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Guias e Dicas
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Análise do Utilitarismo Penal: Hobbes, Bobbio e a Justificação do Direito Penal, Notas de aula de Direito

Neste texto, norberto bobbio discute o paradoxo hobbesiano no pensamento contratualista do iluminismo, onde o direito natural é utilizado para justificar e limitar o direito positivo estatal. Bobbio identifica dois defeitos do utilitarismo penal: a falta de reflexão sobre as especificidades do modelo de direito penal e a atribuição errada da primeira garantia do direito penal. O autor também aborda a separação entre direito e moral e a proposta de um modelo de direito penal mínimo. A análise inclui a discussão sobre as garantias essenciais do direito penal, a eficácia das penas e a necessidade de evitar penas arbitrárias.

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Jacirema68
Jacirema68 🇧🇷

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DIREITO E RAZÃO
Teoria do Garantismo Penal
LUIGI FERRAJOLI
RESUMO: Obra coletiva dos estudantes da disciplina
eletiva "Teoria do Garantismo Penal"
Universidade Federal de Lavras
Departamento de Direito
1º/2018
Professor: Rafael de Deus Garcia
Estudantes: Ana Luisa Araujo Morais, Andreza Layra Silva, Arthur de
Almeida Lancellote Matias Lemos, Bárbara Moraes e Motta, Beatriz
Lobato Moreira Lopes, Bruno Cesar de Oliveira, Bruno Vianna Pinto,
Camila Calheiros Machado, Carollyne Pedroso Montijo, Fernanda Aguiar
Vieira, Fernanda Ciancaglio Valentim, Filipe Silva Azevedo Ribeiro, Flavia
Pereira De Oliveira, Gustavo de Castro Reis, Iesa Joana Rezende de
Oliveira, Igor Mallard, Izabella Costa Carvalho, Jesse Elísio Silva, Letícia
Lucas Rêgo, Lorrayne Gabriele Marciano, Mariely Rodrigues de Almeida
Gomides, Matheus Camargos Nogueira, Otavio Augusto Bracarense De
Paula Trimolet, Rafael De Oliveira Leite, Rafael De Paiva Carneiro, Raiane
Cunha Dos Santos, Tales Benedito Leite Rocha Peleteiro, Thaís Ramos
Mendes, William Henrique Marques Pereira, Yasmin Rodrigues Faria.
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DIREITO E RAZÃO

Teoria do Garantismo Penal

LUIGI FERRAJOLI

RESUMO : Obra coletiva dos estudantes da disciplina

eletiva "Teoria do Garantismo Penal"

Universidade Federal de Lavras

Departamento de Direito

Professor : Rafael de Deus Garcia

Estudantes : Ana Luisa Araujo Morais, Andreza Layra Silva, Arthur de

Almeida Lancellote Matias Lemos, Bárbara Moraes e Motta, Beatriz

Lobato Moreira Lopes, Bruno Cesar de Oliveira, Bruno Vianna Pinto,

Camila Calheiros Machado, Carollyne Pedroso Montijo, Fernanda Aguiar

Vieira, Fernanda Ciancaglio Valentim, Filipe Silva Azevedo Ribeiro, Flavia

Pereira De Oliveira, Gustavo de Castro Reis, Iesa Joana Rezende de

Oliveira, Igor Mallard, Izabella Costa Carvalho, Jesse Elísio Silva, Letícia

Lucas Rêgo, Lorrayne Gabriele Marciano, Mariely Rodrigues de Almeida

Gomides, Matheus Camargos Nogueira, Otavio Augusto Bracarense De

Paula Trimolet, Rafael De Oliveira Leite, Rafael De Paiva Carneiro, Raiane

Cunha Dos Santos, Tales Benedito Leite Rocha Peleteiro, Thaís Ramos

Mendes, William Henrique Marques Pereira, Yasmin Rodrigues Faria.

  • INTRODUÇÃO
  • PRIMEIRA PARTE - EPISTEMOLOGIA
  • CAPÍTULO I. COGNITIVISMO OU DECISIONISMO
  • CAPÍTULO II. M ODELOS DE DIREITO PENAL
  • CAPÍTULO III. O PODER PUNITIVO ENTRE VERIFICAÇÃO E V ALORAÇÃO
  • SEGUNDA PARTE - AXIOLOGIA
  • CAPÍTULO IV. OS F UNDAMENTOS DO DIREITO PENAL
  • CAPÍTULO V. S E E POR QUE PUNIR, PROIBIR , J ULGAR A S IDEOLOGIAS PENAIS
  • CAPÍTULO VI. O O BJETIVO E OS LIMITES DO DIREITO PENAL U M UTILITARISMO PENAL R EFORMADO
  • TERCEIRA PARTE - TEORIA
  • CAPÍTULO VII. A P ENA QUANDO E COMO PUNIR
  • CAPÍTULO VIII. O DELITO QUANDO E COMO PROIBIR
  • CAPÍTULO IX. O JUÍZO COMO E QUANDO J ULGAR
  • QUARTA PARTE - FENOMENOLOGIA
  • CAPÍTULO X. O S UBSISTEMA P ENAL ORDINÁRIO
  • CAPÍTULO XI. O S UBSISTEMA PENAL DE P OLÍCIA
  • CAPÍTULO XII. O S UBSISTEMA P ENAL DE EXCEÇÃO
  • QUINTA PARTE - PARA UMA TEORIA GERAL DO GARANTISMO
  • CAPÍTULO XIII. O QUE É GARANTISMO
  • CAPÍTULO XIV. O PONTO DE V ISTA E XTERNO

E, por fim, na ultima parte, esboça uma teoria geral do garantismo como referencial de justificação que, transcendendo os estreitos limites do direito penal e do direito processual penal, presta-se a verificação do nível de racionalidade de todo o ordenamento jurídico.

Bobbio expõe que a obra direito e razão traz problemas de teoria do direito e de política do direito e deve ser compreendida e julgada a partir desses pontos, resaltando que a parte crítica não é menos importante do que a construtiva, pois elas se apoiam de forma recíproca.

Ferrajoli, tal qual Bobbio, vê no Direito Penal garantístico não uma possibilidade de se fazer justiça plena, perfeita, mas construir uma perfeição dentro da imperfeição. Existem vários Garantismos uns mais outros menos legítimos. Saber que o Homem é Lobo do Homem, e que nos termos modernos o próprio Estado tornou-se um grande lobo, a ameaçar a todos com sua força, Ferrajoli vê no direito penal garantistico com suas conquistas liberais, um mínimo de proteção, de barreiras contra as arbitrariedades.

Por conseguinte, o Garantismo é um meio e não um fim, ele é uma ferramenta dentre outras mais a possibilitar aos indivíduos um mínimo de proteção contra as violências existentes, mas ele sozinho, como adverte Ferrajoli, nada pode fazer. É preciso uma abertura democrática, tanto formal quanto substancial, que equilibre o valor da pessoa humana, a igualdade e a necessidade de punição, para, de modo ainda que parcial e precário, poder se afirmar a existência efetiva e concreta da existência e usufruto da ideia de justiça.

PRIMEIRA PARTE

EPISTEMOLOGIA A razão no Direito Penal

CAPÍTULO I. Cognitivismo ou Decisionismo

Arthur Lancellote Lemos

Igor Mallard

Nos escritos iniciais da obra “Direito e Razão”, Luigi Ferrajoli intenta delimitar o ponto de partida da compreensão da teoria do garantismo penal através de algumas abordagens históricas. E, para tanto, elucida o fato de que são diversas as correntes teórico-filosóficas e divergentes entre si que procuram alcançar um denominador comum de sustentação de um sistema penal funcional, perpassando por alguns modelos liberais até outros de caráter autoritário, com bases tanto legalistas quanto absolutistas. No entanto, a partir de tal abordagem construtiva de modelos contrapostos ao longo da história moderna, foi possível observar uma determinada unidade coerente que pressupõe uma tentativa de desembaraçar o conceito do que pode ser chamado de desvio punível, ou seja, os modelos penais conservam em si um caráter epistemológico da análise do ilícito penal e, com isso, a preocupação em oferecer um maior suporte ao juízo, para que este possa vir a ser racional e confiável, na medida em que se apoia na legalidade e afasta a arbitrariedade nas decisões

O sistema penal garantista se caracteriza como uma forma de identificação do desvio penal orientado a coibir a arbitrariedade das decisões judiciais ao passo que buscam aumentar o seu grau de confiabilidade através da racionalização dos procedimentos.

O garantismo é fundado em dois eixos principais caracterizados pela definição legislativa do desvio e a comprovação do desvio punível. O primeiro eixo é constituído pelos princípios e garantias penais que garantem ao sistema uma forma própria de estabelecer as condutas e atos que aquela sociedade julga como merecedores de

verdade processual, da análise fática e do direito em detrimento do aspecto valorativo da aplicação da lei penal.

Nos moldes deste modelo idealista clássico, a crítica de Luigi Ferrajoli se dá no tocante à função do juiz enquanto algo mecanicista, através do qual se baseia numa aplicação rasa do dispositivo legal desprovida de interpretações para cada caso concreto. O autor admite que haja certo grau de discricionariedade nas decisões processuais. Mas que isto ocorre em razão da impossibilidade do esgotamento das disposições legais diante de sua indeterminação relativa, permitindo a possibilidade da tomada de decisões opinativas baseadas em hipóteses alternativas de interpretação

De forma oposta aos modelos garantistas, os modelos autoritários são informados pelo substancialismo penal e o decisionismo processual. O primeiro se caracteriza pela definição do desvio penalmente relevante não apenas a partir da lei, mas o desvio criminal enquanto em si mesmo, sendo desvalorizado o papel da lei como critério exclusivo e exaustivo de definição dos fatos desviados. A tentação comum para essas técnicas de atenuação ou dissolução da estrita legalidade é, na realidade, punir nem tanto pelo que se fez, senão pelo que é. Desta forma, o substancialismo penal está informado pela confusão entre direito e moral, ou entre direito e natureza, permitindo discriminações subjetivas e invasões incontroláveis na esfera da liberdade dos cidadãos. O decisionismo é a representação do caráter potestativo do juízo, manifestando-se de duas formas: I - o caráter subjetivo do tema processual consistente em fatos determinados em condições ou qualidades pessoais, como vinculação do réu a “tipos normativos de autor” ou sua congênita natureza criminal ou periculosidade social; II - caráter subjetivo do juízo: na ausência de referências fáticas determinadas com exatidão, resulta mais de valorações, diagnósticos ou suspeitas subjetivas do que de provas de fato. Esses fatos subjetivos pervertem o processo penal para um direcionamento inquisitorial, o primeiro direciona o processo no sentido de análise de inferioridade da pessoa julgada e o segundo distorce a verdade processual, transformando a verdade empírica, pública e controlável intersubjetivamente em convencimento intimamente subjetivo e, assim, irrefutável do julgador.

Ao longo dos escritos, em momento oportunamente subsequente à problematização do modelo clássico, Luigi Ferrajoli delineia os aspectos que tratam dos modelos autoritários antigos que, sistematicamente, acarretam-se na hipótese de uma corrente que, apesar de antiga, remonta alguns dos critérios que se conservaram

no tempo. A caracterização marcante de um sistema autoritário vai além da definição formal do desvio punível, isto é, considera-se a conduta desviante um fato também moralmente reprovável, tendo sido o agente da mesma forma atingido, voltada à análise de sua capacidade anti-social ou de delinquência, fenômeno este denominado de substancialismo penal. A forma de análise objetiva tipicamente clássica é preterida pela forma de análise subjetiva do modelo autoritário, o qual confunde as temáticas direito e moral e restringe a liberdade dos cidadãos na medida em que ignora a força vinculativa de autoridade, protetividade e formalidade da lei.

Tal prática autoritária de análise subjetiva acarreta na construção jurisdicional oposta ao cognitivismo, qual seja a do decisionismo processual, o qual carrega em si uma característica potestativa do juiz. As decisões subjetivas, ou seja, a prática decisionista, pressuposto de um cognitivismo ético, se projeta para uma análise do tipo de agente, de sua natureza criminal, de sua periculosidade, baseando-se mais em suspeitas do que em elementos probatórios (empíricos). Deste modo, é possível compreender que o decisionismo leva em consideração a integridade pessoal do agente para a tomada de decisões na medida em que subverte o caráter processual empírico de se alcançar a verdade, deteriorando a possibilidade da verificabilidade e refutabilidade e dando espaço à convicção do juízo com base na formação de seu convencimento pessoal.

A busca pela verdade a partir dos dois caminhos opostos até aqui delineados, isto é, do modelo clássico formalista e do modelo autoritário substancialista, resta registrada que cada qual não se aproxima satisfatoriamente da verdade ideal/real. Enquanto o modelo substancialista faz um juízo de valor, o qual não há oposição de limites na perspectiva da legalidade, desprovida de controle e dotada de arbitrariedades do juízo, buscando, pois, uma verdade material, de outro modo o modelo formalista busca uma verdade formal que se encontra restringida por aspectos legais, regras limitantes que condicionam uma obediência aos procedimentos que garantem a defesa do indivíduo, na medida em que sempre perpetuarão uma verdade aproximativa, provável, de fato apenas processual

Nos três últimos subtítulos do capítulo I o autor analisa como a busca pela verdade é encampada perante o Processo Penal. Ao investigar as conformações e categorizações que a verdade sofre no âmbito dos sistemas penais abordados, visualizamos que esta é um eixo de análise coincidente que possibilita a comparação das concepções do conceito de verdade para os referidos sistemas.

“A 'verdade' de uma teoria científica e, geralmente, de qualquer argumentação ou proposição empírica é sempre, em suma, uma verdade não definitiva, mas contingente, não absoluta, mas relativa ao estado dos conhecimentos e experiências levados a cabo na ordem das coisas de que se fala, de modo que, sempre, quando se afirma a "verdade" de uma ou de várias proposições, a única coisa que se diz é que estas são (plausivelmente) verdadeiras pelo que sabemos sobre elas, ou seja, em relação ao conjunto dos conhecimentos confirmados que delas possuímos.” (1ª Parte, Cap. I, parágrafo 3.3. p. 42)

“Esta diferença entre "experimento" (de um fato presente) e "provas" (de um fato passado) fende profundamente o modelo ideal da verdade processual fática como correspondência objetiva. Sem necessidade de penetrar em todas as difíceis questões relativas ao conhecimento do passado, pode-se realmente afirmar que a verdade processual fática, da mesma forma que a verdade histórica, em vez de ser predicável em referência direta ao fato julgado, é o resultado de uma ilação dos fatos "comprovados" do passado com os fatos "probatórios" do presente” (1ª Parte, Cap. I, parágrafo 4.1. p. 44)

“A tarefa principal da epistemologia penal garantista é a de elucidar as condições que permitam restringir, do melhor modo possível, essas margens e, portanto, basear o juízo (em decisões) sobre a verdade processual em vez de (em decisões) sobre valores de outra modalidade. Podemos chamar "decidibilidade da verdade processual" e "decisão sobre a verdade processual", respectivamente, à verificabilidade (e falseabilidade) e à verificação (ou refutação) das motivações judiciais, e configurar a alternativa epistemológica entre garantismo e autoritarismo no direito penal como uma alternativa entre a presença e a ausência das condições - ou garantias - que asseguram um ou outro.” (1ª Parte, Cap. I, parágrafo 5.1. p.52)

“A tarefa da investigação judicial, igualmente à de qualquer outro tipo de investigação ou explicação, é eliminar o dilema em favor da hipótese mais simples, dotada de maior capacidade explicativa e, sobretudo, compatível com o maior número de provas e conhecimentos adquiridos com anterioridade.” (1ª Parte, Cap. I, parágrafo 4.1. p. 44)

CAPÍTULO II. Modelos de Direito Penal

Jesse Elisio Silva Thaís Ramos Mendes

O modelo garantista de direito penal possui uma coerência e unidade que se fundam na sistematização de alguns princípios fundamentais e derivados que se comunicam e coordenam a própria existência do garantismo enquanto teoria.

Estes princípios, propostos por Ferrajoli estão formulados sob a ideia de pena, delito, lei, necessidade, ofensa, ação, culpabilidade, juízo acusação, prova e defesa, sendo a pena o elemento cuja a sua aplicação tem como condição necessária todos os outros termos.

Cada um destes princípios formam, portanto, garantias jurídicas para a afirmação da responsabilidade penal e aplicação da pena e são condições necessárias sem as quais está proibido punir. Assim as garantias jurídicas condicionam o exercício punitivo, criando sob a ideia de delito, lei, necessidade, ofensa, ação e culpabilidade requisitos de natureza penal e sobre a lógica epistemológica do juízo, acusação, prova e defesa condições processuais.

Sob esta perspectiva, Ferrajoli estabelece 10 axiomas que para ele definem sistematicamente o modelo garantista desde sua elaboração pelo pensamento jusnaturalista ainda nos séculos XVII e XVIII até a sua integração às constituições modernas. São eles A1) Não há pena sem crime, A2) Não há crime sem lei, A3) Não há lei penal sem necessidade, A4) Não há necessidade sem ofensa, A5) Não há ofensa sem ação, A6) Não há ação sem culpa, A7) Não há culpa sem juízo, A8) Não há juízo sem acusação, A9) Não há acusação sem prova, A10) Não há prova sem contraditório.

Estes axiomas têm por característica seu espiral de encadeamento e derivações entre si de maneira que um termo sempre implicará no sucessivo numa cadeia em que a pena, enquanto primeiro elemento, esteja condicionada a realização devida de todo o processo de derivação que se em alguma medida frustrado interrompe o encadeamento e impede a sua aplicação.

De todos os princípios retirados dos axiomas mencionados o que melhor caracteriza o sistema cognitivo garantista é o princípio da legalidade estrita. Neste interim cumpre diferenciar a mera legalidade da mencionada legalidade estrita. Mera

punitivo. São elas: a vedação da imposição de pena sem que se produza a comissão de um delito; a previsão legal do delito enquanto delito; a necessidade da proibição; a necessidade da punição; o efeito lesivo do delito para terceiros; a culpabilidade do autor; a imputabilidade do autor; a comprovação da comissão do delito e a prova empírica, produzida por uma acusação, perante um juiz imparcial, em um processo público e contraditório, em face da defesa, mediante procedimentos legalmente estabelecidos.

O modelo de Direito Penal Mínimo caracteriza um Estado de Direito, pautado nos ideais de legalidade e previsibilidade. É o modelo de que trata nossa Constituição da República de 1988, ao tratar da vedação de pena sem lei anterior que a comine. É um modelo no qual o exercício do poder se baseia na racionalidade e na certeza, de forma que as intervenções são previsíveis na medida em que são baseadas em argumentos cognitivos, e não valorativos.

Nesse modelo, estão presentes a racionalidade e a certeza no exercício do poder, de forma que as intervenções do Estado nas liberdades do cidadão são previsíveis e baseadas em argumentos cognitivos e não valorativos, alcançando uma verdade formal.

Na análise principiológica, podemos destacar o favor rei , que origina os princípios da presunção de inocência, do in dubio pro reu , da absolvição em caso de incerteza, da analogia in bonam partem e da interpretação restritiva, em caso de prejuízo ao réu, ou extensiva, em caso de benefício ao réu. A margem de discricionariedade, então, seria utilizada de forma a sempre restringir a intervenção estatal, e nunca de forma a legitimar seus avanços indevidos.

Por outro lado, temos que um Estado que não respeita nenhuma dessas garantias é um Estado Totalitário ou Absoluto, sendo guiado por um Direito Penal Máximo. Esse modelo é caracterizado pelo exercício incondicionado e ilimitado do poder punitivo, de forma que é gerada uma incerteza e imprevisibilidade acerca das intervenções estatais na liberdade dos cidadãos.

Há, nesse modelo, uma ausência de parâmetros certos e racionais para que se valide ou não os atos punitivos, ficando o réu desprotegido do exercício arbitrário da lei. É necessário entender que esses dois modelos não se apresentam de forma absoluta, sendo, atualmente, mais fácil definir os modelos penais enquanto tendências ao Estado Penal Mínimo ou tendências ao Estado Penal Máximo.

Por fim, cabe destacar que a conceituação do delito nesses dois modelos é substancialmente diferente. No modelo de Direito Penal Máximo o delito é entendido como “o mal em si”, sendo que no modelo de Direito Penal Mínimo há a compreensão de que o delito é uma escolha do legislador, não sendo nem mesmo a sua tipificação incondicionada.

No segundo subtítulo do capítulo 8, parte II do livro, é abordada a questão da certeza. A certeza, nos dois modelos mencionados, é uma escolha oposta, não sendo absoluta. Cada um possui seu preço, de forma que cada certeza gera uma incerteza.

Em um modelo de Estado Penal Máximo, temos que a certeza relativa é a certeza de que todos os culpados sejam punidos, ao passo de que há incerteza quanto a algum inocente ser punido. Dessa forma, há a máxima tutela da punição dos delitos. Em um modelo de Estado Penal Mínimo, por sua vez, temos que a certeza relativa é a certeza de que nenhum inocente seja punido, ao passo de que há incerteza sobre algum culpado não ser punido. Desse modo, temos a máxima tutela das liberdades individuais.

Cabe ressaltar que essa certeza não é relacionada a uma verdade mística quando a comprovação e punição de todos os fatos previstos pela lei enquanto delitos, mas que sejam punidos aqueles delitos em que se tem comprovada a culpabilidade e comissão do autor.

Em um modelo de Estado Penal Máximo as condições para punição devem ser suficientes e as condições para a não punição devem ser necessárias. Por outro lado, em um modelo de Estado Penal Mínimo, as condições para a punição são necessárias, ao passo de que as condições para a não punição são suficientes. O juízo de necessidade e suficiência demonstra a carga de importância depositada em cada certeza nos dois modelos.

No terceiro subtítulo do capítulo 8, parte II do livro, o autor faz uma diferenciação entre verdade fática e verdade jurídica. A verdade fática seria aquela baseada em uma inferência indutiva, insegura porque provável a verdade da conclusão. Já a verdade jurídica, deriva de uma inferência dedutiva, insegura porque opinativa a verdade das premissas.

Na prática, há a confusão dos métodos de solução para essas verdades, de forma que se mascaram os defeitos da legalidade estrita por meio da ideia de livre

“Por um lado, com efeito, a equivalência substancialista entre delitos e mala in se, ainda quando em abstrato possa parecer um critério mais objetivo e racional do que o nominalista da identificação do delito tal como é declarado pelo legislador, conduz à ausência do limite mais importante ao arbítrio punitivo, que é ademais a principal garantia de certeza: a rígida predeterminação acerca do processo de qualificação do delito.” 1ª Parte, Cap. II, parágrafo 8.2. p.

“A certeza perseguida pelo direito penal máximo está em que nenhum culpado fique impune, à custa da incerteza de que também algum inocente possa ser punido. A certeza perseguida pelo direito penal mínimo está, ao contrário, em que nenhum inocente seja punido à custa da incerteza de que também algum culpado possa ficar impune.” 1ª Parte, Cap. II, parágrafo 8.2. p.84/

“A certeza, ainda que não absoluta, a que aspira um sistema penal de tipo garantista não é no sentido de que resultem exatamente comprovados e punidos todos os fatos previstos pela lei como delitos, mas que sejam punidos somente aqueles nos quais se tenha comprovado a culpabilidade por sua comissão.”1ª Parte, Cap. II, parágrafo 8.2. p.

“Ademais, esta é a forma lógica de todos os princípios garantistas antes formalizados, os quais, como se tem observado, estabelecem as condições necessárias, em cuja ausência não é lícito punir, e nem aquelas suficientes, em cuja presença não é lícito deixar de punir.” 1ª Parte, Cap. II, parágrafo 8.2. p.

“Nos estudos históricos, contudo, não há razões de princípio para contentar-se com uma história mínima com preferência sobre uma história máxima. As duas histórias podem inclusive combinar-se, a história mínima como material historiográfico relativamente descontável, do qual é possível induzir com diversos graus de certeza hipóteses de história máxima, igualmente distintas e alternativas entre si. No direito penal, ao contrário, está o dever de decidir. A opção por um direito penal mínimo em relação ao direito penal máximo, expressa pela aceitação unicamente de acusações comprovadas com certeza como condição das condenações, está justificada - e nos ordenamentos desenvolvidos juridicamente imposta - porque tal dever é também um poder agravado de consequências sobre as liberdades dos cidadãos.” 1ª Parte, Cap. II, parágrafo 8.3. p.

“Um certo grau de incerteza caracteriza, na realidade, por seu caráter aproximativo, duas espécies de verdade - fática e jurídica -, nas quais decompusemos

em seu momento a noção de verdade processual. Precisamente, a verdade fática é a validade de uma inferência indutiva, da qual, contudo, é irredutivelmente insegura, porque provável, a verdade da conclusão. A verdade jurídica é, no entanto, a validade de uma inferência dedutiva, da qual, contudo, é irredutivelmente insegura, porque opinativa, a verdade das premissas.” 1ª Parte, Cap. II, parágrafo 8.3. p.

“Na prática, lamentavelmente, os juízes costumam confundir e intercambiar estes dois modos de solução das incertezas, às vezes mascarando os defeitos de legalidade estrita das normas e os espaços de arbítrio originados por eles por detrás da imagem da livre convicção e, outras vezes, suprindo os defeitos de estrita jurisdicionariedade e da pobreza das provas com a ampliação dos tipos legais no âmbito interpretativo.” 1ª Parte, Cap. II, parágrafo 8.3. p.

importunou ofensivamente o pudor de B), de forma a buscar adequar a realidade ao direito da melhor maneira possível, utilizando os tipos específicos e quando necessário de instrumentos como o do concurso de crimes. Para o autor ainda, nos casos quais sejam necessários a aplicação de juízos de valor, a melhor opção para o magistrado seria a sua declaração de inconstitucionalidade justamente por violação a taxatividade.

No tocante a verdade processual, o mesmo argumenta por sua relatividade uma vez que sempre estariam constantes certos graus de incerteza sobre a veracidade das provas, e que em regra no processo penal estas se tratariam de provas indiretas. De forma que o mesmo utiliza de tal fundamentação posteriormente para criticar as provas indiciárias, uma vez que seriam “probabilidades de probabilidades” (fl.107).

Ressaltado o caráter relativo das provas, modernamente estas seriam observadas como argumentos, prováveis acontecimentos, verossimilhanças que se incompatibilizam com ambições de verdades reais e com a valoração legal das provas, uma vez que uma prova não necessariamente deve possuir um valor probatório maior que a outra de plano devendo o juiz através do livre convencimento motivado determinar a aceitação ou não da hipótese acusatória. De tal forma seria afastada a ambição de alcançar a verdade absoluta, como correspondência, de modo que a verdade processual ambicionada devia ser aquela alcançada “mediante garantias ou regras de jogo codificadas, que asseguram essencialmente a possibilidade de refutar as hipóteses acusatórias, desde a contestação inicial até passar ao status de coisa julgada da sentença definitiva de condenação, mediante contraprovas ou contra-hipóteses” (fl. 135).

Sendo assim, o processo penal racional deve se pautar pelo respeito dos princípios acusatórios: respeito a presunção de inocência, ônus da prova da acusação, contraditório efetivo (paridade de armas), exclusão de provas não creditáveis, julgadas por um magistrado imparcial que possa exercer sua livre convicção motivada. A presunção de inocência seria garantida como prova legal negativa de modo que se protegeria os cidadãos de uma punição injusta uma vez que no SG o Estado exerceria a escolha política de não punir todos os culpados para não correr o risco de punir os inocentes, que nenhum inocente seja injustamente condenado, como aconteceria em certas doutrinas substancialistas.

Seria então ônus do Ministério Público ao elaborar a acusação produzir os fatos e as provas de sua alegação, de maneira precisa e clara, de modo a sua hipótese

prevalecer sobre a da defesa. A defesa por sua vez deveria possuir as mesmas oportunidades de manifestação que a acusação de modo efetivo, buscando ao elaborar suas contra hipóteses simplesmente gerar dúvidas sobre as alegações da acusação e a fiabilidade das provas utilizadas e assim sendo fazer prevalecer a presunção de inocência. Já o magistrado deveria se afastar da produção probatória, de modo a se manter imparcial na contenda e excluindo de sua apreciação as provas não confiáveis ou que produzidas de formas ilícitas elaborar um juízo motivado através das provas apresentadas, sendo necessário para a elaboração da sentença condenatória da superação de todas as contra provas apresentadas pela defesa.

Na aplicação do caso concreto, na conotação, o juiz deve se atentar para o enquadramento aos requisitos do tipo legal e além disso deve levar em consideração critérios de equidade ao observar as características acidentais, critérios específicos como a aplicação de qualificadoras e outras circunstâncias que os diferenciam dos demais crimes de mesma espécie. Sendo assim um critério de justiça na aplicação da pena. Além disto é de suma importância que o magistrado, não se observe como agente neutro mas sim como portador de certas pré compreensões e preconceitos de modo ao tomar consciência, tentar limitá-las ao máximo no exercício de sua jurisdição. Buscando ter uma compreensão equitativa, simpatética (dando aplicação ao princípio do FAVOR REI).

Por fim, Ferrajoli, ressalta mais uma vez que o Estado deve sempre levar em consideração: os limites da estrita legalidade e da jurisdicionalidade; que sejam excluídos formalismos inúteis; que ocorra a incorporação de princípios e valores limitativos; que sejam elaboradas críticas externas e internas das leis e das decisões judiciais; que ocorra a análise de todos os campos de discricionariedade.

[1] Apesar de utilizarmos a expressão nexo causal para simplificar a interpretação. O autor utiliza-se desta como culpabilidade. Nos seguintes termos: “A culpabilidade; que deve permitir a atribuição causal da ação à pessoa que seja seu autor” fl.