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Este texto aborda o conceito de tentativa de crime, sua história e os requisitos necessários para que haja tentativa. O documento discute as diferenças entre o direito romano e germânico em relação à tentativa, sua evolução histórica e as teorias que fundamentam a sua punibilidade. Além disso, o texto trata dos elementos necessários para a existência de tentativa, distingue entre tentativa perfeita e imperfeita, e discute a punibilidade da tentativa no direito brasileiro.
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Tipologia: Provas
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Brasília a. 37 n. 147 jul./set. 2000 249
O crime pode ser estudado em sua estru- tura e em sua manifestação. Na estrutura, estudam-se os elementos essenciais do deli- to (antijuridicidade, tipicidade e culpabili- dade), bem como suas respectivas causas de exclusão. Na manifestação do crime, es- tuda-se o delito com referência ao ambiente exterior, destarte, estudam-se o concurso de pessoas, o concurso de crimes, as circuns- tâncias do crime e a tentativa. Eduardo Correia, no seu festejado Direi- to Criminal, diz que entre a ideação crimi- nosa ( nuda cogitatio ) e a consumação do cri- me desenrola-se uma série mais ou menos longa de atos. Quando há a consumação, que é a reunião de todos os elementos do tipo legal do crime, todos esses atos são ab- sorvidos por ela, que é a figura de maior re- levo; mas, quando não há a consumação, os atos anteriores são revestidos de grande re- levância jurídico-penal. O Direito foi bus- car na transação das soluções dos pretéri- tos Direitos Romano e Germânico a solução para a punibilidade desses atos. Para o Di- reito Romano, nos crimes públicos a tentati- va era punida como delito consumado; para o Direito Germânico, em regra, a tentativa
Cláudio Brandão
Cláudio Brandão é Professor titular da Facul- dade de Direito de Olinda, Professor da Facul- dade de Direito do Recife - UFPE e da Escola Superior da Magistratura de Pernambuco.
Sumário
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era impunível. Como dito, a transação entre esses dois Direitos originou a tradicional tripartição entre atos preparatórios, tentati- va e frustração^1. Adaptando o pensamento de Correia à realidade brasileira, já que a norma brasi- leira não diferencia legalmente a tentativa da frustração (como ocorre em Portugal), diremos que a transação entre o Direito Ro- mano e o Direito Germânico originou a tri- partição entre os atos preparatórios, a ten- tativa imperfeita (que corresponde a tentati- va do CP Português, cujo conceito será dado mais adiante) e a tentativa perfeita (que cor- responde a frustração do CP Português).
Os romanos não chegaram a desenvol- ver o instituto da tentativa; Mommsen afir- ma que no “Direito Romano não existia o conceito de tentativa nem, é claro, uma pa- lavra técnica para designá-lo”^2. O desenvol- vimento do instituto da tentativa data do século XVI, com os Práticos ou pós-glosa- dores italianos, mormente Próspero Farina- cius, por meio de sua obra Tratactus Crimi- nalis. Farinacius chamava a tentativa de Co- natus. Ele já distinguia entre a conatus proxi- mus e a conatus remotus. A conatus remotus são os atos preparatórios e a conatus proximus são os atos de execução. Com isso, Farinacius deu as bases da doutrina científica da tentativa. Essa doutrina foi finalizada, todavia, somente em 1810, com o advento do Código Penal francês. O Código Penal francês insti- tui a definição de tentativa que é adotada por quase todos os Códigos atuais. O referi- do diploma penal^3 , em seu artigo 2º, estabe- lece que só há tentativa quando iniciada a execução , o crime não chega a consumar-se por circunstâncias alheias à vontade do agente. O grande mérito do CP francês foi estabelecer o termo inicial para a punição da tentativa, qual seja, a existência de atos de execução. Entretanto, o Código Penal da França de 1810 pune a tentativa com a mes- ma pena do delito consumado, solução re- pudiada pela maioria das legislações^4.
O crime, como todo fato humano, nasce, vive e morre; de um ponto de vista dinâmi- co, diz-se que ele percorre várias fases, que constituem o iter criminis^5_._ São elas: I) cogita- tio , é a cogitação, a ideação criminosa; II) conatus remotus , são os atos preparatórios; III) conatus proximus , são os atos de execu- ção e IV) consumatio , que é a consumação. A cogitação é a primeira fase do iter cri- minis. Toda ação humana passa por uma elaboração intelectual, assim, o crime tam- bém passa pela elaboração intelectual. É essa elaboração intelectual denominada co- gitação. Como sabido, a ação é a unidade dialética entre o querer e o fazer. Portanto, se só há o querer, que é a cogitação, não há ação, e por isso não há crime. A nuda cogita- tio , o simples querer o crime, não é punida. Já bradava, sobre isso, no Direito Romano o ju- risconsulto Ulpiano e, com relação ao Direito Moderno, são felizes as palavras de Welzel: “Também no Direito Penal da von- tade não se castiga a vontade má como tal, mas a vontade má em realização; isto não só porque a vontade má não é apreensível e a moralidade não pode ser imposta a força, mas também pelo profundo abismo que separa, em últi- mo caso, os pensamentos dos fatos”^6. Na história do Direito Penal, todavia, já se deu relevância à nuda cogitatio. Isso se deu no Direito Penal nazista, que era idealizado pela Escola de Kiel. Para a Escola de Kiel, o Direito Penal é um Direito de luta, que deve servir aos ideais superiores da raça ariana. O crime é originado por bacilos que se en- contram no ser humano (surge, pois, a bacte- riologia criminal ) e deve ser combatido antes que o sujeito pratique a ação, pois a função do Direito Penal é evitar que os delitos acon- teçam. Assim, o Direito Penal é um direito da periculosidade, que deve punir o agente antes que ele comece a delinqüir, basta que haja a ideação criminosa para ser imputa- da ao sujeito uma pena. Dizem, ainda, os teóricos do Direito Penal nazista que a von- tade de delinqüir só pode ser captada pelos
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Os atos preparatórios só são puníveis quando forem erigidos a tipos penais autô- nomos, como, v.g. , o tipo penal do art. 291 do Código Penal^13. Os atos de execução, conforme explica- do, são aqueles que começam a realizar o verbo descrito no tipo, como, por exemplo, disparar uma arma, no homicídio; pegar a coisa, no furto, etc. Todavia, a dificuldade desse critério re- side nas chamadas situações fronteiriças. No furto, como o núcleo-tipo é subtrair, o ato de execução começaria quando o agente tem o contato físico com a coisa; entretanto, é inegável a tentativa de furto quando, v.g. , o agente é surpreendido num apartamento à noite, sem ainda ter pego a coisa. Para so- lucionar tais dificuldades, Frank elaborou a fórmula da tentativa, que reconhece o iní- cio da execução em todos os atos que, em virtude de sua necessária correspondência à ação típica, aparecem como partes inte- grantes desta, de modo que, se não houves- se a interrupção da ação, a realização do tipo seria concretizada^14. Assim, o agente sur- preendido em um apartamento antes de ter contato físico com a coisa responderá por ato de execução de furto e, por conseguinte, por tentativa de furto, pela necessária correspon- dência entre a sua ação e a realização do tipo. A consumação é a reunião de todos os elementos da definição legal do crime^15 ; nos crimes que exigem o resultado (crimes mate- riais), é a concretização da conduta e do re- sultado. Nos crimes em que não se exige re- sultado, é a simples realização do verbo des- crito no tipo. É relevante salientar que, nos crimes que não exigem resultado, um eventual dano posterior que seja acarretado pela ação será tido como mero exaurimento do crime.
Para que haja a tentativa, são necessári- os dois elementos: 1 º) atos de execução 2 º) não-consumação do crime por cir- cunstâncias alheias à vontade do agente.
Esses elementos estão espelhados no art. 14, II, do Código Penal, que estabelece: “Diz-se o crime: I - (omissis) II- tentado, quando, iniciada a exe- cução, não se consuma por circuns- tâncias alheias à vontade do agente.” Com relação ao primeiro requisito (atos de execução), já foi visto que, antes de inici- ada a atividade típica, não há que se falar em tentativa, posto que estamos diante dos atos preparatórios e o primeiro requisito da tentativa são os atos de execução. O segundo elemento da tentativa diz res- peito à necessidade de circunstâncias alhei- as à vontade do agente impedirem a consu- mação do delito. Se o agente, por sua pró- pria vontade, não consuma o delito, esta- mos diante de outros institutos penais, como a desistência voluntária e o arrependimen- to eficaz. O Direito, na tentativa, considera reprovável a ação não consumada porque o agente dirigiu a sua vontade para a prática do ato lesivo ao bem jurídico. Destarte, o agen- te teve o dolo do crime , porém, circunstâncias alheias a sua vontade obstacularam a con- sumação; isso se dá porque na tentativa, “o tipo objetivo não está completo na tentativa; o tipo subjetivo, ao contrá- rio, deve dar-se plenamente, com o mesmo conteúdo e a mesma forma que é necessário para a punição pelo deli- to doloso consumado”^16.
A tentativa no direito brasileiro pode ser dividida em tentativa perfeita e em tentati- va imperfeita. A tentativa perfeita, também chamada crime falho, é aquela em que o agente reali- za todos os atos de execução, mas a consu- mação não sobrevem. Pode-se citar como exemplo a ação de Tício, que dá vinho enve- nenado a Simprônio durante o jantar. To- davia, Simprônio não morre porque, por uma característica biológica, era imune ao veneno. Nesse caso, o agente praticou todos
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os atos de execução e o resultado morte não sobreveio por circunstâncias alheias a sua vontade. Houve, pois, tentativa perfeita. No Direito comparado, há ordenamentos, como o Espanhol e o Português, que consideram a tentativa perfeita como frustração, que é um instituto independente da tentativa, punido mais gravemente. A tentativa imperfeita é aquela em que o agente não pratica todos os atos de execu- ção. É o caso, por exemplo, de Mévio, que, querendo matar Tício com uma facada no pescoço, tem seu braço desviado por Sim- prônio, que escorregara, de modo que o feri- mento se produziu na mão da vítima, não acarretando sua morte. No Direito compa- rado, ainda os ordenamentos Espanhol e Português, a tentativa imperfeita correspon- de à figura da tentativa. É relevante ressaltar ainda a figura da tentativa branca. A tentativa branca não produz nenhuma lesão efetiva ao bem jurí- dico, como no caso de Maria que descarrega o tambor de seu revólver no seu marido João e nenhum projétil atinge a vítima, devido à péssima pontaria do sujeito ativo.
A tentativa de crime é punida por conta de uma extensão típica. Quando a norma pe- nal define os delitos, ela o faz na forma con- sumada. Se faltar qualquer dos requisitos da definição legal, quer de natureza objeti- va, quer de natureza subjetiva, não há crime por falta de tipicidade. Todavia, na parte geral do Código Penal pátrio, diz-se que existe o crime na sua forma tentada e na sua forma consumada (art. 14). Para a figura da tentativa adquirir existência, por meio da tipicidade, é necessária uma combinação entre a parte geral do Código com os tipos penais da parte especial; nesse sentido, pode-se afirmar que a tentativa se configura por conta de uma extensão típica. A punibilidade da tentativa está previs- ta no parágrafo único do art. 14 do CP, que estabelece:
“Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena cor- respondente ao crime consumado, di- minuída de um a dois terços.” Não havendo disposição em contrário, pois, a tentativa enseja uma causa de dimi- nuição de pena obrigatória. Conforme salienta Damásio de Jesus, “nossa lei não faz diferença entre a tentativa perfeita (crime falho) e a ten- tativa imperfeita, pelo qual recebem igual tratamento penal no que tange a aplicação da pena em abstrato (art. 14, parágrafo único). Todavia, quando da imposição da sanção em concreto, o juz deve levar em conta a existência de uma das espécies (art. 59, caput )”^17. São três as principais teorias que funda- mentam a punibilidade da tentativa: a teo- ria objetiva (que é a adotada no Direito bra- sileiro), a teoria subjetiva e a teoria da im- pressão. A teoria subjetiva veio de Tittman, mas seu grande elaborador foi von Buri, que, in- clusive, introduziu-na na jurisprudência alemã do antigo Tribunal do Império. Para a teoria subjetiva, o fundamento da punibilidade da tentativa é a vontade contrária ao Direito posta em ação^18_._ A teoria subjetiva data da época em que ainda não havia uma distinção ci- entífica entre antijuridicidade e culpabili- dade, sendo a antijuridicidade considera- da uma ação lesiva ao Direito, provocada por um ato mau. Por isso se dá tanta rele- vância à vontade do agente. Cézar Roberto Bitencourt afirma, com relação a essa cor- rente, que a pena da tentativa era similar à pena do crime consumado^19 , posto que, tanto na tentativa quanto no delito consumado, o aspecto moral, subjetivo estava completo. A teoria da impressão também é digna de menção. Tal teoria, atualmente, é a teoria dominante na Alemanha e são partidários dela Maurach e Jescheck. A referida teoria da impressão foi fundada por Horn e foi desenvolvida por von Bar e nasceu da ten- tativa de conciliar elementos objetivos e sub- jetivos para fundamentar a punibilidade da
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dad del delito intentado, se impone la aplicación de una sanción atenuada con relación al delito consu- mado, pues aquél representa una disminución en su elemento material ”. ONECA, José Anton. Derecho Penal. Madrid : Ed. do autor, tomo 1, 1949. p. 408.
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