estácio de Sá. Professor do SALT. Orientador específico. 5 Doutora em Educação e Sociedade pela Universidade de Barcelona - Professora do SALT e FADBA. Orientadora metodológica.

Was found with this study that the dualistic view was introduced into the Christian community since its the earliest days. Being worshiped by many and rejected by some, it influenced and distorted the biblical understanding of various topics including demonic possession. We conclude from this study that it is not possible to nurture an idea of introduction body and remain consistent with the biblical holism, the Seventh-day Adventist Church, which uses the method of sola Scriptura, defends demonic possession occurring through mind control, refusing therefore to act an introduction body.

Key-words: Demon Possession. Platonic Dualism. Holism. Mind. Body. the Church's position.

1 INTRODUÇÃO

A possessão demoníaca sempre terá suas incógnitas por se tratar de algo pouco discutido no texto bíblico, sendo que uma delas é sobre como ocorre a possessão, se por introdução corpórea ou por controle mental. Questiona-se então se é possível compreender a possessão demoníaca sem cair na filosofia platônica conhecida por dualismo, mantendo assim a visão holística bíblica pregada principalmente no meio adventista? Faz-se necessário responder esta pergunta, pois dela depende a visão adventista de natureza humana, na qual o homem é considerado um ser holístico, integral, portanto, sem divisão. Observa-se que este artigo traça os conceitos de dualismo platônico e holismo bíblico, discorrendo sobre essas duas vertentes da natureza humana e como a possessão demoníaca se processa em cada um desses pensamentos. Em seguida, será apresentado como o pensamento dualista foi introduziu no meio cristão e qual a atual posição da Igreja adventista do sétimo dia sobre holismo. Para tanto, foram pesquisados eruditos teólogos tanto católicos como protestantes, conservadores e liberais, mas destacam-se os adventistas, pois mesmo sendo protestantes, eles merecem uma menção distintiva em virtude de ser parte do objeto de estudo. Entre os eruditos adventistas pesquisados, será utilizado com mais frequência o teólogo Samuele Bacchiocchi, por seu mais recente trabalho sobre imortalidade e ressurreição, onde argumenta com muita propriedade sobre o tema do dualismo e holismo. Entretanto, outras referências foram pesquisadas e serão aqui citadas sobre o mesmo tema.

2 AS DUAS FORMAS DE PENSAMENTO SOBRE A NATUREZA HUMANA

O dualismo clássico da natureza humana provém principalmente dos escritos de Platão, Aristóteles e dos estóicos. A ênfase dessas filosofias incide sobre a distinção entre os componentes dessas naturezas, material e espiritual, sendo o componente material

espírito precisavam ser levados em conta para cuidar da saúde (REYNER, 2005). Mesmo que a nomenclatura “holismo” tenha sido cunhada à tão pouco tempo, a ideia de integralidade do homem é muito mais antiga e trabalha com o mesmo princípio de unidade indivisível (AQUINO, 1998).

3 MESMO NÃO SENDO BÍBLICO, O DUALISMO ENTROU NO CRISTIANISMO

Em todas as eras, o povo de Deus viveu sob o domínio de grandes impérios, sendo eles, respectivamente: babilônico, egípcio, assírio, neo-babilônico, persa, grego e finalmente o império romano (McFALL, 1979). Isso de alguma maneira influenciou suas crenças, filosofias e ideologias. Não há dúvida de que “historicamente o pensamento cristão popular tem sido influenciado” (BACCHIOCCHI, 2007, p. 10), podendo ser percebido claramente na vida do povo Hebreu, em Êxodo, onde, por exemplo, narra-se o episódio em que os israelitas fizeram para si um bezerro de ouro (Êx. 32:1-6) sob a influência da idolatria egípcia (McCOMISKEY, 1979). Assim, de tempos em tempos, o povo se rebelava contra vontade de Deus, seguindo o paganismo. Não foram poucas as vezes em que os profetas se levantaram para repreender os reis e a nação por suas práticas rebeldes. Elias é um ótimo exemplo de profeta que lutou contra a idolatria e as práticas pagãs (1Rs. 17, 18 e 19). Nos tempos do Novo Testamento, segue-se a influência, desta vez não cedida pelos egípcios ou babilônicos e sim pelos gregos, que disseminaram sua cultura e pensamento sobre os povos do mundo conhecido (BUHL, 1909). Não é por acaso que este artigo cita a cultura helenística, já que ela se destaca entre as influências mais fortes sofridas pelo povo de Deus, principalmente a ideia dualística do ser humano defendida pelo filósofo grego Platão, que afirma que o corpo e a alma são entidades separadas, sendo o corpo a prisão da alma (BACCHIOCCHI, 2007). Essa influência já era sentida muito forte nos pais da igreja. Como afirma Ratzinger:

Os pais da igreja viam realmente manifesta nessa concordância a mais profunda unidade entre filosofia e fé, entre Platão e Moisés, entre o espírito grego e o Bíblico. Tão completa para eles era essa identidade entre a busca realizada pelo espírito filosófico e a obtenção que se dera pela fé de Israel, que na opinião deles, Platão não podia ter chegado por suas próprias forças a semelhante conhecimento. (RATZINGER, 2005, p. 88)

Lendo essa afirmação, percebe-se o grau de consideração que os escritos platônicos tinham sobre os pais da igreja. Ainda é possível mencionar Santo Agostinho, que influenciou

grandemente a Igreja Cristã medieval e possuía uma filosofia helênica (VAZ, 2006), pois ele extraiu de textos platônicos elementos que concordam com a doutrina cristã (REALE, 2004). Quando a filosofia helênica apareceu, sua influência foi tão avassaladora que provocou uma cisma entre os Saduceus que a adotaram e os Fariseus que a rejeitaram. Essa influência foi sentida em todos os campos filosóficos, principalmente em questões metafísicas (MARINOFF, 2006), sendo que a questão dualística se encaixa perfeitamente como uma concepção metafísica do homem.

4 IMPLICAÇÕES DO PENSAMENTO DUALÍSTICO

A implicação mais preocupante deste pensamento é a imortalidade da alma (CULLMANN, 1965). No entanto, este tema tem sido bastante discutido por renomados teólogos, tais como Oscar Cullmann, Clark Pinnok e John Stott (BACCHIOCCHI, 2007), como também pela Igreja Adventista do Sétimo Dia. Porém, outro problema precisa ser debatido e este artigo se propõe a fazê-lo, sendo a posição da igreja adventista sobre possessão demoníaca em contraste com o dualismo platônico. No mundo oriental, a ideia de introdução corpórea soa com certa facilidade, visto que o dualismo tem suas bases estabelecidas historicamente nessa região, como comenta Evans- Wents quando se refere à aceitação da crença da introdução do espírito imundo: “Entre os povos, primitivos e civilizados, existe a crença de que demônios, que às vezes podem ser a alma de mortos, conseguem possuir um corpo humano expelindo sua alma e ocupando o lugar dela.” (EVANS-WENTS, 2007, p. 209). O interessante é que no mundo ocidental a ideia não é muito diferente, o Dr. John Andreassi, editor do International Journal of Psychophysiology , no glossário de um de seus livros definiu possessão demoníaca como sendo “a crença de que um corpo de uma pessoa poderia ser habitado e controlado por um espírito ou demônio” (ANDREASSI, 2007, p. 16, itálico nosso). Percebe-se que, em ambos os pensamentos, oriental e ocidental, existe a crença da introdução corpórea de espírito imundo, sendo este o caminho natural de quem é guiado pelo dualismo platônico que, como já foi apresentado, afirma que o homem tem em si um espaço divisível, permitindo assim a entrada de outra entidade. Entende-se que por ela o espírito imundo tem acesso, como percebemos na afirmação de Ribas (2003, p. 118):

O homem e a mulher foram formados à imagem de Deus com individualidade e com o poder e a liberdade de pensar e agir. Conquanto tenham sido criados como seres livres, cada um é uma unidade indivisível de corpo, mente e alma , e dependente de Deus quanto à vida, respiração e tudo o mais. Quando nossos primeiros pais desobedeceram a Deus, negaram sua dependência dEle e caíram de sua elevada posição abaixo de Deus. A imagem de Deus, neles, foi desfigurada, e tornaram-se sujeitos à morte. Seus descendentes partilham dessa natureza caída e de suas consequências. (GRELLMANN, 2008, p. 100).

E continua:

A equação escriturística é muito clara: o pó da terra (elementos terrestres) +fôlego de vida = ser vivente ou alma vivente. A união dos elementos da terra como fôlego de vida resultou numa criatura vivente, ou alma. Esse “fôlego de vida” não está limitado às pessoas. Todas as criaturas vivas o possuem. A Bíblia, por exemplo, atribui o fôlego de vida tanto aos animais que entraram na arca de Noé, quanto àqueles que ali não entraram (Gn. 7:15 e 22).O termo hebraico de Gênesis 2:7, aqui traduzido como “alma vivente” ou “ser vivente”, é nephesh chayyah. Essa expressão não designa exclusivamente o homem, pois também é aplicada a animais marinhos, insetos, répteis e bestas(Gn. 1:20 e 24; 2:19).Nephesh, traduzido como “ser” ou “alma”, provém de naphash, que significa “respirar”. O termo grego equivalente em o Novo Testamento é psuche. Uma vez que a respiração é a mais evidente manifestação de vida, nephesh designa basicamente o homem como uma criatura vivente. (GRELLMANN, 2008, p. 103).

Esses textos do livro Nisto Cremos mostram qual a visão oficial da igreja sobre o homem e sua alma, reforçando assim que a voz oficial da igreja é crer no homem como um ser indivisível, ou seja, integral, holístico. Da mesma forma, o Tratado de Teologia Adventista defende o monismo bíblico em detrimento ao dualismo, pois para ele os “componentes de um ser humano funcionam como uma unidade, não existindo nenhuma alma separável do corpo ou espírito capaz de uma existência consciente à parte do corpo”. (CAIRUS, 2012, p. 239) O movimento adventista já em seus primórdios adotou uma visão sobre temas antropológicos desde então minoritária, mas como sempre, bíblica. Para os adventistas, era muito importante ter um corpo doutrinário que fosse livre de especulação filosófica e da tradição eclesiástica (CAIRUS, 2012). Para Ellen G. White, a visão holística foi importante principalmente no conceito do cuidado com a saúde através do conhecimento da relevância do corpo para Deus, o que para Platão era descartável (WHITE, 2010). A visão holística da natureza humana tem sido defendida no púlpito adventista desde sua fundação, mesmo sofrendo oposição de tradições cristãs e seculares (CAIRUS, 2012). Esta posição ganha contornos mais atuais por ocasião da discussão e confirmação da visão da natureza antropológica, voltada para o holismo bíblico, como foi apresentada na Terceira Conferência Bíblica Internacional em Jerusalém, ocorrida de 11-20 de Junho de

2012, com o tema “Questões em Antropologia Bíblica de uma Perspectiva Adventista.”. (LEAL, 2012). Neste encontro, reuniram-se os principais eruditos adventistas para tratar de temas antropológicos e elaborar uma declaração adventista oficial de afirmação e de negação sobre a natureza do homem. Neste artigo, foram apresentados apenas os assuntos que são relacionados com do tema do holismo. Sendo assim, seguem as duas afirmações e as duas negações. No que se refere às afirmações, pode-se dizer que:

Nós afirmamos que os seres humanos são criaturas de Deus, formadas indivisivelmente do pó da terra, nas quais Deus soprou o fôlego da vida (Gn 2:7). (evolução e dualismo) Nós afirmamos que a morte é a consequência inevitável do pecado, e é tanto a cessação da consciência pessoal, como um fim à vida humana em todas as suas dimensões até a ressurreição. O fôlego retorna a Deus que o deu, e o pó retorna à terra (Gn 3:19; Ecl 12:7) (imortalidade incondicional).

Concernente às negações sobre a natureza do homem, observa-se que:

Nós negamos a imortalidade natural em suas várias formas, incluindo o conceito de alma imaterial, castigo eterno, e reencarnação em qualquer forma de vida. Nós negamos todas as formas de dualismo antropológico, especialmente a crença de que "alma" e corpo são partes diferentes do corpo.

Conforme descrito nessas afirmações e negações oficiais da Igreja Adventista do Sétimo Dia, não deve haver espaço para o dualismo filosófico em qualquer de suas facetas. Entender isso se faz imprescindível para a última parte deste artigo, que discutirá a incoerência de alguém, sendo adventista do sétimo dia, acreditar numa introdução corpórea.

6 A ÚNICA MANEIRA DE SER COERENTE

Se na visão holística não há divisibilidade, a crença de que o demônio entra no corpo do indivíduo possesso não encontra apoio lógico ou coerente. Assim, a única maneira de ser condizente com a visão holística, defendida pela Igreja Adventista do Sétimo Dia com respeito à possessão demoníaca, é que ela “não pode ocorrer exceto pelo sistema nervoso, pois por ele satanás ganha acesso a mente” (SDAC. 1956, p 576). Observa-se então que a mente humana é o canal de acesso para a ação do mal, pois é nela que se encontra o campo de batalha para maior conflito sobre este planeta. Cristo busca controlar nossas mentes, satanás, por outro lado, busca reter o controle da gente porque sabe que uma mente dominada por ele traz “inimizade para com Deus” (Rm. 8:7). (PHILLIPS, 2003,).

7 O QUE É A MENTE?

Para ter uma concepção final sobre possessão, faz-se necessário apresentar alguns conceitos sobre a mente, não pretendendo ser exaustiva essa visualização conceitual porque isso tornaria irrelevante aos objetivos deste trabalho. Para o dualismo, a mente é de uma complexidade tamanha, pois o próprio dualismo, para explicar a mente, precisa desmembrar em partes ainda mais complexamente filosóficas quanto ao seu significado, conceito e nomenclatura. Assim brotam “o dualismo de substância que divide o ser humano em duas substâncias distintas com um corpo material e uma mente imaterial” (BROOK e STAINTON, 2000, p. 83), sendo “ o dualismo de propriedade onde o ser humano é apresentado como um objeto único, mas com duas espécies radicalmente diferentes de propriedades: a propriedade mental e a propriedade material” (BROOK e STAINTON, 2000, p. 83). Em ambos os conceitos, a mente continua atuando no campo metafísico, o que eleva a mente para um plano distintivo e totalmente diferente do cérebro (BROOK e STAINTON, 2000). Descartes, francês, filósofo racionalista e matemático, que viveu entre 1596 e 1650 (BELANGER, 2007), defendia a ideia do Nonspatiality que, numa tradução aproximada, seria “sem espaço”. Tal ideia se refere exatamente à teoria de pensamento sobre a mente, pois para essa corrente filosófica, a mente não teria um local preciso (BROOK e STAINTON, 2000). Outra ideia é a intencionalidade no sentido de que algumas coisas são sobre outras, a mente então seria constituída de um sistema de representações mentais, o qual exibe intencionalidade intrínseca (FELTS; ZILLES, 2001). Para essa ideia, a mente existe pela própria intenção de ser. Para o materialismo, a mente é um processo da matéria. Sendo assim, a mente compreende a parte física. Porém, o materialismo não consegue responder aos questionamentos erguidos diante das complexidades mentais (BROOK e STAINTON, 2000). Já para o holismo, a mente e o cérebro são juntos e trabalham unidos inseparavelmente para o corpo (PERLS, 2002). Para a visão adventista, que é holística, a mente está tão ligada ao corpo que o domínio dela propicia o controle automático do restante do corpo. Ellen White tinha essa ideia em mente, sendo assim, a igreja trabalha com métodos que abrangem o homem em sua integralidade, como afirmam Groger e Follis:

Partindo do fundamental conceito integrador de Ellen White acerca da natureza humana (o profundo relacionamento entre o físico, mental e espiritual), todas as práticas relativas ao ser humano estaria em profunda (se não indivisível) relação com sua vida espiritual. (GROGER; FOLLIS, 2011, p. 153).

8 CONCLUSÃO

Conclui-se, portanto, que a visão adventista de possessão demoníaca vai em direção contrária as ideias do dualismo platônico, principalmente no que diz respeito ao campo de atuação de um espírito demoníaco, porque não é possível nutrir uma ideia de introdução corpórea (facilmente absorvida pelos seguidores do dualismo) e permanecer coerente quanto ao holismo bíblico. Quando este holismo é avaliado na concepção da possessão demoníaca, ele se mostra suficiente para se fazer aceito sem entrar no campo da filosofia platônica. Apesar de inegável, a influência da filosofia helenista dentro da comunidade cristã precisa ser combatida em todas as suas facetas, desde suas implicações quanto à imortalidade da alma até o conceito de possessão, razão pela qual esse trabalho foi desenvolvido. Evidentemente, dentro dos constructos da relação existente entre corpo, mente, alma e espírito, o dualismo, mesmo sendo filosoficamente lógico e correto, contradiz o conceito bíblico de integralidade do ser humano. Por esta razão, faz-se imprescindível que se produza outros trabalhos visando preencher as lacunas existentes dentro do pensamento cristão, criadas pela influência filosófica. Precisa-se evidenciar que não foi levantada a discussão sobre como a visão holística de controle da mente explica os fenômenos físicos típicos de um endemoninhado como também as ações sobrenaturais. A ideia desenvolvida teve como finalidade apresentar qual visão da Igreja Adventista e o seu contraste com o dualismo platônico. No entanto, mesmo não entrando no mérito das alterações físicas e atividades sobrenaturais de um possesso em nível mais agudo, haja vista o tempo e espaço para tal abordagem serem insuficientes, é perfeitamente plausível que alguém possa ser possuído por uma entidade demoníaca sem que a mesma precise ser invadida corporalmente por essa entidade. A compreensão dessas alterações físicas não encontra dificuldades se seus pressupostos forem baseados dentro da ideia de integralidade, onde uma mente, sendo controlada, pode alterar todo o funcionamento do restante do organismo que, por ser inseparável, o conduz a ações que a própria razão duvida.

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