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Divórcio liminar como tutela provisória de evidência: avanços e resistências*. Fernanda Tartuce. Doutora e Mestre em Direito Processual pela USP.
Tipologia: Notas de aula
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Não perca as partes importantes!
Divórcio liminar como tutela provisória de evidência: avanços e resistências.*
Fernanda Tartuce Doutora e Mestre em Direito Processual pela USP. Professora no programa de Doutorado e Mestrado da Faculdade Autônoma de Direito (FADISP). Coordenadora e professora em cursos de especialização na Escola Paulista de Direito (EPD). Diretora do Centro de Estudos Avançados de Processo (CEAPRO). Presidente da Comissão de Processo Civil do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM). Presidente da comissão de Mediação Contratual do Instituto Brasileiro de Direito Contratual (IBDCont). Vice Presidente da Comissão de Mediação do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP). Advogada, mediadora e autora de publicações jurídicas.
Proposta uma demanda de divórcio litigioso com pleitos diversos, a possibilidade de cisão do julgamento para o decreto imediato do fim da união merece análise detida. Havendo controvérsia sobre temas variados (como guarda, alimentos e partilha de bens) mas existindo consenso quanto ao divórcio, é possível decidi-lo liminarmente decretando o fim do vínculo conjugal e determinar o seguimento do feito para a apreciação dos demais pedidos^1? A indagação é relevante porque as pessoas cada vez mais valorizam a celeridade, a liberdade e a sensação de alívio imediato em relação ao fim de situações existenciais relevantes. Além disso, há claro sentimento de injustiça quando partes contrariadas mantêm o status de casadas enquanto discussões sobre outros temas se arrastam no tempo^2. A título ilustrativo, imagine que Janielson e Nereide resolveram se divorciar: apenas
*Artigo publicado na Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil v. 95, mar-abr 2020. 1 TARTUCE, Fernanda. Processo civil no Direito de Família: teoria e prática. 5ª ed. SP: Método, 2020 (no prelo), item 3.2.9.1. 2 TARTUCE, Fernanda. Processo civil no Direito de Família: teoria e prática. 4ª ed. SP: Método, 2019. p.
quanto ao fim do vínculo existe consenso, havendo divergência quanto a todos os fatores jurídicos ligados à extinção da relação. Vale perquirir: cabe o deferimento do divórcio liminar do casal no sistema jurídico brasileiro?
2. Liberdade e relação familiar
Em primorosa lição, João Baptista Villela ensina que a visão atual de família “está profundamente permeada não por aquilo que ela é, em sua essência, senão por aquilo que o sagrado e o político tentaram e tentam dela fazer”; assim, “o que chamamos direito de família é, na verdade, direito da versão de família: um construto elaborado sob a filtragem política e sagrada sob que captamos a instituição^3 ”. Nessa medida, embora o Estado possa projetar uma visão idealizada de família, no plano fático situações multifacetadas conduzem vários núcleos familiares a realidades bem diversas daquela concebida pelo legislador^4. Os rumos da família devem ser definidos pelos seus componentes maiores e capazes no exercício legitimo de sua liberdade. A autonomia privada é “expressão da liberdade”, devendo ser reconhecida como o poder do indivíduo de gerir sua própria vida com base em sua dignidade humana^5. Para Renata Vilela Multedo, no contexto atual de reconhecimento da pluralidade de organizações familiares, ganha relevância a tendência de “desregulamentação legal das relações conjugais por meio da ‘privatização do casamento’”; nessa perspectiva:
“Sustenta-se que o Estado não deveria mais tutelar essas relações através de normas imperativas, mas tão somente mediante regras supletivas (standards), em caso de não manifestação expressa do casal. Mesmo no âmbito das relações parentais já se questiona até que ponto delegar ao Estado, por meio dos órgãos judicantes, a incumbência de dirimir as divergências entre os pais sobre a administração do cotidiano dos filhos, principalmente quando estes detêm a autoridade parental, é uma
(^3) VILLELA, João Baptista. Repensando o direito de família. Disponível em: < https://bdjur. stj.jus.br/jspui/bitstream/2011/118885/repensando_direito_familia_villela.pdf >. Acesso em: 13 mar. 2020. 4 TARTUCE, Fernanda. Processo civil no Direito de Família: teoria e prática. 4ª ed. SP: Método, 2019. p. 28. 5 MULTEDO, Renata Vilela. Liberdade e família – Limites para a intervenção do Estado nas relações conjugais e parentais. Rio de Janeiro: Processo, 2017, p. 22-23.
próprias escolhas e de viver a própria vida da forma que melhor lhe convém.
3. Tutela provisória e deferimento liminar
Em cenários conflituosos, muitas pessoas buscam assessoria jurídica para protegê-las em situações de risco iminente; algumas, inclusive, chegam a mencionar que precisam de uma “liminar” o quanto antes^10. Infelizmente não tende a ser fácil o deferimento liminar de decisões judiciais; para que o juiz promova uma mudança significativa no status quo , ele deve se convencer de que realmente sua iniciativa será essencial (sob pena de indeferir o pleito). Em casos de divórcio, embora o ônus argumentativo do advogado possa ser bem desenvolvido, nem sempre é fácil configurar uma situação de urgência para o decreto imediato do fim do vínculo conjugal. Pode ser que uma das partes deseje se casar rapidamente, por exemplo, precisando então do reconhecimento quanto ao fim da união anterior o quanto antes... na prática, contudo, nem sempre isso se verifica: as pessoas simplesmente querem se livrar do vínculo que não mais integra seu projeto de vida. Nesse caso, embora possa haver urgência sob o prisma pessoal (emocional), o magistrado do caso pode sentir que falta argumento jurídico convincente. Não sendo a urgência o principal fundamento para o deferimento liminar, qual deve ser o substrato invocado para a concessão de divórcio liminar? O Código de Processo Civil destaca, no art. 294, que a tutela provisória pode ter por fundamento a urgência ou a evidência. Como se nota, a possibilidade de concessão de tutelas provisórias foi ampliada no CPC/2015: este passou a contemplar expressamente a existência de hipóteses de deferimento, mesmo que o requerente não se situe em um contexto de emergência^11.
4. Tutela de evidência no CPC/2015.
Na elaboração do Novo CPC, os legisladores não se contentaram com as técnicas criadas até então (em que urgência e verossimilhança autorizavam a antecipação de provimentos): para ampliar oportunidades, passaram a adotar a possibilidade de
(^10) TARTUCE, Fernanda. Dellore, Luiz. Manual de Prática Civil. 15ª ed. SP: Método, 2020, p. 182. (^11) TARTUCE, Fernanda. Dellore, Luiz. Manual de Prática Civil. 15ª ed. SP: Método, 2020, p. 202.
antecipação sem emergência (valor claramente ausente nas situações previstas no artigo 311 do Código)^12. Como bem aponta Daniel Penteado de Castro, “A antecipação da tutela sem o requisito da urgência está fundada na concepção atual do processo justo, senão a necessária observância das garantias que derivam do devido processo legal e, dentre as garantias processuais constitucionais, tem- se a previsão do Princípio da Duração Razoável do Processo (art. 5º, LXXVIII, da CF) e de acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CF) 13 ”.
A tutela provisória de evidência ali prevista busca assegurar o gozo de efeitos de um direito reputado claro ( direito evidente). Embora o cabimento geral de tal tutela esteja expresso no CPC em quatro situações específicas, tal rol não é taxativo. As hipóteses de tutela de evidência não se exaurem na lista do art. 311 do CPC: a tutela de evidência é compatível com os procedimentos especiais (cf. Enunciado 422 do FPPC) e com os procedimentos recursais (CPC, arts. 995, parágrafo único, 1.012, § 4º, 1.019, inc. I, 1.026, § 1º e 1.029, § 5º; Enunciado 423 do FPPC)”^14. Há julgados nesse sentido, como exemplifica o seguinte acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:
“O deferimento da tutela de evidência condiciona-se ao enquadramento dentro de uma das hipóteses contidas no artigo 311, CPC/15, podendo ser concedida independentemente de demonstração de perigo de dano ou de risco do resultado útil do processo. O rol elencado no artigo 311 do CPC/15 é meramente exemplificativo, podendo ser pleiteado o seu reconhecimento em outras hipóteses legais previstas, tais como ocorre no pleito liminar de reintegração de posse, nos termos do artigo 516, do CPC”^15.
Embora o Código de Processo Civil admita a concessão de tutela de evidência fora
(^12) CASTRO, Daniel Penteado de. Antecipação de tutela sem o requisito da urgência: Panorama geral e perspectivas no Novo Código de Processo Civil. Salvador: Juspdvum, 2016, p. 142-143. 13 CASTRO, Daniel Penteado de. Antecipação de tutela sem o requisito da urgência: Panorama geral e perspectivas no Novo Código de Processo Civil. Salvador: Juspdvum, 2016, p. 281. 14 CAMBI, Eduardo et. al. Curso de processo civil completo. 2ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019, p. 351. 15 TJMG; AI 1.0694.16.001616-8/001; Rel. Des. Luiz Artur Hilário; Julg. 09/05/2017; DJEMG 05/06/2017.
Na mesma linha se manifestam Renata Malta Vilas-Bôas e Susana de Moraes Spencer Bruno:
“Diante de um direito potestativo, ou seja, aquele que não admite contestação, que é exteriorização da vontade da parte, é possível a concessão da antecipação de tutela – sem necessidade de ouvir a parte contrária, pois, nesse caso, não há de se falar em contraditório, e, portanto, não há que se falar em ofensa ao direito do réu, na medida em que ele não dispõe de nenhum direito, e, no caso específico, não há que se falar em obrigar o outro a permanecer casado”^19.
Assim, por meio de um julgamento parcial do mérito, o divórcio é decretado e as discussões sobre as demais situações podem prosseguir rumo aos respectivos julgamentos. Eis um exemplo: em certa causa houve recurso da decisão que, a pedido do autor, deferiu a antecipação da tutela para decretar o divórcio do casal. Contra essa “verdadeira decisão parcial de mérito” houve insurgência da ré-reconvinte, que pretendia o reconhecimento também de união estável na decisão parcial de mérito. Este pleito foi negado porque haveria supressão de instância e a situação seria controversa. Já quanto ao divórcio reconheceu-se a possibilidade de decretação antes da sentença com base no art. 356 do CPC porque: 1. não havia controvérsia entre as partes sobre o fim da sociedade conjugal; 2. o direito é potestativo; 3. não haveria prejuízo à posterior análise da partilha de bens e nem à ocorrência de eventual união estável anterior^20. Na realidade, não é nova a situação de haver cisão de julgamento. Se, por exemplo, após decretado o divórcio a instrução se torna suficiente para decisão sobre os alimentos entre os cônjuges mas não sobre a partilha – que pode demandar, por exemplo, a produção de prova pericial – , nada impede que aquele pedido seja julgado antecipadamente também. Já sob a égide do CPC/1973 (que não previa expressamente o julgamento antecipado parcial do mérito), Flávio Tartuce entendia viável possibilitar que a decretação do fim do casamento fosse fixada como prioridade pelo juiz da causa, “dissolvendo-se o vínculo
(^19) VILAS-BÔAS, Renata Malta; BRUNO, Susana de Moraes Spencer. Divórcio liminar: uma possibilidade diante da Emenda Constitucional nº 66/2010. Revista Síntese Direito de Família, São Paulo, SP, v. 15, n. 87, p.13-29, jan. 2015, p. 23- 24. 20 TJSP; AI 2227920-67.2019.8.26.0000; Ac. 13109328; São Paulo; Terceira Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Carlos Alberto de Salles; Julg. 26/11/2019; DJESP 29/11/2019; Pág. 1913.
existente entre as partes de imediato e proferindo-se uma sentença parcial”; as demais situações (como as ligadas a alimentos, uso do nome e partilha de bens), podiam ser discutidas em posterior momento na própria ação de divórcio ou em ação autônoma^21. No mesmo sentido, Pablo Stolze Gagliano defendia a antecipação dos efeitos definitivos da sentença, com base no art. 273, § 6º do CPC/73: “por se tratar, o divórcio, de um direito potestativo, não haveria razão ou justificativa de mérito hábil a impedir a sua decretação”^22. Para ele, a cumulação de pedidos no divórcio litigioso, como guarda dos filhos, pensão alimentícia e partilha dos bens, não impedia a decretação imediata da dissolução do vínculo matrimonial:
“Não haveria sentido em se manter aquele casal – cujo afeto ruiu – matrimonialmente unido, considerando-se não haver mais condição ou requisito para o divórcio, enquanto se discutiam – durante semanas, meses, ou, talvez, anos – os efeitos paralelos ou colaterais do casamento, a exemplo do valor da pensão ou do destino dos bens”^23.
Assim, o divórcio poderia ser decretado liminarmente, prosseguindo o processo com relação a eventuais pedidos que demandassem instrução probatória. Há julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo que, valendo-se da teoria dos “capítulos da sentença”^24 , admitiu o julgamento de mérito do pedido divórcio e determinando o prosseguimento do processo pelas demais discussões. Segundo o relator, “solução diversa não preservaria a força normativa da Constituição e a carga axiológica decorrente da normatização dos princípios da dignidade humana e liberdade na busca do amor e da felicidade”^25. Para Marcelo Luiz Francisco de Macedo Bürger, o art. 356 do CPC/2015^26 encerra “as discussões travadas a respeito da resolução parcial do mérito”:
(^21) TARTUCE, Flávio. A Emenda Constitucional 66/2010 e os alimentos pós-divórcio. Disponível em: http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=704. Acesso em: 20 jan. 2020. 22 GAGLIANO, Pablo Stolze. Divórcio Liminar. Disponível em: < http://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/divorcio-liminar/13956>. Acesso 4 mar. 2020. 23 GAGLIANO, Pablo Stolze. Divórcio Liminar. Disponível em: < http://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/divorcio-liminar/13956>. Acesso 4 mar. 2020. 24 A tese já foi aceita entre nós. Vários tribunais a referenciando, merecendo destaque precedente do STJ segundo o qual é possível conceber uma sentença dividida em capítulos, “cada qual respondendo a um pedido mediante fundamento independente e autônomo” (STJ, REsp 203.132/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 25.03.2003. Inf. de Jurisprudência 0167, de 24 a 28.03.2003). 25 26 TJSP, 8.ª Câmara de Direito Privado, AI 990.10.357301-3, Rel. Des. Caetano Lagrasta, j. 12.11.2010. “Art. 356. O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles: I - mostrar-se incontroverso; II - estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art.
importante para a realização da felicidade afetiva dos cônjuges, de modo a reduzir o nível de litigiosidade a ser instalada no processo^29 ”. Em sua visão, a concessão do divórcio liminar foi admitida pelo CPC/2015 com a previsão da tutela de evidência^30. Como se nota, o pedido deve ser deferido com base nas regras sobre a tutela provisória de evidência. Isso ocorreu em caso julgado pelo Tribunal de Justiça carioca: com base no direito potestativo da parte e no art. 311 do CPC, entendeu-se plausível seu direito. Além disso, a demora processual por falta de êxito em citar o réu não poderia acarretar prejuízo à demandante que pretendia contrair novo matrimônio. Entendeu-se também que o contraditório poderia ser adiado: afinal, “a oitiva do réu e a produção de outras provas em nada alteraria a manifestação de vontade da parte interessada na dissolução da união conjugal e consequente mudança do estado civil^31 ”. No mesmo sentido decidiu o Tribunal paulista: sendo o divórcio um direito potestativo, é possível a concessão de tutela de evidência para decretá-lo “diante da desnecessidade de concordância da outra parte^32 ”. Em outro precedente do mesmo Tribunal, o divórcio foi decretado em sede de tutela de evidência (art. 311, inc. IV, do CPC), “em razão da EC nº 66/2010, que deu nova redação ao § 6º do art. 226, da CF, de modo a não mais exigir das partes que comprovem a culpa e o decurso de tempo para a dissolução do vínculo matrimonial”. Como a ação de divórcio cumulava outros pedidos, o processo deveria “prosseguir para discussão dos demais pedidos, em prestígio à economia processual”^33. No Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, a tutela de evidência foi concedida para a decretação do divórcio, sob o seguinte argumento: “se a parte autora já manifestou sua vontade de dissolver a união matrimonial, caberá, portanto, ao outro cônjuge apenas a sujeição ou adesão ao divórcio, fato que é incontroverso e que dispensa a produção de provas e o próprio consenso do outro consorte”^34.
(^29) Juiz concede primeiro divórcio por liminar na Bahia Disponível em http://www5.tjba.jus.br/portal/juiz- concede-primeiro-divorcio-por-liminar-na-bahia/ 30. Acesso 07 jan. 2020. CPC de 2015 torna divórcio imediato. Disponível em: http://ibdfam.org.br/noticias/5924/CPC+de+2015+torna+div%C3%B3rcio+imediato. Acesso 4 mar. 2020. 31 TJRJ; AI 0042493-26.2019.8.19.0000; Campos dos Goytacazes; Vigésima Câmara Cível; Relª Desª Maria da Glória Oliveira Bandeira de Mello; DORJ 14/08/2019; Pág. 322. 32 TJSP; AI 2267701-33.2018.8.26.0000; Ac. 13101416; São Paulo; Nona Câmara de Direito Privado; Rel. Des. José Aparício Coelho Prado Neto; Julg. 22/11/2019; DJESP 04/12/2019; Pág. 2611. 33 TJSP; AI 2208152-58.2019.8.26.0000; Ac. 13000840; São Paulo; Sexta Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Rodolfo Pellizari; Julg. 22/10/2019; DJESP 24/10/2019; Pág. 875. 34 TJMS; AI 1412299-53.2019.8.12.0000; Terceira Câmara Cível; Rel. Juiz Vitor Luis de Oliveira Guibo; DJMS 16/12/2019; Pág. 102.
Em outra ocasião, o referido Tribunal decidiu que a ação de divórcio consensual ou contencioso já revelava por si só a presença dos pressupostos da tutela provisória de evidência, porque “se uma das partes pretende dissolver a sociedade conjugal, o consectário inexorável é a decretação do divórcio”^35.
6. Impossibilidade de divórcio liminar: visão restritiva.
Embora a visão positiva pareça predominar na doutrina e em várias decisões^36 (há considerável tempo, aliás), nem sempre há acolhimento do pedido de divórcio liminar. Houve negativa de tal pleito pelo Tribunal do Mato Grosso do Sul porque estariam ausentes os requisitos de urgência previstos no art. 300 do CPC/2015, não tendo sido visualizado periculum in mora para a declaração liminar do divórcio; além disso, reputou- se prudente a oitiva do réu^37. Em outro caso julgado pelo Tribunal gaúcho houve negativa pelos seguintes fundamentos:
Embora não se ignore que o divórcio é um direito potestativo, não havendo razão, a priori, para impedir a sua imediata decretação, até porque, segundo o autor, as partes estão separadas de fato desde 2012 e o varão, inclusive, já tem outra companheira, com quem pretende contrair novo matrimônio - no caso, há de se ter cautela no deferimento do pedido, seja porque a mulher/demandada também discute sua manutenção nos planos de saúde do varão, em razão de problemas de saúde que a acometem, seja porque também há controvérsia em relação à data da separação de
(^35) TJMS; AI 1407451-23.2019.8.12.0000; Quarta Câmara Cível; Rel. Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva; DJMS 22/08/2019; Pág. 164. 36 Eis trechos de mais decisões interessantes: “O direito ao divórcio é potestativo e incondicionado. Demonstrada a existência da relação matrimonial por meio de documento hábil e havendo pedido expresso de divórcio, é viável a sua imediata decretação. Nesse contexto, a ausência de angularização processual não impede o acolhimento liminar do pedido formulado pelo divorciando” (TJRS; AI 357 035- 05.2018.8.21.7000; Porto Alegre; Oitava Câmara Cível; Rel. Des. José Antônio Daltoe Cezar; Julg. 28/02/2019; DJERS 12/03/2019); “Decisão agravada que indefere pedido de expedição de novo mandado ante a negativa do Cartório de Registro Civil de averbar o divórcio sem o trânsito em julgado da sentença que o teria decretado. Decretação liminar do divórcio que é possível desde logo (EC nº 66/2010). Direito potestativo da parte” (TJSP; AI 2279250-06.2019.8.26.0000; Ac. 13187505; Barretos; Terceira Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Alexandre Marcondes; Julg. 16/12/2019; DJESP 23/01/2020; Pág. 5237). 37 TJMS; AI 1403295-89.2019.8.12.0000; Terceira Câmara Cível; Rel. Des. Dorival Renato Pavan; DJMS 31/05/2019; Pág. 164;
aclarar: “nas ações de divórcio e de dissolução da união estável, a regra deve ser o julgamento parcial do mérito (art. 356 do Novo CPC), para que seja decretado o fim da conjugalidade, seguindo a demanda com a discussão de outros temas”.
Conclusões.
O CPC/2015 ampliou a possibilidade de concessão de tutelas provisórias para incluir hipóteses em que não há urgência, prevendo para tanto o instituto da tutela de evidência. No âmbito das relações familiares discute-se a concessão da tutela de evidência para a decretação liminar do divórcio. O divórcio liminar pode ser concedido em sede de tutela de evidência. Apesar de não estar previsto no rol do art. 311 do CPC, o pedido de divórcio é um direito claro (direito evidente). Com o advento da Emenda Constitucional n. 66/2010, passou-se a reconhecer o divórcio como direito potestativo; assim, o réu não pode resistir à decretação do fim do vínculo matrimonial. Embora seja comum em demandas de divórcio a formulação de vários pedidos (como os relativos a guarda de filhos, fixação de alimentos e partilha de bens), a cumulação não impede a decretação liminar do divórcio. A cisão do julgamento dos pedidos é técnica expressamente prevista no Código de Processo Civil atual. A título de contribuição, foi editado o enunciado 18 do IBDFAM para esclarecer sobre a possibilidade de decretar o divórcio em sede de julgamento parcial do mérito (art. 356 do CPC). Embora o reconhecimento doutrinário da concessão liminar do divórcio pareça predominar e em algumas decisões também haja tal visão favorável, nem sempre os magistrados acolhem o pedido de divórcio liminar. A resistência absolutamente não se justifica. O deferimento liminar do divórcio, além de prestigiar a celeridade do processo, valoriza a autonomia de cada pessoa - que precisa poder fazer suas próprias escolhas e viver como melhor lhe convém no exercício de sua dignidade.
Referências bibliográficas.
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Família, v. 17, n. 101, abr./maio 2017, p. 203-224. CAMBI, Eduardo et. al. Curso de processo civil completo. 2ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019. CASTRO, Daniel Penteado de. Antecipação de tutela sem o requisito da urgência: Panorama geral e perspectivas no Novo Código de Processo Civil. Salvador: Juspdvum,
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MADALENO, Rolf. Direito de Família. 7ª ed. São Paulo: Método, 2016, edição eletrônica. GAGLIANO, Pablo Stolze. Divórcio Liminar. Disponível em: < http://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/divorcio-liminar/13956>. Acesso 4 mar. 2020. MULTEDO, Renata Vilela. Liberdade e família – Limites para a intervenção do Estado nas relações conjugais e parentais. Rio de Janeiro: Processo, 2017. NUNES, Dierle; MARQUES, Ana Luiza. Parte do Judiciário já entende que é possível a autorização liminar do divórcio. Disponível em https://www.conjur.com.br/2019-ago-08/opiniao-parte-judiciario-aprova-autorizacao- liminar-divorcio. Acesso 07 jan. 2020. TARTUCE, Fernanda. Processo civil no Direito de Família: teoria e pratica. 5ª ed. SP: Método, 2019. _____. Processo civil no Direito de Família: teoria e prática. 6ª ed. SP: Método, 2020 (no prelo). TARTUCE, Fernanda. Dellore, Luiz. Manual de Prática Civil. 15ª ed. SP: Método, 2020 TARTUCE, Flávio. A Emenda Constitucional 66/2010 e os alimentos pós-divórcio. Disponível em: http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=704. Acesso em: 20 jan.
VILAS-BÔAS, Renata Malta; BRUNO, Susana de Moraes Spencer. Divórcio liminar: uma possibilidade diante da Emenda Constitucional nº 66/2010. Revista Síntese Direito de Família, São Paulo, SP, v. 15, n. 87, p.13-29, jan. 2015.